Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Educação tecnológica: desafios e perspectivas / Mirian P. S. Zippin Grinspun (org.)- - 2. ed - São Paulo : Cortez, 2001. Vários autores. ISBN 85-249-0719-3 1. Tecnologia - Aspectos sociais 2. Tecnologia - Estudo e ensino 3. Tecnologia-Filosofia I. Grinspun, Mirian P. S. Zippin.
CDD-607
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índices para catálogo sistemático: 1. Educação tecnológica 607
Mírian P. S. Zippin Grinspun (org.) Anna Maria Moog Rodrigues • Antonio Maurício Castanheira das Neves • Mírian P. S. Zippin Grinspun • Tereza Fachada Levy Cardoso
EDUCAÇAO TECNOLÓGICA desafios e perspectivas 2a edição
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Mírian P. S. Zippin Grinspun (org.) Anna Maria Moog Rodrigues • Antonio Maurício Castanheira das Neves • Mírian P. S. Zippin Grinspun • Tereza Fachada Levy Cardoso
EDUCAÇAO TECNOLÓGICA desafios e perspectivas 2a edição
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PREFACIO É comum ouvir-se dizer que a técnica nasceu com a humanidade, no momento em que o homem primitivo conseguiu lascar uma pedra para ser vir-lhe de instrumento cortante. Mas não teria sido só a habilidade manual a causa da evolução do hominídeo para o homem. Bernardo Bagolini, um jovem e talentoso arqueólogo do Museu Trentino de História Natural, de Trento, Itália, apresentou uma comunica ção ao II Seminário Latino-Americano sobre Alternativas de Ensino da His tória da Ciência e da Tecnologia, realizado pela Sociedade Brasileira de História da Ciência, em São Paulo, em fevereiro de 1987, sob o título: “Os significados do estudo das tecnologias líticas pré-históricas”, em que ele esclarece esse surgir da humanidade simultaneamente com a técnica lítica, a qual “acompanhou”, no dizer do autor, “a existência humana por aproxima damente dois milhões de anos”, a maioria dos quais com as técnicas da lasca das pedras, e somente bastante tardiamente com as de seu polimento. Não há dúvida de que os hominídeos pré-“homo-erectus” já utiliza vam pedras naturais como instrumentos; porém, não mostravam nenhuma intenção de servirem-se delas melhor ou de melhorarem suas formas. Pelo contrário, o “homo-erectus” já mostra uma primeira fase em que há uma coordenação de acaso e uso, “com rupturas não-intencionais de cascalho, usado como instrumento percursor, preso à mão”. Essa desemboca, há cerca de meio milhão de anos, numa segunda fase: a da concatenação, a da “intencionalidade-transformação”, primeiro estágio da verdadeira técnica. Nesse estágio é que aparece o que irá distinguir o homem do hominídeo: a intenção de usar o objeto como instrumento e de transformá-lo para melhor se valer dele. Isto já implica inteligência operativa, habilidade e coordenação das mãos — das quais resulta a simetria do instrumento e a distinção entre ins trumentos de golpe, de corte e de penetração, como verdadeiras inovações técnico-culturais. Isto simultaneamente ao aprendizado da escolha e econo mia dos materiais adequados e das distâncias às suas fontes. A difusão do “homo-sapiens” dá-se por volta de 40.000 anos, já com as técnicas de uso de
pontas de pedras em lanças de madeira e os pequenos artefatos de pedras, os assim chamados “microssílex”, e os instrumentos de pedra semelhantes aos cinzéis, com os quais era possível cortar e dar formas a outros materiais mais moles que as pedras. Foi nessa fase que o homem descobriu como usar o fogo para aquecer-se. Mas só no Mesolítico, há cerca de 10.000 anos, após três épocas glaci ais, é que o homem abandona suas cavernas para viver em cabanas ao ar livre, para caçar e pescar com arco e flecha, coletar sementes, nozes e frutas que apareciam em certas estações e certos locais. Mas somente no Neolítico, há cerca de 6.000 anos, o homem descobriu os segredos da agricultura, da cerâmica, do preparo de alimentos e bebidas e da construção de cidades, numa verdadeira revolução técnica. Desta forma constata-se que a técnica não se resume à invenção e uso de um instrumento. Ela tem a característica marcante de que, uma vez in ventado o primeiro instrumento, desencadeia-se um processo de melhoria de suas formas e usos para satisfazer necessidades crescentes da humanida de. A princípio muito lentamente, como se verifica durante o Paleolítico; mas depois acelerando-se até aparecem as técnicas que possibilitaram as primeiras civilizações pós-neolíticas. Este caráter, por assim dizer, progressista das técnicas foi muito bem ilustrado nas primeiras cenas do filme de Kubrick: 2001, onde se vê dois grupos de hominídeos em luta, até que um deles descobre que, usando um pedaço de osso, pode golpear seus inimigos e vencê-los. No auge da vitória, o hominídeo, entusiasmado, lança o osso para o ar, e esse, subindo ao som de uma valsa vienense, transforma-se numa nave espacial. Aí está expresso simbolicamente o caráter progressista da técnica. Uma vez descoberto o pri meiro instrumento, pelo homem primitivo, progressivamente ele será aper feiçoado até os atuais sofisticadíssimos instrumentos do homem atual, para a conquista dos espaços extraterrestres. Mas o inato caráter progressista da técnica não se explica somente pela habilidade manual concatenada a uma “intencionalidade-transformação” própria da espécie humana. Há que considerar ainda, como mostrou Ernest Cassirer em seu: An Essay on Man, baseando-se nas pesquisas do biólogo Johanes von Uexküll, sobre os sistemas receptor e efetuador que qualquer organismo possui, para adaptar-se ao meio em que vive. Mas o homem, e somente o homem, para adaptar-se ao seu ambiente, desenvolveu um terceiro meio, entre os dois sistemas comuns a todos os organismos. Cassirer chama a esse terceiro meio de “sistema simbólico”. Isto é, somente o homem é capaz de, entre sua percepção de algo e sua atuação sobre o mundo exterior, interpor um símbolo. E é esse símbolo que o faz compreen der e guiar sua ação sobre o mundo em que vive. E Cassirer desenvolve, nesse ensaio, a sua filosofia dos sistemas simbólicos: a linguagem, a ciência,
as artes e a história. O mais próximo e simples sistema simbólico que o homem adquiriu foi a linguagem. Portanto, naquele momento em que o homem diferenciou-se do hominídeo, com a utilização de um instrumento, nasceu necessariamente a linguagem. Foi essa linguagem que conferiu um caráter progressista à técni ca, pois somente dentro de um sistema simbólico, como o da linguagem, é que os símbolos mentalizados podem associar-se entre si formando Conotações que levam à melhoria de fabricação e ao uso dos objetos utiliza dos como instrumentos. Por exemplo: entre as palavras “pedra” e “cortar” Conota-se a expressão “faca de pedra para cortar melhor”. E a linguagem que, com o poder simbólico das palavras, através de denotações e conotações, possibilita, por meio das imagens mentais suscita das pelas palavras, como símbolos de coisas e de eventos, a compreensão, o Conhecimento e o aperfeiçoamento das coisas e eventos percebidos, permi tindo ao homem a intenção de transformá-los. Além disso, a linguagem é meio de comunicação que permite o aprendizado e o adestramento. Portan to, a técnica — que nasceu com a humanidade — não teria esse peculiar caráter de progressividade se não fosse dado ao homem o dom da lingua gem. Pelo relato de Bagolini pode-se conjeturar que o desenvolvimento do caráter simbólico, das reações do homem ao meio ambiente, ter-se-ia desen volvido, a princípio muito lentamente, como num longo aprendizado; mas, uma vez estabelecido, acelerara-se cada vez mais. Assim se poderia enten der como conclusão que a técnica, a linguagem e a humanidade apareceram num mesmo momento, ainda que esse momento tenha durado centenas de séculos. Desse relato pré-histórico pode-se intuir o que foi a técnica em sua origem. Entretanto, ela tem uma história, ao longo da qual evoluiu adquirin do, em cada época, novos aspectos que se iam somando àquele inicial. Ela está presente nas civilizações míticas; aquelas que, como a egípcia e a mesopotâmica, são regidas por mitos — contos sobre os feitos de deuses e heróis que, por sua ação, instituem as crenças, a sabedoria, a organização social e, também, suas técnicas. São civilizações fechadas, hierárquicas e rigorosamente ritualísticas, que só entram em contato umas com as outras, em guerras, para se destruírem. São notáveis, por exemplo, as técnicas arquitetônicas do antigo Egito e da Mesopotâmia; a primeira com as pirâmides e a segunda com os zigurates. Há também o aparecimento de protociências, como a Geometria egípcia, constituída como regras para medir terrenos, e a Aritmética babilónica, como regras para resolver problemas numéricos. Não há, entretanto, teorias que justifiquem essas construções geométricas ou cálculos aritméticos. Portanto pode-se defender a tese de que tais protociências, seriam técnicas de medir e calcular.
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Nessas civilizações, as técnicas são consideradas como trazidas aos homens pelos deuses ou heróis semidivinos, por meio de relatos míticos. Em civilizações míticas, muito próximas de nós, como o são as dos incas e astecas, esses mitos ainda estão vivos entre as populações indígenas, suas descendentes. Um exemplo é a lenda de Quetzalcoatl (a Serpente de Plu mas), um herói civilizador que ensinou aos astecas a agricultura, principal mente do milho, e outras técnicas, inclusive as de medir o tempo pelas estre las. Note-se que os mitos já existem em culturas semelhantes às do Neolítico, como a dos índios brasileiros, nas quais há, por exemplo, a lenda da mandio ca. Uma moça está desgostosa da vida e pede a sua mãe que a enterre viva. A mãe a enterra numa floresta; mas ela protesta que há muita umidade. En tão a enterra numa savana; mas há também o protesto de que é muito seca. Finalmente a enterra numa clareira da mata. Ao voltar, a mãe ouve um grito; retorna e encontra um arbusto; arranca-o como se puxasse os cabelos da filha, e então surge da terra as raízes do arbusto. É a mandioca. Essas civilizações míticas desaparecem na época em que surgem na China, o taoísmo; na índia, o hinduísmo e o budismo; na Pérsia, a religião de Zoroastro; na Palestina, os profetas; e na Grécia a episteme theoretike, as sabedorias teóricas, tanto da geometria e aritmética como da filosofia. Karl Jaspers, autor do magnífico estudo Origem e Meta da História, chama a essa época que transcorre de 800 a 300 antes de Cristo, de época axial. Nela é que as revelações religiosas, as sabedorias e, também, as técnicas não mais seriam trazidas aos homens por deuses ou heróis civilizadores; mas sim por homens historicamente existentes, tais como Lao-tsé, Confúcio, Buda, Zaratustra, os profetas judaicos e os filósofos gregos. É a época em que os homens se individualizam como seres existentes num determinado local e num deter minado tempo. Pois bem, isso aconteceu também com as técnicas. Não seriam mais deuses ou heróis míticos que as ensinariam aos homens; mas sim passariam a ser transmitidas de geração a geração, dos mestres aos aprendizes. Na Grécia aparecem as techné, das quais a mais documentada é a medicina, a qual não é mais revelada aos homens pelo deus Esculápio; mas ensinada até mesmo por escrito, como o é pela coleção de livros de medicina de Hipócrates — o corpus hipocrático. Esses tratados não envolvem teorias, mas somente o como fazer. Há, na Grécia, é verdade, também uma explicação filosófica das doenças; mas os livros hipocráticos insistem que a função do médico é curar as doenças e não compreendê-las. Isto veio a se constituir como cará ter fundamental de toda a técnica. Em suma, a técnica toma-se um saberfazer possível de ser aprendido, sem nenhuma recorrência ao divino nem também ao saber teórico. As ars romanas seguem o mesmo caminho. Tanto a medicina como a arquitetura podem ser assunto de tratados, como o de Vitrúvio De arquitetura, ou como o de Celso De re medicina, destinados ao
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ensino das técnicas necessárias para construir edifícios, pontes c estradas ou uuar doenças. Com a queda de Roma e a vinda do Cristianismo, a humanidade euro péia desinteressou-se pela natureza e pelo seu conhecimento teórico. Po rém, a maneira de pensar teórica preservou-se na teoria de Deus, a Teologia. Mas as técnicas desenvolveram-se espetacularmente, a princípio nos mos teiros, pelo trabalho considerado como louvor a Deus. Assim, as artes roma nas não só foram preservadas como desenvolvidas, mantendo-se o caráter de saber-fazer para fins práticos, ensinado de geração a geração. Mas não só a arquitetura e a medicina desenvolveram-se. O progresso na tecelagem foi notável, acompanhado pelo corte e confecção de roupas. A navegação de senvolveu-se até permitir viagens oceânicas. O uso da força motriz das rodas-d’água e dos moinhos de vento estabeleceu-se. A atrelagem de cavalos para seu uso como animais de tiro deu um grande impulso ao transporte a longas distâncias tanto de pessoas como de mercadoria, e o grande desen volvimento da arquitetura permitiu a construção das catedrais. Tal desen volvimento das técnicas deu lugar a uma verdadeira revolução industrial, tanto na agricultura como na mineração. Tudo com um interesse todo espe cial pelas coisas mecânicas, como atesta o desenvolvimento dos relógios mecânicos. Tudo isso foi muito bem descrito por Jean Grinpal em seu La revolution industríelle du Moyeu Age.
Talvez esse progresso industrial medieval é que tenha permitido che gar, no final do século XV, à descoberta do caminho para as índias, pela maravilha técnica naval que foram as caravelas portuguesas e a navegação pelas estrelas, baseada em conhecimentos de astronomia e de matemática. Com isso surge o Renascimento e o novo interesse pelo conhecimento da natureza e de seus segredos. Começa-se a perceber que aquilo que era ensi nado aos aprendizes por seus mestres, principalmente através do trabalho, essencialmente em base a habilidades manuais, poderia ser realizado pelo estudo e conhecimento de teorias científicas. Mas isso só toma corpo quan do Galileu, no início do século XVII, já recluso em sua Vila de Arcetri, escreve seus Discursos sobre duas novas ciências, onde ele mostra como calcular uma viga em balanço utilizando conhecimentos teóricos da sua nova ciência: a Mecânica Racional. Mas a aplicação de teorias científicas para resolver problemas técnicos foi por muito tempo mal-sucedida. A própria fórmula de Galileu para calcular a viga em balanço não era correta. Cientis tas como Leibniz, Huyghens e Euler fracassaram em seus intentos de resol ver problemas técnicos. Contudo, dessa tendência nasce o que propomos chamar de Técnica Moderna — a qual se propõe a resolver problemas técni cos através de conhecimentos práticos; porém, só eventualmente, auxiliados por teorias científicas. É o caso da invenção da máquina a vapor por Watt, um prático de laboratório apenas instruído em conhecimentos científicos. Por quase 50 anos as máquinas a vapor funcionaram satisfatoriamente, sem 11
se saber por quê, até que Carnot as explicou, fundando com isso a Termodinâmica. Semelhantemente aconteceu com o gerador e o motor elé tricos, porém dessa vez após os técnicos já terem noção da teoria da indução elétrica. E sob a égide dessa Técnica Moderna que se faz a Revolução In dustrial na Inglaterra. Enquanto na França surge a Engenharia, como pro fissão daqueles que resolvem problemas de construção de obras ou fabri cação de produtos, baseados em conhecimentos científicos principalmen te matemáficos. E nesse contexto que surge a Tecnologia. A princípio ela é uma sim ples disciplina pela qual se estudam e se sistematizam os processos técnicos. Lentamente ela vai-se desdobrando em pesquisa sobre as propriedades dos materiais de construção ou dos industriais. Um dos primeiros laboratórios onde se realizam pesquisas tecnológicas é o de Edison, em Menlo Park, EUA. E notória, por exemplo, a pesquisa sobre o material a ser usado nos filamentos das lâmpadas elétricas, que deviam incandescer para emitir luz, porém, sem se fundirem. No Brasil, já no início do século, o Gabinete de Resistência dos Materiais da Escola Politécnica de São Paulo, desenvolveu uma extensa pesquisa tecnológica sobre as propriedades dos materiais de construção usados em São Paulo. Porém, com a incipiente indústria eletrônica, no início deste século, em relação com as válvulas termoiônicas para o rádio e a televisão, foi que a Tecnologia, como utilização de teorias e métodos científicos para resol ver-se problemas da técnica, atingiu seu pleno sucesso. Com a computação eletrônica e a informática a tecnologia adquiriu seu predomínio atual. É no tório o extraordinário desenvolvimento da pesquisa tecnológica a partir de então, atingindo a posição dominante na cultura moderna, que a caracteriza atualmente. A tecnologia não é mais o simples saber como-fazer da técnica. Ela exige, por parte de seus agentes, um profundo conhecimento do porquê e do como seus objetivos são alcançados. Além disso, exige da sociedade em que ela se instalou uma reformulação de sua estrutura e metas, compatí vel com a utilização dos benefícios que trouxer. Contudo a sociedade pode e deve rejeitar eventuais malefícios advindos da atuação tecnológica; mas será necessário que essa rejeição seja feita em base a razões científicas, inclusive econômicas, pois só essas a tecnologia aceita. Isto é: vem-se observando que a correção dos eventuais malefícios da tecnologia está sendo feita pela própria tecnologia, como, por exemplo, a preservação dos ambientes naturais que é, atualmente, um problema tecnológico. De tudo isso decorre que a tecnologia não é mercadoria que se compra ou vende. Ela é um saber que se adquire pela educação teórica e prática e, principalmente, pela pesquisa tecnológica. Uma nação só adquirirá capacitação tecnológica se tiver um sistema de educação completo, incluin do ciências teóricas e aplicadas, e quando dispuser de instituições de pesqui-
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«a e órgãos financiadores das mesmas. A crônica histórica dos eventos tec nológicos recentes, ou de um passado próximo, vem mostrando o fracasÍ0 da transferência de tecnologias quando se pretende comprá-las, ou embu tidas em aparelhos, máquinas ou produtos ou em pacotes de planos, dese nhos e especificações, sem os concernentes conhecimentos por parte dos compradores. Ela tem que ser aprendida através de um sistema educacional üdcquado. Daí o relevante papel assumido pela educação tecnológica, quer para » preparação de todo aquele que vive em sociedades em que a tecnologia estabeleceu-se quer para a formação de pessoal habilitado que a crie, desen volva e opere. Daí o valor e a oportunidade deste livro, em que Mírian Zippin Grinspun, Anna Maria Moog Rodrigues, Maurício Castanheira e Tereza Fachada Levy Cardoso fundamentam filosófica e historicamente, em mag níficos ensaios, a natureza e a importância da estreita relação que há entre Jiducação e Tecnologia, dentro do contexto social e ético. Todos esses pro fessores estão amplamente credenciados para tal, dada a sua posição e notó ria atuação na área de Educação Tecnológica, em cursos universitários de pós-graduação. ífe. Já no primeiro capítulo Mírian Paura Sabrosa Zippin Grinspun define, ampla e substancialmente, o que se deve entender por Educação Tecnológica. De maneira alguma trata-se do ensino técnico-profissional; mas da educa ção visando a formação não só de tecnólogos, como de todos os que vivem nas sociedades tecnologizadas, no sentido de guiar ao desenvolvimento tecnológico, para que ele não ponha em choque a responsabilidade, a liber dade e a autonomia humanas. Em seguida Anna Maria Moog Rodrigues mostra, esclarecidamente, a importância de uma Filosofia da Tecnologia a ser estabelecida como prolegômenos da Educação Tecnológica, no sentido de estabelecê-la como uma paidea grega; isto é, “não só formação e transmissão de valores e co nhecimentos, mas o conjunto da própria cultura, onde esses valores foram elaborados e recriados de geração em geração”. Enfim, a Filosofia da Tecnologia teria como seu principal propósito demonstrar como a tecnologia é parte da cultura ocidental, e não um conjunto de aparelhos e nem mesmo tão-somente um puro saber-fazer, baseado em conhecimentos científicos. Anna Maria Moog Rodrigues mostra como a cultura tecnológica suscita questões referentes a própria essência da tecnologia e suas relações com o homem. Portanto, levanta questões de Ética e de ordem política e religiosa. Questões essas que são expostas e debatidas, extensa e clarividentemente em capítulo seguinte, por Antonio Maurício Castanheira das Neves, que baseia sua argumentação em um princípio de responsabilidade do ho mem para com o homem, postulado por Hans Jonas. Finalmente, no último capítulo, Tereza Fachada Levy Cardoso aborda historicamente o tema da “Sociedade e Desenvolvimento Científico”. Muito
acertadamente a autora lembra que herdamos um mundo radicado no que foi chamado anteriormente de “época axial”, na Grécia antiga; porém reestruturado no século XVII com o aparecimento de ciência moderna e de uma técnica subordinada a conhecimentos científicos. Sob esse enfoque é relatado pormenorizadamente o desenvolvimento da técnica e a construção da ciência e da tecnologia moderna, para fazer compreender o impacto tecnológico sobre o mundo atual. Este enfoque histórico permite à autora concluir com uma brilhante exposição sobre o papel da educação tecnológica, no mundo assim estruturado, para estabelecer-se o controle da tecnologia através dos valores humanos. Desta forma os autores, muito acertadamente, enfatizam em suas con clusões, a questão da ética como “extremamente importante no terreno da tecnologia, uma vez que alguns aspectos transcendem a utilização de uma tecnologia mais sofisticada para encontrar-se com a reflexão dos limites e parâmetros desejáveis e aceitáveis de sua ação”. Esta é uma questão extre mamente difícil de ser resolvida; mas sua solução está sendo urgentemente requerida para evitar que o predomínio que atualmente a tecnologia exerce sobre a sociedade não venha a se constituir como ameaça até mesmo para a existência humana. A solução porém está no próprio caráter da tecnologia como saber que se aprende; isto é que exige uma educação. Daí a importân cia da Educação Tecnológica tão bem anunciada e definida neste livro. Milton Vargas
Prof. Emérito EPUSP
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APRESENTAÇAO Estamos quase perto da chegada do novo milênio, em que inúmeras transformações já se fizeram sentir, assinalando que o novo tempo estará repleto dessas modificações e que o homem, a cada dia, também vai se mo dificando à luz desta nova realidade. Os avanços científicos e tecnológicos mostram-nos que essas mudanças são irreversíveis e só tendem a se ampliar, uma vez que existe uma rede de conhecimentos que cada vez mais se multi plica e se entrecruza nos seus objetivos. Precisamos, então, assumir que o contexto que vivemos — fruto do passado e do presente — caminha para um futuro de uma forma um pouco previsível — em termos de planejamen to das perspectivas esperadas —, mas imprevisível em termos de conheci mento, de novas descobertas e inovações. Um dia tivemos a pedra, depois os objetos que trabalhavam com e na pedra; muitos e muitos séculos depois, com a Revolução Industrial, tivemos a presença da máquina e, posteriormente, pelo caminho da máquina fomos encontrando toda a constatação de um novo mundo marcada pela era da tecnologia. Na verdade, a tecnologia assinala a presença de duas categorias : percebidas de forma muito ampla e generalizada, que são o tempo e o espa ço, e a relação do homem para viver e conviver com essas categorias vai exigir uma nova formação que seja fundamentada no conhecimento, na re flexão e na ação. Dizem os estudiosos desta área, como Adam Schaff, que estamos em plena segunda revolução industrial, a qual se caracteriza por novas bases do processo produtivo, decorrentes dos avanços da microeletrônica. Schaff (1991) diz que esta nova revolução coloca uma série de problemas sociais ligados à necessidade de se encontrar uma instituição que possa substituir o trabalho humano tradicional, de modo que o indivíduo possa satisfazer suas necessidades não-materiais, isto é, as espirituais. Esta revolução técnicocientífica é constituída de uma tríade: a revolução microeletrônica, a revolu ção da microbiologia e a revolução energética.
Vivemos a era basicamente, da tecnologia, resultado do que a ciência já produziu ou está produzindo. Inúmeras são as conseqüências das novas tecnologias que, com o seu poder multiplicador, têm se voltado a quase to dos os campos da esfera humana. Podemos perceber, seja no lar, na escola, na indústria, no comércio, na fábrica ou na igreja, na cultura e no lazer, seja em que área ou campo nos dedicarmos, que a tecnologia trouxe-nos uma nova linguagem, um novo conhecimento, um novo pensamento, uma nova forma de expressão. O homem passou a ter uma melhora da qualidade de vida, assim como uma média de vida muito maior, se compararmos com o início do século, por exemplo. As repercussões ocorrem em todos os seg mentos da sociedade, nas suas diferentes instituições e na própria vida da sociedade com seus pontos positivos e com os seus desafios para viver as mudanças existentes. A relevância da tecnologia na sociedade contemporânea está ratificada em todos os seus domínios e seus reflexos transcendem aos seus resultados/ produtos para relacionar-se entre si numa cumplicidade permanente — seja nos campos político, econômico, social e pedagógico. Não se pode avaliar ou indicar com precisão aonde as tecnologias levarão o homem neste novo milênio que se aproxima: a globalização, as novas políticas de governo, os novos grupos formados na sociedade (por exemplo, via Internet) nos dão alguns modestos exemplos de radicais mudanças e novas transformações neste tempo vivido. Para Sigaut (1996), o termo tecnologia difundiu-se na Europa depois da Segunda Guerra Mundial, primeiramente com a mesma acepção que nos países anglo-saxões de onde provinha, isto é, para designar conjunto de téc nicas modernas e de cunho científico, em oposição às práticas realizadas pelos artesãos. Para autores como Gama (1987), também, no Brasil o termo começou a ser difundido depois da Segunda Guerra Mundial, mas aqui a tecnologia veio como uma substituição à palavra técnica. Este termo pro vém do vocábulo grego techné, que significava o método, a maneira de fa zer eficaz para atingir um determinado objetivo e resultado. Hoje o que do mina nas civilizações é a percepção da técnica como um conjunto de meios necessários para atingir objetivos específicos de produção, sendo esse con junto formado de conhecimentos e habilidades, de ferramentas e máquinas, passando pelas organizações e instituições. Para Vargas (1994), a técnica é uma habilidade humana de fabricar, construir e utilizar instrumentos. Para o autor o surgimento do homem, da técnica e da linguagem teria ocorrido num único momento, embora esse momento possa ter durado séculos. Perrin (1996) diz que, para entendermos o futuro das técnicas, devemos considerar o conjunto de seus componentes: artefatos, conhecimentos, organizações, instituições e símbolos. Não seria a técnica em si, mas tudo aquilo que en volve a produção e o resultado da técnica. Para Ortega y Gasset (1963) a técnica é a produção do supérfluo, hoje e na era paleolítica, e que ela repre16
senta o meio para satisfazer as necessidades humanas. Ortega diz que a téc nica atual se diferencia das outras pela fundamentação nas ciências, sendo que hoje a técnica moderna tem plena segurança e independência em si mesma. Afirma que os atos técnicos “São aqueles em que dedicamos o esforço, primeiro para inventar e, depois, para executar um plano de atividades que nos permita: I o — assegurar a satisfação das necessidades, evidentemente elementares; 2o — conseguir essa satisfação com o mínimo de esforço; 3 o — criar- nos possibilidades complementares novas produzindo objetos que não existem na natureza do homem” (p. 30). Segundo Vargas (1994), a tecnologia como disciplina surge na segunda metade do século XIX, distinguindo-se do estudo das técnicas e da engenharia. Sua finalidade inicial foi a descrição, de maneira interpretativa, das técnicas, dos processos técnicos e da forma de preparação ou fabricação de | produtos industriais, além das formas de organização econômica do trabalho técnico. Sempre relacionada à técnica, Gama (1994) vai nos dizer que a tecnologia é o saber da técnica, sendo o seu conceito ligado ao conceito de produção. O termo amplo na sua conceituação tem em Vargas (1994) uma conotação de desenvolvimento, sendo sua essência encontrada no saber ci entífico moderno para a solução de problemas da técnica. Para ele a tecnologia seria um “conjunto de atividades humanas associadas a um sistema de sím bolos, instrumentos e máquinas visando à construção de obras e à fabrica ção de produtos, segundo teorias, métodos e processos da ciência moder na” (p. 16). Acredita Vargas que o grande problema é ter se confundido tecnologia com mercadoria que se compra quando não se tem ou vende-se quando se tem. Há um momento, diz o autor, da aquisição do conhecimento tecnológico e outro momento relacionado ao campo econômico-industrial da introdução no mercado de um novo instrumento ou de um novo processo decorrente do saber tecnológico (Vargas, 1994:17). A ampla discussão so bre a tecnologia, seu conceito, sua finalidade e seu processo se apresenta, como diz Perrin (1996), ainda, um verdadeiro déficit em matéria de reflexão pedagógica, histórica e filosófica sobre as técnicas. Quanto mais nos debru çamos sobre o estudo da tecnologia, mais nos deparamos com o encontro dos conceitos de irreversibilidade e transformação, quase que concomitantemente ao conceito de um novo tempo para viver essas trans formações. A complexidade do conceito/estudo se estende à estreita vinculação entre tecnologia e ciência, entre técnica e tecnologia e, se quiser mos nos estender um pouco mais, entre tecnologia e educação. O homem e a máquina, de forma mais diferenciada possível, já foi identificado como uma relação que não se confina à questão da produtivida de, nem da utilização da máquina pelo homem, mas sim nos toma de impac-
to no sentido do comportamento do homem perante a máquina (máquina aqui entendida nos produtos das novas tecnologias surgidas no mercado, na sociedade). O que nos chama a atenção, porém, é a falta de uma orientação mais precisa ou mais reflexiva no questionamento da educação para esse novos tempos. Aqui queremos fazer uma referência do que pensamos para esse momento que não se esgota em conhecer a tecnologia, construir o co nhecimento para produção da tecnologia, mas sim da postura do homem, para viver com e para a tecnologia. Se é claro para todos nós que não pode remos prescindir do computador, se é claro que a tecnologia trouxe-nos avan ços consideráveis e descobertas até então impossíveis — seja pelo tempo seja pela permanência —, ainda não está claro que tipo de educação devere mos dar aos nossos alunos — em especial aos criadores/produtores da tecnologia — para dela fazer-se um aliado e não um simples objeto de domi nação ou até de alienação. Esta é a proposta deste livro que tem por objetivo refletir sobre ques tões no campo da educação comprometida com a tecnologia, mas que nela não se esgota, nem lhe deve atemorizar e sim conhecê-la e ter as ferramentas para construí-la, mas sobretudo entender e avaliar as implicações no campo dos valores (e com destaque para a ética), das atitudes e do seu desenvolvi mento pessoal e social. Observamos que as grandes repercussões da tecnologia trouxeram novos paradigmas científicos que, por sua vez, vão repercutir no modelo pedagógico, na noção de educação, na relação entre educador e educando, nos conteúdos e nas novas metodologias. A educação em tempos modernos está inter-relacionada com esses novos paradigmas que se entrelaçam, mas ela, também, deve promover com sua filosofia e procedimentos a formação do sujeito. De um lado, temos os recursos, a racionalidade e a objetividade da tecnologia, e, do outro, o homem, também com seus recursos e suas potencialidades que devem ser trabalhados e desenvolvidos. Acrescem-se, ainda, as modificações que ocorrem nas relações sociais a partir dos resulta dos ou conseqüências advindas dos avanços científicos-tecnológicos. A educação, por um lado, tem um compromisso com a transmissão do saber sistematizado e, por outro, ela deve conduzir à formação do educando fazendo-o capaz de viver e conviver na sociedade, participar de sua vida na relação com o outro. Não podemos, então, separar a tecnologia do homem, tanto no sentido de possuir os conhecimentos e saberes para produzi-la, como para saber como essa tecnologia pode e vai influir na sua subjetividade. O que dificulta ainda mais esse papel na educação é que este saber não mais existe de forma linear e hierárquica; ele se produz em redes de conhecimen to que estão disponíveis dentro e fora da Escola, onde sistematicamente ocorre a educação. Está subjacente à criação e à utilização da tecnologia um con junto de conhecimentos, crenças, hábitos, valores que se amálgamam no interior do indivíduo, construindo a sua própria subjetividade. Podemos acres18
eentar a esse contexto, onde a tecnologia é produzida e consumida, a ques tão cultural da aquisição da mesma e da complexidade da sua utilização. A Educação, como uma área das ciências humanas, tem como objeto de estudo o homem; portanto, ele é o objeto de investigação que durante muitos séculos teve abordagens diferenciadas, como as referentes ao perío do do humanismo, do positivismo, do historicismo e, hoje, estão inseridas na linha do relativismo (Chaui, 1999). Os indivíduos humanos e as institui ções socioculturais só são compreendidos na medida em que a investigação esteja dentro de uma teoria geral da História, que possibilite entender cada formação sociocultural como uma visão do mundo particular, ou como uma etapa de um processo histórico universal. Ora, para falarmos de educação, Hoje, para projetarmos uma educação para o presente e para o futuro, deve mos estar ligados ao momento histórico de sua produção. Este momento, j. portanto, contempla o campo da tecnologia como parte desta história que, por sua vez, está interligada à questão da formação e construção do sujeito. Quando investigo o homem em determinada circunstância, num determina do período histórico, ele vai ser fruto das inter-relações que se manifestam no interior desse momento pesquisado. A tecnologia faz parte desse contex to não como algo de fora, mas como parte de um todo em que o homem cria, recria e se beneficia da sua própria realização e das demais colocadas na sociedade. O objeto de um debate de educação tecnológica parte exatamente des sa proposta: que tipo de educação devemos dar aos educandos, em especial aos tecnólogos, para compreenderem a tecnologia na sua essência, no seu processo de interação com a formação do sujeito? De um modo geral, em educação utilizamos da tecnologia em termos de uma tecnologia educacio nal em que uma série de recursos e procedimentos auxiliam o processo pe dagógico. Vários fatores interagem nessa tecnologia educacional enquanto ela favorece, promove melhores condições para a aquisição dos conheci mentos e competências propostos. Nosso objetivo, entretanto, é discutir a tecnologia na educação e a relação tecnologia — educação como uma rela ção significativa no mundo atual. Temos diferentes formas de educar e di versos procedimentos para alcançar nossos objetivos; não podemos desco nhecer a tecnologia, nem subestimá-la ou superestimá-la em termos da edu cação. O convívio com as duas áreas, mais do que um desafio, impõe-se como necessidade de compreensão e ação do educador do mundo moderno. Nosso enfoque, neste livro, volta-se para o educando, ou como ele deve ser formado para pensar, saber, saber-fazer, e saber-ser em tempos de uma i tecnologia que está sempre se desenvolvendo e se ampliando. De um lado, a ciência transformando a técnica em tecnologia; do outro, a tecnologia posta a serviço do homem que precisa de uma educação que transcenda o casuísmo, o fatalismo, para conhecer melhor a complexidade da tecnologia como pro;)- ■ duto, como processo, como conhecimento, como sentimento, como realida
de, como identidade. Além dessas considerações específicas, temos as re percussões sociais oriundas desta tecnologia. Queremos, então, contribuir para a reflexão sobre a construção deste novo conhecimento, para a forma ção de um sujeito capaz de saber de si e saber sobre o mundo manifestandose como sujeito que percebe, compreende, imagina, reflete, pensa e fala. E um entendimento de si e do mundo de forma mais abrangente. Este livro nasceu da vontade de um grupo de professores que partici pou do Corpo Docente do Curso de Mestrado em Tecnologia, no Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro, na área de Educação Tecnológica.1 Experiência pioneira no Estado do Rio de Janeiro, o Curso destina-se a promover aos profissionais de diferentes áreas do conhecimen to um aprofundamento no campo da tecnologia. Tivemos alunos/profissio nais da engenharia, arquitetura, medicina, professores, químicos, matemáti cos etc. que, com seus saberes diferenciados e específicos, propiciaram-nos questionamentos significativos referentes à reflexão do que se entende por uma educação tecnológica. Em face das exigências dos órgãos superiores e das avaliações que se fizeram necessárias, o projeto inicial sofreu algumas revisões, mas a ênfase continua na área tecnológica com sua inter e multidisciplinaridade, eviden ciada pela relação do conhecimento tecnológico moderno com o mundo produtivo e social contemporâneo. O Curso, em si, com suas características e proposta curricular, propiciou-nos uma reflexão maior nesta área da edu cação tecnológica, buscando aproximar educação e tecnologia pelo cami nho da interação entre esses dois grandes campos, levando em consideração o homem como pessoa na sua construção pessoal e da própria sociedade. Iniciamos a primeira parte do livro tratando da Educação Tecnológica, que tem por objetivo identificar o significado desta expressão e a finalidade de seu conteúdo no campo pedagógico. Aqui há uma representatividade tan-
1. O Curso de Pós-Graduação em Tecnologia, em nível de Mestrado, foi implantado a partir do primeiro semestre de 1992, com três áreas de concentração: Processos Tecnológicos, Gerência da Tecnologia, depois denominada Gestão da Tecnologia e Educação Tecnológica. O Curso foi formado por um corpo docente de professores do próprio CEFET/RJ e, posterior mente, foram contratados mais cinco doutores como professores visitantes. O Curso admitiu, em 1994, doze alunos para a área de Educação Tecnológica (seis em cada semestre). A área de Educação Tecnológica — de onde provém o grupo de professores aqui apresentado — era a área com maior número de alunos e se destinava à preparação profissional dos indivíduos para ocupação de posições imediatas no mundo do trabalho, implicando um enfoque direto sobre as diversas atividades profissionais. O que caracterizava o Curso era sua dimensão multidisciplinar e interdisciplinar. De acordo com Camargo (1997), o Curso de Mestrado em Tecnologia teve o seu projeto inicial em 1990, tendo recebido, posteriormente, mais três reformulações. No momento atual, 1999, está em vigor um novo projeto, e o curso tem a denominação de Curso Novo, de acordo com a avaliação dos órgãos superiores.
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to do que se entende oferecer aos jovens uma educação nesta área, como também, comporta a análise do que se pretende buscar na formação docente dos profissionais em tecnologia da perspectiva educacional. O segundo artigo trata da Filosofia da tecnologia, buscando os pilares básicos onde se constrói a tecnologia e suas repercussões no campo da edu cação. O terceiro artigo aborda a questão da ética e sociedade identificando os pontos básicos em que a tecnologia vai se desenvolver e quais os princí pios éticos que a regem no contexto atual. O quarto artigo trata da história da tecnologia, procurando retratar os pontos principais do tema na realidade brasileira, em especial. Sabemos que muitas outras dimensões poderiam ser trazidas para este livro; nossa proposta é — partindo de nossas experiências — iniciarmos um debate sobre o tema evidenciando a necessidade de termos uma educação tecnológica que, mais do que oferecer material e ferramenta para as inúme ras mudanças que dela decorram, ofereça também as condições de compre ensão do educando, do sujeito que se utiliza da tecnologia, mas dela recebe e dá, através de sua subjetividade, a organização de um homem que, mais do que nunca, cria, usa e, portanto, vive em plena era tecnológica. Nosso desejo (dos autores aqui apresentados) é de provocar uma re flexão sobre os rumos de uma educação que deverá se posicionar e partici pou da revolução científico-tecnológica que, cada vez mais, está nos conclamando para um novo tempo. Como preparar os profissionais que li- , darão diretamente na construção/criação de novas tecnologias? Como for mar o educando, o cidadão para viver esse novo tempo de forma a ter uma consciência crítica da tecnologia como conhecimento, e não como uma di mensão de dominação em termos políticos-sociais-econômicos? Como o homem deve ser educado para unir o conhecimento tecnológico com a sen sibilidade necessária para não ser uma nova máquina de seu tempo? Como a escola deve trabalhar esta educação tecnológica? Educação tecnológica é uma configuração da educação que se apre senta voltada mais para educação, mas que se caracteriza por uma comple xidade em seu significado; pressupõe uma dimensão pedagógica nos funda mentos de sua atividade técnico-científica, possibilitando oferecer os co nhecimentos que visem à formação do homem inserido na cultura de seu tempo, na sociedade de que participa e nas mudanças que acredita coletiva mente poder alcançar. A complexidade da expressão está no fato de que a sua concepção envolve, além dos pilares da educação em si, todos os aspectos que dizem respeito à tecnologia, em especial a ciência e a técnica. Como diz Morin (1991), há complexidade onde quer que se produza um emaranhado de ações, de interações e de retroações, pois nosso universo é fruto do que o autor chama de dialógica de ordem e desordem (p.277). Exatamente esta é a visão 21
da educação tecnológica: emaranhado de ações, interações no nível do con creto, do real e, também, do simbólico. Bastos diz que a concepção de educação tecnológica exige cada vez mais que as instituições e a sociedade, de modo geral, reflitam e se aprofundem sobre este conceito e sobre os procedimentos metodológicos que deverão ser colocados em prática para que se atenda não só às questões do progresso técnico como do surgimento de um “novo paradigma organizacional voltado para a inovação e a difusão tecnológica” (1997:48). Afirma o autor: “A educação tecnológica situa-se simultaneamente no âmbito da edu cação e qualificação, da ciência e tecnologia, do trabalho e produção, enquanto processos interdependentes na compreensão e construção do progresso social reproduzidos na esfera do trabalho, da produção e da organização da sociedade” (Bastos, 1997:65) Hilst (1994) diz que a educação tecnológica deve estar voltada para os desafios das gerações futuras em termos de modernização e capacidade antecipatória, e, se ela deve ser entendida como algo que visa à felicidade do homem, precisamos urgentemente desenvolvê-la dentro desta concepção, baseando-nos não só em conhecimentos científicos mas, principalmente, nos valores que nossa sociedade nos impõe. Posso dizer que tenho a técnica que se transforma na tecnologia e, por sua vez, compreende um saber específico, o qual pode resultar num produto final ou numa teia de processos cuja utilização faz parte da indústria de bens de consumo; ela retorna pela sua função e modernização, pelos estudos e pesquisas à etapa inicial para uma reformulação, transformação ou supera ção da mesma e criação de nova tecnologia. A habilidade da concepção, do processo e da avaliação implica a presença do homem como mentor/inven tor, usuário, pesquisador, avaliador. Em outras palavras, quero dizer que o homem e a tecnologia estão sempre juntos, pois se hoje ela substitui o ho mem no seu fazer-saber, se ela diminui suas horas de trabalho e amplia as de lazer, se ela possibilita chegar a lugares nunca antes permitidos a não ser pelo sonho e pela imaginação, é porque o homem um dia a concebeu e a criou. Não é obra do acaso, nem crença, nem mito, nem rito sagrado; ela é obra do homem e, portanto, implícita e explicitamente a educação se fez e se faz presente. As questões da concepção e da metodologia de uma educação tecnológica podem ser desdobradas em várias dimensões, mas o sentido deste texto é instigar a reflexão de uma educação tecnológica que favoreça e pro mova os avanços e transformações da sociedade, e que se debruce, ao mes mo tempo, sobre conhecimentos e valores éticos implícitos no saber-fazer e saber-ser de um cidadão para viver o tempo da era tecnológica.
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A educação buscando a promoção do homem para caminhar nas redes e teias de novos conhecimentos/valores; a tecnologia impulsionando o ho mem para saber e agir em face das novas mudanças, e a educação tecnológica fundamentando e promovendo uma educação capaz de ajudar o homem a eriar, inventar, formar-se para um tempo em que conviver com a tecnologia não é coisa dos deuses, nem dos sonhos, mas sim da realidade dos homens e dos fatos que compõem a nossa história. Mírian Paura Sabrosa Zippin Grinspun
Bibliografia BASTOS, João Augusto de Souza Leão de Almeida. Os Centros Federais de Educação Tecnológica-CEFETs — núcleos de inovação tecnológica. Educação e Tecnologia. Revista Técnico-Científica dos Programas de Pós-Graduação em Tecnologia dos CEFETs PR/MG/RJ. Curitiba, CEFET-PR, ano I, 2:48-72, dez. 1997. CAMARGO, Andréa de Góes. Interdisciplinaridade/multidimensionalidade em Educação Tecnológica — situação do mestrado em tecnologia no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckowda Fonseca — CEFET-RJ. Dissertação de mestrado em Tecnologia, CEFET/RJ, 1997. CHAUI, Marilena. Convite à fdosofia. São Paulo, Ática, 1999. GAMA, Ruy. A tecnologia e o trabalho na história. São Paulo, Nobel/Edusp, 1987. HILST, Vera Lúcia Scortecci. A tecnologia necessária. Uma nova pedagogia para os cursos deformação de nível superior. Piracicaba, Unimep, 1994. MORIN, Edgar. O paradigma perdido. A natureza humana. Sintra, Publica ções Europa-América, 1991. ORTEGA Y GASSET, José. Meditação da técnica. Tradução de Luís Wa shington Vita. Rio de Janeiro, Livro Íbero-Americano, 1963. PERRIN, Jacques. Por uma cultura técnica. In: SCHEPES, Ruth (org.). O império das técnicas. Tradução de Maria Lúcia Pereira. São Paulo, Papirus, 1996. SCHAFF, Adam. A sociedade informática. As consequências sociais da se gunda revolução industrial. São Paulo, Brasiliense/Unesp, 1991. SIGAUT, François. A tecnologia, uma ciência humana. In: SCHEPES, Ruth (org.). O império das técnicas. Tradução de Maria Lúcia Pereira. São Paulo, Papirus, 1996. VARGAS, Milton. Para uma filosofia da tecnologia. São Paulo, Alfa-Omega, 1994.
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EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA Mírian Paura Sabrosa Zippin Grinspun
Num primeiro momento vem a nossas mentes — eu assim acre dito — o que podemos entender pela expressão Educação Tecnológica. Poderia, por exemplo, estar ligada às tecnologias educacionais, po deria ser uma dimensão mais específica de uma educação profissio nal ou educação técnica, ou poderia ser uma forma nova de se colo car em prática uma área da Educação apoiada em teorias tecnológicas (Bertrand, 1991). Afirma Bastos (1997) que a educação no mundo de hoje tende a ser tecnológica, o que, por sua vez, vai exigir o entendimento e inter pretação de tecnologias. Como as tecnologias são complexas e práti cas ao mesmo tempo, elas estão a exigir uma nova formação do ho mem que remeta à reflexão e compreensão do meio social em que ele se circunscreve. Esta relação — educação e tecnologia — está pre sente em quase todos os estudos que têm se dedicado a analisar o contexto educacional atual, vislumbrando perspectivas para um novo tempo marcado por avanços acelerados. Mello (1993) afirma que a educação passa a ocupar, hoje, junto com as políticas de ciência e tecnologia, um lugar central nas decisões macropolíticas do Estado em termos de qualificação dos recursos humanos exigidos pelo novo padrão de desenvolvimento, sendo este um dos consensos do debate sobre políticas educacionais em nível internacional. A Lei n° 9394/ 96 das Diretrizes e Bases da Educação Nacional traz referências ex plícitas e implícitas sobre tecnologia, como o domínio dos princípios
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científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna (art. 35); o incentivo ao trabalho de pesquisa e investigação científica, visando ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia (art. 43); a determina ção de uma educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia (art. 39). Na Declara ção Mundial sobre Educação Superior da Unesco, em 1998, encon tramos, também, a necessidade de se rever a educação superior, uma vez que ela está sendo desafiada por novas oportunidades relaciona das a tecnologias que têm melhorado os modos pelos quais o conhe cimento pode ser produzido, administrado, difundido, acessado e controlado. Seja uma análise teórica, seja uma proposta prática, não há como separar a tecnologia e suas estreitas relações com e na educação. Neste estudo vou procurar desenvolver o conteúdo de uma edu cação tecnológica, com suas características básicas, sua finalidade, seus procedimentos, mas, e principalmente, como uma tentativa de estruturá-la a partir de sua concepção pedagógica. A argumentação que apresento, todavia, não esgota a profundidade do tema, uma vez que esta expressão ainda está por merecer novos questionamentos, pois sua interpretação passa pelas categorias que a compõem — edu cação e tecnologia — numa tentativa de integração e não de justapo sição. Na realidade, o que proponho é uma discussão sobre a educa ção — seus conceitos, sua finalidade e os novos paradigmas que es tão colocados no mundo de hoje advindos das inúmeras transforma ções que estamos presenciando no nosso cotidiano, e de uma concep ção talvez mais estratégica numa fase de transição entre a modernidade e a pós-modemidade. Num segundo momento, proponho uma dis cussão sobre a tecnologia assinalando os dados principais e suas re percussões em nossa vida. Finalmente, apresento alguns pontos bási cos para o início de um debate sobre a necessidade de uma educação tecnológica no contexto atual. No processo educacional, o que se pretende alcançar é que o indivíduo seja capaz de obter conhecimentos, construí-los através de uma atitude reflexiva e questionadora sobre os mesmos. Junto a essas questões relacionadas ao conhecimento, o processo educacional tra balha a dimensão dos sentimentos, da afetividade e da criatividade. O indivíduo não só aprende com a educação, como também se posiciona frente aos fatos e à realidade que existe dentro e fora dele. Essa atitude e esse pensamento críticos constituem o que se pode
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denominar de uma atitude filosófica em relação a sua própria identi dade e às situações que o circundam. Em termos de uma educação para viver a era tecnológica, há que se pensar sobre valores subjacentes ao indivíduo, que pode criar, usar, transformar as tecnologias, mas não pode se ausentar, nem desconhecer os perigos, desafios e desconfortos que a própria tecnologia pode acarretar. Em relação ao objeto, ao produto final oriundo das tecnologias, observa-se que há a descoberta, de algo novo que pode até fascinar e seduzir, e que com o uso toma-se parte do cotidiano, podendo até ser esquecido para dar lugar a um novo produto. Estou diante de três momentos significativos: um que diz respeito ao aparecimento da tecnologia, tanto como processo como produto, e aqui incluo toda^a questão histórica do seu próprio desenvolvimento, isto C 0 jve nos entende por técnica, por tecnologia e como ela se desej^correm na dias atuais; outro que diz respeito às transformações que í^ t0 a gua sociedade por força da tecnologia, tentando mostrar t)£, seu a p j. r irreversibilidade como as rápidas mudanças decorrentes «lC ja js. e 0 moramento, e, portanto, suas implicações nas relações f %r indo até terceiro, que diz respeito à relação homem e tecnologia re»l0gia g Um que ponto o homem é dependente da tecnologia ou a tecn« serviço para este homem. fgnificado Na dimensão educação tecnológica vou buscar o íilcaçg0 desta expressão à luz de uma filosofia que oriente a eá omo ^ sujeito para que ele seja capaz tanto de criar a tecnologia,fí)rmaç^0 e frutar dela e refletir sobre a sua influência na sua própria ? s tuc j0 de toda a sociedade. Uma sociedade tecnologizada é, anttecnologia uma sociedade com toda a sua trama de relações sociais. A^ mas g re _ oferece recursos e avanços, mas impõe determinadas ncí;l^^Vipite gras; nasce uma nova ética nessas relações. Estou ciente
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o indivíduo enquanto um ser histórico, concreto e real. Esta educação se baseia num processo que abrange a observação perante o fato, a compreensão, a interpretação e a ação diante dos fatos em si. Para isso preciso lembrar que esta educação deve ser inserida — em pri meiro lugar — numa visão de mundo específica, com os valores e práticas de uma civilização ou cultura determinada. Nesse contexto — por certo — tenho que refletir/analisar as questões do mundo atual, tais como a globalização, a pós-modernidade, o progresso ci entífico — tecnológico, entre outras. Em segundo lugar, devo buscar as questões relacionadas — em termos de educação — à finalidade e aos princípios que regem esta educação, isto é, o que se espera que a educação promova no indivíduo tanto em termos de desenvolvimen to pessoal, quanto em termos do desenvolvimento social, quando ele poderá questionar e posicionar-se, por exemplo, quanto à hegemonia das nações que detêm o poder do conhecimento científico-tecnológico e, por fim, preciso estabelecer que projeto de educação vou desen volver para a consecução dos objetivos propostos. O que venho observando nessa dimensão educacional é a pers pectiva de uma proposta mais voltada para os aspectos humanísticos em contraposição a toda uma vertente racionalista, positivista, que predominou na sociedade com o domínio do mundo científico, do mundo objetivo. Esta observação pode ser comprovada por todos, por exemplo, quando observamos os movimentos ecológicos em di ferentes formas e situações; com relação às questões que envolvem os direitos humanos; ou através da luta pelas grandes causas sociais. Tenho a impressão de que o avanço da tecnologia, de um lado, com toda a sua sofisticação, promoveu no homem uma instigação, uma provocação, e ele começa a se questionar sobre essa invasão, seus compromissos éticos, sua utilização desenfreada. Os valores huma nos estão, hoje mais do que nunca, sendo proclamados, necessários e desdobrados num sentido ético, de modo a levar este homem, que vivência e processa a tecnologia de seu tempo, a ter uma visão maior desse contexto. De um lado, a revolução tecnológica; de outro, a edu cação — questões estreitamente relacionadas ao modelo de socieda de do qual são parte. Esta complexidade nas relações da tecnologia com a educação transcende o conhecimento em si dos fatos específi cos para ampliar-se no próprio contexto da humanidade. Hans Jonas (1995) analisa em sua obra que o futuro da humanidade está compro metido pelos efeitos adversos de empreendimentos tecnológicos e,
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Ui/ 0 autor, devemos convergir esforços para a questão da responsa bilidade da dimensão ética desse contexto. O que estamos querendo é chamar a atenção para o fato de que não são tão isoladas as áreas de educação, tecnologia ou das novas relações sociais. Há pontos signi ficativos, como a ética, que precisa ser pensada na sociedade con temporânea em virtude dos avanços científico-tecnológicos que estamos vivendo. O fato não é só o conhecimento, mas o resultado desses conhecimentos. Nesse sentido, poderia assim indagar como uma instigação pedagógica: para que serve, então, uma educação tecnológica? Arrisco uma resposta: para formar um indivíduo, na sua qualidade de pessoa humana, mais crítico e consciente para fazer a história do seu tempo com possibilidade de construir novas tecnologias, fazer uso da crítica e da reflexão sobre a sua utilização de forma mais precisa e huma na, e ter as condições de, convivendo com o outro, participando da sociedade em que vive, transformar essa sociedade em termos mais justos e humanos. Há momentos de conhecimento da tecnologia, de sua relação com a ciência, da compreensão do binômio tecnologia e progresso e suas repercussões nas relações sociais. Passo agora a tratar das categorias que englobam a educação tecnológica numa perspectiva mais pedagógica, na tentativa de ofe recer uma proposta nova para a sociedade contemporânea. Para isso é preciso considerar os seguintes pontos: o conceito de educação dentro de um paradigma da modernidade ou pós-modemidade e, portanto, uma educação que esteja consoante com o seu tempo, partindo-se do pressuposto que a tecnologia já faz parte desta modernidade. O que se observa nesta modernidade é que a construção do conhecimento tem como base a razão subjetiva, isto é, a construção parte do próprio indivíduo pela sua natureza sensível e racional. Na contemporaneidade há uma convergência cada vez maior entre a ciência e a cultura devido à restituição do sujeito à ciência e da ciência ao sujeito. O sujeito é visto não numa concepção metafísica tradicional, mas, sim, como elemento básico e indispensável ao pro cesso cultural. Ortiz (1994), ao discutir a questão da mundialização e cultura, afirma que as inovações tecnológicas têm uma influência ca pital na mundialização da cultura, formando a infra-estrutura mate rial para que ela se consolide. Morin (1986) nos dirá que o sujeito moderno vive uma série de conflitos éticos e que, ao tomar consciên cia dos fatos, ele o fará também numa perspectiva conflituosa, pois a
nossa condição de sujeito é a de viver na incerteza e no risco. Nada mais complexo para a educação que esta afirmativa, na medida em que não cabem mais modelos tidos como certos e verdadeiros e mui to menos modelos que excluem qualquer alternativa pessoal ou soci al por não estarem de acordo com a realidade. O homem mais do que nunca, então, está presente com sua com petência e sensibilidade no novo paradigma. Mas que paradigma se ria esse de uma educação para a modernidade? Afirma Demo que “(•••) modernidade na prática coincide com a necessidade de mudança social, que a dialética histórica apresenta na sucessão de fases, onde uma gera a outra. (...) ‘ser moderno’ é ser capaz de dialogar com a realidade, inserindo-se nela como sujeito criativo. Faz parte da reali dade, hoje, dose crescente de presença da tecnologia que precisa ser compreendida e comandada. Ignorar isto é antimoderno, não porque seja antitecnológico, mas porque é irreal” (1993:21).
Modernidade significa um desafio em que se aponta para o fu turo com suas novas propostas, onde a educação se faz presente não como antes, mas sim como a mediação nesse novo tempo. A utiliza ção das tecnologias com sua dimensão interativa mostra que a educa ção tem que mudar para que o indivíduo não venha a sofrer com lacunas que deixaram de ser preenchidas porque a educação só esta va preocupada com um currículo rígido voltado para saberes e co nhecimentos aprovados por um programa oficial. A educação ocupa nesta modernidade, junto com a ciência e a tecnologia, um lugar de destaque, principalmente se identificarmos na educação uma dimensão básica na formação do sujeito, na qualifi cação dos recursos humanos requeridos por um novo modelo de de senvolvimento. Se a educação tem esse papel na modernidade, seja em termos do conhecimento, das competências sociais, da humanização da tecnologia, temos que identificar essa tessitura para o momento atual e para os próximos tempos, assim como o papel da escola, onde a educação sistematicamente ocorre. Há que se entender que esta modernidade ou, para outros auto res, a pós-modemidade leva-nos a uma nova concepção de razão e racionalidade de forma mais plural e multidimensional; a razão não é o elemento único que permeia nossas vidas, nossos conhecimentos, temos que formar um homem livre e autônomo para viver a profun didade e intensidade do seu momento. Lembro-me de Morin (1981)
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no seu livro Para sair do século XX, quando diz que precisamos su perar a noção de Homofaber para um Homo sapiens que seja capaz de produzir poesia e arte, sonho e delírio, paixão e amor. Belloni (1998), ao discutir a questão da tecnologia e formação de professores, afirma que . v “(...) a escola moderna, formadora do cidadão emancipado e autôno mo, nascia sob o signo da palavra impressa que tinha uma conotação democrática e subversiva. A escola da pós-modernidade terá que for mar o cidadão capaz de ‘ler e escrever’ em todas as novas linguagens do universo informacional em que está imerso” (pp. 146-7).
Na medida em que a modernidade encaminha para novas questfles nos diferentes campos do conhecimento, observo que se estrutu ra de maneira mais consistente uma educação tecnológica e que pre cisamos discuti-la dentro do cenário pedagógico-social onde ela se apresenta. Para chegar, entretanto, à educação tecnológica, vamos assinalar, em primeiro lugar, pontos significativos da educação e da tecnologia com abordagens necessárias à compreensão do seu signi ficado.
1. Educação Considero a educação como uma prática social, portanto, uma prática que se realiza num tempo histórico determinado, com carac terísticas ideológicas específicas e voltadas para a subjetividade. É uma área da sociedade na qual mantém estreita relação pelos seus objetivos e pela formação do indivíduo que vai participar da socieda de. Etimologicamente, educação provém de dois vocábulos latinos — educare e educere —, tendo o primeiro o significado de orientar, nutrir, decidir num sentido extemo, levando o indivíduo de um ponto onde ele se encontra para outro que se deseja alcançar; educare se retere a promover o surgimento de dentro para fora das potencialidades que o indivíduo possui. Geralmente, trabalha-se mais o conceito de educare do que o de educere, favorecendo o primeiro conceito no estabelecimento de currículos e programas atualizados e significati vamente coerentes. A política educacional contribui e estabelece as normas a serem atingidas para uma educação que se pretende de qua lidade; a questão do educere, entretanto, não tem tanta intensidade, 31
uma vez que se volta mais para o indivíduo no seu espectro múltiplo de formação. Acho que poderíamos dizer — de uma maneira muito generalizada — que temos um sentido externo que deve caminhar junto ao sentido interno do próprio ato de educar-se. No que se refere às definições da educação, identifico que as mesmas estão associadas às diferentes correntes pedagógicas que as formulam, assim como às diferentes propostas culturais que as determinam. Observa-se que algumas características são predominantes, como a idéia de aperfei çoamento, de intencionalidade, de atividade como processo e produ to, de individualização ou socialização, como comunicação, como auto-educação e hetero-educação. Estou diante de diferentes cami nhos, de uma rede de conhecimentos que me impulsiona a ver a edu cação como uma teia de intenções e ações que são colocadas na prá tica para sua efetiva realização. No momento atual, em que estamos observando uma série de mudanças em todos os campos da sociedade, há que se pensar na educação mais contextualizada possível, considerando as causas e os fatos que ocorrem no seu cotidiano. As rupturas nas relações desse contexto vão sendo inevitáveis, muito embora desconfortáveis e do lorosas. Há, porém, como diz Rogers, possibilidades para se buscar uma vida criativa em face do contexto em que as mesmas rupturas se instalam, para que as novas mudanças possam ser desenvolvidas. Inau gura-se um novo tempo, com novas possibilidades, novas propostas. A educação faz parte deste tecido social e sua participação no contexto da sociedade é de grande relevância, não só pela formação dos indivíduos que atuam nesta sociedade, mas, e principalmente, pelo potencial criativo que ao homem está destinado no seu próprio processo de desenvolvimento. Constatamos mudanças em todas as áreas da sociedade, sejam elas geográficas, políticas, históricas ou culturais; na educação tam bém vamos encontrar mudanças em relação a seus objetivos e proce dimentos. O desenvolvimento de uma sociedade não consiste num simples movimento linear da mesma, mas na realização de um proje to em que haja interiorização na consciência dos que a integram e, também, na sua viabilidade, através dos instrumentos que esta cons ciência promove. Este é o papel da educação: participar da rèalização desse projeto. Na nossa sociedade, em qualquer segmento, em quase todas as instituições ouvimos falar de “ crise”, advinda da situação que estamos
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i vivenciando, em virtude de novos valores e princípios que vão sendo estabelecidos. Poderíamos entender a crise como um período de tran■ llçiío, em todas as áreas, na busca de novos modelos paradigmáticos. Durante esta transição ou após “as crises”, cumpre-se, quase como um ritual, reinventar tudo: a razão, o Estado, a ciência, a técnica, a -política, a arte e a educação. Questiona-se a origem dessas crises, seu Éppcesso e sua superação. Onde se encontra a origem desses novos modelos? nas crises? nas mudanças advindas do avanço científico e leuiológico? Como são escolhidos os novos modelos? a partir de que princípios são estruturados esses modelos? Acredito que esta origem está em tudo e, também, em todos nós. Este novo amálgama que o tecido social impõe é fruto de crises e mudanças nos fundamentos da ciência, da política, da economia e, principalmente, na crise dos fun damentos da vida humana. No novo mosaico que a vida nos apresen ta temos, hoje, um novo espaço físico, em nosso planeta, no qual não tantos muros marcando os limites de determinadas áreas, e, tam bém, um novo espaço psicológico (no sentido de contrapor-se ao físi co) que nos leva a um outro modo de pensar e de agir. As ideologias utópicas modernas nos apresentavam a ciência, a tecnologia como Instrumentos infalíveis e necessários ao controle racional da natureza ti da sociedade. Entretanto, essas “verdades” estão sendo questiona das, estão sendo mobilizadas a partir de uma nova atitude do homem,
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um tempo em que o intelecto e espírito, razão e emoção se integram, numa “grande aventura” de conciliar todas as áreas externas e inter nas da pessoa humana. Há uma tentativa de se vislumbrar o sujeito como um todo, sem fragmentá-lo. Ao se dar importância à razão, ao conhecimento, reservamos, também, o espaço para a emoção e o sen timento. Um dos traços que confere, então, peculiaridade à sociedade atual é esta situação de crise, seja ela política, cultural ou ética. Te mos uma sociedade marcada por contradições e desafios da civiliza ção científica tecnológica: altos avanços neste campo capazes de fa zer a vida mais humana, mais longa, com uma cultura, hoje, de lazer, mas que, por outro lado, nos levam, por suas estratégias, a vivenciarmos uma situação de domínio, destruição e até mesmo de alienação. A moderna civilização convive com esses contrastes mas também com suas aspirações. A educação também vive a sua crise, seja ela caracterizada pe los objetivos e finalidades de suas propostas, seja pelos seus procedi mentos ou metodologias a serem seguidos. Com que modelo de edu cação ela está comprometida, nos dias de hoje: ensinar? dominar téc nicas mais modernas? fazer com que o aluno aprenda a usar o com putador? adequar o aluno às normas vigentes no campo político-social? formar o cidadão? preparar a escola para competir com a televi são? Enfim, qual o modelo de educação que existe nos dias atuais? A íntima vinculação da educação com o contexto social e cultural levanos a rever, então, os seus modelos na medida em que ela tem que estar refletindo os anseios desta sociedade, e que, por estar em crise, tem os seus desafios muito mais instigados e problematizados. Sem entrar (muito) no mérito da questão das “crises” desta sociedade, pre cisamos compreender como e por que elas existem e como a educa ção deve agir para fazer com que o indivíduo compreenda sua socie dade e nela interfira satisfatoriamente. A educação deve estabelecer princípios para este novo cami nho. Princípios éticos que orientarão não só o comportamento dos profissionais, mas as relações do homem com a natureza, do homem com os outros homens, e, também, os princípios que orientarão a construção de uma nação mais justa e mais humana. A educação, por certo, partirá em busca de uma ética de valori zação dos valores da pessoa humana. É uma espécie de revolução copemicana que provavelmente ocorrerá nas relações homem e natu
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reza, A educação deverá propiciar a seus educandos compreender a itproximação desses novos campos, dos novos valores, dos novos universos que vêm sendo descobertos. Cada vez mais observamos que os caminhos da ciência mo derna para os próximos tempos são caminhos multidisciplinares; #proximam-se as ciências e os limites das mesmas vão ficando mais tênues e imprecisos. Não podemos mais conceber o educando como centrado num círculo existencial-hermenêutico, isto é, um ser humaIK) abstrato, descontextualizado social e historicamente. A educação precisa buscar a compreensão e interpretação desse contexto para si tuar o educando no significado do humano e na compreensão do inundo que o abriga. A crise da modernidade nas ciências e na educação apresenta dificuldades em caracterizar o "todo ”, em caracterizar o desenvolvi mento do ser humano numa ação conjunta do campo objetivo com o campo subjetivo. Este, em grande parte, apresenta-se como antídoto àquele, muito embora na prática estejam juntos, ligados. A revolução no campo da ciência (em particular, na Física e na Biologia) traz mudanças à nossa vida cotidiana através das aplica ções tecnológicas. Em face dessas novas mudanças que vêm ocor rendo em todas as áreas, em todas as ciências, há que se estabelecer novos paradigmas para a compreensão e interpretação dos fatos. Tor na-se urgente pensar uma forma de conciliar os conhecimentos que estão emergindo no nosso tempo com uma filosofia de educação. Os estudos conjuntos da natureza e do imaginário, do universo e do pró prio homem devem caminhar integrados, aproximando-se do real e, por certo, permitindo-nos enfrentar melhor os diferentes desafios de nossa época. Cada vez mais estamos percebendo a necessidade de fazermos esse percurso numa linha inter e transdisciplinar. Como interdisciplinar estamos nos referindo a uma nova concepção de di visão do saber, em que ele se caracterize por uma interdependência, interação com outros saberes, buscando a integração do conhecimen to de forma significativa e relevante. Como transdisciplinar entende mos a coordenação dos saberes dispostos por diferentes áreas ou dis ciplinas num sistema lógico de conhecimentos, de forma que possa haver a passagem de um campo do saber para outro campo do saber. Andrade, ratificando a importância de um currículo interdisciplinar para educação, afirma que:
“(■••) um currículo escolar atualizado não pode ignorar o modo de fun cionamento da mente humana, as necessidades da aprendizagem e as novas tecnologias informáticas, diretamente associadas à concepção de inteligência. É preciso hoje pensar o conhecimento, e o currículo, como uma ampla rede de significações e a escola como lugar não ape nas de transmissão do saber, mas também de construção coletiva” (1998:101).
A dimensão interdisciplinar — em termos de unir educação e tecnologia — tem como objetivo não dividir os saberes nem hierarquizá-los, mas sim trabalhar como um todo capaz de integrar uma rede — conhecimento, razão e emoção — em benefício de um desenvolvimento pessoal e social do homem. A dimensão transdisciplinar responde, também, pelo que devemos e podemos fazer com os conhecimentos adquiridos sistematicamente na Escola, numa pers pectiva além do currículo estabelecido. Os estudos mais recentes das tendências contemporâneas da educação brasileira têm nos indicado a Pedagogia histórico-crítica como um dos modelos que melhor correspondem às nossas necessi dades e interesses e que, também, possibilitam a formação mais críti ca e adequada de nossos educandos. Um dos pontos, entretanto, que fica em aberto é a integração dos aspectos cognitivos com os afetivos e emocionais. A teoria e o discurso contemplam a parte crítico-social; na prática, porém, existe o desafio em integrar todos os “saberes” do aluno, numa visão de interdisciplinaridade, de totalidade. Preva lecem, desta forma, apenas os aspectos cognitivos. A educação continua procurando sua identidade no bojo da so ciedade, sem entretanto perder de vista o seu papel de geradora de idéias, criadora de valores, investigadora de conhecimentos e reali zadora de ideais. Cabe à educação, por sua vez, o papel de respeitar a cultura de seu povo, de sua gente e de sua história, trabalhando com os dois lados desta história: o conhecido e o novo. Como ligar essas duas forças? o que representa, hoje, a educação para a nossa realida de social na medida do seu próprio desenvolvimento? como formar o homem para um tempo em constante transformação? Os educadores comprometidos com a competência técnica e seu próprio compro misso político buscam um novo referencial para educação em termos da formação da subjetividade que possibilite uma formação mais pró xima ao real e concreto sem perder de vista a singularidade do sujei to. Nesse sentido algumas perguntas são inevitáveis: como se traba-
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«w. então, com a categoria totalidade na educação? como trabalhar o |p|,f|tecr constituído e o saber constituinte que se revelam no momento e •*||# tempo da descoberta, da invenção da interrogação, da - • - pfublematização? como se desenvolve a questão da ética na educa pfio, a partir do modelo de sociedade que temos, em que a ética é | extremamente questionada? como unir o conhecimento com o imagi|ttário, com as diferentes representações que estão inseridas na formaÍ|l§0 do indivíduo? o que representa uma educação omnilateral? Bpr Estas respostas vão trazer à tona não só as ações e atividades !gp ocorrem no meio onde se instala a educação, como vão ampliar í 01 caminhos para a compreensão dos conflitos e contradições desta W fOciedade. Nada está pronto e acabado; a educação vai trabalhando e Ê: interferindo no presente e construindo e mobilizando o futuro. v Para o prof. Newton Sucupira, toma-se impossível propor um conceito de educação isento de qualquer elemento normativo. Para ele, definir educação significa enunciar o seu “dever ser”, entenden%S do-a como K».. “(...) as atividades intencionalmente exercidas sobre o desenvolvimento &w de uma personalidade com o objetivo de promover e ativar processos ítpt de aprendizagem que conduzem a disposições, atitudes, capacidades K e formas de comportamento consideradas úteis e valiosas pela socieBpf dade” (1980:28).
HÊU., Sucupira aborda a questão da própria condição ontológica do homem, o que faz com que toda educação se mova numa tensão polar das categorias: natureza e liberdade, facticidade e sentido, ser e dever ser. E esta polaridade vai nos remeter à dialética do “conduzir” e do "deixar crescer”. Outro dado significativo apontado pelo autor, na conceituação de educação, é o representado pela ciência e pela tecnologia e pela ideologia delas resultante que, com o seu tipo de racionalidade analítico-funcional, vai comprometer, no seu âmago, o homem e suas for mas de vida. As conquistas da ciência e da técnica não são neutras em seus efeitos éticos e sociais. A ciência e a técnica, para o autor, em muitos casos constituem-se na mais nova forma da ideologia tecnocrática que, segundo Habermas, faz com que a sociedade desli gue o conceito que tem sobre si mesma e adote um modelo de organi zação científica segundo o tipo de racionalidade formal.
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Chamamos a atenção, mais uma vez, para o fato de a educação ser vista e interpretada sempre a partir de uma “essência” do que se denomina educação, isto é, um posicionamento teórico que a confi gure e não, a partir dos fatos ou necessidades isoladas de cada grupo, sem uma filosofia que a dimensione. A educação é coextensiva ao ato de viver. Todo homem, em qualquer lugar, em qualquer circuns tância, está envolto pelo processo educativo. Não podemos pensar e fazer educação desvinculada do processo de produção e das relações sociais, ou mais precisamente, sem uma estreita relação com o proje to de sociedade. Assim é que a educação precisa estar voltada para a realidade, mais exatamente para transformá-la. Essa concepção dinâmica, abrangente e contínua vai solicitar uma outra educação que atenda objetivos explícitos e implícitos da ação pedagógica. Ela é importante para entendermos a relevância e o significado da educação tecnológica. Essas e outras perguntas, nesta área, têm me mostrado a neces sidade de estudar e repensar sobre os paradigmas da educação para um novo tempo que esteja comprometido com a cultura contemporâ nea, em que de um lado, tecnologia tem uma dimensão significativa e, de outro, assim também a formação do aluno no seu valor de pes soa humana. Esta preocupação, algumas vezes, representa um desa fio na medida em que esta pessoa, num processo de educação, com seus próprios valores, busca constantemente responder às grandes exigências de uma sociedade em mudança. Nesse sentido, a complexidade é bem maior. Morin (1991) diz que a complexidade não é a chave do mundo, mas o desafio a enfren tar, e que o pensamento complexo não é aquele que evita ou suprime o desafio, mas o que ajuda a revelá-lo e, algumas vezes, tenta ultra passá-lo. Estamos vivendo num mundo “sem fronteiras", com muitos desafios, com uma inversão de valores, com crises nas institui ções sociais, com crises no próprio desenvolvimento do indiví duo. Este quadro pode ser comprovado quando observamos os se guintes dados: a) as explosões do desenvolvimento: a população, o conheci mento, as aspirações; b) as questões macro como a globalização, a modemidade/pósmodemidade, a política neoliberal;
c) os problemas críticos: as guerras, a cultura, a tecnologia e a formação do homem; d) os problemas básicos: a luta pelo poder, as questões econô micas, as ideologias, o poderio tecnológico, o desemprego; e) os conflitos profundos: o eu e o mundo exterior, a ciência e o lado espiritual, a liberdade individual e a organização social; f) os contrastes: os países em desenvolvimento e os países de senvolvidos, o conhecimento e sua utilização, o poder e sua dominação, a riqueza de poucos e a miséria de muitos; g) as faltas sentidas: moradia, alimentação, saúde, educação e segurança; h) as novas necessidades do complexo tecnológico: mundo da informática e da comunicação; i) as grandes inquietações do mundo moderno: as questões re ligiosas e as questões éticas. Em face desses dados de conquistas e desafios, de avanços e dificuldades, não podemos mais pensar numa educação voltada ape nas para a questão da escolaridade traduzida em conhecimentos e saberes específicos; temos que pensar numa educação com objetivos mais amplos, tanto em termos daqueles conhecimentos como, e prin cipalmente, na formação de um cidadão mais crítico e consciente para viver e participar desse contexto, numa visão local, nacional e mundial, numa perspectiva de ação visando à busca de valores com prometidos com uma sociedade mais humana e com mais justiça so cial. A partir desse quadro, e principalmente pelas transformações científicas, temos que rever os paradigmas existentes e tentar buscar um novo paradigma que responda por essa nova ordem históricosocial e cultural. Eles surgem através das crises existentes nos dife rentes campos da ciência, sendo também percebida a necessidade de se estabelecer um novo paradigma em educação que contemple as mudanças ocorridas no seu contexto, no seu cotidiano, onde a educa ção tecnológica se faz presente. 1.1. As crises e os paradigmas f Paradigma, em grego, significa exemplo delo ou padrão. Na filosofia platônica, era o
ou, melhor ainda, momundo das idéias, proló-
tipo do mundo sensível em que vivemos. Paradigma é um modelo abstrato nesta dimensão. Foi, porém, Thomas S. Kuhn quem fez uso sistemático e consciente do termo paradigma em ciência. Para Kuhn, paradigmas são realizações científicas universalmente conhecidas que durante um certo período de tempo nos oferecem, além dos proble mas, as soluções modelares para a comunidade que está envolvida com a ciência. Eles têm o sentido de indicar uma série de valores, crenças, procedimentos e técnicas comungadas por uma comunidade específica e que num conceito mais abrangente pode significar um tipo de elemento desse conjunto, isto é, as soluções efetivadas para que determinadas situações possam substituir algumas regras como base para a solução dos demais problemas da ciência normal. Kuhn introduziu este conceito a partir da descrição esquemática do desenvolvimento científico, identificando uma estrutura básica na contínua evolução dessa modalidade de pensamento. O autor analisa esse desenvolvimento como uma sucessão de períodos ligados à tradição, mas que se apresentam com rupturas revolucionárias não cumulativas. A descoberta de um novo paradigma ocorre com a consci ência da anomalia, isto é, quando há o reconhecimento de um erro ou falha pela natureza em relação às expectativas paradigmáticas vigentes. Kuhn afirma que: “Paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma” (1978:219).
A força de um paradigma reside justamente neste consenso, na força desta comunidade científica, em determinada época. Para a pas sagem de um paradigma a outro, ocorre uma crise. Enquanto a “ciên cia normal” continua em suas pesquisas dentro do antigo paradigma, certas anomalias podem ser até ignoradas, pois elas vão de encontro às regras anteriormente estabelecidas. Assim, a ciência “normal” é ao mesmo tempo um obstáculo e uma garantia de precisão para um novo paradigma emergente. A crise é uma precondição necessária para o aparecimento de novas teorias. A partir do estabelecimento da crise há que se repensar sobre um novo paradigma que reoriente o quadro apresentado. Um paradigma apresenta-se como superado quando um outro alternativo e mais satisfatório torna-se disponível, assimilando as
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lacunas e as anomalias em fatos esperados. O que geralmente aconte ce é que os fatos novos, a princípio, não são tão valorizados como os antigos; sua força está justamente na operacionalização de seus obje tivos. Na concepção de Kuhn, tanto nos períodos pré-paradigmáticos como durante as crises, os cientistas desenvolvem teorias especulativas e desarticuladas que nos direcionam para novas descobertas. Kuhn acredita que, somente depois da articulação da experiência vivida com a teoria experimental e com a ratificação do que foi experimen tado como novo, é que teremos a passagem para um novo paradigma. Para o autor, um acúmulo de anomalias e conflitos entre fenômenos observados e a matriz inicial pode provocar não apenas um remanejamento de alguns pontos do paradigma, mas até mesmo a substituição dessa matriz inicial. Esse processo, chamado por Kuhn de “revolução científica'', é caracterizado por uma consciência ini cial de que existem anomalias e, pela mudança conseqüente das cate gorias de linguagem e das normas disciplinares, acompanhada pela modificação da estrutura da percepção. Esta “ciência revolucionária" é caracterizada pelo surgimento de um novo paradigma, que tem origem nas descobertas que não podem mais acomodar-se nos paradigmas já existentes, obrigando a alterar o modo como se pensa C se descreve uma série de fenômenos naturais. Toda mudança de paradigma é, no fundo, uma questão de valo res, que parte de determinados critérios externos à ciência normal. Kuhn acredita que embora pí; “(...) os valores sejam amplamente compartilhados pelos cientistas e este compromisso seja ao mesmo tempo profundo e constitutivo da ciência, algumas vezes a aplicação dos valores é consideravelmente afetada pelos traços da personalidade individual e pela biografia que diferencia os membros do grupo” (1978:230).
Os paradigmas, então, emitiriam juízos de valor externos à ci ência normal; há que se pensar, entretanto, que esses valores relacio nam-se, diretamente, com quem os emite. Santos (1997) diz que a crise do paradigma dominante é o re sultado interativo de uma pluralidade de condições sociais e teóricas. Estas têm apresentado mudanças significativas estruturais, sendo que o aprofundamento do conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares que o fundamentam. Diz Santos que estamos diante de 41
“(...) um novo paradigma, uma nova racionalidade, com uma promes sa de sociedade baseada em dois pilares potencialmente contraditóri os: a regulação (constituída pelos princípios do Estado, do mercado e da comunidade) e a emancipação (com três lógicas de racionalidade: estética, moral e técnica)” (1997:31).
Quanto às questões das condições sociais, afirma Santos que elas antes estavam restritas ao campo da sociologia da ciência e que hoje ocupam papel de relevo na reflexão epistemológica. Santos en tão propõe um paradigma emergente que considere, além dos aspec tos científicos, os aspectos sociais. Ele acredita que a ciência é uma incansável criadora de fórmulasmundo (p. 48), mas que, por outro lado, temos o conhecimento adquirido pela própria sociedade. Para fundamentar esse paradigma apresenta um conjunto de teses identificadas com: 1) Todo conhecimento científico-natural é científico-social. 2) Todo conhecimento é local e total. 3) Todo conhecimento é autoconhecimento. 4) Todo conhecimento científico visa constituir-se em senso comum. O saber cada vez mais está se juntando com outros saberes, numa formação de uma grande rede de conhecimentos; a sensibilida de do homem, seus valores e sentimentos são colocados à prova, a todo momento, tanto em nível de confronto e contradição como de descoberta e assimilação. Fala-se, de uma maneira bem ampla e ge neralizada, nos movimentos holísticos que estão se fazendo cada vez mais presentes na ciência, na filosofia, na educação e na psicanálise de modo a ter aceitação e penetração na nossa sociedade. A questão do imaginário social cada vez mais é estudada pela educação, sendo relevantes sua observação e interpretação. Com este “ universo” de fatos, não podemos exigir que os paradigmas existentes em educação respondam a tantas novas frentes que se abrem no nosso dia-a-dia. O que precisamos pensar é que estamos diante de mutações na socieda de contemporânea, com um peso considerável das novas tecnologias, com uma sociedade pós-industrial, com a crise do Welfare Sate, com crise dos paradigmas existentes. Perguntamos, então: • como se relacionam as questões sociais com a educação? • a partir de que critérios será estabelecido esse novo paradigma?
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• como articular as preocupações imediatas da educação com as perspectivas mais avançadas da sociedade? Quase que me envolvo num “jogo de quebracabeças", confor me fala Kuhn; a proposta que não pretende ser revolucionária, enquanto “joga por terra” toda a trajetória vivenciada, assume, entre tanto, a característica revolucionária do pensamento kuhniano quan do rompe com o estabelecido e busca a problematização da realida de, querendo obter novas respostas a velhas perguntas, criando situa ções e fatos que possibilitem ao indivíduo ter mais e melhores condi1 ções para (re)criar a sua própria participação na sociedade. Daniel Graz (s/d.), num trabalho apresentado sobre “Paradigmas perdidos”, afirma que como a ciência da educação mudou muito nes tes últimos quinze anos, as teorias educacionais perderam a maior parte de seu valor, ou foram substituídas por várias teorias, mas que têm validades menores em estrutura e magnitude. Graz chama a esse desenvolvimento de "Erosão de Paradigmas ” e sua argumentação está baseada em três fontes principais: • desvalorizações epistemologicamente motivadas da possibili dade do progresso e da ciência em geral; • o uso intraparadigmático de exemplos pedagógicos centrais; • tentativas pós-modemas de destruição da dignidade do conhe cimento científico. Graz vai nos apresentar uma alternativa de paradigma em edu cação, baseando-se nos trabalhos de Klafki, que fala sobre uma “ciência educacional críticoconstrutiva ” que ainda não foi elaborada. Essa ciência será crítica enquanto sua abordagem questiona como a ;; humanidade poderia alcançar a autodeterminação e solidariedade onde existem obstáculos a esses objetivos específicos. Construtiva, por que sua abordagem, diferindo de uma mera intenção de conhecimen to descritivo ou analítico, estará sempre tentando promover o desen volvimento de novas habilidades. Este modelo precisa ter mais res postas às suas perguntas, procurando a justificativa clara dos pontos principais desta abordagem. Esta tentativa de encontrarmos um paradigma que melhor res ponda ao nosso desenvolvimento e a pluralidade de categorias que JÉ englobam os critérios desse paradigma, por certo, representam um momento de reflexão, análise e desafio. A partir, então, desta obser vação, aponto para o que chamo de eixos paradigmáticos, assinalan
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do que já encontramos novas abordagens nesta questão, como o paradigma sistêmico, paradigma holístico, ou o paradigma emergen te, proposto por Santos (1997). 1.2. Eixos paradigmáticos
A modernidade que estamos vivendo nos direciona para uma cultura do novo, do progresso, da constatação da mudança. Suas me táforas essenciais não se esgotam com o poder econômico, nem com o desenvolvimento da técnica: são quase que revoluções em todos os segmentos que se pretende alcançar. O mais significativo é o papel da educação em preparar os cidadãos de forma técnica e politicamen te competente para enfrentar essas mudanças que já estão ocorrendo. A educação tem hoje uma dimensão formal muito grande e, por outro lado, ela direciona a maneira de nos relacionarmos com o mundo. A Escola onde a Educação ocorre formalmente precisa rever sua visão dinâmica de organização para atender ao novo contexto da modernidade. Esta modernidade que nos acena para o futuro pode nos levar a um certo medo ante as transformações que se pretende alcançar. São medos, entretanto, plausíveis, e, como diz Paulo Freire, “(...) o reconhecimento do medo que limita sua ação permite que você chegue a uma posição muito crítica, na qual você começa a atuar con forme as relações dialéticas entretáticas e estratégias” (1987:71-2).
Paulo Freire nos aponta para a questão dos medos, mas também indica que eles estão junto com os sonhos da transformação. Há que se pensar nesta educação na linha do futuro, da modernidade como uma transformação que responda à generalização de conhecimentos que o contexto atual está a exigir. A especificidade se faz necessária, desde que cada vez mais eu tenha consciência da globalização que esse específico inclui. Esta educação, também, tem que se compro meter com a parte das atitudes, habilidades, interesses e valores que perpassam toda a realidade social e, por fim, esta educação deve ser a responsável — em termos de formação de cidadania — pela conscientização dos participantes desta sociedade. Voltamos, então, a analisar os eixos temáticos, caracterizando-os a partir de sua necessidade junto aos novos paradigmas em educação.
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Objetividade — neste campo queremos privilegiar a questão do saber, da ciência e do conhecimento. Para Japiassu, “(...) saber é todo um conjunto de conhecimentos metodicamente ad quiridos, mais ou menos sistematicamente organizados e susceptíveis de serem transmitidos por um processo pedagógico de ensino. Ciência é o conjunto das aquisições intelectuais, de um lado, das ma temáticas, do outro, das disciplinas de investigação do dado natural e empírico, fazendo ou não uso das matemáticas, mas tendendo mais ou menos à matematização. Epistemologia é o estudo metódico e reflexivo do saber, de sua orga nização, de sua formação, de seu desenvolvimento, de seu funciona mento e de seus produtos intelectuais” (1992:15-6).
Por esse eixo paradigmático, a educação vai propiciar ao aluno as condições para o domínio do conhecimento e da ciência. A educa' ção irá funcionar como a mola propulsora das condições necessárias para o aluno adquirir aquele domínio. O conhecimento é a relação que se estabelece entre um sujeito e um objeto, podendo ser concreto ou abstrato. Outro dado significativo nesse eixo são as formas que são da das a este conhecimento, no caso, o mito, o senso comum, a ciência, a filosofia e a arte. A manifestação desse conhecimento ocorre pelo pensamento e é expressa pela linguagem. Há uma estreitíssima rela ção entre esse conhecimento, o pensamento e a linguagem. A educa ção tem, pois, um compromisso com esta relação. Retomo a Habermas para lembrar que ele se entregou a uma revisão do pensamento e da prática social, reformulando a teoria do conhecimento. Suas primei ras tentativas retratam a ciência como algo produzido pela sociedade, do mesmo modo que a cultura. Habermas integra a questão da racionalidade, da moralidade e das questões práticas que surgem na vida social. O autor aponta para três tipos de interesse na produção do conhecimento: um interesse pelo domínio, associado a uma idéia positivista das ciências e do mundo do trabalho; um interesse pela compreensão, relacionando as ciências hermenêuticas aos processos culturais; e um interesse pela emancipação relacionado às ciências críticas e à evolução social progressista. Acredito que dois pontos são fundamentais nesta questão da objetividade:
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• a interdisciplinaridade — nas ciências da Educação a interdisciplinaridade desempenha uma função essencial na obtenção da coerência do sistema e na elaboração de uma teoria de educação geral que mantenha certa unidade. A interdisciplinaridade tende a buscar esta unidade na ciência (em termos desta interdisciplinaridade). Para que ela ocorra, com determinadas áreas ou disciplinas, há que se ter sobre a mesma: conscientização dos seus objetivos; continuidade na sua tarefa; abertura quanto aos seus métodos, objetivos, técnicas e procedimentos; reciprocidade gerada pela interação e correlação en tre as disciplinas e a integração das partes que a compõem. • a generalidade — as fronteiras dos saberes cada vez mais es tão se alargando e integrando com outros saberes. Uma ciência, hoje, interpenetra seus conhecimentos em outra ciência, buscando uma generalização de determinados conceitos ou finalidades. Estamos vi vendo num mundo onde as fronteiras estão desaparecendo com o ri gor que se lhes era apresentado; vivemos nesta generalidade a cons trução de um “grande conhecimento”, de redes de conhecimento, cujas áreas específicas de sua construção poderão ser convertidas em pos sibilidades de realização. Um novo paradigma tem que privilegiar essa objetividade, com os componentes que, no meu entender, dela fazem parte. Todo um processo da história das ciências e sua evolução vão ser contempla dos neste eixo como forma de assegurar maior segurança à constru ção do conhecimento e do pensamento que o delineia. Esta constru ção, como diz Piaget (1987), se dá de forma contínua, baseada em estruturas sempre novas. Em relação às condições socioculturais que influenciam no processo do conhecimento, Piaget acredita que elas são apenas “ocasião” de funcionamento dos conhecimentos. Piaget vai nos mostrar que o papel da inteligência é de compreender e de inventar, isto é, de construir estruturas, estruturando o real. Este eixo temático vai nos levar a refletir sobre as novas manei ras de pensar e de conviver que estão sendo elaboradas no contexto atual, principalmente através do mundo das telecomunicações e da informática. Subjetividade — esse eixo tem por objetivo repensar a questão das atitudes, valores e sentimentos que envolvem o processo da edu cação. A relação sujeito-objeto, que propicia a questão do conheci mento, não é uma questão que se dá no vazio e, sim, num processo em que aquelas categorias ocorrem. Se para Habermas o paradigma
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da relação comunicativa é estabelecido nesta relação sujeito-objeto, a forma como se dá esta comunicação direcionará a argumentação da mesma. Nesta comunicação aparecem três áreas específicas: o mun do objetivo das coisas, dos objetos; o mundo social das normas e regras; e o mundo subjetivo das vivências e emoções. É exatamente neste mundo subjetivo oue tento buscar as refle xões para o novo paradigma. As vivências e ?.s emoções convivendo com o conhecimento, com os saberes. Não há no cotidiano uma dife renciação de sua efetividade, mas o que percebo na prática educacio nal é um significado menor a esta subjetividade em valorização aos aspectos cognitivos. Neste eixo vamos buscar os caminhos viáveis de uma análise da afetividade que envolve o processo educativo: as emoções, as pai: xões que agilizam a vida do homem. Não cabe entrar aqui no mérito específico desta questão, lembrando Spinoza, para quem a razão não é superior aos afetos, nem cabe a ela controlá-la. Queremos, sim, entrar no mérito da qualificação da educação no que tange aos senti mentos que estruturam a vida do homem. Esta vida, seja no contexto atual, seja nos rumos da modernidade, não poderá prescindir das ques tões que envolvem o campo da afetividade. J Este eixo, portanto, trará à mesa de discussão o que se entende por afetividade na educação, nela englobando, principalmente, o cam po das emoções, dos sentimentos. Acredito que a profundidade desse eixo levar-nos-á a repensar, na educação, tantas questões pelas quais ela deve se envolver, como, por exemplo, o imaginário social e as representações sociais. As emoções agindo no e sobre o indivíduo como forma de resgatar a sua riqueza interior na construção da sua própria história de vida. Totalidade — esse eixo procura buscar os fundamentos de análi se do aluno como um todo, baseando-se, principalmente, nos trabalhos de Howard Gardner que se dedicou a explicar como talentos, habili dades e criatividade relacionam-se com a inteligência. Gardner (1987) apresenta-nos uma teoria das Inteligências Múltiplas, mostrando que na realidade temos sete tipos de inteligência: inteligência lingüística, lógico-matemática, musical, espacial, cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Esta teoria abre novas possibilidades em educação, pro pondo perspectivas originais para a avaliação de indivíduo, assim como oferece opções que permitem realizações pessoais em várias áreas do saber. 47
Enquanto totalidade, o novo paradigma em educação terá que ter as normas necessárias para sinalizar a educação como um “ todo”, bem como para identificar todos os aspectos do ato pedagógico como indissociáveis na sua operacionalização. Não se trata apenas dos as pectos pessoais que deverão ser atendidos numa interação permanen te; trata-se, também, de buscar uma integração nos fatores que dimensionam aquele ato exercido. Chamo a atenção para esse eixo que deve considerar o homem como um todo — em todas as etapas do seu processo educacional —, holisticamente envolvido, valorizando os aspectos da vida pessoal, social e buscando uma atitude interdisciplinar para a ação pedagó gica. Totalidade aqui retratada como a busca de uma visão mais com pleta do homem e da sociedade; totalidade no sentido de integrar a rede de conhecimentos e saberes com as competências e habilidades; totalidade no sentido de resgatar o humano no plano tecnológico, no campo econômico, político, social, no sentido de impulsionar os elos entre o educare e o educere que compõem a própria etimologia da educação. Por certo a criatividade está contemplada neste eixo temático. A proposta desses eixos talvez nos leve a pensar na maneira que podemos conciliar a educação e a tecnologia como dimensões de um contexto que deve estar comprometido com o tempo e o espaço — e, portanto, com a história — em que elas ocorrem.
2. Tecnologia Etimologicamente, tecnologia provém de técnica, como já vi mos, cujo vocábulo latino techné quer dizer arte ou habilidade. Esta derivação mostra que tecnologia é uma atividade voltada para a prá tica, enquanto a ciência é voltada para as leis a que cultura obedece. Vargas (1994b) diz que a atualidade do termo foi abrangente que seu significado alargou-se, sendo o mesmo abordado sob vários enfoques, “visando finalidades diferentes, em busca de solução para problemas específicos de áreas diferentes” (p.224). Destaca, então, o autor os usos diversos da palavra tecnologia: utilização no sentido de técnica; emprego com referência às máquinas, equipamentos, instru 48
mentos e sua fabricação ou mesmo na utilização ao manejo deles; relacionado com os estudos dos aspectos econômicos da tecnologtk c seus efeitos sobre a sociedade. No primeiro caso confunde-se técnica com tecnologia; no segundo, o mal uso é o emprego para significar a organização, o gerenciamento e até o comércio de seus aparelhos; e no terceiro, o mal uso pode designar um processo cujo conhecimento leva à melhoria da produção ou do consumo de bens materiais, ou à II solução de problemas sócio-econômicos nacionais. A tecnologia deve ser tratada no contexto das relações sociais e dentro de seu desenvolvimento histórico. Ela é o conhecimento cien tífico transformado em técnica que, por sua vez, irá ampliar a possi bilidade de produção de novos conhecimentos científicos. Vargas propõe um significado do termo tecnologia incluindo-o dentro da cultura ocidental. Devemos entender tecnologia como í “(...) aplicação de teorias, métodos e processos científicos às técnicas. (...) tecnologia como aplicação científica é característica da sociedade moderna. É um saber aplicado integrante de nossa cultura” (1994b:225).
O principal objetivo da tecnologia é aumentar a eficiência da atividade humana em todas as esferas, incluindo a produção. Poderí amos dizer que a tecnologia envolve um conjunto organizado e siste matizado de diferentes conhecimentos, científicos, empíricos e até í intuitivos voltados para um processo de aplicação na produção e na comercialização de bens e serviços. Para Enguita (1988) poucas coisas despertam hoje dose bem elevada de fetichismo como a tecnologia. Nas gerações passadas atri buíam-se todos os bens e males aos espíritos, ao destino e à vontade divina, sendo que no presente somos levados a nos extasiarmos dian te da evolução da tecnologia. Ela possui uma visão otimista que é a de libertar-se do esforço, trabalhos desagradáveis e rotinas, sendo a visão pessimista responsável desde a alienação do trabalho até o es gotamento dos recursos, chegando à destruição universal. De um modo geral, as tecnologias são interdependentes e se apresentam sob duas formas: implícita e explícita. A primeira é aquela que permite a produção de um bem físico e que se acha embutida no seu valor, sendo seus gastos cobertos com patentes, licenças ou até mesma assistências técnicas. No caso da tecnologia explícita, estamos nos referindo àquela que não está embutida em um bem físi-
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co, podendo ser objeto de comércio direto. Apontamos dados inerentes à tecnologia, em que a educação se faz presente direta ou indiretamente: 1) necessidade e objetivo de sua produção; 2) a questão da invenção e da inovação; 3) a tecnologia de ponta; 4) a dimensão pública e privada do bem efetivado; 5) a transferência de tecnologia; 6) a questão ética da tecnologia. Sabemos que a ciência interage, intimamente, com a tecnologia, e esta com a sociedade, pois a ciência sem a tecnologia permaneceria intacta no meio científico. Na medida também em que tenho um descompasso entre tecnologia e sociedade, por exemplo, posso ter uma alta taxa de desemprego, principalmente nos países mais desenvolvi dos, os quais dispõem de alta tecnologia como recursos nas empresas e indústria. Uma revolução científica tecnológica diminui as ocupa ções chegando até a suprimi-las, faz um deslocamento de funções e atribuições, redimensionando o processo de trabalho, altera os siste mas de gerenciamento com criação de novas ocupações ou funções. Se, de um lado, o processo toma-se mais ágil para a empresa, por outro, nem sempre é o mais desejado para o trabalhador. A tecnologia nos põe à frente de um processo angustiante porque contraditório: se não adotamos as novas tecnologias para satisfazer o sistema em ter mos do trabalho, podemos correr o sério risco de não nos engajarmos no processo mundial e, portanto, perdermos a competitividade; mas se, por outro lado, beneficiamos só esse aspecto de utilização cada vez maior das tecnologias de primeira linha, podemos estar, também, correndo o risco de perder — de vez — o homem para a máquina. Ao destacarmos os pontos principais da tecnologia, enquanto reflexão pedagógica sobre suas causas, podemos também apontar as conseqüências nas relações sociais: 1) a questão do emprego/desemprego; 2) a formação do trabalhador: generalista ou especialista?; 3) a qualificação para o trabalho: as novas exigências do mer cado; 4) formação do sujeito X novas mudanças tecnológicas; 5) quantidade de informações X qualidade de ações;
6) tecnologia e desenvolvimento. O grande desafio da tecnologia é o desenvolvimento tecnológico e suas repercussões numa sociedade, pois ele vai depender da capacitação científica desta sociedade; e para que haja esta formação científica, há que existir necessariamente uma educação científica. Não podemos pensar em tecnologia somente como resultado e pro duto, mas como concepção e criação, e para isto não só precisamos do homem para concebê-la mas, e sobretudo, da educação para formálo. Na tríade ciência-tecnologia-sociedade, por certo, a educação tem üm lugar de destaque pelo que ela produz, desenvolve, mas sobretu do pelo que ela pode construir. 2.1. Evolução da tecnologia
A tecnologia que temos hoje, e que é utilizada por todos na sociedade contemporânea, teve o início de sua trajetória muitos sé culos atrás, sendo seu surgimento — em termos do que atualmente se concebe como tecnologia — relacionado às questões das próprias descobertas e avanços científicos da humanidade. A evolução do seu conceito está relacionada a todo um contex to onde ela se insere. Na Grécia, como já dissemos, tivemos a techné, que não era uma habilidade qualquer, mas uma tarefa com determi nadas regras que poderiam ser traduzidas pelo nome de ofício. Platão utiliza o vocábulo dando-lhe o significado de uma realização materi al e concreta. Aristóteles faz uma distinção entre techné e physis, mostrando que a techné é sempre um conhecimento prático que visa a um fim concreto. Ao correr de muitos séculos até o século XX, a tecnologia vem sempre apontando para alguma coisa em termos fu turos, vislumbrando mudanças e transformações, enquanto a ciência aponta o existente, o presente numa configuração de um modelo a fundamentar novas ações e decisões. A tecnologia caracteriza-se, de uma maneira geral, como um conjunto de conhecimentos, informações e habilidades que provem de uma inovação ou invenção científica, que se operacionaliza atra vés de diferentes métodos e técnicas e que é utilizado na produção e consumo de bens e de serviços. Ciência e tecnologia estão sempre juntas, não apenas em termos do conhecimento estruturado e funda mentado, mas também em termos da prática efetivada. A ciência está comprometida com os princípios, as leis e as teorias, enquanto a
tecnologia representa a transformação deste conhecimento científico em técnica que, por sua vez, poderá gerar novos conhecimentos cien tíficos. Em outras palavras, é um conhecimento e uma ação que não param jamais, em constante reciprocidade, na medida em que a tecnologia está buscando, permanentemente, aperfeiçoar as mudan ças trazidas pela ciência. Esta dá o suporte teórico e a tecnologia, a infra-estrutura com seus instrumentos tecnológicos, surgindo assim uma nova produção técnica que está sempre em busca de novos co nhecimentos científicos. Uma vez que a tecnologia é colocada à disposição da sociedade ou do mercado, ela passa a ter um valor que é determinado pela for ma como vai ser adquirida. O valor de consumo, ou mesmo o valor como bem à sociedade, mais do que imposto pelos tecnólogos, ele é imposto pela própria sociedade. Observamos, hoje, que nesta socie dade existem formas mais ou menos avançadas de tecnologia nos seus mais diferentes setores e instituições; temos tecnologia no cam po das comunicações, da educação, da saúde, da produção, dos servi ços etc. Historicamente, a tecnologia está relacionada à evolução e mu danças dos fatos e situações que ocorreram na nossa sociedade em termos reais e concretos, mas a apreensão desses fatos por si só não vai caracterizar a tecnologia. Ela interfere nesta realidade criando procedimentos e instrumentos para que sua ação ocorra além das pró prias mudanças sociais, sendo isto observado ao longo da história. Gostaríamos de chamar a atenção nesse estudo — que pretende refle tir sobre a relação educação-tecnologia e, portanto, sobre uma for mação adequada do indivíduo para viver o que se denominou chamar de era tecnológica — para as repercussões que a tecnologia causa nas relações sociais, levando a uma nova visão de mundo por parte do indivíduo. Ressalte-se nesta questão, em termos de formação (mais uma vez, repito, em termos educacionais), a qualificação exigida para o trabalhador e sua respectiva inserção no mercado de trabalho. Ob servemos sucintamente como isto ocorreu ao longo do que se deno minou chamar de Revoluções Industriais. A primeira Revolução Industrial, que começou na Inglaterra no fim do século XVIII e depois se expandiu para o resto do mundo no século XIX, teve como marco significativo a máquina a vapor, a in dústria do aço e o surgimento das ferrovias. Nesse momento, a máquina começa a modificar a vida do trabalhador. Na segunda Revolu-
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H ção Industrial, que surge no final do século XIX e é caracterizada I pelo aparecimento do aço, energia elétrica, petróleo e indústria qui % mica, temos uma nova presença do trabalhador, não só pelas substi p tuições inevitáveis como pelas relações no mundo do trabalho marcadas pela administração fordista. Interessante observar nesta fase, r do ponto de vista pedagógico, o surgimento e o fortalecimento de s uma área na educação — a Orientação Vocacional/Profissional — que tinha como objetivo, inicialmente, orientar os indivíduos para I uma nova escolha profissional de acordo com suas possibilidades e % limitações. De um lado, o trabalho, de outro, o indivíduo tentando I conciliar e integrar as características, só que, neste momento, com uma visão mais individualista do processo educacional. A terceira Revolução Industrial, marca dos últimos trinta anos, caracteriza-se por uma acelerada transformação no campo tecnológico com conseqüências não só no mercado de bens de serviço e de consuI mo, como, também, no modo de organização dos trabalhadores, no 1 modo de produção e na qualificação necessária dos novos trabalhadoI res e nas relações sociais. Esta fase é marcada, segundo Schaff, por uma tríade revolucionária: a microeletrônica, a microbiologia e a ener gia nuclear, o que nos levará, segundo o autor, a um grande desenvolI vimento da humanidade, mas que tomará necessário também — alerta § Schaff— que estejamos atentos aos perigos que este desenvolvimento |- poderá trazer, dependendo de como se utiliza esse conhecimento científico-tecnológico, bem como as suas repercussões na esfera social. A terceira revolução — a da tecnologia da informação — mostra, segundo Schaff, que nesta revolução as capacidades intelectuais do ho mem são ampliadas e inclusive substituídas por autômatos que elimi nam o trabalho humano na produção e nos serviços. Adverte o autor: “É evidente que a solução do problema não consiste em proibir o pro gresso — o que como já dissemos seria puramente utópico — mas em estabelecer medidas sociais profiláticas que se oponham às conse qüências sociais negativas” (1991:25).
Baptista (1993) diz que existem três grandes elementos na téc nica (o autor designa tecnologia como ciência da técnica) que são fatores determinantes nas grandes linhas de sua evolução: a energia, o material e a informação. Acrescenta, também, o autor que os gran des marcos da evolução técnica são sempre e claramente assinalados pela renovação de cada um desses fatores: 5»
— a revolução industrial troca a madeira pelo ferro; — a revolução tecnológica dos séculos XIX e XX troca o car vão pelo par petróleo-eletricidade; — a revolução informática troca tratamento analógico da infor mação (via homem) pelo processamento digital (via máquina). O que vemos é que esta evolução vai formando uma cultura em que a tecnologia se toma imprescindível. A técnica éfria e objetiva; a cultura que se vale da técnica e da tecnologia é que levanta a ques tão do sentido da vida e da busca dos valores que deseja privilegiar. A tecnologia mantém esta relação com a cultura — portanto, implici tamente, com a educação — tanto do ponto de vista informal, com a caracterização sociopolítica da sociedade, como do ponto de vista formal, com a caracterização científico-profissional dos campos emer gentes da própria técnica. Gallino (1995) diz que temos, hoje, a tecnologia de processos produtivos, a tecnologia informática, a tecnologia de processos de decisão, a da comunicação de massa, de transportes, como as tecnologias biológicas, químicas e médicas. Assistimos assim, hoje, a uma mudança vertiginosa na socieda de dos resultados da tecnologia, com seus aperfeiçoamentos e novas invenções e, por outro lado, estamos convivendo com o homem que tem de aprender a lidar com essas tecnologias, tem de adaptarse às novas tecnologias, mas tem de ser capaz de, convivendo com essas
tecnologias, adquirir conhecimentos que sejam capazes de compreen dê-las, manejá-las e de saber como se relacionar com elas. Dentro de toda essa retrospectiva das revoluções em que a técnica se fez pre sente, a questão crucial existe e diz respeito à dimensão social do trabalho e, por conseqüência, do trabalhador. Se o futuro permanece como uma incógnita frente ao que o homem será capaz de criar, in ventar, fica também em suspenso como ele deverá ser educado para viver esse futuro, de modo a que as sociedade façam uso da tecnologia como um bem a serviço do progresso, do desenvolvimento, sem es quecer o caráter humanístico que envolve as relações entre as insti tuições e entre os indivíduos. Quando o sonho de Júlio Verne parece-nos surpreendente nos dias de hoje, fica a sensação de um certo vazio do que poderemos e deveremos sonhar para um futuro não tão distante. Se em 1962 tive-
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mos a colocação em órbita da terra do primeiro satélite de telecomu nicações; se em 1981 tivemos o bisturi a laser, o computador de 5* geração; se em 1986 tivemos o fax; em 1991 o carbono sintético; o que poderemos esperar para 2001, 2011, 2021, 2051, e assim por i; diante? Fábrica de genes humanos? Descoberta de vacinas/remédios í para todas as doenças deste século? Manipulação de neurônios? Passeios em fins de semana nos outros planetas, em outras galáxias? Carros voadores? Telepatia como disciplina nas escolas? Enfim, como exercício futurólogo, vale a pergunta: o que nos aguarda no novo século e como trabalhar com a tecnologia e para ela em termos de educação? Como será esta educação na relação com a tecnologia: educação via Internet, a distância, currículos abertos, quem será o professor, como ficará a escola, continuará existindo? Insistindo na questão pedagógica aliada à tecnologia, vem a re flexão a respeito de que novo modelo de educação vamos precisar, então, para atender a essas mudanças colocadas pelo avanço tecnológico, tanto no sentido estrito da própria tecnologia (como in venção ou transformação), como no sentido da formação do sujeito como trabalhador e cidadão. Não cabe realizar tarefas para um trei namento, ou especialização das novas tecnologias, mas, sim, dar ao indivíduo as bases para gerir e gerar essas demandas que estão colo cadas na sociedade. Há um caráter educacional na tecnologia, assim como um caráter social. Trabalhar esses dois pólos é o compromisso de uma educação de qualidade que tem na tecnologia a base tanto de um saber-fazer, como de um fazer-saber-para quê. Tanto a constru ção do conhecimento para gerar a tecnologia, como a produção e a avaliação da tecnologia são tarefas que necessitam da educação como fundamentação e princípio para o alcance de seus objetivos.
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3. Educação Tecnológica A expressão Educação Tecnológica não possui um consenso no seu significado, uma vez que pode se direcionar mais para os aspec tos inerentes à educação e ao ensino técnico, como, também, pode referir-se aos mecanismos e processos advindos do desenvolvimento científico tecnológico. A Educação Tecnológica pode ser focalizada de vários pontos de vista: do mundo da educação, do mundo do trabalho, da produção 55
de conhecimentos, da necessidade de novas metodologias, ou da filo sofia da tecnologia. De um modo geral, quando a ela se refere há uma tendência ou em associá-la à educação técnica ou à educação profis sional. De acordo com Rodrigues, a educação tecnológica se refere mais precisamente ao tipo de educação para os que irão aprender a fazer a tecnologia. A autora faz uma diferença entre as expressões educação tecnológica e educação para a tecnologia. A primeira voltada para os que irão aprender a fazer a tecnologia e a segunda, para aqueles que irão lidar com a realidade de uma sociedade tecnologizada. Rodrigues mostra que, apesar das duas expressões terem significados comple mentares, elas não são idênticas e que esse último tipo de educação seria possivelmente a educação que deveríamos dar a todos os jovens para os adequar à vida contemporânea (1996:1).
Para Bastos, a educação tecnológica situa-se, ao mesmo tempo, no âmbito da educação e qualificação, da ciência e tecnologia, do trabalho e produção, enquanto processos interdependentes na com preensão e construção do progresso social reproduzidos nos campos do trabalho, da produção e da organização da sociedade. Ele complementa seu pensamento dizendo que a concepção fundamental da educação “(...) não é adjetiva, pura e simplesmente da tecnologia, como ela es tivesse incompleta e necessitando de técnicas para se tornar prática. É uma educação substantiva, sem apêndices e nem adendos. Existe por si só, não para dividir o Homem pelo trabalho e pelas aplicações técni cas. É substantiva porque unifica o ser humano empregando técnicas que precisam de rumos e de políticas para serem ordenadamente hu manas. É substantiva porque é um Todo: educação como parceira da tecnologia e esta como companheira da educação — ambas unidas e convencidas a construir o destino histórico do Homem sem domina ção e sem escravidão aos meios técnicos” (Bastos, 1998:34).
Os estudos que vêm sendo desenvolvidos têm se pautado por áreas mais ou menos específicas num enfoque teórico que se respal da, geralmente, em aspectos econômicos, políticos ou sociais. A ne cessidade da busca de um domínio mais pedagógico é um fato marcante no campo da Educação Tecnológica. Este campo, por cer to, depende do domínio de enfoques teóricos, conceitos e categorias particulares de diferentes campos científicos, mas há que se ter um
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tratamento específico sobre a sua estreita relação com a própria Pe dagogia e sua aplicação no campo educacional. A Educação Tecnológica, que tem suporte nos dois eixos bási cos de sua concepção, numa interação dialética, incorpora também as dimensões correlatas da questão do trabalho e, portanto, das práticas sociais em que esse trabalho vai ocorrer. Ela vai além dos conheci mentos das técnicas ou de um ensino técnico para comprometer-se com uma visão de mundo que contempla os valores que o fundamen tam e determinam. Na medida em que a educação tecnológica ampliou o seu nú cleo de atividades comportando diferentes formas de atuação e con cepção, há que se ter uma visão um pouco mais objetiva do que en tendemos atualmente por Educação Tecnológica. 3.1. Conceitos de Educação Tecnológica
O conceito de Educação Tecnológica prende-se, evidentemen te, aos conceitos específicos de sua expressão, mas na sua interação e integração diz respeito ou à formação do indivíduo para viver na era tecnológica, de uma forma mais crítica e mais humana, ou à aquisi ção de conhecimentos necessários à formação profissional (tanto uma formação geral como específica), assim como às questões mais contextuais da tecnologia, envolvendo tanto a invenção como a ino vação tecnológica. Bastos (1998) diz que ela não admite aceitar a técnica como autônoma por si só e, conseqüentemente, não determinante dos resul tados econômicos e sociais. A educação tecnológica segue o cami nho das inovações não como descobertas em si, mas como uma bus ca da compreensão dos novos papéis e funções que o homem tem na sociedade, oriundos, por sua vez, das novas relações sociais. Em ou tras palavras, a educação tecnológica caracteriza-se por um dinamis mo constante, tendo a complexidade do meio (tantos em termos cien tíficos como sociais) e a prospecção do futuro como faróis de seu projeto pedagógico. Não há uma preocupação específica em ensinar uma tarefa/ofício a um educando, mas sim em fazer despertar nesse indi víduo o valor da tecnologia, sua utilização e a capacidade e possibili dade que ele possui de poder transformar e criar novas tecnologias. 57
Passemos, então, a alguns conceitos de educação tecnológica: “A Educação tecnológica é a vertente da Educação voltada para a for mação de profissionais em todos os níveis de ensino e para todos os setores da economia, aptos ao ingresso imediato no mercado de traba lho (...) a educação tecnológica assume um papel que ultrapassa as fronteiras legais das normas e procedimentos a que está sujeita, como vertente do sistema educativo indo até outros campos legais que co brem setores da produção, da Ciência e da Tecnologia, da capacitação de mão-de-obra, das relações de trabalho e outros, exigidos pelos avan ços tecnológicos, sociais e econômicos que tem a ver com o desenvol vimento” (Brasil, MEC/SEMTEC, 1994). “O conceito de educação tecnológica implica a formação de profissi onais habilitados a transmitir conhecimentos tecnológicos sem perder de vista a finalidade última da tecnologia que é a de melhorar a quali dade de vida do homem e da sociedade” (Pereira, 1996). “(...) conjunto de situações de ensino-aprendizagem que visam facili tar nos educandos a análise de conjunturas, estruturas ou contingen tes, em que a técnica é o fator determinante” (Baptista, 1993).
As diferentes abordagens mostram a forma como é concebida a Educação Tecnológica, sendo a última uma posição adotada em Portugal, conforme nos mostra o autor, em que ele evidencia uma participação ativa e bem-sucedida dos educandos nos ambientes técnicos. Alguns pontos são básicos no conceito que pretendemos estruturar para educação tecnológica, quais sejam: • a educação é a tônica do processo evolutivo da tecnologia; • a formação do indivíduo deve estar voltada para as condições — em termos de acesso ao conhecimento e pesquisa — de sua inser ção no campo da tecnologia, propiciando-lhe meios e ferramentas para criar tecnologias; • a interação ciência-tecnologia se faz presente em todo seu per curso, e para isto o comprometimento é bem maior com o processo do que com o produto/resultado final da tecnologia; • a construção de uma educação que não separe a tecnologia de seu cotidiano, esclarecendo e desvelando as implicações das novas relações sociais, em especial a formação do trabalhador;
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despertar no indivíduo o lado humanístico da tecnologia c, por. outro lado, instigá-lo à rede de conhecimentos e saberes que a tecnologia propicia. Não'podemos valorizar a técnica em detrimento do mundo subjetivo; para tudo há lugar, em especial para se pensar e para aprender a aprender. Em termos de cursos existentes na área de Educação Tecnológica, queremos destacar o curso de mestrado em Tecnologia na área de Educação Tecnológica oferecido pelo CEFET/RJ. O CEFET/RJ foi criado em 1978, pela Lei n° 6545, de 30.6.1978, com base na infraestrutura existente na Escola Técnica do Rio de Janeiro, sendo que em 1993, através da Lei n° 8711, de 28.9.1993, ficaram determinados a finalidade e os objetivos dos Centros Federais de Educação Tecnológica no que diz respeito ao ensino superior. A partir desta data os CEFETs poderiam ministrar ensino em grau superior, tanto de graduação como pós-graduação, visando à formação de profissio nais e especialistas na área tecnológica. O curso de mestrado em Tecnologia foi implantado em 1992, com uma área em Educação Tecnológica, sendo seu objetivo o de enfocar a educação e a profissão deforma global, para a boa formação do indivíduo em todas as suas relações com a natureza e com o mundo social, econômico e cultural em que vive e atua profissionalmente.
Observam-se outros modelos de mestrado em Tecnologia, no país, oferecidos através dos CEFETs, em que predomina a questão da verticalidade dos cursos oferecidos pelo CEFET e a estrutura organizacional dessas instituições em prol do avanço da tecnologia mediante parcerias com empresas e indústrias. Esses cursos sinalizam que vivemos, hoje, um tempo nitida mente marcado pelos avanços da tecnologia, que nos impõe novas formas de organização nos diferentes segmentos da sociedade, assim como novas formas de se pensar em educação. De um lado, observa mos as instituições, como a escola — o modo como ela interage com essas mudanças e qual o seu papel na produção dos novos conheci mentos inerentes ao desenvolvimento tecnológico. A ciência e a tecnologia, juntas, numa estreita interdependência com suas causas e efeitos. Por outro lado, seja na escola, na sociedade, de um modo geral, temos o indivíduo que se informa, mas que nela se forma en quanto cidadão que é. Como, então, se coadunam os dois lados desta moeda, isto é, o homem que se forma para viver, conviver, criar, recri ar, usar, transformar as tecnologias existentes e a tecnologia, em si? 59
O que ele tem que aprender na escola para se preparar, hoje, para a vida futura? E como deve se formar este homem, enquanto pessoa no convívio com a tecnologia em termos de progresso e desenvolvimen to, sem esquecer dos valores e da ética que fundamentam a tecnologia? A análise da relação educação-tecnologia e a busca de uma iden tidade para Educação Tecnológica incorporam alguns aspectos da discussão do significado desta expressão em termos da formação da cidadania, o que engloba, além do conhecimento científico, os co nhecimentos inerentes ao processo do desenvolvimento pessoal e social. Com tal interesse, este texto aborda a discussão dessa temática, destacando a perspectiva da Pedagogia, pelos subsídios que pode (e deve) acrescentar ao entendimento da importância da tecnologia no contexto atual e nas perspectivas futuras. Essa importância se dá tan to no sentido da mediação da educação com a sociedade, como no da superação de percepções isoladas — e portanto fragmentadas — so bre o significado desta expressão. Ao nos referirmos à Educação Tecnológica, estamos nos apro priando dos conceitos de educação —já explicitados — para inserilos, conjugá-los, no mundo da tecnologia. A diferença consiste em que no primeiro caso vamos utilizar mecanismos adequados, atuais, novos e tecnologicamente corretos para sua utilização no campo edu cacional, seja numa dimensão pessoal ou social; no caso da Educa ção Tecnológica, há uma referência ao “tipo” de educação que quere mos atingir, o que engloba o conceito da expressão com os aspectos do por que e para que esta educação existe. No entendimento da Educação Tecnológica, destacam-se alguns pontos especialmente polêmicos: a relativa indefinição, a diversida de de noções, de acordo com as perspectivas teóricas delineadas, a não equivalência ao ensino técnico e a formação simplesmente pro fissional. Quanto à indefinição, é interessante observar nos documentos ligados ao Centro Federal de Educação Tecnológica o que se entende por esta expressão; ela envolve a discussão sobre novas tecnologias e seus impactos na qualificação profissional em relação aos cursos téc nicos de nível médio e cursos superiores, principalmente na área de engenharia. Os CEFETs buscam, paralelamente à formação do técni co de nível médio, a formação do profissional de nível superior, em várias dimensões.
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A educação tecnológica é muito antiga na realidade brasileira, Ela teve início, pelo então ensino técnico que criou as suas primeiras escolas técnicas propriamente ditas, em 1909, com o objetivo de for; mar artífices, ou seja, pessoas que dominassem o trabalho manual. Posteriormente, em outras décadas, com o surgimento da industriali zação, tem início uma educação técnica paralela ao sistema regular de ensino, em que instituições como o SENAI começaram a preparar mão-de-obra qualificada para o mercado de trabalho. Na década de 60, com o avanço do desenvolvimento tecnológico, volta-se à questão do ensino técnico, que no tocante aos aspectos j pedagógicos teve seu ápice na Lei n° 5692/71, com a obrigatoriedade do ensino profissionalizante. Sem entrar no mérito dessa discussão, esta determinação legal trouxe à tona o velho debate sobre educação geral x formação profissional, hoje retornando ao cenário pelas mãos C do ensino técnico x ensino médio. Em 1978, foi assinada a Lei n° 6545, de 30.6.1978, criando os H Centros Federais de Educação Tecnológica. Seus idealizadores res saltaram no Relatório do Grupo de Trabalho, encaminhado aos ór gãos superiores, que as novas autarquias educacionais seriam instiI tuições de ensino técnico com a finalidade de ministrar cursos da área de tecnologia e de formação de professores. Afirmaram também que §6 “os CEFETs exerceriam uma liderança natural do ensino de Tecnologia, sendo o seu modelo paradigma para o ensino nesta área. A Educação Tecnológica vai aos poucos solidificando sua estrutura cuja base se encontra no ensino técnico.”
O curso de mestrado em Tecnologia no CEFET/RJ, além do aprofundamento da relação educação-tecnologia, pretende dotar o profissional/aluno desta área de conhecimentos que se inter-relacionam de forma interdisciplinar, integrando-os aos conhecimentos es pecíficos do campo profissional. Em outras palavras, uma proposta que visa unir teoria e prática numa visão dialética. Pretende-se discutir, no Curso, a filosofia, a ideologia e a ética subjacentes ao trabalho dos diferentes tecnólogos. As atividades inerentes aos seus trabalhos te rão um posicionamento teórico, uma reflexão no campo da educação como norteadora de princípios, a partir da própria concepção de ho mem. Em síntese, os resultados, a produção, os artefatos etc., oriun dos dos avanços da ciência e da tecnologia, estarão sendo desenvol vidos no sentido da realização do homem como pessoa. 61
Como diz a profa. Carmem Perrota: “(•••) a educação como instrumento concreto de conhecimento cientí fico e tecnológico e a compreensão das condições de produção deste conhecimento, forma, em vez de consumidores acríticos da ciência e da tecnologia, cidadãos capazes do exercício da reflexão sobre a prá tica social e individual cotidiana da vida e do trabalho, articulada com as relações sociais mais amplas.” (1995:199).
Quanto à diversidade de noções, a não equivalência ao ensino técnico, a questão da formação profissional são pontos extremamen te importantes quando se aborda a questão da Educação Tecnológica. Ela é mais abrangente que o ensino técnico, uma vez que faz parte do seu contexto tanto a educação geral como a específica, e a estreita relação da Escola com a Empresa não se faz pela via do profissional habilitado, mas sim do profissional qualificado para conviver numa sociedade humana. A ciência e a tecnologia modificam cada vez mais o cenário de nossas vidas; a modernidade traz um saber funcional às vezes bem distante de um saber pessoal. As forças produtivas esquecem este tipo de saber e a “máquina” dinamiza, movimenta e substitui o ho mem. O processo produtivo remete para a escola o papel de formar indivíduos que dominem um código científico, cada vez mais especi alizado, capaz de fazê-los entender o mundo que os cerca. Neste sentido, a educação tecnológica seria a mediação para discutirmos os pontos principais entre esta educação (o que, para que e como formar) e as tecnologias. No mundo atual, em que a microeletrônica, a microbiologia e a energia nuclear assinalam no vos caminhos de desenvolvimento da humanidade, com todos os seus progressos e perigos, temos que nos educar para aprender e usar no vas tecnologias, desenvolver e refletir sobre as necessidades dessas tecnologias e fazê-las aliadas e cúmplices do próprio bem-estar do homem e da sociedade. A educação convivendo com a nova revolução industrial, que vem se caracterizando por grande velocidade nas mudanças dos pro cessos tecnológicos, na escala de produção, na organização do pro cesso produtivo, tem que capacitar os indivíduos para os novos tem pos que já chegaram. Esta nova aprendizagem não se limita ao co nhecimento de conteúdos para criar novas tecnologias, para se fazer
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ciência, mas, sim, as novas atitudes e valores advindos deste momen to que vivemos. Na educação, hoje, não devemos estar apenas comprometidos com a diversidade de conteúdos, com o aprendizado das diferentes linguagens, mas também com a formação de competências sociais, como afirma Mello: “(...) como liderança, iniciativa, capacidade de tomar decisões, auto nomia de trabalho, habilidade de comunicação, constituem novos de safios educacionais. Em contraposição ao acúmulo de informações segmentadas e superficiais, torna-se mais importante dominar em pro fundidade as básicas e as formas de acesso à informação, desenvol vendo a capacidade de reunir e organizar aquelas que são relevantes” (1993:30).
Para detectar as informações relevantes há que se pensar no conhecimento da maneira mais abrangente possível, caracterizandoo, como já nos referimos, como uma rede da qual se tem acesso, hoje, tanto pelos meios formais da escola como por outros caminhos, via Internet, por exemplo. Precisamos pensar no desenvolvimento das condições e oportunidades para que o educando tenha acesso a esta rede de conhecimentos. A educação pode e deve contribuir para o surgimento e o desen volvimento das competências básicas, sendo que no mundo atual elas são extremamente significativas se levarmos em consideração a ques tão da competitividade no cenário internacional. Precisamos estar atentos para a formação do sujeito que não vai implicar, nesse senti do, um adestramento ou treinamento em serviço para obtenção de tais competências; mas não posso e não devo, como educador, deixar de oportunizar essas e outras competências para o desenvolvimento pessoal/social do educando, sob pena de não lhe oferecer uma educa ção mais interligada com o contexto onde ela se insere. A educação tecnológica, acredito, deve ser vivenciada em to dos os segmentos de ensino, guardando em cada um deles as peculi aridades que o currículo e o desenvolvimento do aluno proporcio nam. Dentro desta percepção, a educação tanto pode estar compro metida com a formação de profissionais que irão atuar — ou estão atuando — no campo da tecnologia, como pode estar direcionada para a discussão e reflexão de seus aspectos singulares, voltada para uma educação fundamental, mais especificamente o ensino médio.
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O importante na Educação Tecnológica é o trabalho de formação da cidadania, propiciando ao cidadão os requisitos básicos para viver numa sociedade em transformação, com novos impactos tecnológicos, com novos instrumentos nas produções e relações sociais. Em suma, a Educação Tecnológica está baseada na concepção de uma educação transformadora, progressista, que vai além de uma proposta de ensino na escola para aprofundar-se junto com o projeto político pedagógico dessa instituição que, por certo, nos dias atuais deve integrar as diferentes categorias do saber, fazer, ou do saberfazer para uma grande categoria do saber-ser. Para que alcancemos estas etapas precisamos estar atentos e acreditar numa educação crí tica que dê lugar tanto aos fundamentos básicos teóricos como à prá tica social que ela caracteriza. Educação é esse misto de responsabi lidade e de muita esperança na possibilidade de transformações na sociedade. Como diz Paulo Freire (1996), quanto mais penso sobre a prática educativa, reconhecendo a responsabilidade que ela exige de nós, tanto mais me convenço do dever nosso de lutar no sentido que ela seja realmente respeitada (p. 107).
Características da Educação Tecnológica • a Educação Tecnológica não impõe o ensino das novas tecnologias, mas sim promove o despertar para a interpretação do contexto atual à luz de seus condicionamentos e fundamentos; • a Educação Tecnológica pretende levantar questões relativas aos valores pertinentes ao momento em que vive, sobressaindo a di mensão ética num mundo crivado de tecnologia em todos os setores sociais; • a Educação Tecnológica exige uma interação da teoria e práti ca, ressaltando a rede de conhecimentos advindos das teorias exis tentes e da necessidade de se rever a prática pelo que a teoria sinali zou; • a Educação Tecnológica busca integrar ensino e pesquisa fa zendo com que se entendam as questões vivenciadas pelos educandos; • a Educação Tecnológica procura identificar a partir do traba lho as novas exigências impostas pelas relações sociais e de que ma neira poderemos superar as dificuldades existentes;
• a fundamentação básica da Educação Tecnológica resume-se no saber-fazer, saber-pensar e criar que não se esgota na transmissão de conhecimentos, mas inicia-se na busca da construção de conhe cimentos que possibilite transformar e superar o conhecido e ensinado. • a Educação Tecnológica não é tecnicismo, determinismo ou conformismo a um status quo da sociedade, e sim um posicionamento, um conhecimento e envolvimento com saberes que não acabam na escola, não se iniciam com um trabalho, mas estão permanentemente Solicitados a pensar-refletir-agir num mundo marcado por progressi vas transformações.
Alguns pontos para reflexão Sem a pretensão de esgotar o tema proposto, apresentamos al guns pontos não conclusivos, mas que servem para uma reflexão mais presente e necessária ao estudo desenvolvido. 1. A Educação Tecnológica que começa a se estruturar, princi palmente nesta década, está a merecer estudos e pesquisas que refli tam o seu desenvolvimento na realidade brasileira; 2. A Educação Tecnológica, aliada à ciência e à tecnologia, pre cisa de definições no plano das gestões macropolíticas para que seus objetivos e finalidade tenham o apoio dos órgãos governamentais (inclusive na questão das políticas públicas nesta área). 3.0 compromisso dos CEFETs na área da Educação Tecnológica transcende o mero aprendizado em cursos de graduação ou pós-gra duação para se impor no cenário nacional como uma instituição vol tada para a educação de um profissional — em qualquer área tecnológica — que interage os conhecimentos de uma educação ge ral com a especificidade de sua formação. 4. A Educação Tecnológica acompanha o seu tempo e seu pró prio desenvolvimento e, portanto, os aspectos contextualizados in terferem e são produzidos, também, por aquela educação, como a questão da qualidade, das parcerias, da produtividade. 5. O importante na Educação Tecnológica é a sua dimensão ampla que se a toma complexa e abrangente, traz a marca de uma era marcada pela revolução, pela transformação e, por isso, da própria superação.
6. A Educação Tecnológica realizada no presente, respeitando o passado de sua evolução, está com os olhos voltados para o futuro, para, como diz Mello, a "produtividade, qualidade dos bens eprodutos (que) são decisivos para a competitividade internacional ” (1993:44), em termos dos bens voltados principalmente para o me lhor desenvolvimento do homem. 7. A informática, em especial, como outros avanços tecnológicos, está nos obrigando a uma nova alfabetização. Esse assunto é da área da educação e, portanto, precisamos dele para ler os dados específi cos, mas principalmente para termos uma nova leitura do mundo. 8. Os pontos centrais da Educação Tecnológica são a interdisciplinaridade e a multidimensionalidade de sua concepção. 9. A Educação Tecnológica tem que trabalhar com o presente, mas permanentemente sensível às prospecções que o futuro já lhe acena. 10. A Educação Tecnológica tem um comprometimento com a tecnologia, mas muito mais com o homem que é capaz de produzi-la e transformá-la. Em termos de recomendações/sugestões para a continuação do debate da Educação Tecnológica, poderíamos identificar: • levantamento de estudos e pesquisas nesta área; • organização dos pontos principais que a tecnologia poderá tra zer à sociedade contemporânea, assinalando a questão do trabalho produtivo, da exigência das novas competências sociais e das novas relações sociais; • verificação das políticas públicas nesta área e os recursos dis poníveis para o campo das pesquisas científicas; • possibilidade de desenvolver programas de iniciação científica; • promover um fórum de debates sobre a educação tecnológica e sua abrangência tanto em termos de formação dos docentes como de qualificação dos profissionais que atuam na área tecnológica; • discussão de um trabalho de Orientação Educacional (incluindo a área de Orientação Profissional) na medida em que a Educação Tecnológica envolve novos valores, novas relações, ampliando-se, por tanto, a questão de escolhas do indivíduo, tanto pessoais como sociais. • rever o papel da escola hoje, no sentido de desenvolver uma educação tecnológica que atente aos novos procedimentos de infor-
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inação/comunicação, propiciando ao aluno os meios para a constru ção de seus conhecimentos, sem esquecer a formação em termos do sentir e criar. Educação Tecnológica: a busca de sua identidade para nós não se constitui numa utopia do próximo milênio, mas um desafio educa cional, do momento presente para todos os educadores comprometi dos com a cidadania de seu povo. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional — a Lei n° 9394/96 — em vários momentos faz alusão à Educação Tecnológica. Acreditamos que a simples exigência legal não garante o seu efetivo desenvolvimento. De nada adiantará termos valores proclamados se a prática não corresponder a essas determinações. Há que se refletir sobre o seu papel no mundo atual, marcado pelas transformações e pelas mudanças em vários setores. Não adianta conhecê-las e internalizar os seus resultados/produtos. Devemos ser capazes — como educadores — de criar condições para interferir nessas transformações, na medida em que, como protagonistas da história, somos responsáveis — e muito — pela própria história que ajudamos a construir. Três valores, no nosso entender, estão subjacentes à Educação Tecnológica: responsabilidade, liberdade e autonomia. Saber desen volvê-los e cultivá-los é uma tarefa da educação, mas por certo será uma tarefa bem maior de todos que, produzindo, inventando, inovan do a tecnologia, sejam capazes de formar um cidadão crítico e cons ciente para fazer a história de seu país... bem mais desenvolvido e humano.
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