Perguntas básicas sobre decisões decisões sobre o fim fi m da vida © 2004, Editora Ba sic Quest Qu estion ionss on Cultura Cristã. Publicado em inglês com o título Basic En E n d o f L ife if e decisio dec isions: ns: H o w D o We Kn K n o w W h at’ at s’ Right? Copyright © 1998 998 by The Center Center for Bioethi Bioethics cs and Human Digni Dignity ty.. T odos od os o s d ire ito s são reservados.
Ia edição edição em português — 2004 3.000 exemplares Tradução Suzana Klassen Revis Re visão ão David Araújo Araújo Rita de Cássia Pampado do Canto Edito Ed itora raçã ção o Maria Eterna Gomes Malta Dedone Rissato Editoração Capa Magno Paganelli
Publicação autorizada pelo Conselho Editorial: Cláudio Marra (Presidente), Alex Barbosa Vieira, André Luís Ramos, Mauro Fernando Meister, Otávio Henrique de Souza, Ricardo Agreste, Sebastião Bueno Olinto, Valdeci da Silva Santos
CDITOAA CU1TUAA CAISTÃ Rua Miguel Miguel Teles Teles Júnior, 394 - Cambuci Cambuci 01540-04 01540-040 0 - São São Paulo - SP - Bra Brasil sil C.Postal C.Postal 15.136 15.136 - São São Paulo Paulo - SP - 01599-97 01599-970 0 Fone (0** (0**11) 11) 3207-7099 - Fax Fax (0**11) (0**11) 3209-1255 www.cep.org.br -
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Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas Editor: Cláudio Antônio Batista Marra
Sumário
Colaboradores................................................. 6 Introdução....................................................... 7 Objetivo ........................................................... 9 Considerações Fundamentais
1. A morte é uma parte natural da vida? E qual deve deve ser no noss ssaa atitu atitude de frente fren te a ela? .... 11 2. Quando estou morrendo ou num “processo de morte”? ................................................... 14 3. Quão agressivo deve ser o tratamento médico para pessoas com doenças ou ferimentos ferime ntos potencialmente poten cialmente fatais? ......... ............ ... 17 4. Como posso me preparar adequadamente para o processo proce sso de m o r t e ? ........................ 24 5. É egoísmo querer estar no controle durante o processo proces so de m o rte rt e ? ......... .............. .......... .......... .......... ......... .... 29 6. Devo considerar a doação de órgãos e, se sim, quando? .............................................. 31 7. Se eu sou idoso, deficiente ou se minha qualidade de vida é muito baixa, a minha vida tem menos v a l o r ? ......... .............. .......... .......... .......... ......... 33 8. Quais são os papéis do paciente, do médico e dos membros da família na hora de decidir sobre o tratamento? ....................... 37 9. Quem precisa saber que eu estou morrendo ou posso estar morrendo? ......................... 39
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10. O que significa consentimento informado e competência mental? ............................. 42 11. Eu tenho direito legal de determinar qual será o meu tratamento médico? ............... 44 12. Que planos posso fazer em relação à tratamentos e à questões financeiras enquanto ainda estou saudável................. 46 13.0 que são diretivas prévias? .....................52 14. As diretivas prévias são uma boa idéia? . 54 15. Quem toma decisões quanto ao tratamento de um paciente incompetente que não deixou diretivas prévias? ......................... 59 16. Quando a hospitalização é apropriada? ... 61 17. O que é o tratamento de longo prazo? .... 65
Suspensão do Suporte à Vida 18. O que é uma ordem para “não ressuscitar” e quando ela é apropriada?.......................68 19. Devo ser cauteloso sobre iniciar o uso de equipamento de suporte à vida, temendo que sua suspensão possa ser difícil? ...... 72 20. Que fatores o paciente, a família ou outras pessoas próximas devem considerar antes de decidir pela suspensão do suporte à vida?.......................................................... 74 21. Se eu remover o suporte à vida, sou responsável pela morte? ......................... 77 22. Suspender a administração de fluídos e nutrição pode ser considerado ético em alguns casos? 80
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23. O meu desejo de estar com Cristo deve ser considerado na hora de tomar decisões do fim da vid a? ........................ 83 Sofrimento
24. O sofrimento deve ser evitado a todo custo?..........................................................85 25. De que forma o meu conhecimento sobre os últimos dias de Cristo afeta a forma como encaro meus próprios últimos dias? 88 26. Eu devo pedir a Deus que alivie o meu sofrimento? ................................................ 91 27. Como posso lidar com o sofrimento que Deus não alivia?.........................................94 28. Os médicos têm à sua disposição os meios de controlar adequadamente a dor físic a? .................................................. 98 29. O que é uma clínica especializada em pacientes terminais e o que ela pode fazer por mim e por meus entes queridos? .... 100 Conclusão....................................................... 107 N otas .............................................................. 108
Colaboradores Linda K. Bevington, M. A., é administradora de projeto
do Center for Bioethics and Human Dignity, Bannockburn, Illinois. Paige C. Cunningham, J.D., escreveu vários artigos
sobre aborto e a lei. Ela é co-autora do artigo que a ju íz a O ’C onn or cito u em sua disc u ssão sobre a viabilidade de sobrevivência da criança fora do ventre materno sem suporte artificial no caso Webster v. Reproductive Health Services.
William R. Cutrer, M.D., trabalhou por m uitos anos
como obstetra e ginecologista, especializando-se no tratamento da infertilidade. Atualmente ele é diretor da área Dallas/Fort Worth para a Christian Medical and Dental Society. Timothy J. Demy,Th.M, Th.D., é capelão militar, co-
autor e autor de vários livros e artigos. Ele é membro da Evangelical Theological Society. John F. Kilner, Ph.D., é diretor do Center for Bioethics
and Human Dignity, Bannockburn, Illinois. Ele também é professor de Bioética e Cultura Contemporânea na Trinity International University, Deerfield, Illinois. Dónai P. O’Mathiina, Ph.D., é professor associado de
Ética Médica e Química no Mount Carmel College of Nursing, Columbus. Ohio. Gary P. Stewart, Th.M., D.Min., é capelão militar e co-
autor de vários artigos e livros. Ele é membro da Evangelical Theological Society.
Introdução vida é a maior dádiva que possuímos. Sem la, nada mais importaria. Não haveria nin guém para amar, nada em que nos tornarmos, nada para conquistar. Mesmo assim, nela há de sacordos, decisões difíceis... e morte. A vida re quer que aceitemos as coisas boas juntamente com as ruins - e as decisões do fim da vida não são exceção. As decisões que cada um de nós toma ao longo da vida são produto daquilo que valorizamos. O modo como tratamos os outros e a nós mesmos durante o processo de fim da vida é determinado pelos valores que temos. Enquan to você lê este livro, tenha em mente que estas perguntas e respostas tratam de questões do fim da vida, e não de questões sobre a morte. Aque les que estão morrendo não estão mortos! Eles estão vivos e têm sua dignidade intacta, indepen dentemente de suas debilitações. Quando você olha no rosto de uma criança, adolescente ou adulto que está morrendo, o que você vê? Outro paciente, um inválido, uma vida que não vale a pena ser vivida ou alguém que já passou da hora? Você vê seus próprios medos, ou prefere não olhar? Você está tão concentrado no fim que
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perdeu de vista a vidal Você vê alguém para amar, alguém para cuidar, para tocar, segurar em seus braços ou confortar? Você vê um ser humano, uma pessoa de valor igual a qualquer outra? As respostas que damos para estas perguntas determinam a forma como iremos encarar o fim da vida.
Objetivo ste livro não tem o objetivo de reproduzir todas as informações disponíveis sobre o assunto, mas sim, de simplificar, complementar e suplementar outras fontes acessíveis, às quais os leitores são encorajados a consultar. Alguns desses materiais estão listados no final deste livro. Esta obra não tem a intenção de tomar o lugar do aconselhamento ou tratamento teológico, legal, médico ou psicológico. Caso se faça necessária a assistência em qualquer dessas áreas, por favor, busque o auxílio de um profissional especializado. Os pontos de vista expressos neste livro são exclusivamente aqueles dos autores e não representam ou refletem qualquer posição ou endosso de quaisquer agências ou departamentos governamentais, militares ou outros.
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C o n s i d e r a ç õ e s f u n d a m e n t a i s
1. A morte é uma parte natural da vida? E qual deve ser nossa atitude frente a ela?
Muitos terapeutas sugerem que a morte é uma parte do ciclo de nascimento, morte e re nascimento. Eles inferem erroneamente que a morte é uma parte natural da vida e, portanto, deve ser prontamente aceita - a vida de cada indivíduo termina e nasce um outro indivíduo para tomar seu lugar. Podemos admitir que a morte é natural em um sentido: ela é um acontecimento esperado no mundo físico. A palavra natural também se re fere a algo que segue a ordem regular das coi sas, sem a intervenção de acidentes, violência ou doenças.1 A Bíblia, entretanto, sugere que a humani dade foi trazida para o mundo sem nenhuma insi nuação de que a morte fosse parte do plano ori ginal de criação. Deus declarou que aquilo que criou era “muito bom” (Gênesis 1.31). O concei to de morte foi apresentado a Adão e Eva como algo ruim, que aconteceria se escolhessem deso bedecer a Deus e comer da árvore do conheci-
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mento do bem e do mal (Gênesis 2.17). Enquan to eles honrassem seu relacionamento com o Senhor, a morte não iria ocorrer e nem a humani dade iria experimentar culpa ou vergonha (confi ra Gênesis 2.25). Eles, porém, sucumbiram à ten tação de serem tão grandes quanto seu Criador e desobedeceram ao Senhor, cortando o seu re lacionamento com ele. O resultado foi a culpa, a vergonha (Gêne sis 3.6,7), a antes desconhecida dor física, o tra balho com grande esforço e, por último, a morte física e espiritual (Gênesis 3.16-19). Separados de Deus, eles experimentariam a separação de corpo e alma. A morte pode ser comum, mas não é natural. A morte é uma intromissão invasiva à ordem natural das coisas. A morte é tão natural quanto um coágulo que se desenvolve numa artéria. E um mal que separa entes queridos uns dos outros. Ela cria ansiedade, uma forte sensação de espera e, uma vez que acontece, causa perda e tristeza profundas.2 E uma experiência contra a qual a humanidade vem lutando há muito e continua ten tando adiá-la. Instintivamente, sabemos que a morte não é natural. De fato, as Escrituras des crevem a morte como um inimigo, o último inimigo a ser conquistado graças à morte, sepultamento e ressurreição de Cristo (1 Coríntios 15.1-26). A morte é tão pouco natural que Deus man dou seu único filho como antídoto, para que ele
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experimentasse morte espiritual e física no lugar de cada ser humano e ressuscitasse como espe rança da vida eterna com Deus para todos aque les que nele crêem. Não devemos ver a morte como algo natural ou como uma amiga que alivia o sofrimento, pois pensar assim levaria muitos a buscar a morte de forma ingênua, assumindo er roneamente que o sofrimento não pode continu ar depois da morte (Lucas 16.19-31; 2 Coríntios 5.10), e a evitar as valiosas lições que Deus tem para nós e para aqueles que estão participando do processo de morrer. E por causa da desobedi ência (pecado) que a humanidade deve suportar o sofrimento à medida que a vida se aproxima da realidade da morte. Porém, ao mesmo tempo, devemos nos lem brar de que a morte é um inimigo derrotado. Não devemos temê-la. Não devemos resistir deses peradamente a ela. Deus permite-a, em sua mi sericórdia, para que não precisemos sofrer para sempre ou passar a eternidade sob os fardos de um mundo caído. Assim como devemos receber a vida humildemente como uma dádiva, também devemos receber a morte com humildade quan do ela vier. Devemos reconhecer que nossos es forços para combater esse inimigo um dia, inevi tavelmente, se mostrarão fúteis; mas devemos também confiar naquele que já derrotou a morte e pode nos dar vida nova. Quando pensamos em nossa mortalidade e em nossa eventual morte, devemos fazê-lo tendo
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em vista a forma como vivemos. Nossos suces sos profissionais e ocupacionais, por mais impor tantes que sejam, não são relevantes. Vivemos de forma autêntica, para que possamos ser ama dos? Amamos aos outros para que eles também possam viver de forma autêntica? Deixamos que outros cuidem de nós, e realmente cuidamos de les - aqueles que conhecemos na infância, ju ventude, idade adulta e aqueles com os quais, em qualquer idade, andamos no vale da sombra da morte? O processo de morte e a morte em si são os verdadeiros inimigos e não as pessoas que es tão passando por isso. Até que tenhamos apren dido a amar, especialmente aqueles que são os mais fracos entre nós, o processo de morte con tinuará a ser algo terrivelmente ameaçador, que nos isola, e a morte, um fim apropriadamente de sejável. Ser amado e amar a outros, especial mente a Cristo, nos dá um senso de plenitude: oferece-nos o desejo de abrir mão desta vida para receber - com ansiedade - a nova vida. 2. Quando estou morrendo ou num “processo de morte”?
Alguns podem dizer que estamos todos mor rendo - o envelhecimento em si é uma doença terminal, pois ele acaba nos levando à morte, mes mo que outra coisa não o faça antes. Entretanto, não é sábio rotular a vida de “terminal” só por que, um dia. todos iremos experimentar a intro missão da morte. Pensar na vida como um está-
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gio terminal que começa quando nascemos rou ba de nossa existência todo o seu potencial e beleza. Também torna confusas as discussões sobre o fim da vida. A tecnologia médica tem avançado a ponto de que devemos limitar o uso da palavra terminal para nos referirmos a um determinado período de tempo também chama do de processo de morte. A coisa mais importante a ser dita sobre o processo de morte é de que ele é parte do proces so de vida (veja a figura 2-1). Morrer é uma par te de viver, pois também aqueles que estão mor rendo ainda estão vivos. Assim sendo, as pessoas que estão morrendo devem receber o mesmo res peito e proteção que são devidos a todos os seres humanos vivos criados à imagem de Deus.
condição reversível (tratamento curativo)
saúde \
c o nd iç ão i rr ev er siv el processo de morte
Intrusão potencialmente fatal requerendo intervenção
figura 2-1: O processo de vida
Quando pessoas saudáveis sofrem de uma doença ou ferimento possivelmente fatais (qual quer coisa, desde um corte até câncer), a condi ção de debilidade resultante pode ou não ser re-
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versível. Chamá-la de reversível significa que existe uma intervenção médica que pode remo ver o que está ameaçando a vida, que possa res taurar e, de forma geral, melhorar sua saúde. Se tal intervenção médica não existir, então a condi ção é irreversível, ou seja, terminal - pois mais cedo ou mais tarde esta condição irá levar à mor te. Tais pessoas estão morrendo, ou seja, estão no processo de morte (veja a figura 2-2). Consciente ou potencialm ente consciente ;
condição irreversível
/ \ Permanentemente inconsciente
Morte não iminente____ /(Tratamento dos sintom as+)
i \ _____ Morte iminente _____ (Tratamento de conforto +) Morte não iminente /(Tratamento dos sintomas -)
\ _____ Morte iminente _____ (Tratamento de conforto -)
figura 2-2: O processo de morte
Várias categorias são úteis para entender e reagir à situação de pessoas que estão no pro cesso de morte. Essas categorias podem refletir o quanto as pessoas estão debilitadas ou quão próximas estão da morte. Por exemplo, pessoas podem estar seriamente debilitadas a ponto de estarem permanente mente inconscientes. Per deram a capacidade de interagir com o mundo de qualquer modo - de receber ou transmitir co municação - e essa capacidade não tem como ser restituída. Aqueles i io se encaixam nes
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sa categoria podem estar conscientes ou poten cialmente conscientes. Outras categorias refle tem a proximidade da morte. Por exemplo, exis tem aqueles cuja morte é iminente - irão morrer logo (em algumas horas, dias, semanas ou, no máximo, meses)-, não importando quais interven ções médicas sejam usadas, assim como exis tem outros que irão viver mais tempo. Apesar de a categoria parecer vaga, ela é precisa o sufici ente para ser considerada não apenas uma cate goria moral, mas também legal.’’ Não há como ser mais precisa do que isso porque, por vezes, pessoas que claramente estão para morrer “logo” podem, de forma imprevisível, viver muito mais do que o esperado.
3. Quão agressivo deve ser o tratamento médico para pessoas com doenças ou ferim entos potencialmente fatais? E importante pensar que devemos tratar to dos os seres humanos viventes fazendo o máxi mo possível. Apesar das intervenções médicas variarem, devem sempre refletir o grau máximo de tratamento para cada paciente. As formas pri márias desse tratamento - tratamento curativo, tratamento de sintomas, tratamento de conforto ou tratamento de respeito —vão variar, dependen do do estado do paciente (ver figura 2-2). Pessoas em estados reversíveis, por respeito à vida, de vem receber todo o tratamento médico possível
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para que tenham a saúde restaurada. Esse é o tratamento curativo (ver figura 2-1). Alguns paci entes, entretanto, têm infecções, ferimentos ou do enças fatais que não podem ser revertidos atra vés de intervenção médica. Estas pessoas entra ram no processo de morte - sua condição é termi nal. Já que o tratamento curativo não é possível, outras formas de tratamento são necessárias. A maioria dos pacientes num estado irrever sível está consciente ou potencialmente consci ente, isto é, pode recobrar a consciência em al gum momento, no futuro. Muitos nessa catego ria não se encontram no estágio de morte imi nente (ver questão 2). Nesses casos, mesmo que o mal causador não possa ser revertido, grande número de problemas médicos relacionados pode surgir - dificuldade em respirar, desidratação, falha renal ou infecção. Esses problemas podem ser tratados de diversas maneiras. Esse é o tra tamento de sintomas. Tal tratamento muitas ve zes é necessário não apenas para garantir o con forto do paciente, mas também para sustentar a vida dele. Por respeito à vida, pacientes e profis sionais da saúde optam por todas as formas ne cessárias de tratamento de sintomas. Quando o estado de tais pacientes deteriora e a morte torna-se iminente , então os pacientes ou aqueles indicados por eles para tomar deci sões médicas (ver questão 13) não têm a obriga ção moral de continuar com o tratamento de sinto
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mas. A suspensão do tratamento de sintomas nesse caso não significa abandonar a vida ou de sejar a morte. Pode ser, sim, uma reação apro priada e humilde para uma realidade inevitável: a morte virá em breve, independente do que for feito. Em alguns casos, a continuação do trata mento de sintomas pode significar um fardo ain da maior para o processo de morrer, aumentando o desconforto e tornando a comunicação com os entes queridos mais difícil. Os pacientes podem rejeitar tal tratamento quando as desvantagens são maiores que os benefícios. Algumas vezes, entre tanto, os pacientes têm razões especiais para pro longar a vida até o último momento, como o casa mento de um filho ou o nascimento de um neto. Sob essas circunstâncias, é apropriado continuar o tratamento de sintomas. Mesmo que pacientes em estado de morte iminente venham a interrom per o tratamento a certa altura, devemos fazer de tudo para que ele continue a receber quaisquer tratamentos e medicamentos que sejam necessá rios para reduzir seus desconfortos. Esse é o cha mado tratamento de conforto. O que dizer da outra categoria de pacien tes cujo estado é irreversível, isto é, os que esão permanentemente inconscientes? Quando sua morte torna-se iminente, raramente há moti vos para continuar o tratamento dos sintomas. Já que, por definição, eles não são mais capazes de interagir com o mundo ao seu redor, eles não goza
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rão dos benefícios de um tratamento prolongado durante o processo de morte nos casos especiais citados anteriormente (o casamento de um filho e assim por diante). E sabido, porém, que pode haver casos em que outras pessoas, que não o paciente, poderiam ser beneficiadas pelo prolongamento do processo de morte. Mas tais interesses só devem prevalecer quando houver evidências de que o paciente aprovaria esse procedimento. Os pacientes não podem ser “usados” contra sua vontade, simplesmente para beneficiar uma outra pessoa. Nem mesmo o tratamento de conforto é necessário para o paciente permanentemente inconsciente da mesma forma que o é para outros pacientes, pois ele não sofre de desconforto consciente (pacientes em corna que podem sentir dores estão, por definição, fora da categoria de permanentemente inconscientes). Ainda assim, é apropriado, por respeito a eles e a seus corpos, oferecer qualquer cuidado que possa limitar a deterioração visível de seus corpos (manter a boca úmida e limpa, lavar o corpo e assim por diante). Esse é o tratamento de respeito. O tratamento de respeito deveria ser ministrado a todos os pacientes, independente de sua condição. Talvez a categoria que causa maior perplexidade é a de pacientes permanentemente in conscientes, mas não em situação de morte imi nente. É o caso, por exemplo, dos pacientes em estado vegetativo persistente, uma vez que se determine a certeza e a persistência de seu esta-
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do. Entre as muitas coisas que são verdade so bre esses pacientes, duas são mais dignas de ên fase aqui. Em primeiro lugar, existe o perigo real de que aqueles que estão num estado vegetativo serem vistos como “vegetais” e, portanto, de al guma forma, subumanos. Mesmo que não inten cionalmente, eles são tratados com menos res peito do que merecem. E aconselhável evitar os termos “vegetativo” e “vegetal” a fim de nos pro teger contra tal perda de respeito. Em segundo lugar, é compreensível que as pessoas lutem para posicionar esses pacientes em algum lugar entre a vida neste mundo e no outro. Por exemplo: quando é que um cristão deixa de interagir com este mundo e passa ao reino espiritual que está além dele? Em termos de ex periências de vida, o paciente permanentemente inconsciente já deixou este mundo e, assim, não é claro o benefício para o paciente da continui dade de um tratamento de sintomas para sim plesmente manter suas funções orgânicas. Ou eles já começaram a interagir conscientemente com o “mundo além deste mundo” ou estão sen do impedidos de fazê-lo - presos numa espécie de limbo entre os dois mundos. É compreensível, portanto, que pacientes ou aqueles que têm po der de tomar decisões médicas por eles resol vam não usar o tratamento de sintomas em tais circunstâncias e optem apenas pelo tratamento de respeito. Eles não devem ser impedidos de
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tais pacientes ainda estão vivos de acordo com critérios amplamente aceitos, também é eticamen te apropriado que eles recebam o mesmo tipo de tratamento de sintomas ministrado a outros paci entes que não estão em condição de morte imi nente. Tal tratamento de sintomas também pode ser escolhido por respeito à vida humana. Essa decisão, bem como a de recusar o tratamento de sintomas, deve ser feita em sã consciência e di ante de Deus pela(s) pessoa(s) responsável(is). Podemos resumir, então, quão agressivamen te devemos tratar as pessoas com doenças po tencialmente fatais da seguinte forma: devemos tratar de todos os pacientes, mas a extensão do tratamento dependerá da condição de cada paci ente. Quando for apropriado aplicar tratamento curativo, também é adequado usar o tratamento de sintomas, de conforto e de respeito. Quando o tratamento curativo não é possível, mas o trata mento de sintomas é apropriado, deve-se tam bém usar os tratamentos de conforto e de res peito. Quando se observa que o tratamento de sintomas não será mais benéfico, apenas os tra tamentos de conforto e de respeito deverão ser administrados. Algumas vezes, porém, só o tra tamento de respeito é apropriado. A dificuldade em se tomar uma decisão au menta quando a condição do paciente varia en tre as categorias de reversibilidade e irreversibilidade, a duração de sua inconsciência é incerta
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ou a iminência de sua morte é questionável (vei as formas ovais em cinza nas figuras 2-1 e 2-2). Muitas vezes, a luta de uma pessoa para viver é medida em porcentagens. Um médico pode afir mar, por exemplo, que uma cirurgia tem 20% de chance de reverter um quadro de doença, ou as chances podem ser de meio a meio. Duas diretrizes são importantes quando existe tal incerteza. Primeiramente, quando não está cla ro em qual das duas categorias o paciente mais se encaixa, e qual o tipo de tratamento mais apro priado, prefira a que permite uma possibilidade maior de tratamentos. Se, por exemplo, a rever sibilidade de um estado é incerta, porém possí vel, opte pelo tratamento curativo, que oferece o maior número de tratamentos, incluindo o de sin tomas, conforto e respeito. Se a iminência da morte de um paciente terminal é incerta, opte pelo tratamento de sintomas, que também inclui mais possibilidades do que o tratamento de conforto. A segunda diretriz é reconhecer que pacien tes (ou aqueles que têm o poder de tomar deci sões médicas por eles), com a ajuda do aconse lhamento de outros (ver questão 8), estão na po sição mais apropriada para determinar qual será o melhor plano de ação. Quando há incerteza, há o risco de conseqüências nocivas e é o paciente quem vai sofrê-las. Considere a situação em que quimioterapia rigorosa e terapia de radiação têm pouca probabilidade de reverter o câncer do pa-
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ciente. Se a terapia não surtir efeito, acabará ape nas tornando os últimos meses de vida da pessoa ainda mais miseráveis. Em casos como esse, o tratamento, e não a doença, pode acabar cau sando um sofrimento ainda pior. Assim, o me lhor plano de ação nem sempre é tão óbvio. A tecnologia de suporte à vida oferece a esta gera ção e às próximas a capacidade (ou infortúnio) de haver mais escolhas quanto à hora de nossa morte. Devemos sempre ter em mente que a tecnologia médica é uma invenção humana e não uma obrigatoriedade divina. As pessoas, especialmente a comunidade da fé, devem respeitar a dificuldade de tais deci sões. Elas devem encorajar o paciente (ou aque les que estão decidindo por ele) a buscar a von tade de Deus. pois só ele vê além das incertezas. O Senhor não é um observador incompassivo, mas sim o Sumo Sacerdote que sente conosco nossas fraquezas e entende nossa luta e o desejo de fazer o que é certo. “Aproximemo-nos, então, com segurança do trono da graça para conse guirmos misericórdia e alcançarmos graça como ajuda oportuna” (Hebreus 4.16). 4. Como posso me preparar adequada mente para o processo de morte?
A maneira mais importante pela qual um in divíduo pode preparar-se para o processo de morte é tornar-se pessoalmente íntimo com aque-
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le que tomou nossa forma humana como uma criança em Belém. Conhecer a Jesus Cristo como o único que nos salva de nossos pecados derruba a muralha que nos separa de Deus, acaba com o medo da morte e do julgamento eterno. Entre tanto, não elimina nossa apreensão quanto ao pro cesso de morte nem muda a maneira como vire mos a morrer. Jesus sofreu muito no jardim do Getsêmani por causa do modo como viria a mor rer. Ele estava profundamente entristecido e per turbado em relação ao inevitável processo de mor te que estava prestes a consumir sua existência humana. Ele caiu ao chão e suplicou ao Pai que interviesse em seu favor (Mateus 26.39-41; Mar cos 14.33-36; Lucas 22.41-46). A agonia das horas que precederam sua mor te foi a mais terrível de toda a história humana do Filho de Deus, pois, naqueles momentos excruciantes, o julgamento do pecado marcou o próprio Deus na pessoa de Jesus Cristo. Mas pense tam bém no processo de morte ao qual Cristo esteve sujeito. O cuidado paliativo que ele recebeu (tra tamento de respeito) foi uma esponja molhada em vinagre oferecida a ele da ponta de um ga lho. Se ele não tivesse morrido depois desse ges to de compaixão, os soldados teriam apressado sua morte, quebrando suas pernas (João 19.33). E esta morte trágica e necessária (João 6.38) que ajuda a separar o medo de morrer do proces
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do processo de morte seja difícil, a existência es piritual que se segue é a recompensa pela fé. Uma outra forma através da qual podemos nos preparar para o processo de morte é cons truir e manter relacionamentos saudáveis com membros da família (especialmente com aqueles mais próximos de nós, como o cônjuge e filhos), amigos e membros da igreja. O processo de morte não é uma experiência limitada apenas ao indiví duo; é uma experiência da comunidade. O amor ao longo dos anos saudáveis, juntamente com gestos autênticos de perdão sempre que neces sário, irão garantir que o processo de morte não encontrarão paciente solitário e sem apoio. Lem bre-se de que o processo de morte pode invadir a vida de qualquer membro da família a qualquer hora e em qualquer idade. Famílias e amigos são presentes de Deus que devem ser cultivados e valorizados para que, nos tempos de vitória, a ale gria mútua seja compartilhada. E, em momentos de tragédia, confusão, dor e perda, possa-se divi dir o conforto e o cuidado. Não deixe que um orgulho ferido o mante nha distante daqueles de quem você precisa e que precisam de você. E impensável imaginar que a família, amigos e igrejas deixem aqueles a quem amam ou mesmo os que detestam, mor rendo sozinhos num hospital, cercados de estra nhos cujo compromisso com o paciente pode ou não ser autêntico e cujas tecnologias parecem tão frias e estéreis. E trágico ver quantas pesso
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as idosas não têm “ninguém que ainda se impor te com elas” e é de quebrar o coração que as comunidades cristãs acreditem que, ao mandar flores e cartões dizendo que estão orando pelos idosos e por aqueles que estão morrendo possam substituir o toque das mãos, a proximidade de um abraço, o sorriso em um olhar trocado e o som do cuidado verdadeiro vindo de lábios que po dem ser vistos.4 Esqueça as flores e envie a si mesmo, ao vivo e pessoalmente, sempre que isso for viável. Lembre-se de que Deus veio em pes soa, na pessoa de Jesus Cristo, para um mundo em processo de morte. Certifique-se de que seus entes queridos compreendem e estão decididos a fazer valer os seus desejos em relação a tratamentos no fim da vida. Se você entrar no processo de morte sa bendo que sua família e seus amigos vão enten der seu ponto de vista sobre a tecnologia de su porte à vida (as condições sob as quais você quer que ela seja usada bem como quando você quer que ela seja suspensa) você terá um pouco mais de sensação de controle, num momento em que o controle é tênue ou limitado. Antes de experimentar o processo de mor te, cada um de nós deve adquirir a compreensão da realidade da morte, não só como uma inimiga, o que ela certamente é, mas também como uma entrada - uma passagem para outra dimensão de vida. Para o cristão, ela marca o completar de uma tarefa, uma vida de fidelidade que chegou
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ao fim. Lembre-se das palavras de Jesus quando ele recebeu vinagre para aliviar a sua sede: “ Está consumado! E, inclinando a cabeça, rendeu o es pírito” (João 19.30). Através de sua morte, Jesus completou sua longa jornada, abrindo o único ca minho para o céu; através da sua ressurreição, ele abriu caminho para a jornada humana. Por mais trágica e antinatural que seja, a morte é o caminho para a vida eterna. Pense nas considerações de Paulo quando reflete sobre o fim da vida: “Qu anto a mim, estou sendo já oferecido por libação, e o tem po da m inha partida é chegado. Combati o bom combate, comple tei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da Justiça me está guardada, a qual, o Se nhor, reto Juiz, me dará naquele Dia; e não
somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vind a” (2 Tim óteo 4.68, ênfase acrescentada).
Paulo viveu sua vida fielmente; ele não afir mou que conseguiu fazer para o Senhor tudo o que queria. Mas o que Paulo fez, ele o fez com fidelidade, suportando os desafios espirituais ao longo do caminho. Ele estava preparado para o processo de morte. Devemos superar a idéia de que, no fim de nossa vida, teremos tempo de co locar tudo em ordem com Deus. Poderíamos, en tão, dizer que o perdão é algo que devemos bus car apenas durante nosso processo de morte. A
29 morte, porém, não senta e fica esperando até que cuidemos de todos os detalhes antes de nos le var. Não podemos planejar fazer as pazes com Deus no final de nossas vidas; devemos manter a paz com Deus ao longo de toda nossa vida. É difícil ver a morte como uma passagem, quando vivemos apenas para satisfazer a nós mesmos e não para servir a Deus e aos outros.5
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E egoísmo querer estar no controle durante o processo de morte? 5.
O processo de morte chega sem pedir per missão. Portanto, o controle total está fora de questão. O que na verdade buscamos, é uma.se«sação de controle, ou melhor, um papel vital no processo de tomar decisões no fim da vida. O termo comum usado para descrever o controle do paciente é autonomia pessoai que basica mente significa domínio sobre si mesmo. Pode nos preocupar saber que, num mundo em que os custos são tão importantes, se receberemos me nos cuidados do que realmente precisamos. Po demos também nos preocupar com tratamentos excessivos e sofrimento prolongado. Sabemos que, algumas vezes, os médicos encaram a mor te de um paciente como um fracasso pessoal e, por medo de serem processados, hesitam em sus pender tratamentos pesados que trazem poucos benefícios. Além do mais, tendo em vista que a
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que nunca vimos, nossa confiança na equipe médica pode ser tênue. Em outras palavras, os motivos pelos quais as pessoas querem ter controle sobre o tratamento no final da vida são compreensíveis e podem simplesmente refletir um dese jo correto de receber cuidados adequados. O problema surge quando nossos medos fazem com que desejemos controle absoluto so bre o tratamento no fim da vida. A maior parte de nós não tem conhecimentos médicos suficientes para compreender todos os benefícios e riscos de tudo o que pode ser feito do ponto de vista médico. O desejo excessivo de estar no controle pode interferir naquilo que é melhor para nós, assim como a falta de desejo de participar do que está acontecendo poderia resultar em alguma forma de abuso. Assim, é melhor pensarmos na vida e na morte em termos de interdependência em vez de autonomia. A experiência e capacidade da equipe médica que está tomando conta de você são vitais para sua compreensão das condições que estão ameaçando ou tirando sua vida. A equipe não deve ser paternalista (tratando você como uma criança ignorante) e você, como paciente, não deve ser autônomo (tomando decisões sem levar em consideração o impacto sobre outros), Juntos, você, os médicos, as enfermeiras, sua família, líderes espirituais, amigos e outros formam uma equipe cujo conhecimento sobre você e seu
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estado é muito maior do que a sua própria com preensão. Essa equipe pode oferecer muito con forto num momento que pode sertão inquietante. A morte não precisa e não deve ser uma ex periência pela qual passamos sozinhos. Vivemos dentro de relacionamentos que envolvem respon sabilidades para nós mesmos e para outros, e mor remos com as mesmas responsabilidades. No processo de morte, o amor ainda nos ensina a cui dar de outros, e não apenas de nós mesmos. Cris to nos ensinou esse princípio quando foi ao encon tro das necessidades de sua triste mãe e do ladrão durante o seu próprio processo de morte.
6. Devo considerar a doação de órgãos e, se sim, quando? Pesquisas nos Estados Unidos mostram que a diferença entre o número de pessoas que preci sam de transplante de órgãos e o número de doa dores de órgãos continua a aumentar, mesmo com um aumento no número de possíveis doadores que ocorreu entre 1988 e 1996.6Mesmo havendo au mentos em todas as faixas etárias, a doação por parte de pessoas com mais de cinqüenta anos au mentou significativamente.7Como a experiência de fim de vida pode acontecer em qualquer idade e porque é mais provável que os órgãos de doado res mais jovens não precisem ser descartados é importante que discussões sérias sobre a possibili dade de doar órgãos aconteça o quanto antes - a
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partir dos dezoito anos de idade8. Antes dessa idade, os pais devem considerar o nível de maturidade de seus filhos. Não é preciso impor discussões desta seriedade com as crianças, pois, a decisão de se usar os órgãos de uma criança no caso de sua morte fica por conta dos pais. Mesmo que nem todos concordem,9parece prudente que os adultos de um modo geral tomem decisões sobre a doação de órgãos em cooperação com outros membros da família (ou, quando necessário, com um companheiro ou com panheira). Esse é o caso, quer uma lei de "escolha obrigatória” seja criada nos Estados Unidos da América.10Além disso, pode ser prudente incluir um médico na discussão." No momento, parece que certos médicos têm ignorado as diretivas prévias (ver questão 13) em relação à decisão de um indivíduo em doar seus órgãos, colocando a responsabilidade final por essa decisão sobre membros da família no momento da morte do ente querido. Com muita frequência, os mem bros da família não são capazes ou não desejam fazer o que está indicado na diretiva prévia de seu ente querido; podem até ficar espantados com a sugestão, pois não estavam cientes do desejo do familiar de doar seus órgãos.12 Quando você doa um órgão a outro indivíduo, está realizando um serviço tão grande quanto aquele de qualquer médico, pois está dando visão a um cego, vida a alguém que necessita de
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um coração ou fôlego para alguém cujos pulmões estão falhando. Você traz alívio de uma possível perda e, muitas vezes, de dor incessante. Você também oferece a um outro ser humano maior oportunidade de viver ainda mais abuiidantemente se, através de uma vida que ele venha a co nhecer, encontre o doador de toda a vida que é o próprio Senhor. Nós, que cremos no Senhor, po demos esperar sua vinda, quando nossos corpos perecíveis e restos decompostos forem levanta dos dos mortos e transformados em corpos com pletos e imperecíveis - o corpo físico e mortal substituído por um corpo espiritual e imortal (1 Coríntios 15.42-54; 1 Tessalonicenses 4.1317). Nossos órgãos são parte da terra, parte de nosso corpo natural e, portanto, são perecíveis. Somente através da doação é que esses órgãos poderão continuar a servir um propósito mais útil e durável. Nossos corpos espirituais, que não são carne e sangue e nem são mortais, não precisa rão deles (1 Coríntios 15.50). 7. Se eu sou idoso, deficiente ou se minha qualidade de vida é muito baixa, a minha vida tem menos valor? A idade e a qualidade de vida podem deter minar sua capacidade de realizar tarefas, mas não têm absolutamente nenhuma relação com o seu imenso significado como membro da raça hu mana. O simples falar da vida em termos de
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quanto “valor” ela pode ter já a coloca inadequa damente numa escala de valores. Sugere erro neamente que a vida pode ser trocada por outras coisas de valor. A vida não é negociável dessa forma. Vida é vida! O maior significado das pes soas não está em sua mobilidade e função, mas sim, nas mãos criativas daquele que nos fez e do qual somos imagem (Gênesis 1.26-27; 9.6). O significado de um ser humano é estabele cido por Deus e não pela humanidade. Esse fato está no centro de cada debate ético gerado pelos avanços da tecnologia médica. E essencial que não subestimemos a verdade de que “homens e mulheres, em sua própria natureza, refletem algo da dignidade e valor do próprio Deus”.13Nossa visão de Deus determina como vemos e trata mos uns aos outros e a nós mesmos. O amor e preocupação de Deus para com cada um de nós não falha só porque somos fracos, menos inteli gentes, estamos doentes e morrendo; portanto, o nosso amor também não deve fraquejar nessas circunstâncias. Entre as pessoas de maior gran deza e sucesso em nosso país, estão as enfer meiras e voluntários que optaram por cuidar da queles que estão morrendo - escolheram respei tar e se importar com os que sofrem. Esses doa dores de cuidado não esqueceram o significado inerente de um ser humano. Porém, é verdade que, à medida que as pes soas se esquecem de Deus ou o abandonam, elas
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também estão desonrando a criação, da qual os seres humanos são a parte mais importante. Se algo (ou alguém) não traz benefícios para a soci edade, tais pessoas sugerem que esse elemento deve ser descartado para que uma outra coisa ou pessoa possa tomar o seu lugar. E a conclu são natural, derivada da teoria da evolução, de que os mais fracos não conseguem e até mesmo não devem sobreviver. Parece também ser a opinião de muitos que quando os fracos, os que estão morrendo e os que são de idade estão lon ge dos olhos, também ficam longe do coração. Como podemos dizer que respeitamos os fracos e os que estão morrendo quando, por exemplo, mais de três quartos daqueles que morrem nos EUA o fazem em um hospital e em programas federais sem a consideração da acelerada econo mia norte-americana, a qual não tem tempo para aqueles que não conseguem “acompanhá-la”? Eles freqüentam as igrejas e sustentam a economia com sua força e seus talentos, mas, quando ficam fra cos e fragilizados, muitas vezes as igrejas e em presas estão mais preocupadas com seus substi tutos mais jovens e fortes e não asseguram que haja cuidado adequado para aqueles que passa ram por ali antes. Todos na sociedade acabam colocando o peso da responsabilidade nos ombros do governo. Apesar de o governo estar ajudando e dever continuar a fazer isso, a igreja e o mundo
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(dívida) de manter instituições para atender as ne cessidades dos mais velhos. O rei Davi pedia a Deus que não o “rejei tasse na sua velhice” e não o desamparasse quando lhe faltassem as forças - uma alusão a um comportamento muito comum em relação aos idosos e aos fracos (Salmo 71.9). Nós, o povo de Deus, que somos imagens de Deus, te mos a responsabilidade de assegurar que a dig nidade e as necessidades dos fracos e idosos não passem despercebidas ou sem solução. Ig norar, desvalorizar ou desonrar aqueles entre nós que estão enfraquecidos é uma forma de opres são. Para que possamos dizer que somos o povo de Deus, é preciso que mostremos justiça e in tegridade ao defender “a causa do aflito e ne cessitado” (Jeremias 22.15-17). “Deus assiste na congregação divina; no meio dos deuses, estabelece o seu julgamento. Até quando julgareis injustamente e tom areis partido pela causa dos ímpios? Fazei ju stiç a ao fraco e ao órfão, p rocedei retamen te para com o aflito e o desampa rado. Socorrei o fraco e o necessitado; tirai-os das mãos dos ímpios.” (Salmo 82.1-4)
Em outras palavras, sua dignidade é estabe lecida por Deus e colocada sob a proteção da sociedade. Sua idade, capacidade ou situação mé dica não afetam sua dignidade intrínseca.
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Q u e s t õ e s r e l a c io n a d a s a d e c i s õ e s
8. Quais são os papéis do paciente, do médico e dos membros da fam ília na hora de decidir sobre o tratamento? Nos dias de hoje, tomar decisões é muito di ferente do que era no passado. Historicamente, o médico tomava as decisões de sua área basea do naquilo que achava ser melhor para o pacien te. Hoje em dia, enquanto o paciente estiver cons ciente, informado (isto é, competente; comparar com a questão 10) e for maior de dezoito anos, a opinião popular sugere que a decisão sobre tra tamento médico seja tomada pelo paciente. Uma visão um pouco mais colaborativa, entretanto, é possivelmente o melhor modelo - médico e paci ente trabalhando juntos para oferecer o melhor tratamento possível. E irreal e pesado demais para o paciente tentar tomar todas as decisões médi cas sozinho. Pacientes podem decidir se querem ou não receber tratamento que vá sustentar sua vida, mas as decisões relacionadas a como os equipamentos serão usados para atender ao seu desejo dizem respeito ao médico.14 Se, por exemplo, um paciente de oitenta e cinco anos de idade, com câncer e que está cons ciente é informado antes de uma cirurgia que ele tem uma chance em quatro de morrer durante a
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operação, ele pode recusar o procedimento. En tretanto, se ele aceitar o risco, as decisões técni cas sobre procedimentos específicos ficam por contado médico. O paciente pode, ainda, estipu lar que, se ele sofrer uma parada cardíaca, não se deve fazer nenhum esforço para ressuscitálo. O médico pode achar que essa é uma estipu lação impertinente, já que uma parada cardíaca pode ser apenas uma situação temporária que pode ser consertada - assim, torna-se necessá rio que médico e paciente discutam esse assunto antes da cirurgia. O ponto mais importante sobre decisões do fim da vida é que elas não devem isolar o paciente, mas também não podem igno rar o médico. O processo é uma jornada que am bos devem realizar. O respeito mútuo é essencial nesse processo. A abertura completa em relação ao prognóstico do paciente (o impacto esperado da doença sobre a vida do paciente), além da não-coerção por parte do médico irá oferecer ao paciente competente a confiança necessária para que tome decisões ao longo do caminho. Além do envolvimento do médico, o pacien te precisa também do apoio dos membros da fa mília e dos amigos mais próximos no momento de tomar decisões conscientes. Desde que tam bém tenham o cuidado de evitar qualquer coer ção, por mais sutil que seja, essas pessoas po dem ajudar o paciente a identificar e pesar as diversas considerações não relacionadas ao as-
39 pecto médico e que podem estar envolvidas na escolha de um tratamento. Sua compreensão e envolvimento são ainda mais importantes quan do o paciente perde a capacidade mental de to mar decisões. O paciente pode evitar adivinha ções, problemas judiciais e conflitos entre médi cos e membros da família através de uma direti va prévia como um testamento em vida ou uma procuração com o fim de decidir sobre cuidados médicos (ver questão 13). E aconselhável colo car, não apenas sua família, mas também os ami gos mais chegados ao par de suas preferências sobre decisões do fim da vida. Na possibilidade de que nenhum membro da família seja localizado, um amigo pode assumira responsabilidade de ex pressar suas preferências caso as diretivas escri tas não possam ser obtidas imediatamente, tenham se perdido ou não estejam sendo respeitadas.
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9. Quem precisa saber que eu estou morrendo ou posso estar morrendo?
Apesar do conhecimento sobre a própria morte ou possível morte ser algo muito sério e que ocorre com freqüência assustadora, é im portante saber quão avançado é o seu estado. É impossível tomar decisões interdependentes quan do a figura central, o paciente, não está envolvi da. Diretivas prévias (ver questão 13) só são vá lidas se o paciente encontra-se mentalmente in competente e não substituem a consulta ao paci
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ente que ainda é competente. Pacientes compe tentes devem saber da verdade para que possam estar informados ao se envolverem nas decisões relativas ao tratamento médico, a ser ou não in ternado, onde e com quem passar os seus últi mos dias de vida e como colocar seus negócios em ordem.15A menos que o paciente peça expli citamente para não ficar sabendo da gravidade de seu estado, o que é pouco provável, os médi cos têm a responsabilidade moral de dizer a ver dade a seus pacientes. A família e os amigos do paciente que está morrendo também precisam ser informados, mas não necessariamente pelo médico. Se o paciente está inconsciente ou mentalmente incompetente, então o médico deve informar a pessoa que foi designada pelo paciente nas diretivas prévias (ver questão 13) ou, se tais diretivas não existirem, uma pessoa próxima que possa tomar decisões. O estado de saúde do paciente, entretanto, é con fidencial e o médico não deve revelá-lo, sem o consentimento do paciente, a nenhuma outra pes soa a não ser ao próprio paciente (ou aquele que está tomando as decisões). Mesmo assim, paci entes devem permitir que os médicos se comuni quem com outros indivíduos selecionados, a me nos que o próprio paciente deseje fazê-lo. Os pa cientes que estão morrendo não devem escon der seu estado da família pelos mesmos motivos que eles não gostariam de ser deixados de fora.
41 A família e os amigos precisam de tempo para se preparar para a morte, especialmente aqueles que fazem parte do grupo que está tomando as deci sões. É sempre melhor tomar decisões do fim da vida em conjunto - paciente, médico e familiares (ver questão 8). A morte é mais do que uma ex periência pessoal; ela tem impacto sobre muitas pessoas. Portanto, todos os que vão ser afeta dos de maneira significativa devem ser infor mados. Mesmo que haja exceções e razões para adiar essa notificação, elas são poucas e dizem respeito à situação de cada família. Exceções, porém, não são regras e devem ser exercidas com grande cautela. Não há necessidade de se causar desconfiança ou ainda mais dor sem uma forte justificativa. A idéia de que o médico está protegendo o paciente que está morrendo ou que o paciente está protegendo a família de notícias indesejá veis demonstra falta de consideração sobre a ne cessidade de encerrar relacionamentos e de co locar os assuntos em ordem. Vivemos com nos sos entes queridos e devemos estar com eles na hora da morte. Mesmo que, durante a vida, fa lhemos em cuidar uns dos outros tanto quanto deveríamos, devemos fazer todo esforço possí vel para cuidar uns dos outros quando a morte interfere e causa a separação temporária. Que a maneira como nós morremos possa refletir o amor que Cristo deseja colocar dentro de cada um de Decisões sobre o hlm da Vida
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nós - um amor que não busca o benefício pró prio e nem age inadequadamente, mas sim, se alegra com a verdade (1 Coríntios 13.5,6). 10. O que significa consentimento informado e competência mental?
O consentimento informado é a decisão voluntária feita por um adulto mentalmente competente e informado sobre aceitar ou rejei tar o tratamento médico proposto. Competên cia mental é a capacidade legalmente estabele cida de tomar e comunicar decisões. Para fins legais, a determinação da competência mental é responsabilidade de profissionais da saúde mental. A capacidade mental necessária para ser considerado mentalmente competente tem três aspectos. Inclui a capacidade do paciente em (1) assimilar informações, (2) analisar es sas informações em relação às suas próprias crenças e valores e (3) comunicar a outra pes soa a decisão resultante. A natureza da informação que o paciente deve receber e a descrição detalhada dos riscos e possíveis resultados de uma determinada linha de tratamento foi medida usando-se como refe rência um desses dois modelos: o modelo basea do no médico ou o modelo baseado no paciente. Tradicionalmente, a quantidade e a especificida de das informações passadas têm sido julgadas usando como referência o modelo do “médico
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razoável”. Ou seja, o que um médico com bom senso revelaria em circunstâncias semelhantes? Um especialista em um hospital-escola poderia oferecer detalhes que não seriam esperados de um médico de família num hospital da comunida de. Esse modelo um tanto patriarcal está sendo substituído por um modelo mais voltado para o paciente: o que o “cliente” precisa saber para que tome uma decisão inteligente? Um número crescente de pacientes mais sofisticados exige maiores detalhes sobre o procedimento propos to, sobre a linha de tratamento e sobre o uso inte grado de medicina alternativa. Para que um paciente chamado de mental mente competente possa dar um “consentimento informado” verdadeiramente ético, ele precisa re ceber mais do que informações. O paciente pre cisa não apenas receber informações suficien tes (talvez assinando um formulário que contém todos os detalhes), mas deve também compre ender essas informações. Para determinar se este requisito está sendo preenchido, qualquer familiar ou amigo do paciente pode simplesmen te perguntar a ele com o que consentiu e o por quê. Se o paciente não conseguir dar uma expli cação razoável, é possível que não tenha sido um consentimento informado. Por fim, para ser considerado ético, o con sentimento informado deve estar livre da influ ência coerciva do médico, familiares e outros.
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Mesmo a coerção mais sutil, tal como a situação econômica, deve ser eliminada ao máximo. Quan to a isso, o próprio termo, consentimento infor mado, é infeliz. Implica que o paciente irá sem pre consentir com o que o médico propõe. Esse não precisa ser o caso, por exemplo, quando o paciente pesa as considerações médicas e nãomédicas conflitantes de um modo diferente da quele que o médico faz.16 Menores são considerados legalmente in competentes para tomar suas próprias decisões quanto ao tratamento médico (exceto para ques tões que são protegidas pelo seu direito à priva cidade, como contracepção e aborto). O consen timento informado deve, portanto, ser dado por um dos pais ou um guardião legal. Mas, se um menor de idade está livre do controle dos pais (normalmente pelo casamento) ou é maduro o suficiente (o que é determinado por um juiz), ele pode dar ou recusar o consentimento quanto ao tratamento médico. Quando, por exemplo, me nores de idade recusam transfusões de sangue por motivos religiosos, o seu não-consentimento deve ser suficiente. II. Eu tenho direito legal de determinar qual será o meu tratamento médico?
A menos que você seja menor de idade ou mentalmente incompetente (ver questões 10 e 15) você tem o direito legal de determinar qual o tra
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tamento médico que irá receber. É um princípio legal claramente reconhecido que um adulto com petente tem direito praticamente ilimitado a re cusar até mesmo tratamento médico que poderia manter sua vida.17Esse direito baseia-se em prin cípios da lei comum sobre consentimento infor mado e proteção contra agressão física. Um pa ciente tem o direito de ser informado de todo o procedimento e dos riscos antes de consentir qual quer tratamento médico (ver questão 10). Se o consentimento não for dado, o médico pode ser acusado de agressão física. Mesmo pacientes que são incompetentes têm o direito de recusar tratamento médico se há evi dências claras de que eles não gostariam de con tinuar a viver sob determinadas circunstâncias. Se não há esse tipo de evidência, o tratamento ainda assim pode ser suspenso se o paciente encontra-se num estado vegetativo persistente ou em outros casos em que ele não é competente.18 Se esse tipo de suspensão de tratamento é apro priado ou não, depende dos fatos peculiares a cada caso. Esse amplo direito de recusa inclui todas as formas de tratamento médico, mesmo que a morte seja certa como resultado da decisão. Em alguns casos, pede-se a suspensão da nutrição e da hi dratação, considerando que esses procedimen tos são uma forma de tratamento médico não con sentido ou indesejado. Com mais freqüência, po-
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rém, a questão gira em torno do uso de intervenções médicas como respiradores, tubos para alimentação e ressuscitação. Recusar tratamento médico não é a mesma coisa que cometer suicídio, e o responsável que honra os desejos do paciente não está auxilian do em um suicídio. Legalmente, existe uma distinção clara “entre causar a morte de forma ativa, provocando o fim da vida, e permitir a morte ao rejeitar ou suspender um tratamento que manteria a vida”.10 O direito de um paciente em determinar seu tratamento, entretanto, não é ilimitado. Uma pessoa não pode exigir tratamento médico desnecessário, como, por exemplo, a amputação de um membro ou a hospitalização para remover uma verruga. O médico não é um profissional técnico que pode receber ordens para satisfazer os desejos da pessoa. Os médicos têm a obrigação de praticar a medicina de maneira ética, de acordo com os padrões de sua especialidade e aqueles da comunidade médica dentro da qual ele exerce sua profissão.
12. Que planos posso fazer em relação a tratamentos e a questões financeiras enquanto ainda estou saudável? E comum que adiemos para o final aquilo que vem no final. O problema é que questões sobre o fim da vida podem não esperar até que
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nossas prioridades tenham sido completadas. Ali ás, questões do fim da vida são na verdade ime diatas, já que se pode ficar doente ou ser grave mente ferido a qualquer momento. Sabendo que um dia seu cônjuge, seus filhos ou seus amigos irão cuidar de você enquanto você está no pro cesso de morte, você deve assegurar-se, da me lhor maneira possível, que eles conheçam suas preferências e o modo como o seu processo de morte pode ser financeiramente administrado. Mesmo que sua capacidade de providenciar es tabilidade financeira adequada dependa da sua renda, benefícios da empresa, seguros comple mentares e bens acumulados ou herdados, não há desculpas para que sua família não fique sa bendo quais são suas preferências em relação ao tratamento que deseja receber no final da vida. Juntamente com uma diretiva prévia (ver ques tão 13), prepare um testamento com um advoga do (ou com a ajuda de um livro ou software es pecífico) deixando claro quem irá herdar seus bens. Para maximizar os recursos à disposição dos seus entes queridos, com frequência, tam bém é importante que antes da morte seja defini do um responsável pelos seus bens que poderá, então, redistribuir a propriedade dos bens para seu cônjuge e entre adultos e seus filhos. Procu re auxílio legal sobre estas questões. Não confunda um testamento com uma di retiva prévia você precisa dos dois. Uma vez
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que você tiver uma diretiva prévia, envie cópias desse documento para todos os indivíduos que precisam prec isam saber sab er sobre sobr e ele. Esse grupo gru po inclui não apenas o seu médico e a pessoa que você quer que tome as decisões médicas em seu lugar, caso você venha a ficar mentalmente incompetente, mas também outros membros da família. Não se esqueça também de incluir aqueles que podem querer dificultar o trabalho da pessoa que você escolheu escolh eu para tomar tom ar as as decisões deci sões em seu luga lugar, r, por serem contrários a qualquer aspecto de sua direti va. Se atualizar a diretiva, certifique-se de man dar cópias para todos aqueles que têm a versão anterior do documento. Certifique-se também de que o original assinado por você e pelas testemu nhas está em um lugar seguro e que pelo menos seu cônjuge e aquele que você elegeu como pro curador em seu testamento saibam onde fica (o procurado procu radorr será identificado em seu testamento). testamento ). Outro preparativo importante é determinar uma funerária e um cemitério. A compra de um espaço no cemitério pode pode diminuir considerave conside ravel l mente os custos no fim fim da vida. vida. Deixar essa ess a res ponsabilidade para os os seus seus entes entes queridos por oca sião da sua morte apenas aumenta o desgaste que eles já estarão sofrendo com todos os acon tecimentos. Mesmo que pareça desagradável, os entes queridos de alguém que sofre de uma do ença terminal e que ainda não fez esse tipo de preparativo, devem fazê-lo antes da morte da pes
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soa. Descubra quais são e, se possível, atenda os desejos daquele ente amado que está morrendo. Quando os planos são feitos antes da crise emoci emo ci onal que normalmente acompanha a morte de um ente querido, é mais fácil evitar ser levado a fazer um sepultamcnto que está além das suas posses. E frustrante saber que as economias da vida inteira de uma pessoa podem ir parar pa rar no bolso de de uma instituição de saúde, de profissionais dessa área, do governo ou outras organizações. A fim de, possivelmente, possivelment e, evitar evit ar que isso aconteça, é fun damental que haja planejamen plane jamento to financeiro. Uma Uma vez que você não é mais capaz de trabalhar, os pagam pag amento entoss recebid rece bidos os da Prev Pr evidê idênc ncia ia podem ser uma fonte de renda, mas normalmente o que se recebe da Previdência não é suficiente para co brir todas as necessidades necessi dades geradas por uma doen doen ça terminal. Esse valor normalment norm almentee é baixo e não não está disponível imediatamente - pode ser que você você tenha que esperar meses até receber o primeiro pagamento. A Previdênc P revidência ia também não não realizará pagamentos pagament os a menos que você esteja este ja incapacit incap acita a do de realizar “trabalho substancial”, ou seja, tra balho que o possibilite possibilit e susten s ustentar tar a si mesmo. Se você tem seguro de invalidez pago por seu empregador ou por você mesmo, verifique em que momento você pode começar a receber os benefícios. Lembre-se de que, quando o se guro de invalidez é pago por seu empregador, tem imposto descontado e, quando o seguro é pago
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por você mesmo, não. E preciso prec iso que um médico mé dico confirme que você está incapacitado de continu ar empregado no seu trabalho atual. Verifique com seu empregad em pregador or ou ou corretor correto r de seguros quais são outros benefícios benefí cios que você você pode receber recebe r com esse tipo de seguro. Apólices de seguro feitas em grupo com empregadores podem ser convertidas em uma apólice individual, desde que seja dado um avi so com um mês de antecedência. Nesse caso, é você quem deve pagar as mensalidades. Custa caro, mas pode ser a única opção de seguro de vida que lhe resta. Se você tem menos de seis meses de vida, as despesas com esse tipo de seguro compensam pelos benefícios financei ros que a apólice garante para aqueles que você está deixando. Se você tem seguro-saúde atra vés do seu empregador, você pode continuar sendo coberto mesmo quando para de trabalhar. Mas, para isso, você deve arcar com o valor individual de acordo com a regulamentação dos órgãos pertinentes. Se você tem o seu próprio seguro de vida vida ou seguro-saúde, procure seu cor cor retor e certifique-se dos benefícios incluídos na sua apólice. Você pode, por exemplo, ter adqui rido um plano que continua a lhe dar cobertura sob determinadas circunstâncias sem que você tenha que pagar a mens me nsali alida dade de.2 .20 Não se esqueça esq ueça das clínicas especializadas especial izadas no tratamento de pacientes terminais. Se você se
51 encaixa nessa categoria (ver questão 29), uma instituição dessas pode ajudar a aliviar o peso financeiro, físico, emocional e espiritual. A Previdência não exige que você penhore seus bens para entrar num programa de tratamento para pacientes terminais. Além disso, alguns programas de tratamento terminal sem fins lucrativos podem oferecer tratamento para pacientes terminais que contam com menos de seis meses de vida e não têm seguro ou plano de saúde (isso graças a programas para angariar fundos e donativos). Os custos de planos de saúde e assistência médica são terrivelmente altos. É desanimador que um negócio dedicado a lidar com o sofrimento humano pareça estar mais baseado na margem de lucros do que na compaixão. Ainda assim, devemos fazer tudo o que for possível para aliviar o peso que a nossa morte ou a de um ente querido traz. Manter um seguro quando temos dependentes ou começar um fundo quando ainda somos jovens para que possamos deixar algo para aqueles que ficam para trás depois de nossa morte são atitudes prudentes que devem fazer parte do nosso planejamento financeiro. Os testamentos protegem nossos bens. Diretivas prévias orientam sobre o tratamento que receberemos no fim da vida. Seguros de vida e invalidez normalmente são oferecidos pelas empresas a seus funcionários; mas se esse não for o caso, você deve adquirir o melhor seguro possível dentro de suas
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condições financeiras. Mesmo que não possa mos adivinhar ou controlar o futuro, o amor por nossa família nos força a nos preparamos para ele. Ao dirigir-se àqueles que têm meios, Paulo escreve: “Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé” (1 Timóteo 5.8). Viver sem nenhu ma preocupação sobre o efeito que nossa vida e morte tem sobre nossa família e amigos vai con tra a fé em Deus. O processo de morte faz parte da vida, tanto quanto procurar um lugar para morar - ambos requerem planejamento para que as coisas corram bem. 13. O que são diretivas prévias?
Uma diretiva prévia é um documento legal mente autorizado que permite a uma pessoa to mar certas decisões sobre futuros tratamentos e cuidados em relação à sua saúde. A implementa ção de diretivas também pode ser regulamentada por procedimentos hospitalares, comitês de ética e as circunstâncias específicas de cada caso. Existem diversos tipos de diretivas prévias, incluindo tanto um testamento quanto uma pro curação para tratamento médico. Podem conter detalhes específicos ou ser bem gerais. Também podem ser escritas, orais (usadas como prova dos desejos do paciente quando não há nenhum ou tro documento) ou filmadas.
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Nos EUA, alguns estados exigem uma de terminada forma. Outros documentos, mesmo que não sigam um formato específico, podem ser considerados como prova dos desejos do paciente. Assim, esses documentos também poderiam ser considerados diretivas prévias. Alguns estados americanos limitam o efeito de diretivas prévias. Outros estados dão a elas uma aplicação mais ampla. Uma forma comum de diretiva prévia escri ta é o testamento em vida. Este é uma declara ção por escrito que delimita quais tratamentos médicos você deseja ou não caso você se torne incapacitado de expressar sua vontade. As limi tações sobre os tratamentos que são permitidos variam. Por isso, certifique-se de que seus dese jos estão de acordo com as leis de onde você reside. Nos Estados Unidos, quando da elabora ção deste texto, os testamentos em vida eram legais em todos os estados exceto Massachusetts, Michigan e New York. Este tipo de testamen to torna-se efetivo apenas quando é determinada uma doença terminal, morte iminente ou no caso de diagnóstico de um estado vegetativo perma nente. A procuração (Durable Power o f Attorney fo r Health Care - DPAHC) é um documento que nomeia uma ou mais pessoas para tomar decisões médicas em seu lugar, caso você se torne mentalmente incompetente (ver questão 10). A pessoa designada algumas vezes é chamada de
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substituto, agente de tratamento de saúde ou pro curador. Esses procuradores são autorizados a agir por lei (Durable Power o f Attorney fo r Health Core Act ) ou por um testamento. A pro curação difere do testamento em vida, pois ela não descreve qual o tratamento médico a ser dado. Essa procuração pode ser usada como for ma de colocar em efeito um testamento em vida ao nomear uma pessoa específica para repre sentar os desejos do paciente e orientar de que forma devem ser seguidas as instruções do tes tamento. Essa procuração é considerada legal em todos os estados, exceto no Alaska, que permite apenas o uso do testamento em vida. Nenhuma dessas diretivas prévias é autoexecutável. Uma pessoa deve mostrar o docu mento e ele deve ser aceito como sendo a ex pressão autêntica e não-coagida dos desejos do paciente.21 Entretanto, mesmo que haja uma di retiva prévia detalhada, esta por si só não dita as decisões médicas. O médico pode consultar mem bros da família, outros médicos, o comitê de éti ca do hospital, a equipe de enfermagem, cape lães e outros, especialmente se o resultado é a morte certa do paciente. 14. As diretivas prévias são uma boa idéia?
Muitas pessoas, inclusive cristãos, têm com preensivelmente resistido ao testamento em vida
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como sendo uma questão ética problemática. Alguns se preocupam com o fato de que esse tipo de documento, a princípio, foi desenvolvido por organizações como um passo estratégico em direção à eutanásia. Esse fato histórico, considerado isoladamente, porém, não deve levar ninguém a imediatamente rejeitar a idéia de um testamento em vida, mas sim, examinar mais cuidadosamente os seus méritos. Muitas pessoas realizaram esse escrutínio crítico e chegaram à conclusão de que esses documentos são perigosos. Como as pessoas não podem prever todas as situações futuras, os testamentos em vida podem acabar facilmente dando permissão para recusar ou suspender tratamento em circunstâncias nas quais a pessoa na verdade teria desejado tal tratamento. Por esse motivo, uma outra forma de diretiva prévia tem sido bem recebida: uma procuração para tratamento médico. Pode não ser o instrumento perfeito, mas oferece o melhor meio possível de declarar certos desejos e valores do paciente quando este está mental mente incapacitado. Os desejos e valores dessa pessoa devem ser respeitados pois ela ainda é um ser humano vivente. Se as pessoas querem colocar alguns dos seus desejos e valores num testamento em vida (ou uma seção de testamento inserida numa procuração), essas informações podem ser úteis para
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decisões no lugar do paciente. Tais informações podem incluir não apenas questões como evitar o tratamento excessivo - razão pela qual surgiu o testamento em vida - como também, cada vez mais, para lidar com questões de tratamento in suficiente. Usados dessa maneira, os testamen tos em vida agem diretamente num movimento contrário à eutanásia, temida por aqueles que se opõem a essas medidas de diretivas prévias. De qualquer maneira, deve constar na diretiva pré via que qualquer desejo expresso no documento deve servir apenas como orientação, ficando a decisão final por conta da pessoa que foi indica da pelo paciente. Deve-se também comunicar a existência das diretivas prévias a todos os mem bros da família e aos profissionais que estão cui dando d( paciente - um último passo muitas ve zes esquecido e que, com frequência, torna as diretivas nulas. Se o paciente não estabelecer uma diretiva prévia antes de sua doença, a lei de auto-deter minação do paciente (Patient S e lf Determinati on Act) torna obrigatório aos hospitais nos Esta dos Unidos que avisem aos pacientes de seus direitos em recusar tratamento médico, caso a situação torne-se incurável ou irreversível. Te nha em mente, porém, que os hospitais não po dem receber instruções relativas a tratamentos no final da vida de pacientes que não são capa zes de se comunicar. Lembre-se de que “a maior
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parte das pessoas conhece alguém cujo processo de morte ocorreu de forma tumultuada, seja por cansa de excesso de tratamento ou por trata mento de apoio inadequado (ênfase acrescen tada). Os dados limitados que estão disponíveis apoiam a veracidade desses relatos.”22 Portan to, é de suma importância que toda pessoa que tem a possibilidade de entrar num processo de morte (ou seja, todos nós) redija uma diretiva pré via - de preferência dentro das normas legais de cada lugar; se, entretanto, você preferir não ela borar tal documento, um memorando pessoal as sinado (de preferência com testemunhas) é me lhor do que nada. Ainda assim, temos que ser realistas sobre o quanto os médicos respeitam essas diretivas pré vias. Dados coletados em 1992 sugerem que, nos EUA, 75% dos tratamentos que os pacientes re ceberam estavam de acordo com suas diretivas prévias. Esse índice relativamente alto provavel mente é em função do fato de que havia uma semelhança entre os valores do médico e os do paciente. “Ao que parece, os desejos dos paci entes foram respeitados na medida em que os médicos acharam que esses pedidos resultavam em decisões corretas” .23 Em outras palavras, se o médico não concordava com a determinação do paciente, era menos provável que esta fosse seguida. Em 1997, The New England Journal o f Medicine informou que médicos e enfermei
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ras, quando “forçados a escolher entre aquilo para o qual haviam recebido treinamento e aquilo para o que não foram treinados a fazer, podem conti nuar a administrar um tratamento agressivo mui to além do ponto em que os pacientes ou suas famílias (ou ainda os próprios profissionais da saúde) teriam preferido que eles parassem”.24 Provavelmente, o melhor que se pode fazer é preparar uma diretiva prévia e certificar-se de que o conteúdo é conhecido pelo seu médico, sua família e seus amigos. Se o médico não concor dar ou recusar-se a seguir o que foi estipulado nas diretivas, procure entender o porquê desse desacordo. Se não for possível chegar a um acor do, procure outro médico. E preciso que os mé dicos saibam que respeitar os desejos dos paci entes não implica que eles ou outros membros da equipe médica estarão auxiliando em suicídio. O poder legislativo estadual e decisões judiciais de vem ter bem clara a diferença entre uma pessoa exercendo o seu direito de recusar tratamento médico e um caso de suicídio ou suicídio assisti do. Os médicos devem, sim, preocupar-se com o tratamento excessivo ministrado contra a vonta de do paciente, especialmente nos Estados Uni dos. Recentemente, nos estados de Michigan (caso Osgood vs. Genesys Regional Medicai Center, março de 1997) e Ohio ( Caso Anderson vs. St. Francis - St. George Hospital, ou tubro de 1996) médicos foram acusados de agres
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são física por terem realizado procedimentos que estavam contra as instruções deixadas pelo pa ciente, e um pedido de não ressuscitar, respecti vamente.25 As diretivas prévias são feitas para proteger o paciente da intrusão de tecnologia indesejada. É frustrante ver julgamentos, cujos resultados acarretarão mais despesas para o sis tema de saúde, tornando-se a principal razão para o atendimento dos desejos do paciente no fim de vida. Tendo em vista que a maior parte das difi culdades em relação a diretivas prévias não acon tece por má vontade dos médicos, pacientes ou outros, a boa comunicação desde o início é es sencial para que as decisões sobre o fim da vida de uma pessoa sejam respeitadas.26 15. Quem to mu decisões quanto ao tratamento de um paciente incompetente que não deixou diretivas prévias?
Se você escolher não preparar nenhuma das duas formas de diretiva prévia, você deve dizer aos membros mais próximos de sua família e a amigos quais procedimentos do fim da vida você preferiria, caso se tornasse incapacitado num es tágio terminal. Sem instruções, os médicos são obrigados a fazer o que acharem melhor. Não coloque sua família numa posição desnecessária e emocionalmente exaustiva tendo que lutar na justiça pelo seu tratamento durante o p ocesso
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de morte. Quando o paciente não deixou nenhu ma diretiva prévia, pode ser que um substituto para tomar decisões seja indicado. Normalmente, o médico consulta o cônjuge. O comitê de éti ca médica do hospital também pode analisar de cisões de tratamento caso esteja se consideran do a possibilidade de suspender tratamentos que estão mantendo vivo o paciente. Há dois riscos que acompanham a escolha de não se preparar uma diretiva prévia. Em pri meiro lugar, aqueles que não têm uma diretiva prévia não podem estar tão certos sobre o tipo de tratamento que irão receber. Em segundo lu gar, à medida que a sociedade desenvolve uma grande abertura em relação a suicídio e eutaná sia (ver o livro Suicídio e Eutanásia, desta sé rie), o tratamento médico não irá se preocupar apenas em como restaurar e manter a vida, mas também em como acabar com ela. Na Holanda, que tem permitido a eutanásia há vários anos,27a vida de um número significativo de pacientes in competentes foi terminada sem o consentimento deles. Assim, é arriscado deixar o tipo de trata mento e intervenção médica nas mãos de pesso as com valores diferentes dos seus. Sua vida pode ser interrompida prematuramente. Baseados no medo genuíno de que o pro cesso de morte torne-se desnecessariamente hu milhante, os defensores do suicídio auxiliado por um médico encontraram uma forma de promo
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ver o “golpe de misericórdia”.28 Apesar de al guns proponentes do suicídio auxiliado por um médico serem, de fato, motivados por compai xão, a inerente dignidade de cada vida humana e a desconfiança psicológica do que esta “solução” irá gerar entre pacientes e a comunidade médica exige que busquemos uma alternativa que pro mova o cuidado e não a morte. Grande parte da comunidade médica já sentiu a pressão do movi mento em favor do suicídio auxiliado por um médico e, em resposta a esse movimento, está criando programas e cursos educativos para médicos que precisem de um treinamento relaci onado a tratamentos paliativos e do fim da vida.29 Uma das questões discutidas nesses treinamen tos é a finalidade e uso das diretivas prévias.
16. Quando a hospitalização é apropriada? A vida humana é um empréstimo de Deus e deve ser usada para a glória dele no contexto da comunidade. Isolados, somos incompletos - so mos pessoas que precisam de relacionamentos para descobrir o significado e o propósito de nos sas vidas. O fato de sermos criados à imagem de Deus envolve tanto um propósito divino - ao qual devemos nos dedicar - como também a obriga ção moral que nos orienta enquanto buscamos cumprir essa finalidade. Para alcançar o(s;
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propósito(s) de Deus para nossa vida (o que nem sempre será completamente claro para nós), de vemos viver por um período do qual apenas Deus sabe a duração e devemos viver dependentes de Deus, de maneira justa, reta e fiel (ver lCoríntios 4.2; 6.18-20). Cada um de nós faz várias coisas para man ter nossas vidas. Trabalhamos para receber sus tento e ter com o que comprar comida, vamos ao supermercado para comprá-la, nos exercitamos para viver mais e, mais cedo ou mais tarde, nos aposentar. Durante esse programa de manuten ção, vamos a clínicas ou hospitais fazer check ups e, às vezes, por motivos mais sérios. Faze mos tudo isso para viver, ou melhor, para a glória de Deus —para nos ajudar a alcançar quaisquer propósitos que ele tenha para nós. Assim, falan do de um modo geral, devemos lançar mão dos benefícios médicos que ajudam a manter os nos sos frágeis corpos funcionando. Da mesma for ma que isso pode significar o tratamento em um hospital, pode também significar mudar-se para uma instituição para tratamentos mais prolonga dos (ver questão 17) onde os cuidados médicos e outros serviços de apoio estão sempre disponíveis. Mais cedo ou mais tarde, nem mesmo um programa de manutenção cauteloso será capaz de impedir que nosso corpo passe para a fase final do processo de morrer, quando a morte c iminente (ver questão 2). Nesse ponto, as ques
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tões sobre o fim da vida tornam-se prioritárias. Tanto nós quanto nossos médicos precisamos aceitar o fato de que completamos tudo o que Deus queria fazer conosco exceto aquilo que ele quer fazer dentro e através do processo de mor rer. Não se esqueça que você tem a oportunida de de estar em comunhão com ele e de influenci ar positivamente a vida de outros até o momento da sua morte. Nos últimos meses e dias de sua vida você pode providenciar cuidados médicos em sua casa. Esse tipo de cuidado inclui a liberdade de se po der evitar ou suspender o uso de tecnologia para prolongar a vida (ver questão 3). Mantenha con tato com seu médico para que você possa rece ber o tratamento paliativo adequado (tratamento de conforto, ver questão 28) e que controle qual quer dor que possa surgir. Se as condições per mitirem e você preferir morrer em casa, esse ambiente será mais familiar e amigável. E mais fácil sentir paz entre a família e os amigos do que num ambiente estranho. Quando Rute deu à luz Obede, as mulheres da comunidade oraram para que ele fosse para Noemi, sua avó, “restaurador da tua vida e con solador da tua velhice” (Rute 4.15). Em nossa sociedade tão agitada, perdemos o contato pró ximo entre as gerações de uma família e o cuida do uns pelos outros que tal proximidade traz. Essa separação tem nos forçado a buscar fora da fa
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mília o cuidado pelos membros que estão enve lhecendo e morrendo. Se os altos custos de hos pitais nos forçarem a ficar mais unidos como fa mília e cuidar uns dos outros, eles estarão nos fazendo um favor. Segurar a mão de um ente querido enquanto ele morre no conforto de seu lar não irá nos machucar e nem aos nossos fi lhos, pode até mesmo nos curar. Entre em contato com seu corretor de segu ros para ter certeza de que a seguradora cobre os custos do tratamento em casa. Caso eles não o façam, você deve considerara possibilidade de mudar de seguradora. Certamente existem ar gumentos favoráveis ao tratamento em casa no fim da vida. Em um estudo, metade dos pacien tes em estado grave que morreram, passaram sua última semana conectados a um respirador numa UTI. Evitar tal tratamento, quando for mo ralmente justificável, pode muito bem resultar em mais visitas ao doente e outros tipos de cuidado e apoio.30 A escolha de se morrer em casa é sen sata. Para o caso de você não estar consciente em seus momentos finais, certifique-se de que seus familiares e outras pessoas envolvidas em seu tratamento saibam do seu desejo de morrer em casa. Tenha em mente que cada vez mais hospi tais estão oferecendo programas de tratamento paliativo para os que estão no processo de mor te. Se você precisar ou preferir ser internado para
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receber tratamento no fim da vida, saiba que muitos hospitais estão criando espaços que são mais aconchegantes. Um número cada vez mai or de profissionais da saúde está percebendo que a medicina moderna deve oferecer um ambiente tranquilo, com luz suave e música, que permita o contato físico com o paciente, para que ele, a família e os amigos possam passar pelo “pro cesso de separação” ao morrer com mais pri vacidade e num ambiente menos estéril do que a enfermaria ou UTI de um hospital/1Reúnase com o serviço de assistência social do seu hospital para saber que tipos de serviços para o fim da vida ele oferece. 17.0 que é o tratamento de longo prazo?
Quer a condição do paciente seja reversível ou irreversível, tanto a convalescença (cura gra dual que ocorre em resultado ao tratamento cu rativo) quanto a provisão de um tratamento de sintomas durante o processo de morte requerem cuidados de longo prazo. Esse tipo de tratamento mais extenso não está disponível no hospital, de vido aos seus altos custos. O tratamento de lon go prazo é definido como a provisão de cuidados médicos extensos ou outros tipos de cuidados para pacientes cuja condição requer alguma for ma de tratamento além da hospitalização. Qua tro das principais categorias de tratamento de lon-
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go prazo são: tratamento de enfermagem em casa, tratamento para pacientes terminais, tratamento de saúde em casa e cuidados em casa.32 Tratamento de enfermagem em casa pode ser administrado em três níveis, dependen do das necessidades dos pacientes. Pacientes que precisam de cuidados durante vinte e quatro ho ras recebem os serviços profissionais de uma en fermeira registrada e que trabalha sob a supervi são de um médico que está disponível em caso de emergência. Pacientes que não precisam ser monitorados o tempo todo recebem tratamento de enfermagem intermediário. Por fim, há tam bém aqueles que precisam apenas de cuidados básicos. Este terceiro grupo de pacientes nor malmente não requer cuidados médicos. Visite o local de enfermagem para ver como são admi nistrados os três níveis de tratamento e coloquese ao par do custo de cada nível. O tratamento para pacientes terminais oferece médicos, enfermeiras habilitadas e uma variedade de assistentes voluntários que procu ram ir ao encontro das necessidades dos pacien tes com doenças terminais, tipicamente aqueles cuja morte pode ocorrer dentro de seis meses. Esse tipo de tratamento acontece em clínicas especializadas ou em casa. O tratamento para pacientes terminais leva em consideração as ne cessidades do paciente como um todo: seus as pectos físicos, mentais, emocionais e espirituais.
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Clínicas com certificação federal normalmente recebem fundos do governo. Para mais detalhes, veja a questão 29. O tratamento de saúde em casa inclui uma grande variedade de serviços oferecidos na casa do paciente, às vezes sob a supervisão de um médico. Enfermeiras, fisioterapeutas e assisten tes trabalham juntos para oferecer serviços médi cos e cuidados pessoais (ajudam o paciente com sua higiene, a vestir-se...) tudo isso no conforto do lar do paciente. Os custos baseiam-se em valores cobrados por hora para assistentes e por visita (de uma ou duas horas) para as enfermeiras registra das ou terapeutas. Consulte seu convênio para determinar quais desses serviços são cobertos. Os cuidados em casa oferecem serviços não-médicos em casa. Esses serviços podem in cluir assistência com tarefas domésticas como limpeza e manutenção. O custo desses serviços é baixo e normalmente cobrado por hora e inclui o material. Alguns programas locais oferecem ali mentação uma ou duas vezes por dia, entregan do as refeições diretamente na casa do paciente. Essas refeições podem ser entregues cinco dias por semana e normalmente custam pouco. Ou tros programas de cuidados em casa incluem ser viços de voluntários que visitam o paciente, aju dam com pequenas tarefas, fazem serviços ex ternos (banco, correio) e ajudam a escrever car tas. Grupos religiosos ou voluntários locais mui-
Coleção Bioética 68 tas vezes oferecem esse tipo de serviço. Pode ser que sua comunidade tenha também um ser viço de apoio por telefone em que voluntários fa zem ou recebem chamadas de pacientes idosos que vivem sozinhos. Finalmente, para garantir a segurança de seu ente querido, pode-se conside rar a aquisição de um sistema de resposta a emer gências que é operado por telefone ou por um equipamento eletrônico. Verifique com seu médico quais serviços de cuidado de longo prazo estão disponíveis em sua comunidade. Fale também com seu pastor para saber se igrejas de sua comunidade oferecem ser viços de cuidado de longo prazo. E possível en contrar diversas informações sobre esse assunto nas Páginas Amarelas ou na página de Serviços Comunitários da sua Lista Telefônica. Os paci entes não precisam ficar sozinhos. Há diversos programas cívicos, religiosos e governamentais que trabalham para tornar a vida do paciente mais humana, confortável e até mesmo agradável.
Su s p e n s ã o
d o s u po r t e à v i d a
18. O que é uma ordem para “não ressuscitar” e quando ela é apropriada?
É uma declaração para que não seja feita nenhuma tentativa para reviver o coração ou os
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pulmões se os batimentos cardíacos ou a respi ração do paciente pararem - em outras palavras, nada de ressuscitação cardiorrespiratória. Essa declaração, que indica a total aceitação ou aqui escência à morte, pode ser apropriada no caso de um paciente terminal cuja morte é iminente (ver questão 3). E responsabilidade do médico discutir com o paciente os objetivos e opções de tratamento que são coerentes com esses objeti vos. Tais objetivos podem incluir uma morte tran quila, ao contrário de usar-se toda a tecnologia disponível até o final. Sem uma ordem de “não ressuscitar” assinada pelo paciente e pelo médi co que o está tratando, os outros profissionais médicos têm a responsabilidade de usar todos os métodos à sua disposição para manter a vida do paciente, mesmo que este esteja prestes a mor rer de qualquer maneira. E perturbador para os pacientes receber in formações a respeito da ordem de “não ressus citar”. Muitas vezes eles sentem-se desconfor táveis, pois essa discussão, quer intencionalmen te ou não, implica que eles têm uma doença mui to grave que pode resultar em abandono, defici ência e morte. Um estudo realizado em 1996 mostrou que as conversas entre pacientes e mé dicos sobre os procedimentos relacionados à or dem de “não ressuscitar” não passavam todos os dados necessários para o paciente tomar uma decisão bem-informada. Nenhum médico descr
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veu clarainente a probabilidade de sobrevivência com a ressuscitação cardiorrespiratória e a mai oria mencionou os riscos e benefícios através de expressões vagas de probabilidade. Aliás, ape nas 13% discutiram os possíveis resultados de uma ressuscitação cardiorrespiratória. Eles ra ramente perguntaram sobre os valores do paci ente, não procurando, assim, usar um contexto que fosse mais facilmente compreendido pelo pa ciente. O estudo também mostrou que os médicos ofereciam poucos comentários de empatia e, com frequência procuravam impor suas próprias opini ões sobre a ordem de “não ressuscitar” ao invés de trabalhar com as preocupações do paciente.’’ Essas duas questões - ansiedade do pacien te e falta de clareza por parte do médico - suge rem que alguém da família ou uma outra pessoa de confiança do paciente deve estar presente quando o médico e o paciente forem discutir pla nos sobre tratamento no fim da vida. Se você, como membro mais próximo da família, perder essa reunião ou descobrir que não foi feita, agen de um horário com o médico o quanto antes. Lembre-se de que esta discussão é obrigatória por lei só quando o paciente dá entrada no hospi tal devido a “uma doença grave em que a parada cardiorrespiratória não é improvável ou quando o paciente têm uma doença crônica e seu estado pode deteriorar-se” .34 Não parta do pressuposto de que o paciente incluiu instruções sobre proce-
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dimentos de ressuscitação cardiorrespiratória nas diretivas prévias.33 A aceitação de uma ordem de “não ressus citar” por parte do paciente não é uma ordem para que a equipe médica abandone o tratamen to. Os tratamentos de conforto e de respeito (ver questão 2) pela equipe médica e familiares de vem continuar na forma de medicação e da pre sença da família. Isso pode acontecer no hospi tal ou em casa, se o paciente preferir morrer na companhia daqueles mais próximos a ele (ver questão 16). Uma ordem de “não ressuscitar” limita, a pedido do paciente, o uso de técnicas com potencial de sustentar a vida e que não te rão efeitos duradouros e apenas irão postergar uma morte inevitável. Normalmente, quando os médicos consideram apropriada uma ordem de “não ressuscitar” é porque eles crêem que a ressuscitação cardiorrespiratória não será efi caz de qualquer maneira no caso do paciente em questão. Porém, antes de decidir solicitar uma ordem de “não ressuscitar”, informe-se com o médico sobre todos os benefícios possí veis, bem como os aspectos nocivos que pode riam decorrer no caso de uma ressuscitação car diorrespiratória ser tentada em você ou em seu ente querido.
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19. Devo ser cauteloso sobre iniciar o uso de equipamento de suporte à vida, temendo que sua suspensão possa ser difícil?
Podemos dizer duas coisas: você tem razão em ser cauteloso, mas deve cuidar para não ser exageradamente cauteloso. A primeira razão para ser cauteloso é que alguns médicos (e membros da família) relutam em suspender as medidas de suporte à vida (respirador, diálise e assim por di ante) até que o paciente tenha falecido. Para eles, evitar (ou suspender) o suporte à vida é neces sariamente problemático, pois eles definem esse procedimento como “a decisão de não instituir (ou continuar) uma terapia medicamente apro priada e possivelmente benéfica”.36Há situações, entretanto, em que o uso do suporte à vida não é necessariamente a escolha “medicamente apro priada” (ver questão 3). A definição em si é ten denciosa a favor do uso de tecnologia de suporte à vida. Mesmo que os médicos estejam tornan do-se mais sensíveis aos desejos de seus pacien tes. as pesquisas ainda mostram que "os pacien tes terminais nos Estados Unidos com freqüência recebem intervenções indesejadas” .37 Portamtr, você tem razão em ser cauteloso. Em segundo lugar, entretanto, não se deve usar de cautela excessiva. Ao invés de não inici ar nenhum tipo de-.suporte à vida, uma saída se-
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ria pedir o uso de equipamentos durante um p e ríodo de teste. Uma vez que a intervenção é experimentada, os médicos e o paciente podem determinar com maior precisão se o tratamento é ou não apropriado e benéfico. Se o paciente concorda com esse “período de teste” e todos os envolvidos compreendem a lógica por trás desse procedimento, é possível dar-se um consentimento mais bem informado sobre continuar ou suspen der o suporte à vida. Se a intervenção não for cumprida, como é desejado, o médico deveria honrar a decisão do paciente de suspendê-la. Comprovadamente, suspender um tratamento já iniciado é psicologicamente mais difícil para os médicos do que não o iniciar, mas não é mais problemático do ponto de vista ético. Mesmo quando o tratamento é iniciado sem se estipular um período de teste, os médicos normalmente têm mais base para tomar decisões uma vez que os pacientes já estejam recebendo o tratamento em questão por algum tempo. Mas a suspensão é mais fácil se um período de teste pré-determina do já tiver terminado e for tomada a decisão de não se autorizar a continuação do tratamento mais ou menos da mesma forma como um medi camento é descontinuado depois de ser receita do por um certo tempo, caso não esteja surtindo os efeitos desejados. Portanto, seja cauteloso, mas não demais.
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20. Que fato res o paciente, a fam ília ou outras pessoas próxim as devem considerar antes de decidir pela suspensão do suporte à vida? Para que possamos entender o processo de morte, precisamos fazer pelo menos três pergun tas. Primeiro, qual é o diagnóstico? Precisamos saber qual é a doença em questão. Segundo, quais são as possíveis intervenções médicas? Precisa mos saber se o estado é reversível ou irreversí vel e quais formas de tratamento curativo ou sin tomático (ver questão 3) são apropriadas. Ter ceiro, qual é o prognóstico da doença com e sem o tratamento? Precisamos determinar por quan to tempo e com que qualidade iremos viver de acordo com cada intervenção possível ou sem intervenção nenhuma. Determinar se você ou seu ente querido está morrendo é importante porque a santidade da vida não obriga àqueles que irre versivelmente estão prestes a morrer a prolon gar esse processo através de todos os meios pos síveis. Mas demanda, entretanto, que seja per mitido ao paciente nesse processo morrer da ma neira mais humana e indolor possível. Se o tratamento irá reverter o quadro e res taurar a saúde, não pense duas vezes antes de submeter-se a ele. Se o tratamento não vai re verter o quadro, pode prolongar o tempo de vida significativamente e permitir que você continue
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interagindo com o mundo, submeta-se a ele.7’8 Porém, se o tratamento não vai reverter o qua dro e a morte é iminente, você pode aceitar o processo de morte juntamente com os tratamen tos de conforto e respeito que são apropriados para o seu estado (ver questão 3).39Os objetivos do paciente devem ter precedência sobre a tec nologia disponível - só porque determinado pro cedimento pode ser realizado não significa que deva ser. A tecnologia fo i feita para as pesso as e não as pessoas para a tecnologia. Essa compreensão de tecnologia é uma paráfrase do que Jesus afirmou: “O sábado foi estabelecido por causa do homem e não o homem por causa do sábado” (Marcos 2.27). Apesar de a família ter que prover tratamen tos de saúde para entes queridos idosos, não há motivo algum para prolongar inapropriadamente esse período difícil de envolvimento íntimo, espe cialmente quando a morte daquele ente querido é iminente. O medo da morte ou sentimentos de culpa dos familiares não justificam prolongar o processo de morte, quer o paciente seja ou não cristão. Lembre-se de que nós, como jardineiros dos que são fracos, temos a responsabilidade de fielmente plantar e regar, mas é somente Deus que pode causar o crescimento espiritual da pes soa que estamos cuidando (1 Coríntios 3.6-9). Somos chamados para amar aqueles que conhe cem o Senhor bem como aqueles que não o co-
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nhecem. Não somos responsáveis por fazer com que pacientes que estão morrendo se arrepen dam, prolongando seu processo de morte até que isso aconteça. Nosso papel é de refletir a ima gem e caráter de Deus - e não fazer o papel do Espírito Santo. Também não é necessário encarar essa de cisão com medo de cometer um erro terrível. Mes mo que a morte iminente não traga outras conse quências, ela deve servir para que nos coloque mos de joelhos em oração. “Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida. Peça-a, porém, com fé, em nada duvidando” (Tiago 1.5-6a). Você, seus en tes queridos, seu pastor e a equipe médica co nhecem a situação melhor do que qualquer um, exceto Deus. Ele está no controle e quer que você o envolva no processo de morte. Não se esqueça de que o Pai celeste sabe como é a ex periência de enfrentar a morte de um Filho. Ele entende sua dor e o seu sentimento de perda. Esteja certo de que ele irá guiá-lo e dar-lhe a sabedoria necessária para lidar com mais esse desafio. “Cada situação é diferente, cada pessoa é única. Assim, quando chega a hora de pergun tar se os aparelhos devem ser desligados, não perca seu tempo procurando uma lista bem or ganizada de regras.”40 Ouça a seu médico, ouça a Deus, ouça a seu pastor, ouça a Deus, ouça a
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seus amigos, ouça a Deus e então, confie em seu coração (“na multidão de conselheiros há segu rança” - Provérbios 11.14). Durante todo esse processo, mantenha-se atento para os motivos do seu coração! E difícil confiar em um coração que só se preocupa com o seu bem-estar e se esquece dos outros. Você deve perguntar-se de que maneira sua morte, ou a de um ente querido, irá afetar todos aqueles que estão envolvidos de maneira mais próxima. A sinceridade da fé e uma decisão tomada em conjunto com os que estão próximos da crise são fatores que podem diminuir a possibilidade de to mar-se uma decisão egocêntrica. 21. Se eu remover o suporte à vida, sou responsável pela morte?
Dos pontos de vista médico, legal ou ético não há nenhuma diferença entre evitar tecnolo gia de suporte de vida ou suspender a mesma, e nenhuma das leis de diretivas prévias faz distin ção entre esses dois atos. As pessoas têm o di reito constitucional de solicitar que determinado tratamento médico seja suspenso ou evitado, mesmo que isso resulte em morte.41 Legalmen te, as cortes ultimamente têm feito distinção entre o suicídio auxiliado por um médico - que é ilegal em praticamente todo lugar-e suspen der ou evitar o suporte à vida, que é um proce dimento legal.
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Moralmente falando, as pessoas não são res ponsáveis pela morte do outro se elas não a cau saram ou tiveram a intenção de fazê-lo. Quan do o equipamento de suporte à vida é removido, é a doença ou ferimento - e não a suspensão - a causa médica da morte. Ainda assim, a suspen são pode ser feita com a intenção principal de se apressar o processo de morte (trazendo a mes ma questão problemática dos casos de suicídio auxiliado e eutanásia - ver questão 15). Ou, a suspensão pode ser feita com o intento louvável de permitir que um ente querido morra sem ter que carregar o fardo de um processo de morte medicamente prolongado (quando a condição é irreversível e a morte é iminente - ver questão 3). Algumas pessoas sentem-se culpadas depois de tomarem a decisão de suspender o suporte à vida porque alguma coisa não foi resolvida entre o paciente e aquele que tomou a decisão ou por que essa pessoa não discutiu com o paciente quais eram os seus desejos em relação ao tratamento, antes que o paciente ficasse inconsciente. A qua lidade de nossos relacionamentos e nossa capa cidade de comunicação têm muito a ver com a dificuldade em se tomar uma decisão no fim da vida. A maneira como amamos uns aos outros ao longo de nossa vida irá determinar a forma como iremos lidar emocionalmente com as decisões durante o processo e experiência de morte. En tretanto, um fato permanece: a decisão de se
79 suspender a tecnologia de suporte à vida não precisa ser uma decisão para matar; pode ser, sim, a decisão de aceitar que a intervenção médica é inapropriada. A suspensão de suporte à vida nesses casos não é o mesmo que fazer papel de Deus. Lem bre-se de que a intervenção médica é uma for ma de intervenção humana, e não uma ordem divina. O uso da intervenção médica deve sem pre beneficiar o paciente; quando ela é inútil, deve ser removida. Deus deu a cada um de nós um determinado período de tempo neste mundo. Por não sabermos qual é o exato momento em que a morte ocorre, somos responsáveis por tomar uma decisão que honre a vida e agrade a Deus. Esse honrar a vida e agradar a Deus inclui saber quando os esforços para se continuar a vida são fúteis. As Escrituras nos lembram com freqüência da brevidade ou fragilidade da vida e da frustração que a acompanha (Salmo 90.10). Tiago diz que a vida de cada um de nós é “como neblina que apa rece por um instante e depois se dissipa” (Tiago 4.14) e lsaías compara nossa carne à grama apesar de ter um momento de beleza, mais cedo ou mais tarde ela seca e morre (lsaías 40.6-10). À medida que a morte se aproxima, não temos a obrigação de lutar incessantemente, como se pudéssemos conquistá-la. Antes da volta de Cris to, jamais iremos conquistar a morte. Então, até lá, devemos usar a dádiva das intervenções mé Decisões sobre o Fim da Vida
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dicas como uma ferramenta para sustentar a vida, melhorar a saúde e prover conforto.
22. Suspender a administração de fluídos e nutrição pode ser considerado ético em alguns casos? Enquanto os pacientes conseguem comer e beber (ou seja, engolir e digerir) você deve lhes dar comida e líquidos. Ele são “os famintos” e “os sedentos” para os quais as Escrituras dizem que devemos prover (Mateus 25.37-46). O pro cesso de morte, entretanto, é caracterizado por um desligamento de vários sistemas, inclusive o sistema digestivo, e devemos proceder com cau tela para que não terminemos por tornar o pro cesso ainda mais difícil. Quando o sistema diges tivo falha, a única opção disponível é a “hidrata ção e nutrição artificial” (comida especial em for ma líquida e água são enviados diretamente para o canal digestivo ou outra parte do corpo mecani camente, como, por exemplo, através da inserção de um tubo). Assim como na intervenção mecâni ca que substitui uma parte do corpo que esteja falhando (um respirador que forneça ar quando os pulmões já não funcionam mais sozinhos), devese seguir os critérios para uma intervenção ética (ver questão 3). Se o estado possivelmente fatal do paciente é reversível, deve-se fornecer hidra tação e nutrição artificial para sustentá-lo enquan to o tratamento curativo faz efeito. Se sua condi-
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ção é irreversível, e ele está consciente ou poten cialmente consciente e sua morte não é iminente, ele deve receber nutrição e hidratação artificial como forma de tratamento de sintomas. Se o paciente encontra-se em estado de morte iminente com ou sem intervenção, a hi dratação e nutrição artificial só devem ser fei tas caso ofereçam tratamento de conforto para aqueles que podem experimentar esse conforto e tratamento de respeito params que não po dem. Durante os últimos dias de vida do paci ente, o sistema digestivo normalmente pára de funcionar - fazendo com que o paciente fique enfraquecido e menos alerta. E preciso cuidar para que não se dê início ou continuidade à hi dratação e nutrição quando estas já não podem mais alterar a iminência de morte e só aumen tam a dor ou desconforto proporcionados por um tubo inserido no corpo. Outro risco de se continuar a hidratação é causar uma saturação de fluídos, que pode cau sar grande dor e sofrimento. Há um consenso cada vez maior entre profissionais da saúde que '"pacientes sentem pequeno ou nenhum descon forto com a suspensão da alimentação por tubo, da nutrição parenteral (dada em outra parte do corpo que não o tubo digestivo) ou da hidratação intravenosa” .42 Além disso, quando a hidratação artificial é evitada ou suspensa, pode-se dar con forto satisfatório pela via oral. A medida que o
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processo de deterioração evolui, membros da fa mília ou da equipe médica podem colocar lascas de gelo sobre os lábios do paciente para mantêlos úmidos. Mesmo que, num estágio de morte iminente, pacientes inconscientes não tenham a sensação de dor e, portanto não precisem de tra tamento de conforto, eles ainda devem receber o tratamento de respeito, que pode incluir a pre venção da deterioração da boca e dos lábios man tendo-os úmidos. No caso mais complexo de pacientes per manentemente inconscientes, mas que não estão na iminência de morrer (quando o termo perma nente pode ser satisfatoriamente estabelecido), valem as mesmas considerações e diretrizes que foram explicadas na questão 3. Enquanto muitos desejam que se continue a hidratação e nutrição artificial, outros devem ter a liberdade de não con tinuar, de acordo com as diretrizes apresentadas. O desconforto de alguns, a essa altura, é com preensível, pois eles consideram que a hidrata ção e nutrição artificial são como água e comida com valor simbólico. Parades, isso representa o mínimo de ajuda a que todo membro da humani dade tem direito até o momento de sua morte. No fim das contas, entretanto, justificar o va lor da hidratação e nutrição artificial com base somente em seu valor simbólico não é muito con vincente. A maioria dos indivíduos e comissões que tem discutido esse assunto está convencida
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de que a hidratação e nutrição artificial - ofere cida automaticamente através de tubos com pou ca ou nenhuma interatividade entre o pacientes e aqueles que estão cuidando dele - não preserva, de fato, para a maior parte das pessoas, o signifi cado simbólico da água e do pão ao que está ne cessitado. Tem-se visto grande diversidade de opi niões até mesmo entre cristãos sérios que lutam pela liberdade de opinião daqueles que estão fa zendo um tratamento e devem tomar essa deci são. O desafio para nós é manter o respeito ab soluto pela vida humana, criada à imagem de Deus. Não se deve evitar a nutrição e adminis tração artificial de fluídos com o propósito de causar a morte. Alguns continuarão com a hidra tação e nutrição artificial, independente da imi nência ou não de morte. Outros irão reconhecer que há certas ocasiões em que essas intervenções podem perder seu aspecto benéfico e talvez até mesmo fazer mal. Diante de tais circunstâncias, eles podem suspendê-la, não como sinal de des respeito, mas como uma expressão de fé que en xerga além da perseverança e da morte e vê a esperança que desejamos (Romanos 5.1; 8.20-24). 23. O meu desejo de estar com Cristo deve ser considerado na hora de tomar decisões do fim da vida? De acordo com o plano de Deus, cada pes soa morrerá e será julgada (Hebreus 9.27). O
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julgamento daquele que crê será diante do Filho de Deus, onde ele receberá de acordo com aqui lo que fez durante a vida ao corpo, seja bem ou mal (2 Coríntios 5.9-10). Um pouco antes de dis cutir esse julgamento, o apóstolo Paulo descreve sua atual experiência à luz de um futuro, com a esperança que o motiva a viver cada dia de ma neira que seja agradável a Deus. Apesar das per seguições (2 Coríntios 4.8-10), das ameaças de morte (4.1 1,12) e do sofrimento que acompanha a mortalidade (4.16; 5.1-4), Paulo se regozija na promessa de sua própria ressurreição, quando seu corpo temporal e perecível será substituído por um corpo eterno. Apesar de Paulo preferir estar com o Senhor (5.8; Filipenses 2.21 -26), continu ava sendo seu desejo honrar a Deus servindo aos outros. No julgamento, Paulo sabia que recebe ria a recompensa por ter sido fiel a Deus e ter testemunhado o evangelho que amava. Nós temos apenas uma chance de viver nes te corpo mortal e, como Paulo, devemos esco lher viver o mais plenamente possível (Jó 14.5; Eclesiastes 3.2). A tecnologia médica não nos dá tanto controle quanto pensamos sobre a hora da nossa morte. Deus ainda é soberano. Recebe mos a vida para aproveitá-la (Eclesiastes 2.24,25: 3.12,13) e também para investir em outros espe lhando aquilo que Jesus Cristo fez por nós. Cada vez que respiramos, devemos fazê-lo buscando honrar a Deus. Enquanto estamos conscientes podemos influenciar outras pessoas de maneira
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ativa. Mesmo que desejemos estar com Cristo, na eternidade nós não vamos mais poder teste munhar para os que estão perdidos através de nossas vidas e palavras como podemos fazer hoje. O serviço fiel ao Senhor deve ser a motivação que nos impulsiona a viver. A nossa motivação de servir a Deus aqui na terra é uma expressão de nosso amor por Deus e que tem origem na esperança de vida eterna e recompensa. A medida que seu estado de saúde tornarse irreversível e a morte se aproximar, seu dese jo de estar com Cristo ficará mais forte, enquan to sua capacidade de testemunhar diminui. Abra mão desse corpo mortal e não olhe para trás. Deixe que aquilo que o está debilitando o leve para os braços de um Deus e Salvador que quer vesti-lo com os trajes da retidão. Sirva a Deus fielmente até chegar sua hora - e seja lá o que for que o processo de morte trouxer, saiba que ele está esperando à porta do seu lar eterno para abraçar você.
So f r i m e n t o
24. O sofrimento deve ser evitado a todo custo?
O sofrimento é uma experiência ampla e mis teriosa que está presente em todos os aspectos
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de quem somos. Pode envolver dor física prolongada devido a um ferimento ou doença, bem como angústia incessante que acompanha os conflitos mentais, emocionais e espirituais. O sofrimento não é algo que procuramos ou desejamos, ou pelo menos não deve ser. Mas ele parece ter um jeito de nos encontrar. Nosso problema é que temos a tendência de ver o sofrimento como sendo absolutamente mau, um inimigo que deve ser evitado a todo custo. Somos como o rapaz que, em sua imaturidade, evita discutir aspectos difíceis do seu relacionamento com a namorada porque isso “não é divertido”. Esse evitar aquilo que é desagradável acabará trazendo ainda mais desapontamento quando a namorada, sabiamente, o deixar. Por vivermos em um mundo imperfeito, as coisas que bram, os planos mudam e as pessoas adoecem e, com frequência, morrem. O sofrimento é inevitável, mas não é o pior dos males. O sofrimento serve para nos lembrar de que física, mental, emocional ou espiritualmente, algo não está certo. Ele nos força a depender de outros, a consertar relacionamentos, a buscar res postas. O mais estranho, porém, é que esse intruso desconfortável e indesejado é um professor e um motivador que nos impede de cairmos em uma existência imatura, egoísta e isolada. Quando estruturamos nossa vida de modo a evitar todo sofrimento ou falhamos no modo como reagimos a ele, criamos sofrimento ainda maior,
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ou mesmo sofrimento do pior tipo: pessoas voltando-se umas contra as outras e cometendo to das as formas de abusos. Numa tentativa de im pedir nosso próprio sofrimento, machucamos e destruímos outros através de difamação, traição e até mesmo guerra. Respostas inadequadas a circunstâncias difíceis são destrutivas para a vida. A solução para o sofrimento pode ser encontra da não em matar a si mesmo ou matar outros, mas sim em decisões que gerem alguma cura, em decisões que honrem a vida. É nesse contex to que o tratamento paliativo ou de conforto, du rante a experiência do fim da vida, torna-se um tratamento adequado. O resultado mais valioso do sofrimento é nos lembrar de que precisamos depender do Senhor. Se ignoramos os propósitos de Deus, nós, como os amigos de Jó, aumentamos ainda mais o nos so sofrimento e o de outros. Se rejeitamos a exis tência de Deus, nos privamos do conforto em meio ao nosso sofrimento e dos insights sobre a cau sa desse sofrimento. Nós nos separamos do úni co que pode nos salvar do sofrimento eterno que merecemos por causa de nosso egocentrismo pe caminoso. O sofrimento pede que identifique mos qual é a sua fonte e então encontremos a solução apropriada. Nós não procuramos e nem
evitamos o sofrimento; tentamos reagir a ele de formas que respeitem nossa experiência de vida e morte. Nosso propósito de perseverar, de tra
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balhar e aprender com o sofrimento faz com que nossa vida, amizades, casamento e esforços tor nem-se mais significativos e duradouros. “[Sofrer] é o mesmo que enterrar a alma, onde ela espera na escuridão fria e isolada, silen ciosa, solitária, aguardando o começo da prima vera, pelo calor do sol e pela companhia de todas as coisas viventes. ‘Se um grão de trigo cair no chão e não morrer, ele não dará fruto...’ [Sofrer] não é apenas o solo escuro onde cai o grão, mas também o solo de onde crescem os frutos.”45 Lembre-se de que, como cristão, o sofrimento que você suporta no fim de sua vida é seguido de uma primavera eterna de calor e companheirismo. 25. De que form a o meu conhecimento sobre os últimos dias de Cristo afeta a forma como encaro meus próprios últimos dias? Jesus não estava ansioso para entrar no processo de morte. Aliás, a questão de sua morte lhe causava muita angústia. Sabendo que estava próxima, ele levou três de seus amigos para um lugar onde eles pudessem orar por ele enquanto gastava tempo sozinho, agonizando so bre sua morte iminente junto a seu Pai celeste. Durante esse tempo, ele pediu a Deus que remo vesse o sofrimento que estava por vir, mas teve o cuidado de desejar apenas aquilo que era a von tade de Deus (Mateus 26.36-46). Nós também
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podemos pedir para que a morte seja adiada e, como Ezequias, podemos receber uma prorroga ção de nossa vida (Isaías 38-39). Seria esperado que nós não desperdiçássemos essa oportunida de como fez Ezequias, mas permanecêssemos fiéis em representar a Deus na forma como vi vêssemos. Mas, como no caso de Jesus, uma prorrogação de nossa vida pode não ser aquilo que Deus quer para nós. Mesmo assim, não pre cisamos esperar com ansiedade o processo de morte. A atitude de Jesus diante da morte deve ser suficiente para convencer qualquer descren te de que a morte não é natural, mas sim uma intrusa (ver questão 1). Jesus suportou o seu processo de morte. Uma vez que Jesus percebeu que sua morte es tava próxima, encarou cada desgraça e humilha ção como uma pessoa cuja fé está completamente nas mãos de Deus, seu Pai. Desde o momento em que Jesus deixou o jardim do Getsêmani, sa bia que seu destino era irreversível. A humilha ção que caiu sobre Jesus na forma de mentiras, traição e nudez também pode vir sobre nós na forma de fraqueza, incontinência e isolamento. Ele confrontou cada humilhação, jamais negan do que sua morte era inevitável ou pedindo que um soldado “acabasse com ele rapidamente” para eliminar o sofrimento. Nós também iremos so frer humilhações, esperamos que não sejam tan tas e que tenhamos o apoio de nossa família, mas
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sofrer uma humilhação não diminui a dignidade daquele que a sofre. Jesus sempre foi o Filho de Deus. A nudez que sofreu na cruz não pôde di minuir seu caráter ou fazer com que fosse me nos importante no plano de Deus. O mesmo é verdadeiro para nós. Jesus lembrou-se do propósito de sua vida. Durante os dias finais de sua vida, Jesus foi colocado diante dos líderes políticos de sua época, bem como de soldados, multidões e famí lias. A cada confronto ou ocasião, manteve-se fiel à sua missão, sabendo que estava realizando a vontade de Deus através do sofrimento duran te o final de sua vida. Como ele diz em Mateus 26.54: “Como, pois, se cumpririam as Escrituras, segundo as quais assim deve suceder?” Não per mita que a deterioração física desvalorize os últi mos momentos de sua vida. Pode ser que você não consiga falar com os mais poderosos de seu país durante seu processo de morte, mas você estará na presença de médicos, enfermeiras, amigos e membros da família. Enquanto você estiver consciente, representa de forma ativa o Rei dos Reis. Seja fiel - “Estou plenamente cer to de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus” (Filipenses 1.6), sendo que para muitos de nós esse dia será depois de nossa morte. Enquanto ele está trabalhando em nós, podemos estar tra balhando para ele! Lembrando-nos de todos os
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fiéis que partiram antes de nós, “corramos com perseverança a carreira que nos está proposta, olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus” (Hebreus 12.1 b-2). Jesus tinha certeza sobre seu futuro. An tes de sua morte, Jesus deixou claro para seus discípulos que ele estava indo para um lugar de onde voltaria para buscá-los (João 14.1-4). Du rante sua oração para o Pai em favor dos discí pulos, Jesus disse “Eu te glorifiquei na terra, con sumando a obra que me confiaste para fazer; e, agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse o mundo” (João 17.4,5). O Senhor sabia de onde tinha vindo, o que devia fazer na terra e para onde iria ao final. Assim como Cristo, os cristãos têm a certeza de um futuro que vai além do tú mulo - têm a segurança da vida eterna. 26. Eu devo pedir para que Deus alivie o meu sofrimento?
Na pergunta anterior, tratamos dessa ques tão sob o ponto de vista de Jesus no Jardim do Getsêmani. Em sua carta aos Coríntios, Paulo faz referência a um mal físico que ele chama de “espinho na carne” (2 Coríntios 12.7). Paulo orou três vezes pedindo que Deus removesse o mal,
92 Coleção Bioética mas Deus recusou seu pedido dizendo que, em sua fraqueza, Paulo saberia que a graça de Deus seria suficiente. É só em nossa humildade (fra queza) que vemos o verdadeiro poder de Deus. Se Deus interviesse, limitando as consequências da humanidade decaída, fazendo-nos todos fisi camente saudáveis e intelectualmente brilhantes, teríamos menos necessidade e, portanto, menos oportunidades de nos admirarmos com o poder de nosso Deus. E não é exatamente isto que o progresso humano e a tecnologia têm feito - di minuir nossa necessidade e desejo de buscar a Deus e reconhecer sua presença? Nossa condi ção espiritual egocêntrica torna necessário que o sofrimento não seja completamente eliminado para todos aqueles que pedem; porém, Deus prome teu dar força e graça para que possamos supor tar as dificuldades. Aliás, é impossível que cres çamos espiritual, emocional, física e intelectual mente se não admitirmos nossas fraquezas. Ig norar uma fraqueza é deixar que ela floresça; reconhecê-la é entender que precisamos de aju da. Quando admitimos nossas fraquezas, desco brimos o poder de Deus que, um dia, irá nos mol dar à imagem de seu Filho. Nos exemplos de Jesus e Paulo, vemos pe didos de alívio para o sofrimento serem rejeita dos de forma que a perfeita vontade de Deus pudesse ser alcançada. Em outras partes das Escrituras, há inúmeros exemplos de pessoas
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que pediram alívio ou cura e receberam. Ana queria ser fértil (1 Samuel 1.9-11); Naamã que ria ser curado da lepra (2 Reis 5.1 -14); o centurião romano queria que seu servo, que estava à beira da morte, fosse curado (Mateus 8.5-7); e Jairo, cuja filha estava num processo irreversí vel de morte, pediu a Jesus pela vida da menina (Marcos 5.21-23). Cada um desses pedidos foi atendido e os necessitados tiveram sua saúde restaurada. Em todos esses exemplos, quer a saúde tenha sido restaurada ou não, o resultado estava de acordo com os propósitos do Senhor e não com os desejos daqueles que estavam pedindo. Cada um dos resultados trouxe a pes soa que estava pedindo para dentro de um rela cionamento correto com o Criador e fortaleceu sua oportunidade de ser uma bênção para ou tros. Assim, se você pedir alívio do sofrimento, saiba que a resposta à sua oração é para o seu bem e para a glória de Deus. Quando Deus não remove sua provação (por enquanto), essa é uma resposta tão válida quanto o seria uma cura milagrosa. Mesmo que muitas das doenças e mortes pre maturas sejam resultantes de estarmos vivendo em um mundo caído, as Escrituras também li gam a saúde física, emocional e espiritual à obe diência. A forma como vivemos nossa vida rela ciona-se fortemente com nossa saúde geral.
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Coleção Bioética “Filho meu, atenta para as minhas palavras; aos meus ensinamentos inclina os ouvidos. Não os deixes apartar-se dos teus olh os; guarda-os no mais íntimo do teu coração. Porque são vida para quem os acha
e saúde pa ra o seu corpo.” (Provérbios 4.20-22)
Mesmo que Deus sempre nos perdoe pelas más escolhas que fazemos, muitas vezes o sofri mento que estamos experimentando é conseqiiência de alguma dessas escolhas. A morte pre matura de Moisés e Aarão são exemplos de con sequências que não podiam ser mudadas através da oração (Números 20.11,12; 23-29). Enfim, o fato de que Deus dá a todas as pessoas a liber dade de fazer escolhas e enfrentar suas conse quências é uma expressão do sábio amor de Deus por seus filhos. 27. Como posso lidar com o sofrimento que Deus não alivia?
Alguns dizem que ficar com raiva de Deus é uma reação apropriada quando o alívio do sofri mento não vem. Apesar de ser tentador aceitar esse tipo de conselho - especialmente quando estamos sujeitos às dificuldades do sofrimento não devemos fazê-lo. A confiança em Deus não pode ser conciliada com ficar com raiva de Deus. Se, de fato, estamos com raiva de Deus, normal-
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mente é melhor que expressemos isso em parti cular com um amigo ou conselheiro ao invés de negar o fato. Desta forma, podemos reconhecêla, bem como a falta de confiança que ela signifi ca. Através da reflexão, algumas vezes iremos descobrir que o sofrimento é produto de nossas próprias atitudes e expectativas inapropriadas, ou que é resultado de estarmos vivendo em um mun do caído. O sofrimento pode vir como disciplina, para nos moldar; como consequência de esco lhas erradas, como o sentimento de opressão daqueles que abandonaram a verdade; ou por ne nhum outro motivo além de que somos humanos - adoecemos e morremos. Qualquer reação que nos leve a questionar a bondade de Deus deve ser superada. Quando Jesus estava sendo tentado por Sa tanás para depender de Si mesmo, ainda que estivesse extremamente faminto e cansado, ele respondeu: (1) “Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus”; (2) “Não tentarás o Senhor teu Deus” e (3) “Ao Senhor, teu Deus, adorarás, e só a ele darás culto” (Mateus 4. 4, 7, 10). Ele sabia que não importava quão severo fosse o sofrimento, mesmo que o fim fosse a morte, no final, seu Pai não o abandonaria. Depois que os bois e camelos foram rouba dos, que seus servos e ovelhas foram abatidos, seus filhos e filhas foram mortos e seu marido foi
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acometido de uma terrível doença de pele, a es posa de Jó, profundamente entristecida por cau sa de seu sofrimento intenso e de suas perdas, ficou com raiva de Deus. Voltando-se para o seu marido, que estava enfrentando um desconforto indescritível (ver Jó 3.20-26), ela perguntou: “Ain da conservas a tua integridade?” e então ela or denou a Jó “Amaldiçoa a Deus e morre” (Jó 2.9). A esposa de Jó não estava interessada em com preender o sofrimento. Sua fé era tão forte quanto os confortos de sua vida. Jó, por outro lado, mes mo estando perplexo com sua dor, amava, temia e confiava em Deus. Mesmo tendo ficado perturbado e tendo questionada a razão de ter nascido, havia uma coisa que .1ò jam ais faria - amaldiçoar a Deus. Em resposta a sua mulher ele disse “Falas como qualquer doida: temos recebido o bem de Deus e não receberíamos também o mal?” (Jó 2.10). No final, a fé de Jó foi fortalecida e sua confiança em Deus tornou-se mais profunda. Ao longo da vida. nunca sabemos o suficiente, ou podemos supor que conhecemos a Deus tão bem a ponto de podermos nos tornar preguiçosos em nossa fé. Esse homem irrepreensível passou pelas pro vações mais difíceis só para descobrir, no final, que ele podia amar a Deus ainda mais. O mesmo vale para nós. Procure as bênçãos diárias de Deus que podem ajudá-lo a suportar seu sofrimento. Se
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a graça de Deus é bastante para nós, com cer teza seremos capazes de identificá-la. Bênçãos vêm de várias formas, mas nós muitas vezes não conseguimos enxergá-ias porque queremos mais do que precisamos. A graça vêm através do ou durante o sofrimento - poucas vezes a graça de Deus é manifesta através da remo ção do sofrimento, mesmo que o alívio tam bém seja uma experiência de sua graça. As bênçãos diárias podem incluir o toque suave daquele que está cuidando de você quando a dor parece insuportável, um medicamento que dá um pouco de paz, um telefonema de um amigo que quebra o silêncio ensurdecedor, uma distração que interrompe pensamentos destru tivos, o sono depois de sobressaltos e inquieta ção, a lembrança de uma música ou versículo das Escrituras que nos traz à memória a fideli dade de Deus e a morte, quando nossa jornada na terra está completa. As bênçãos de Deus podem vir tantos para os que são retos como para os que não o são, quer nós a mereçamos ou não. E uma pena que raramente notemos essas bênçãos. Estamos tão ocupados procurando pela obra de suas mãos que acabamos perdendo o trabalho de seus dedos. Em qualquer momento em que soframos, ele está lá. Não deixe que seu sofrimento o torne cego para a Presença que o envolve!
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“Para onde me ausentarei do teu Espírito? Para onde fugirei da tua face? Se subo aos céus, lá estás; se faço a minha cama no mais profundo abismo, lá estás também; se tomo as asas da alvorada e me detenho nos confins dos mares, ainda lá me haverá de guiar a tua mão. e a tua destra me susterá. Se eu digo: as trevas com efeito, me encobrirão, e a luz ao redor de mim se fará noite, até as próprias trevas não te serão escuras: as trevas e a luz são a mesma coisa.” (Salmo 139.7-12)
28. Os médicos têm à sua disposição os meios de controlar adequadamente a dor física? Apesar de 25 a 30% dos pacientes que estão morrendo de câncer sofrerem com dores excruciantes, o Dr. Matthew Connoly nos lembra que “não é que nos faltem os meios para aliviar o sofrimen to, mas sim, que como indivíduos (médicos), faltanos o conhecimento ou a coragem de usar apro priadamente as ferramentas que temos à nossa disposição”.44 Uma análise destas questões no Journal o f Am erican M edical A ssociation acrescenta que “o apoio que pode estar disponível (para aliviar a dor) é fragmentado e não está dire cionado. Ninguém que está morrendo precisa sentir dor, sabemos como aliviar a dor; aliás, sabemos
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como aliviar a maior parte dos sintomas. Sabemos muito sobre como dar apoio às famílias e pessoas no fim da vida, mas nenhum desses fins tão bené ficos é atingido com frequência”.45 A dor muitas vezes recebe tratamento insu ficiente porque os médicos usam a droga errada ou não administram a dose apropriada. Alguns médicos preocupam-se que o uso prolongado de drogas em doses altas pode causar dependência. Entretanto, em três estudos recentes, envolven do quase 25 mil pacientes com câncer, apenas 7 acabaram viciando-se nos narcóticos que esta vam tomando para aliviar a dor.4b Nos casos em que um paciente está irreversivelmente para morrer dentro de um período relativamente curto de tempo, a dependência certamente não é o as sunto mais importante a ser tratado. Questões como dependência ou vivacidade do paciente devem ser consideradas no momento de decidir sobre o tratamento apenas quando o paciente estiver preocupado com elas. E encorajador sa ber que escolas como a üniversity q f Southern Califórnia estão oferecendo cursos sobre con trole da dor. Alguns já podem vislumbrar o dia em que o tratamento paliativo, incluindo o con trole da dor, se tornará uma especialidade médi ca à parte.47 O controle de dor está disponível para ofe recer conforto durante o processo de morte. Diga ao seu médico como você está se sentindo. Se
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você está desconfortável, não pressuponha que tudo o que podia lhe trazer alívio já foi feito. Al gumas vezes, a solução pode ser encontrada ajus tando-se a dosagem de drogas que você está re cebendo; outras vezes pode ser necessário mu dar o medicamento. Se você já está usando ou pode usar medicação intravenosa, pode até ser que você mesmo possa controlar a quantidade e frequência com que recebe a droga. E importan te aliviar a dor, já que ela pode limitar sua capaci dade de se relacionar com os outros. 29. O que é uma clínica especializada em pacientes terminais e o que ela pode fazer por mim e por meus entes queridos?
É uma forma de oferecer cuidados médicos no fim da vida quando o objetivo já não é mais manter a vida, mas sim ajudar a pessoa a morrer bem. Envolve, basicamente, tratamento paliativo (conforto) e tratamento de respeito (ver questão 3) que é oferecido por equipes de profissionais da saúde na residência da pessoa, num hospital ou outra localidade. Muitas equipes de tratamen to terminal são exemplos vívidos daqueles que Cristo disse que seriam benditos no reino de Deus porque serviram ao próprio Deus, servindo, no momento de maior necessidade, pessoas a quem Deus ama tanto. ‘‘Porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era
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forasteiro, e me hospedastes; estava nu, e me vestistes; enfermo, e me visitastes” (Mateus 25.35,36). O tratamento terminal é o último refú gio que oferece tratamento holístico pessoal e proteção profissional não apenas da dignidade, mas também da integridade. Esse tipo de trata mento literalmente defende o significado de cada ser humano que entra na fase terminal do proces so de morte, permitindo que a pessoa mantenha seus relacionamentos interpessoais, sua espiritua lidade e o senso de existência até o momento da morte.48 A equipe de tratamento terminal colocase ao lado da família e amigos como representan te do paciente, como defensora e amiga. As equipes de tratamento terminal normal mente consistem de médicos, enfermeiras, as sistentes sociais, capelães e muitos voluntários, sendo que os médicos não estão a todo tempo envolvidos de forma ativa. Esses membros da equipe interdisciplinar usam suas habilidades para suprir as necessidades da pessoa como um lodo: física, espiritual e emocionalmente. Seu objetivo é realizar aquilo que é melhor para o paciente e sua família. Estudos mostram que alguns médicos, devi do à natureza curativa de seu treinamento, não estão à vontade eom apenas esse tipo de trata mento para os pacientes terminais. Eles tendem a tratar excessivamente seus pacientes, a fim de estar certos de que fizeram tudo o que podiam -
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muitas vezes, com medo de ser processados ou por terem uma tendência natural a ver a morte de seus pacientes como um fracasso pessoal.49 Mas com a ênfase que vem sendo dada ao trata mento no fim da vida, essa tendência está mu dando gradualmente e sabe-se de médicos que estão mais propensos a se envolver ativamente no tratamento terminal, especialmente quando passam a aceitar o fato de que o tratamento pa liativo é uma prática médica genuína e necessá ria. Procure descobrir como o seu médico enca ra o tratamento terminal e que papel estaria dis posto a desempenhar. Se ele negar esse tipo de tratamento e suas razões não forem satisfatóri as, procure outro médico. Isso é importante, pois, de um modo geral, pacientes em estado terminal não podem entrar num programa de tratamen to terminal sem a ordem de um médico. As enfermeiras das equipes de tratamento terminal monitoram as condições físicas do paci ente, estando atentas também para suas varia ções emocionais e questões espirituais. Elas ba sicamente controlam todo o cuidado com o paci ente terminal. Elas administram o tratamento paliativo receitado pelo médico, que normalmen te envolve a medicação apropriada. A maior par te dos remédios para dor é administrada por ade sivos colocados sobre a pele ou por líquidos via oral. Injeções e aplicações intravenosas também são usadas, mas como menor freqüência, pois
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causam mais desconforto e limitam a mobilida de. As enfermeiras também ensinam o paciente e/ou familiares a auxiliar na administração de al guns medicamentos, ajudando o paciente e a fa mília a terem um certo controle sobre a situação. Auxiliares de enfermagem asseguram que as necessidades fisiológicas e os confortos físicos do paciente sejam supridos. Outros membros da equipe de tratamento ter minal, como assistentes sociais, capelães e vo luntários, exercem um papel importante ao suprir a ampla gama de necessidades do paciente e dos familiares. As assistentes sociais ajudam o paci ente a lidar com o estresse emocional que acom panha o processo de morte. Muitas pessoas têm dificuldade em encarar o fato de que vão morrer e, por isso, querem evitar o tratamento terminal, pois ele é uma forma de admitir que a morte é certa e iminente. As assistentes sociais ajudam os pacientes que entram em tratamento a lidar com a realidade de sua morte iminente. Os ca pelães fazem parte da equipe para oferecer seu apoio, dando instrução teológica, aconselhando, lendo as Escrituras, orando e ouvindo. Os volun tários realizam tarefas práticas que ajudam o paciente a manter-se ativo, tendo propósitos e exercitando-se intelectualmente, lendo, indo visi tar determinados lugares, oferecendo companhia ao conversar ou assistir televisão, fazendo com pras ou ajudando o paciente a escolher um pre
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sente para o aniversário do cônjuge ou outra ocasião, ou simplesmente por diversão. Só a imaginação é o limite para o trabalho do voluntário. Os voluntários trazem alegria e sentido para uma fase da vida que, de outra forma, poderia ser enfadonhamente técnica e fútil. Eles nos ajudam a viver até que morramos. O tratamento terminal nos faz lembrar que o sofrimento “é uma questão complexa com elementos mentais, sociais e espirituais, bem como a questão física. Se ignorarmos esses outros elementos, então independente do que façamos so bre a dor física, o paciente não terá alívio do sofrimento” .50 O tratamento terminal oferece uma equipe diversificada para ajudar os pacientes a expressar suas preocupações e medos livremente para que possam encarar a morte de maneira realista e honesta com o mínimo de sofrimento possível. Amor, um toque carinhoso e medicação apropriada podem aliviar a maior parte da dor ligada ao processo de morte.51 Com esse tipo de tratamento, a morte não é um processo extremamente longo e impessoal. “O tratamento terminal representa a mais alta qualidade de vida nos últimos dias dessa vida.”52 Existem tratamentos terminais feitos tanto por voluntários quanto por profissionais com certificado federal.55 Apesar de os tratamentos voluntários geralmente não oferecerem serviços de enfermagem, medicamentos ou equipamento
Decisões Decis ões sohre o Dim da Vida ida
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médico (muito poucos o fazem), eles são um óti mo ponto de partida para os doentes terminais que ainda podem se locomover e que não preci sam de cuidados médicos regulares. Porém, uma vez que a doença avança, é recomendável que o paciente paci ente comece com ece a p arti ar tici cipa parr de um program pro gramaa que seja mantido e certificado pelo governo fe deral. Nos EUA, para que o paciente possa re ceber assistência gratuita do governo para esse tipo de tratamento, é preciso que este paciente seja declarado terminalmente doente por um médico, certificando que o paciente não tem prob pr obab abilid ilidad ades es de viver vive r mais do que seis meses. Além disso, o paciente pacien te deve deve ter mais de de sessenta e cinco anos de idade. Se o paciente tem menos de sessenta e cin co anos, a cobertura cob ertura oferecida oferecid a pelo pelo governo ame ame ricano limita-se àqueles que estão incapacitados de trabalhar ou desempregados. Se o paciente tem menos de sessenta e cinco anos e não se qualifica para receber assistência do governo, deve procurar um seguro ou plano de saúde que ofereça o tratamento terminal. Ao atingir os ses senta e cinco anos, o paciente passa ater direito à assistência gratuita, mas pode ser que o com pleme ple mento nto de um plano seja necess nec essári ário o para se manter o nível nível do tratame trata mento nto terminal term inal que estava sendo recebido dentro do plano exclusivamente parti pa rticula cular.3 r.34 Também, antes ant es de agosto de 1997 1997.. qualquer paciente que saísse do tratamento ter
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minai minai após 210 210 dias não tinha tin ha direito di reito à cobertura se quisesse quise sse volt v oltar ar algum tempo mais tarde.5 tard e.555 O Bal B ala a nced nc ed Budg Bu dget et A c l dos Estados Unidos, de 1997, não traz mais essa estipulação. Um paciente pode voltar ao tratamento terminal dentro das condições anteriormente mencionadas a qualquer hora e ficar o tempo que for necessário nece ssário que ele receba cuidados médicos apropriados. Verifique as diretrizes atuais (e locais) quando você ou um ente querido estiverem dando entrada a um tratamento terminal com cobertura do governo. A assistênci assistênciaa do governo americano ameri cano é de uma uma quantia fixa por dia, por paciente, para cada um dos programas de tratamento terminal certificados. O programa recebe essa quantia desde o dia em que o paciente dá entrada até o dia de sua morte, É responsabilidade do diretor do programa fazer uso uso apropriado desses fundos enquanto o paciente estiver sob tratamento. Apesar de o custo por dia nos primeiros meses ficar em torno de U$ 30, esse custo pode subir para até U$ 300 por dia du duran rante te os últimos últim os dias que precedem prece dem a morte. Esse valor fixo diário inclui os salários, custos administrativos, medicamentos e vários tipos de equipamentos médicos. Algumas instituições de tratamento terminal recebem auxílio através de ang angaria ariação ção de fundo e donativos.
Conclusão
tecnologia moderna tem tem criado decisões do fim da vida que são excruciantes e desorientadoras. Talvez, de certa forma, seja bom que tais decisões não sejam sejam tão fáceis. fáceis. Agonizar com a decisão de se evitar ou suspender qualquer inter venção médica significa manter o senso de digni dade da vida e amor pela humanidade. Se viermos a errar, errar, que seja seja para o lado da vida e não da morte. Sabemos que não devemos matar, mas, a certa altura, precisamos deixar que uma doença siga o seu curso. Determinar essa hora de abrir mão é, normalmente, o maior dos desafios. Ape sar de fazermos bem em consultar outros sobre suas opiniões, nossa fé, que é biblicamente guia da e de onde devem vir as decisões finais, será julgada por ninguém ninguém menos menos do que o próprio Deu Deuss (Romanos 14.10-12). Ore, ouça o conselho de outros e decida. “A fé que tens, tem-na para ti mesmo perante Deus. Bem-aventurado é aquele que não se condena naquilo que aprova. Mas aquele que tem dúvidas é condena cond enado do se comer, comer, porque o que faz não pro vém da fé; e tudo o que não provém da fé é pe cado.” (Romanos 14.22,23). Tome Tome sua decisão - Deus Deus conhece conhec e o se seu coração.
A
N O T A S I Michaelis - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, s.f “ na tural” . 2. Vigen Guroiun, Life s Living Toward Dying (Grand Rapids; Lierdmans. 1996). pp 21 -25 3. John !■'. Kilncr, Life in the Line (Grand Rapids: Perdmans. 1992). pp 131-36, esp n 1. 4. Gary !.. Thomas. "Deadly Com passion” . Chrisiiumty Today. 16/ 06/1997, p. 20-21. 5. Para uma discussão dara sobre a morte ser amiga ou inimiga, veja Dennis R Hollinger. “ AT heo logy o i Death” , in Suicide: A Chris tian Response, ('rucial ('onsiderations for Choosing Life. T i m o thy J. Deny e Gary P Stewart (editores) (Grand Rapids: Kregcl, 1998). pp. 258-61 6. Aaron S pital, “ Mandated Choice: A Plan to Increase Public Com mitmen t to Organ D onation” . JAMA 273 , no. 6 (1995): 504 Veja também o Relatório anual do U S. Scientific Registry for 'Trans plant Recipient and the Organ Procurement and Transplatration Network -Transplant Data: 1988-1995. Richmond.. Virginia, United Network for Organ Sharing, 1996. 7. 11. M. Kaufmann e outros. "Trends m Organ Donation. Recovery. and Disposition: UNOS Data for 1988-1990’’. Transplantation
Proceedings 8 (1997): 3303-4 Veja também T. .1. Cosse, T. M. Weisenberger e G.J. Taylor. "W alk in g the Walk L3ehavsor Shifts to Match Attitude Toward Organ D ona tion-Richm ond , Virginia . 1994-1996” , Transplantation Proceedings 8 (1997): 3248. 8. Para um artigo interessante sobre um plano para motivar a doação de órgãos, veja G. Gubernatis, “ Solidary Model as Nonmonetary Incentive Could Increase Organ Donation and Justice in Organ Allo cation at the Same Time. Transplantation Proceedings 8 ( 1997) 3264-66 Pile propõe que aqueles que doarem seus órgãos antes de um estado de doença teriam prioridade para receber orgãos. caso houvesse necessidade. Ple afirma que tanto a justiça quanto a motivação para que as pessoas doassem órgãos aumenta riam se este esquema fosse adotado
Decisões sobre o Fim da lida 9.
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L. Roeis e outros. " A Survey on Attitud es to Organ Donation among Three Generations in a Co un try w ith Ten Years o f Presumed Consent Legislation” , Transplantation Proceedings 8 ( 1997):
3225. 10 A lei da escolha obriga tória, se fosse declarada legal, e xigiria que cada adulto competente que quisesse doar ou nào doar seus órgãos quando de sua morte declarasse previamente sua vontade. A respos ta seria impressa em sua carteira de motorista (no Brasil, na cartei ra dc identidade), a qual ele nào receberia caso se recusasse a responder a questão. Estudos atuas sugerem que a maioria da população aprova esta lei Veja Aaron Spital, “ Mandated Choice” . ! 1. Charles J. Dougherty. “ Our Bodies, our Families: The F am ily's Role in Organ Donation", Second Opinion (Outubro de 1993, pp 59-67) 12. Cosse. Weisenbergcr e Taylor. "W alk in g in the W alk". 3248. 13 Nigel M. deS. Cameron. TheN'ew Medicine: Life and Death after
Hippocrates (Wheaton, Illinois: Crossw ay Books, 1991, p. 172). 14. Rober Orr. David Bicbcl e David Schiedcrmayer. More Life and Death Decisions: Help in Making Tough Choices about ('are for the Elderly. Euthanasia and Medical Treatment Options (Grand Rapids, Baker: Bristol. Tennessee: Christian Medical and Dental Society, 1997. pp. 75-86). 15. Sissela Bok, “ lues to the Sick and D yin g" , in Intervention and Reflection: Baste Issues in Medical Ethics. 5il Ed., Ronald Mun son (Nova York: Wadsworth Publishing, 1996, p. 295) 16. Charles Junkerman e David Schiedcrmayer, Practical Ethics fo r
Students. Interns and Residents (Frederic, Md.: University Pu blish ing . 1994. pp. 46-5 1). John F. Kiln er. "Fo rgoin g Treat ment". in Dignity and Dying. A Ch ristia n Appraisal, John F. Kilner, Arlene B. MiHer e Edmund D. Pel!egrmo(Editores)(Grund Rapids: Eerdmans, 1996. pp. 12-13) 17. Edward R. Grant e Paul Benjam in L inton, " R e lie f or ReproaclV’ Euthanasia Rights in the Wake o f Measure I 6". Oregon L. Rev. 74 (1995. pp 449.460. 18. Ibid. 19. Ibid.. 462 20. K ristin Davis, “ Dealing with Death: A terminal Illness Can O b li terate the Best-Laid Financial Plans", Kip/inger's Personal Fi
nance Magazme{Abx\\ de 1997. pp. 90-95). Este artigo mostra muitas outras sugestões para ajudar a administrar as despesas medicas do fim da vida. 2 1. .1unkermun e Schiedcrmayer. Practical Ethics for Students . In
terns. and Residents, pp.76-77.
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Right Place at the Right Time: A guide to Long-Term Choices. 33. James A. Tulsky e outros, “ See One, Do One. Leach One0 House S taff Experience Discussing Do-Not-Resuscitate Orders” , Archi ves of Internal Medicine 156 (19%, pp. 1285, 1287) 34. Junkerman and Schiedermayer, Practical Ethics for Students ,
Interns and Residents, 4 35. Ibid. 36. Thomas J. Prendergast e John M. Luce, “ Increasing Incidence o f W ithho lding and W ithdrawal o f Life Support from the Critica lly 111” , American Journal o f Respiratory and Critical Care Medicine 155 (1997, p. 16). 37 Brody e outros, “ W ithd raw ing Intensive Life-S ustaining Treat ment” , p. 652. 38. Veja George Lea Harper Jr., Living with Dying: Finding Meaning
in Chronic Illness (Grand Rapids: Eerdmans, 1992) “ Uma d if i-
Decisões sobre o Fim da lida euldade primária de viver com minha doença é sua natureza crônica. Diferente de outras doenças ou estados, os doutores não podem providenciar uma 'cura' para o meu linfoma. O que tem sido nos apresentado é uma série de tratamentos, alguns mais, outros menos eficazes, criados para controlar ou dim in u ir o cres cimen to do câncer." 39. John T. Dun lop. “ Death and D yin g” , m Dignity and Dying, p. 39-41. John K Feinberg sugere o seguinte para alguém sofrendo grandemente com uma doença term inal: “ Faça o possível para dim in uir a dor. e não force o paciente a se submeter a procedim en tos ou a tomar medicamentos que já provaram ser ineficazes e que não tenham nenhum beneficio. Kntreianto, por causa do manda mento de não tirar a vida, não mate nem ajude o paciente a cometer suicídio. Se os analgésicos aceleram a morte, dá-los é uma opção moral mente aceitável. O p rinc ípio do efeito duplo se aplica .” , in Suicide, 170 40. Join Lareckson Tada, “ Decision M ak ing and Dad” in Suicide. 475. 41. Choice in Dying, “ Issues. Backgound on the R ight to D ie” . 24/ 01/1998, no site http://vvww.choices.org/issues.htm , 42. B rody e outros. “ W ithd raw ing Intensive Life-Su staining Treat ment” , 655 43 Ken Gire. Windows o f the Soul: Experiencing God in New Ways (Grand Rapids: Zondervan. 1996. pp. 199). O termo depressão e usado no lugar de sofrimento no original. 44 Matthe w Connoly, “ The Management o f Cancer Pain” , m Suici
de, p. 76. 45 M arw ick, “ Ge riatricians” , 445 46 Susan Brink , “ Best hospitals 1997” , US News and World Report , 28/07/1997, p. 62 47. Richard L. Worsnop, “ Caring for the Dy in g” . CO Researcher , 05/ 09/1997. p. 775. 48 Martha I,. Twadd le. “ Hospice Care” , in Dignity and Dying , p 184. 49 Brink . “ Best Hospitals” . F relatado que “ os médicos são mu ito menos paternalistas nos dias de hoje( ..) Ainda assim, eles são treinados para ver a morte como uma falha da medicina e sentemse compelido s a errar por fazei mais do que por fazer menos. A família em processo de perda também aumenta o impulso para fazer qualquer coisa possível, mesmo quando o tratamento não tem chance alguma de ajudar o paciente ” Veja também The SUPPORT Investigators, “ A C on tro lled Tria l” , pp 1591-92. Worsnop, “ Ca ring fo r the D yin g” , p. 771. diz que “ apesar de sua influê ncia estar
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aumentando grandemente, a fi lo so fia das casas de tratamento para pacientes term inais vai contra os ideais da maio ria dos médicos da Am érica. Seu conceito mais elevado é a preservação da v ida, e a morte de um paciente é muitas vezes vista como um fracasso pessoal e profissio nal.” 50. Conno ly, “ The Management o f Câncer Pain” , 75 51. Twaddle, “ Hospice Care” . Veja também Phipps, Dealh, 58. Falan do nessas casas de tratamento para pacientes terminais, Phipps diz que “ maior priorid ade é dada a dim inuição da dor, com um sucesso fenomenal. Um estudo nas casas de tratamento para pacientes termi nais inglesas mostrou que 37% dos pacientes estavam enfrentando dor severa. Destes, apenas 1% não tiveram suas dores diminuídas depois da admissão.” Observe que este comentário fo i feito em 1987. A tecn ologia de a livio da dor avançou m uito deste então. 52. Worsnop, “ Caring fo r The D ying ” , 777. 53. Hm Setembro de 1997,2154 casas de tratamento para pacientes terminais certificadas pelo governo federal dos Estados Unidos estavam em operação “ comparadas com 1011 em 1991 e apenas 158 em 1985. “ Os lugares que lideram o rankin g de casas de tratamento para pacientes term inais” , de acordo com a Hospice Association , “ são C alifórn ia , Geórgia, Carolina do No rte, Ohio, Pensilvània e Texas” . Worsnop. “ Caring fo r the D ying” , p. 782. 54. Partes do material forma adaptadas de uma entrevista com Mary Jo 0 ’M aylley, D ireto ra do Candell Home Care and Hospice. 111 W. Church Street Liberty ville, Illinois 60048 (23/01/1998) 55. Davis, “ Dealing w ith Death”