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Jsé Eduardo Faria ( organizador) organizador)
DIREITOS HUMANOS DIREITOS SOCIAIS E JUSÇA
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I ª edição, 3ª tragem
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© J É EUR EUR R I G çâo agem 03. 2 agem 03 DIREITOS HUMANS S SCS JUSIÇA
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1 f�Zo{ l024
BN 85.7420-012 ISISBN
Di D i o s e e v a d o d t a ã o po j)3S297o8cPon0onSP o SP �1 ',V ;· . -u • Te/4535de3: (AOr0xalúS Fax l 36
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R www.malheirsdtoes.cobr �f : Ual alheosdtoes@,zaz co \ 'G alheosdtoes@ ' . � :_ :_11 ,3 \ 1 6 JU L :;07 �U;mpra
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Compoâo
Hevétca Etoa Lta.
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Vân Lúca Aato
Pnd n Bz
Ipesso o as 02002
"O pior
mal já está feito quando se tem pobres para defender e ricos para conter. É apenas sobre a mediocridade que a força das leis se exerce completamente: elas são igualmente impotent contra os tesouros do rico e contra a miséria do pobre; o primeiro as engana, o segundo lhes es capa. Um rompe a rede, o outro passa através dela.
"
(ousseau, in Discours sur l'Economie Politique)
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Ipesso o as 02002
"O pior
mal já está feito quando se tem pobres para defender e ricos para conter. É apenas sobre a mediocridade que a força das leis se exerce completamente: elas são igualmente impotent contra os tesouros do rico e contra a miséria do pobre; o primeiro as engana, o segundo lhes es capa. Um rompe a rede, o outro passa através dela.
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(ousseau, in Discours sur l'Economie Politique)
SUMRO
APRESENTAÇÃO .. ......... ...... . ....... .... ..
9
1 INTRODUÇÃO: INTRODUÇÃO: O JUDICIÁRIO JUDICIÁRIO E O DESENVOLVI DESENVOLVI MENTO SÓCIO-ECONÔMICO JOSÉ EDUARDO FARIA...................................... FARIA.............. .................................. ..........
1.1 A crise brasileira: origens e desdobramento........ 12 O impaco da crise nas insiuições jurídico-udi ciais .................................... 1.3 A formação écnicoprofissional dos operadores do direio....................... 14 Alternaivas e dilemas na formação da magistra ura..............................
11 12 17 19 26
2 OS DESAFIOS DO JUDICIÁ JUDICIÁRIO RIO UM ENQUADRA MENTO TEÓRICO· CLSO FRNANDS CAMPIONGO...................................... 30
2.1 O judiciário e os novos faores sociais . ..... 22 O judciário e a ransformação das esruuras norma ivas ............................... ........................................ ......... 2.3 O judiciário e as ambigüidades das funções udi canes ................... 24 Concusão ............. ... .... ........ ..
31 36 44 50
3 AS TRANSFORMAÇÕE TRANSFORMAÇÕESS DO JUDICIÁRI JUDICIÁRIO O EM FACE DE SUAS RESPONSABILIDADES SOCIAIS JOSÉ EDUARDO FARIA......... FARIA........................ ......................... ..........
52
4 CRISE DA DA NORMA JURÍDIC JURÍDICA A E A REFORMA REFORMA DO JUDICIÁRIO JOSÉ INALDO D IMA OPS.. 68 4.1 O processo de mudança social e políica políica no Brasil O Judiciário na berlinda ....................
68
6
DIREITOS HMANOS, DREITOS SOCIAS E STIÇA 4.2 organização do Judiciário: autonoma ou soamento.......................... 4.3 Uma questão de meos ou uma questão política cultura liberal e a democracia socal ........ 44 conto potco e o conlito dstributvo u dicário entre a defesa do status quo e as demandas populares ............................ 4.5 m concusão....................
7 81 85 92
COLABRDS
5. O JUDICIÁRIO E OS DIREITOS HUMANOS E SO CIAIS: NOTAS PARA UMA AVALIAÇÃO DA JUS TIÇA BRASILEIRA OSÉ DARDO FARIA ... 94 6. DIREITO SUBJETIVO E DIREITOS SOCIAIS O DI LEMA DO JUDICIÁRIO NO ESTADO SOCIAL DE DIREITO JOSÉ ENADO DE LIMA LOPES .. 13 reitos socais são diretos subjetvos? ......... 2 que é um direito subjetvo para a teora gera do direito ....................... 3 stória de um conceito da justiça à proprie dade........................ 4 ireitos socias da garantia da berdade ndivdua promoção das condições de berdade soca .. .... 5 Judiciário como arena de confitos distrbutivos: a potca púbica como objeto de demandas popu lares ............................. emocraca e justça distrbutva a faácia da justi ça comutatva nas demandas popuares .. .. . ...
3 4
OSÉ DARDO FARA (organzador) é rofessor de ocioogia Jurídica e de etodoogia da ênca do reto na Facul dade de reto da Unversidade de ão aulo entre seus vários lvros pubicados destacamse O Brasil pósstituinte (Graa 989); A função social do Judiciário (tca 989); e Direito e Economia na Democratização Bra sileira (aheiros ditores 993).
24
ESO FERNANDES AMIONO é roessor de eora do s tado na Facudade de reito da ontcia Universidade a tóica de ão auo.
29 38
7. A REDESCOBERTA DA IGUALDADE COMO CONDIÇÃO DE JUSTIÇA O KNTZ ............ 44
OSÉ EINADO LMA LOES é roessor de istóra do reito e de ocioogia urdca da Facudade de reito da Un versidade de ão aulo. O KNTZ é roessor de Fosofa otca da Facudade de Filosofia Letras e iêncas umanas da Universdade de ão auo.
124
DIREITOS HUMANOS, DIRIOS SOCIAIS E JSIÇA
autônomo. No Brasil, o ransplante do regime de sesmaras, por exemplo, é j á algo mas complexo. Porque as sesmaras eram de legações régas e doações régas de terras desocupadas; orgna ramente terras que haviam sdo culvadas e se encontraram aban donadas; assm, o sesmero não competia com outros ocupantes ou com dreios alheos que l he nterferssem na propriedade. Além dsso, o regme logo se assoca com o trabalho escravo, dstinto do trabalho servl europeu, em que o camponês gozava, ao me nos dealmene, de dreitos própros sobre os campos cultvados e deva ao senhor servços e rendas, mas não a desocupação pura e simples da erra. 28
6.4 Direitos sociais: da garantia da liberdade individual à promoção das condiões de lberdade social
Ronald Dworkin disngue argumenos de princpos, que fundamentam dretos ndvduas, e argumentos de poltca y) que undamentam obetvos coletivos. Princpos, diz ele, são proposções que descrevem diretos, poltcas são propos ções que descrevem objevos. 29 Os objevos gerais coleivos destnam-se a disribuir de certa orma os beneícios da vda so cal, em torno de alguns obevos maores: efcênca econôm ca, igualdade ou proporconaldade na dsrbução, etc. Drei os e objetvos socas podem ser mas ou menos absolutos. As sim dreitos fundamentais (akgun, que dão consistênca a uma ordem poltca, e dreitos partculares nttutna. Um dreto a comer para sobrevver, mas não um dreito a que o Congresso venha a abolr a propredade prvada para que ele possa comer Os princpos também podem ser abstratos ou con cretos Princpio de liberdade de expressão (abstrao) que com pee com o direio dos ouros de não inerferênca, ou de respei8. Cf. Fernando Sodero, Esboço Histórico da Formação do Direito Agrá rio no Brasil, Rio, IAUP 990. Ver também Mchel Vley, Le Droit RomaiÍ
op. ci. p 79: "Le égime féodal donne à chaue ere une mutitude d'aants drots un enchevêtrement de drots multiples et variés snstalle su chaue tere drot du ser qui exploite, drots des segneus auxquels pofe une patie des re venus, droit du ro, droit des pêtres et de lEgise qui lven la dme et telle ou tele edevance.. 9. Op. ct. p. 90 Paa uma visão atual do estado da uestão da justça ente os pensadoes lberas particulamente os eras de pncípios, como Dwor kn e Rawls ve Ávao de Vita, Justiça Libeal: rumentos Liberais conta o Neoliberalismo Ro Paz e Tea, 993.
DIRIO SUBEIVO E DIREITOS SOCIAIS
5
o ou de segurança do fuuro, que só se orna concreto quando defnido no caso concreto (em concorrênca com outros prncí pos) (pp 90-94). Os dreitos socas estão como proposções de direto ou de poltca? Se de dreto, tratase de dreos fundamentais ou par tculares? 30 Tomemos alguns exemplos de dretos socas expressos na onstução Federal de 19. Há uma dvsão nos dreitos so cas dreitos à segurdade socal (saúde, previdênca socal, as sstênca socal) e os outros dreos (cultura, educação e despor o; ciênca e ecnologia; comunicação social; meio ambente; fa míla, criança, adolescente e idoso; índos). a Dt à ua (art. 6). No artigo 05 ela vem def nda como dever do Estado e da famlia. O art. 0 especifca que o dever do Estado será "efeivado medante a garanta de.. , enumerando uma sére de metas ou objetvos a serem alcança dos. O § 1 dz que o acesso ao ensno obrgatóro e gratuto é t ú ujt v O § diz que o seu n-fnt u fta gua ta naa a auta tnt O artgo 1 prevê a aplcação compulsória de receias de mpostos na educação, matéria que precsa ser inserda na in terpreação do Capíulo de Fnanças Públcas.
Dt à aú (art. 6). Nos argos 196 a 00 não cons ta que o dreio à saúde sea dreo subetivo públco, nem que haja responsablidade da autordade quando da fala ou nsufi cênca do servço Consta, no artigo 196, que o dever do Estado será garantdo medante políticas socias e econômcas que v sem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e gualitáro às ações e servços para sua promoção, pro eção e recuperação. Pvêna a (ars 6, 010). Também não exise qualquer previsão de garana efeva. 30. Cf. osé Aonso da Slva, Curso de Direito Constitucional Positivo São Paulo Malheros, 99 pp. 58-9. Para ee, os diretos socias (direitos do ho mem trabalhado ou do homem consumidor) são os pessupostos paa o goo dos demais deitos indviduas, paa o execco eetivo da gualdade garantda formalmente, ou seja gualdade peane a le (que a mesma le se apique aos mesmos casos) e iguadade na le (que a le não sancone dscmnaões njustifi cáves). Sobre o pncípio da gualdade ve Anacleto de Olveira Faa, Do Princíio da Igualdade Jur(dica São Paulo Ed RT, 973 esp. cap. IV. Sobre o pin cípo da gualdade na flosofa juídca, ve Chaim Peelman, La Giustizia, Tor no, Gappchell 99. Ver ambém Fnns op. cit. pp. 6 a 95.
1
128
IREITOS HUMANOS, IREITOS SOCIAIS E JSIÇA
IREO SBJTIVO E DIRETOS SOCIAIS
29
série. Destes odos, os direitos difusos são são para nós os mais im potantes. Em segundo lugar vêm os direitos coletivos 32
sim a controvérsia judicial pode te um papel eevante e relai vamente eficaz
O dieito subjetivo individual é feito valer através do direito de ação, peo qual aquele que em interesse (substancia) provo ca o órgão urisdiciona do Estado (Pode Judiciário) para ober uma sentença e se necessáro sua execução forçada, cona a ou tra parte que he deve (uma pesação uma ação ou uma omis são). Daí a importância do disposto no Código Civil: a cada di reio corresponde uma ação que o assegura (art 75) Inexistindo ação aparece a chamada obrigação natural natural quem cumpre uma obrigação natual faz bem quem não a cumpre não sofre sanção (art. 970 do Código Civi). O dieito romano clássico era um di eito de ação davase uma ação paa que uma parte pudesse ob te de outem compulsoriamene execiando a vioência neces sária, sob a fiscaização do peor o que lhe parecia devido. As sim como no caso do dieito inglês tadicional, a ação antecede o dir direit eito o (remedy precedes right).
Os novos direios que aliás nem são tão novos visto que á se incoporaam em divesas constituições contemporâneas in clusive basileiras anerioes a 1988, têm característica especia E esa consiste em que não são fruíveis, ou exeqüíveis individual mene Não que iso dizer que uidicamente não possam em deteminadas circunstâncias ser exigidos como se exigem udi ciamente ouros direitos subetivos. subetivos. Mas de egra de pendem pa a sua eficácia, de auação do Executivo e do Legislativo por te em o caáer de generaidade e pubicidade. Assim é o caso da educação pública, da saúde púbica, dos serviços de segurança e justiça, do direito a um meio ambiente sadio o lazer a assistência aos desampardos a previdência social e outos previstos no atigo 6? no atigo 7?, sem conta as disposições dos incisos do artigo 170, do arigo 182, do aigo 193 do aigo 225, e mui tas outras espalhadas ao ongo do corpo de toda a Consiuiçã Consiuição o de 1988 Oa, todos os dieitos aí pevisos têm uma caacterísi caacterísi ca que durane muio empo assombou os que foam fomados em nossa dogmáica herdeia do século XIX não se trata de di eios individuais não gozam aparenemente da especificidade de proeção proposa no atigo 75 do Código Civi qua a ação, quem o seu iula quem o devedo obigado Natualmene a dogmática do século XIX que ainda pevaece entre nós, teve enormes dificuldades para dar a resposa a isto Tratavase co mo já disseram aguns entre nós, parafraseando Piandello de direitos à procura de um autor. De fao a dificudade deiva ma terialmente do modeo social do mercado, ao qual corresponde um modeo juídico de elações inepessoais 33
Dento da esfera de liberdade individual chamada de iber dade geográfica (significando um espaço de vida no qual a inter ferência de terceios - particulaes ou ou Estado - apenas ocorre ocorre se houver vonade do homem live) os remédios também são tra dicionais. Digamos que esa chamada esfera da vida privada se consitui e oganiza, aualmente, sob o signo das obigações pi vadas advindas dos contraos (de massa, de consumo, ou priva dos propiamente) ou da responsabilidade civi (eações involun táias, como diziam os cássicos). Nestes casos, ambém o Judi ciáio em um papel adiciona. Chamado a intervir po quaquer das partes para impo e executar as obrigações enre particula res Mesmo que hoe em deteminados campos os direios dos par icuaes deixem de se individuaisas (como no caso do direito do consumidor, do direito ambienta e urbano, etc.), ainda as 32. Os dreitos coletvos já tveam taamento jurídco em outros casos Para fca no exempo mas óbvo, basta emrar o caso daflênci e do cocur so e creores. A se nsaua uma regra segundo a qua odos os que têm rela ção judca com um devedor passam a se cedoes de uma únca massa faida, sobe a qua poderão promover eecução coetva Mas a eecução ege que os crédios sejam cssco e, denro de cada casse que seam rteos atu ramene vsto que os economstas e os advogados já não têm mas os udmen os de uma teora da justia, ouvem-se contnuamete as oces de se dscuti se um boo deve crescer paa ser epardo ou se deve se epado enquanto cesce (ou dmnu) Os antgos souconaram o polema: seja repartdo popoco namente de modo a dar para todos mas também de modo que os que mas pre csam ecebam antes É este o nsituto tadcona da alênca, execco coetivo de dretos dvduas (cf Finns op ct pp 88 e ss)
6.5 O Judiciáio Judiciáio como arena de conftos distributivos: distributivos: a política pública como objeto de demandas populares Visos os dieitos sociais quais os emédios existenes Em primeiro luga luga pecebamos as difeenças dieito à moadia po exemplo distinguese de dieito de propiedade. Claamene, os dieios sociais, mesmo como dieitos subetivos não são iguais aos dieios individuais individuais E iso porque sua fuição é disina As sim como numa sociedade cada sócio em direio ao luco, e isto 33 Sobre o assunto ver o meu Resposble o Fbrcme e Dees o Cosuor, São Pauo d R 992, onde resumdamente esboo este mo deo e se enconta bbografa básica sobe o tema
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DIREITOS HUMANOS, DIREITOS SOCAIS E STIÇA
ção, ou saúde, ou preservaão de meio ambiente dependerá sem pre, mais ou menos do seguinte: gastos públicos, de curto, mé dio e longo prazo e legislaão disciplinadora das atividades inse ridas em tais campos. A legislaão terá ou o caráer de organiza ão do servio público, ou a prom oão indirea do serviço de saúde ou educaão por particulares (empresas, não nos enganemos) Esta última opão opão signiica, claramente, promover alguma legislaão sobre o assunto, e exercer, de certa orma, o poder de polícia, seja autorizando, fiscalizando ou coordenando e estimulando a coordenaão das atividades estatais, privadas e todas entre si 37 Nesta perspectiva, cresce a importância de alguns capítulos constitucionais pouco conhecidos dos juristas em geral Refiro me paricularmente ao Título V (' Da Tributaão e do Oramen o"), Capítulo I (Das Finanas Públicas), artigos 163 a 169 Em geral o esudo de tais normas tem sido relegado a um segun do plano, seja nos currículos das aculdades de direio, seja no debate público Em geral, ambém, o esudo de ais normas restringe-se a uma perspectiva negativa dos ributaristas que in vocam continuamente os princípios fixados na Magna Carta in glesa (de 125) para argumenar sempre pela iconstitucionali dade das iniciaivas do Estado É certo que há inúmeras iniciati vas inconstitucionais, mas será que nosso esudo jurídico deveria resringirse ao esudo do limite ao poder de tributar? Será que a tano se reduz o direito público que precisamos saber em plena transição pós-moderna, digamos assim, do Esado? Ora, os prin cípios da Magna Cara, para quem conhece um pouco de histó ria, dizem respeito à renda feudal, e não ao ributo moderno. 38 A analogia radicional no caso tem o limie de toda analogia ope ra com a semelhança de ermos relevantes e não com a idenida de, o que sempre torna suas conclusões incertas. Assim, para a compreensão das políticas públicas é essen cial compreenderse o regime das nanas públicas E para com preender estas últimas é preciso inserílas nos princípios consti tucionais que esão além dos limites ao poder de tributar Elas precisam estar inseridas no direito que o Estado recebeu de pla nejar não apenas suas conas mas de planejar o desenvolvimento nacional, que inclui e exige a efetivaão de condições de exercí 7 Para uma análise úcida e riqíssima dos impasses impasses da culura jrdica tradconal, do Esado, do udicário no Brasi conemporâneo ver José Eduardo Faria, Direio e Economia na Democraização Brasileira, op. ci. . C. nôio Manel espanha, "Par a ma Teoria da Hsóra Insi ciona do nigo Regime, Regime, n Poder e Intiuiõe na Europa do Antigo Regime Lsboa Caose Goubekian 194.
DRETO SBETVO E DIREITOS SOCIIS
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cio dos direitos sociais pelos cidadãos brasileiros brasileiros Assim, o Esta do não só deve planejar seu orçamento anual mas também suas despesas de caital e programas de duração continuada (art 6, § ) ) As políticas públicas agrupamse ambém em gêneros diver sos existem (1) as poicas sociais de presaão de serviços es senciais e públicos (ais como saúde, educaão, segurana e jus iça, etc), (2) as políticas sociais compensatórias (tais como como a pre vidência e assistência social, seguro desemprego, etc), (3) as po líticas de fomento (créditos, incentivos, preços mínimos, desen volvimento industrial, tecnológico, agrícoa, etc), (4) as reformas de base (reorma urbana, agrária, etc), () políticas de estabiiza ção monetária e outras mais especíicas ou genéicas Em todas elas colocamse diversas quesões relativas aos princípios demo cráticos qual o grau de transparência ou de sigilo que se requer em cada caso, qual a previsibilidade de que se pode dispor, qual o impacto que que se pode causar, causar, qual o senido da políica, verii cados seus beneiciários a curto, médio e longo prazo? Qual a responsabilidade responsabil idade do Esado na implementação da política públi ca? Responsabiliza Responsabilizase se por prejuízos causados a indivíduos singu lares, ou não? Responsabiliza-se pelo insucesso, insucesso, ou seja, pelo re sultado da política, ou apenas pelos meios? 40 Os membros dos poderes públicos, Executivo, Legislativo e Judiciário, podem ser politicamente responsabilizados pela nãoimplementaão de po líticas públicas? Podem ser responsabilizados politicamente ou civilmente pela distorção ou desvio de políticas públicas? Sem os planos, sem os oramentos, nada de política pública pode ser implemenado Paradoxais e quase inúeis seriam, en9 Sobre a qesão do panejameno, ver Eros Robero Gra, Planejameno Econômico e Regra Jurfica, São Palo Ed RT, e ábo Koder Comparao Regime Consicional do Conroe de Preços no Mercado Revita de Direito Público . 9, pp -2. Tavez a conrbução mais úcida para a discussão do ema vena sendo dada por osé onso da Siva. Em exo claro e preciso ( Consiião Consiiã o e sa Revisão, Cadernos Lierai IV IV/XCI), /XCI), reslado de confe rência apresenada em 2 de abr de 99 az um eempar diagósco da inca pacidade do Esado brasero de formular as poicas pblicas, devido a sa pr vaaão por grupos socias deerminados e ao sisema de represenação congressua que ransorma os legisadores em agenciadores de verbas pblicas O eo é de eira indispensável. 0 Sobre o assno, c. Claus Oe Prolema Eruurais do Esado Ca pialia, op. ci.; ambém sobre a responsabilidade, limiada ou ineisene do Esado peo desempeno, por pariclares, de aividades scaliadas, ver ean F. Oversake, "Responsabiié d abrican de prodi dangere Reue de Droi Cil LXX 45 Paris
4
DIREITOS HUMANOS, DIREITOS SOCAIS E JUSTIÇA
tão, as decisões judiciais a respeito de qualquer direito socia? Evenualmente não, e isto passamos a ver em seguida. As poíicas púbicas são um conjuno heerogêneo de medi das do pono de vista jurídico, como já mencionado Envolvem elaboração de eis programáicas, portanto de orçamenos de des pesas e receias públicas. Dependem de eis de direio privado ou púbico, como sejam as que denem planos direores de cidades, zoneamentos, definição de áreas de preservação ambiental, có digos de variada espécie (como o Código de Deesa do Consumi dor), reorganização de insitutos herdados do sécuo XIX, tais como os contratos que se transormam em contratos de massa, contratos-padrão, reorganização da propriedade, definindose no vos conjunos de coisas fora do comércio, não alienáveis, e as sim por diante Imaginemos uma política habitacional: nea es tão envolvidos vários dos assunos já elencados. Para além dis so, existem os aos concretos de execução de tais políicas nor malmente exercidos por órgãos administraivos centralizados e descenralizados (autarquias e empresas púbicas), sem conar o poder de polícia, exercido por anecipação (na forma de autori zações e licenças) ou posteriormene (na orma de fiscalização) Além de tão variados meios, é preciso lembrar a caracterís tica situação do udiciário raase de um poder disino dos ou ros pois só aua mediante provocação, como já referido acima. "Ne procedat iudex sine actore (Não aja o juiz sem autor que o provoque). Assim, se o Execuivo e o Legisativo podem dar início espontaneamente (do ponto de vista jurídicoinstitu cional) a reformas, o mesmo não se dá com o udiciário Ese depende de provocação dos ineressados Nauralmente hoje em dia já existem mecanismos processuais, ainda novos para os pa drões da tradição jurídica, que possibilitam o ingresso de substi tutos processuais de interesses coetivos pensemos especialmen e nas ações civis públicas, nas diversas ormas de defesa dos con sumidores previstas no Código de Deesa do Consumidor, nos mandados de injunção e na ampiação da egitimidade para pro posiura da ação direa de inconsiucionalidade. Mesmo assim não havendo, ou não aparecendo interessados na propositura de tais ações, a questão icará adsrita aos meios individuais de de esa de interesses fazendo com que se ragmentem decisões que, a rigor, deveriam aingir toda uma políica De mais a mais, como visto no caso dos panos de estabili zação econômica desde 1986 ao udiciário acorrem os interessa dos em obsar, por iegalidade ou inconsitucionaidade, a api-
DIREIO SUBJEIVO E DIREITOS SOCIAIS
135
cação de agumas normas Não se vê e nem seria possível ver-se a ida ao Judiciário para a proposa de uma poíica aernaiva O foro próprio nauralmene dá-se no Execuivo e no Legislai vo. Mas com iso fica evidene o imie do udiciário ao ratar de deerminadas quesões: podendo impedir a apicação de uma norma poderia colocar outra em seu ugar? Sua função, neste caso não seria sempre a radiciona: aplicar num caso concreo o direio vigente. Como criar direio geral e novo? Imaginemos o direio à saúde (ar. 6 e ar. 196 da Consi uição Federa), ou o direio a um meio ambiente saudável (ar 225 da Consiuição Federal) ou o direio ao bemestar urbano (art. 82 da Consituição Federa). Como torná-os eicazes? Não se rata de apicar uma norma quaquer entre indivíduos que dis puam deerminada coisa. Tratase anes de garanir condições de exercício de direios sociais e de gozo de bens não submeidos ao regime da propriedade da disponibiidade do consumo da mercadoria As conradições começam a surgir de maneira mui o clara E as conradições surgem quer pea deficiência do Judi ciário em resover probemas de caráer coleivo ou comum quer pela faa de equilíbrio na aplicação de princípios aparentemene conradiórios Assim, de um ado a exploração mercanil da saúde é freqüenemene ouvada como um valor da iniciativa privada Ao mesmo empo que proliferam os serviços paricuares de saú de, decaem os serviços púbicos da área. As seguradoras e pres adoras de serviços de saúde aendem a uma popuação mais ou menos deinida: os que êm emprego fixo em seores mais ou menos organizados da aividade econômica, ou os que êm ren da sufciene para filiarse a um plano de saúde O que dizer dos rabahadores informais dos que esão em setores menos dinâ micos da economia, dos funcionários púbicos, dos que não po dem pagar um pano de saúde? Quem os defende? O que vemos é o avanço progressivo da mentalidade privaisa: o Judiciário é chamado a decidir iso sim se é ou não ega ou consiuciona a inervenção legislaiva nos conraos de ais planos de aúde, em que condições as cáusulas de reajuse de tais ou tais panos devem ser mantidas ou podem ser anuladas ec Mais ainda, ao inerferir em ais conratos-padrão, esará ambém o udiciário inerferindo na distribuição desigua dos benefícios viso que o reajuse de uma presação pesa diferentemene para indivíduos de classes dierentes de renda. Ouro exemplo que mosra as conradições exisenes enre os ineresses individuamene postulados e a políica púbica e o pape desempenhado peo udiciário: o caso dos reajuses das pen
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RETOS HUMANOS, DRITOS SOCAS E USTÇA
Além de um princpio raconal da ação, a justça era para os clásscos, uma virtude na qual dstinguiam três aspectos. Par tindo do princípio de que por ela se repartem igualmene as coi sas entre os homens (" Justitia est constans et perpetua voluntas jus suum cuique tribuendi - Digesto I 1: Justça é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o que é seu), Sto. Tomás de Aquino distngue: ) uma justiça gera (ou lega) cujo obeto é garantir as condições de possibilidade da vida em comum (o bem comum); ) uma ustiça particular, que pode ser () distri buiva (igualdade na distribuição individuaizada do que é socal mente realzado) ou (2) distribuição igua entre ndivíduos en vovidos em trocas determinadas Ora, segundo este entendimen to tanto a justiça gera quanto a justiça dstributiva dizem res peto a conflitos de caráter necessaramente transindividuais, mui to embora venham a afetar concretamente os indivíduos Sua so ução passa inicamente pelo diagnóstico da stuação social e de pois pea adjudicação de resultados aos indivíduos Mas a solu ção social tem que levar em conta um bem superior ao bem de cada um: este bem é superior não porque mais importante em si mesmo, mas por ser a condição essencia para a manutenção da vida comum. Desaparecidas as condições de possibidade da vda comum como sustentar as vidas ndvduas? Este diema hobbesiano é resovdo nos cásscos pea herarquzação dos bens, tendo o bem comum precedência O bem comum no entanto, não é encarnado no Estado ou numa sociedade é uma condição concreta e dea ao mesmo tempo. Concreta porque não pode não existir enquanto os homens estão juntos; ideal porque não cor responde a um estado, mas a u m processo de produção da vida. Não nos estendemos mais sobre o assunto basta dizer que os no vos direitos sociais só podem ser adequadamente compreendidos a partr de uma perspectva socia e públca não ndivdua e nem mesmo corporativista (c. Finnis, caps VI e VII). Isto sgnifica que a dsputa existente atuamente no Bras traduzse no segunte quem deve icar mas rico e quem deve i car mais pobre? Se nossa perspectiva for individuaista e conser vadora a resposta será os de sempre. O seu de cada um é o que hoe temos: aos pobres sua pobreza e cada vez mais de sua po breza; aos ricos sua riqueza e cada vez mais de sua riqueza. Esta remos aplicando, numa terrível falácia a justça comutativa: o que eu tenho, não devo perder o que sempre tive deve contnuar a ser meu e as regras que me permitem ter cada vez mais deve ser mantidas quaquer novo imposto é um confisco quaquer mtação ao meu atua estado de liberdade é uma tirana. Mas existe nestes argumentos tão comuns e tão convincentes para os mas
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despreparados a extrardnária faáca que consiste no seguinte a ustiça comutativa, que tem por objeto a manutenção da igua dade nas trocas e do equiíbrio entre os guais, é um princípio de ação a ser apicado dentro da moldura maior da ustiça distributia, pela qual se distribui proporcionalmente, segundo os méri tos a capacidade, a necessidade, de maneira igua os benefícios e os malefícos da vda comum. Se o sistema socal não consegue mais por razões de natureza econômica, poítica e sócocutural, distribur proporcionalmente segundo uma igualdade de necessi dades méritos e capacdades premiando os espertos os bem nascidos etc., naturamente a apicação de um uzo de justça no caso concreto fca preudicada. Sem a resposta essencial à pergunta colocada acima (quem deve ficar mais rico? quem deve pagar a conta?) pouco se escla rece ambém pouco se escarece quando se diz que a conta deve ser paga pelo Estado. O Estado sabemos todos vve essencial mente de impostos. Incapaz de cobrar mpostos que operem trans ferêncas de renda que efetivamente permitam a constituição de polticas públcas está garantindo apenas a reprodução da con centração de renda Mais ainda a própria corrupção dentro do Estado não sgnifica outra coisa senão como já visto uma for ma de apropriação peos mais espertos e mas influentes grupos particuares membros da máquna estata ou não, dos fundos pú bicos Assim a corrupção não é apenas uma coisa de funcioná rios: a corrupção é um desvio de inalidade do Estado social e democrático toda vez que os benefícos dos investimentos públi cos são apropriados segundo crérios que escapam àqueles pre vistos na regra de justiça Se, por outro ado a cobrança de im postos for apenas para ampliar a mesma forma de atuação do Estado, garantindo a concentração da renda naturamente tam bém não se ustiica. Daí a importância de um sistema tributário a privegiar mpostos diretos e não indiretos, por exemplo As questões aqu coocadas precisam ser nserdas no s eu con texto estrutural. De modo que não só de nefciênca, corrupção ou falta de polticas promoconais (compensatórias, sociais) vi ve a crse do Estado e do Judciário no Brasl. Para além da boa ou má vontade de alguns grupos existem constrangimentos es 43
43. Não é outo o drama do Direio Aeativo: deam-se conta os seus divulgadoes desta erríve falácia Sobre as diicudades de aocar aravés do Ju dicirio as perdas e ganhos sociais ma definidos em leis gerais ve Geoge Fle cer "Corrective jusice o modes Harvard Law Reiew, n. 106 May 1993 pp 658 a 1678 em que az a cítica dos adeptos do utiiaismo econômico da escoa de ieito e Economia
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A RCB DA IGUALDADE COMO CONDIÇÃO DE JSTIÇA ROLF KUNTZ
Repor a igualdade no centro da reflexão liberal foi uma das façanhas de John Rawls, de Harvard, autor de uma das obras de filosofia política mais provocantes dos últimos 40 anos. Des de Locke o liberalismo sempre se deu mal com aquela noção. Não podia dispensá-la como ponto de partida, mas também não po dia carregá-la, sem problemas, por muito tempo A solução loc kiana, uma encantadora série de malabarismos, aparece no capí tulo 5 do Segundo Tatado sobre o Governo 1• A maioria de seus herdeiros não foi tão refinada. Cada um a seu modo, porém, os grandes pensadores liberais deram um jeito de livrar-se da carga incômoda ou, se não, de aeitá-la sem atrapalhar muito os valo res do capitalismo. Esse tipo de preocupação se esgotou na déca da passada. Com a onda neoliberal, e depois com a desagregação do este europeu, o problema quase sumiu da pauta conservadora. Foi o triunfo ideológico do mais bronco darwinismo econômico. Der rubado o muro de Berlim, proclamouse a falência do marxismo e de toda poltica "estatizante e intervencionista. Gente pouco afeita a folhear livros sem fgurinhas ulgou-se em condições, de uma hora para outra, de mencionar com desprezo o nome de Keynes. 1. Parte do malabai smo consste em mostar como é possível acumula r sem lmte e sem volar retos naturas e otas pessoas Esse ieto sea volao, ama ocke, se a posse, além o necessáo ao consumo, resulasse em estução e bens Mas a soceae "natual, sto é não poíca o capaz, seguno a teora lockana e car um meo e toca e e acumulação não perecível: o inhero Nese ponto, Locke em e racocna é claro como se não houvesse corresponênca enre a repartção a rena em ermos monetáros e a stbução os bens reas É nteessane no entanto, a foma como ele usa a éa e moea como reserva e vaor A noção ea amla aos mercantlstas Foi neglgencaa com más conseqüêncas para a teora peos clásscos
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No Brasil, o domínio público dessa caricatura de pensamen to é quase incontrastado, mes mo porque boa parte da esquerda não se recuperou, até agora do trauma causado pelo desabamento de seus mitos. Triunfant e a direita, perp lexa a esquerda e trava da a política porque as elites não conseguem rearticula-se, a "questão social é reposta na pauta do assistencialismo. Diante da evidência de 32 milhões de pessoas em extrema pobreza e de 60 milhões condenados a viver com menos de US$ 60 mensais per capita, as elites não têm resposta de maior alcance que uma caridosa campanha contra a fome. Pode não haver nada parecido com essa miséria, no Primei ro Mundo, mas também não há respostas criativas ao problema de 30 milhões de desempregados. As políticas de pleno emprego estão falidas, admite-se por toda parte; fala-se em redução da se mana de trabalho, mas a proposta mais freqüente é tornar as re lações de emprego "mais flexíveis Na Espanha, os socialistas tomam a iniciativa de pôr em debate mudanças desse tipo, como estmulo à sustentação do emprego Os padrões de competição impostos pelo Extremo Oriente acabam ganhando o status de "normalidade. Enquanto o drama não se resolve, e não se re solverá tão cedo, fechamse as fronteiras, tenta-se frear a imigra ção e, de vez em quando, torram-se algumas famílias de estran geiros A combustibilidade, como descobriu a nova geração ale mã, é uma das propriedades qumicas mais interessantes dos po vos morenos Os turcos, porém, nada têm a ver com as decisões de cúpula da Volkswagen, da Kodak, da Nestlé, da Peugeot ou da Mitsu bishi. Por isso, enquanto as famílias de imigrantes fornecem um alvo à estupidez organizada, os grupos transnacionais prosseguem na sua rearticulação, dando novo formato aos mercados e jogando pela borda milhões de trabalhadores. Se há algo fora de dúvida, quanto a essa reorganização do capital, é o seu caráter excluden te e concentrador. Os novos padrões de tecnologia e de gerência criam multidões de excedentes, alargam a distância entre as maio res e as menores remunerações e deixam aos planeadores e polí ticos um novo problema: descobrir um meio de reincorporar mi lhões de trabalhadores à atividade produtiva Talvez ninguém te nha exposto essa questão com maior clareza do que o se cretário do Trabalho dgoverno Clinton, professor Robert Reich. 2 A al ternativa seria deixar crescer, ninguém sabe até onde, a desigual dade econômica 2 Ver especalmene o vo The Work ofNations, etao nos Estao Unos em 1992
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A questão mais importante, é claro, não seria a piora do coe ficiente de Gini nos países do Primeiro Mundo. Não faltaria al gum economista neoliberal, democrata-cristão ou simplesmente recémegresso do comunismo, para encontrar uma justificativa. O problema é em primeiro lugar político. Na Europa se traduz, de imediato, pela distinção entre nativo e imigrante, o bode ex piatório de hoje. Nos Estado s Unidos, país de imigração e de po pulação multirracial assunto é mais complicado A mobiliza ção contra o desemprego se converte mais facilmente em pressão protecionista ou em resistência a inovações como o Nafta, o Acor do Norte-Americano de Livre Comércio. No Brasil, ainda envolvido com os desajustes dos anos 80, o cenário criado pela rearticulação do capital apenas começa a ser percebido Ficará muito mais c laro quando o País reingressar no grande circuito do investimento internacional. Mesmo com ta xa bruta de investimento reduzida a uns 15% do PB, e, portan to, com moderado índice de renovação tecnológica nos últimos quatro ou cinco anos, a indústria brasileira exibe notável ganho de produtividade Boa parte resultou, simplesmente, de mudan ça organizacional Uma parcela dos desempregados não será reab sorvida, já se sabe, com a mera recuperação da economia. Essa noção já é quase lugar-comum. Pouco se tem discutido, porém, sobre o que acontecerá quan do a indústria voltar a investir pesadamente em bens de produ ção. Os equipamen tos novos estão facilmente disponíveis: ou são nacionais, porque o setor de máquinas também se modernizou durante a crise, ou podem ser importados com rapidez, porque o comércio está mais aberto Um dos aspectos mais notáveis da nova revolução tecnoló gica e gerencial é seu caráter cncentrador Esse caráter se mani festa, por exemplo, na onda de fusões, incorporações e jointvenures dos últimos anos. Há uma redivisão mundial dos mer cados entre um número decrescente de grupos A concentração também se reflete numa nova escala de remunerações profissio nais. Na soleira do século 2, repõe-se uma questã o clássica: o de semprego associado à alteração da tecnologia e da organização Desta vez, porém, a mudança inclui uma revolução também nos padrões de concorrência. Em cada mercado particular, pequenos diferenciais de produtividade se tornam mais e mais importan tes A busca da eficiência se reflete na alteração do organogra ma, com redução das funções intermediárias, na criação de um novo tipo de operário, mais versátil e com maior iniciativa, e na
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redistribuição das tarefas. A produção se torna mais horizontal: cresce a importância dos rnecedores de insumos, componentes e serviços. Essa redistribuição é também geográica É cad a vez menos metafórico faar em carro mundial, avião mundial ou seja lá o que for qe possa ser planejado, desenhado, construído, finan ciado e distribuído com talentos e meios materiais de países dife rentes. Isso universaliza os padrões e demandas de produtivida de, tanto quanto o efeito destruidor de empregos. Durante a maior parte deste século, a ação poítica e a vigo rosa expansão econômica mitigaram os problemas da desigual dade e da pobreza no mundo capitalista. Ação política significa, neste caso, todo esforço de complementação dos mecanismos de mercado e, de modo especial, todo esforço de correção de seus efeitos mais dolorosos Ajuda ao desocupado, políticas de pleno emprego, tributação progressiva, extensão da aposentadoria a to das as categorias profissionais, assistência médica pública, am pliação dos direitos trabalhistas e universalização do ensino bá sico tudo isso contribuiu para atenuar a luta pelas fatias do bolo. Mais que isso como oi possível conjugar crescimento eco nômico, aumento do bemestar e redução da desigualdade, a ima gem do capitalismo como regime excludente chegou a transformar-se, para muita gente, em mero anacronismo. Isso a ria de Charles Dickens e de Jack ondon autores irremediavel mente datados Neocapitalismo foi o nome atribuído a essa combinação de mercado e controle institucional. A combinação assumiu formas diferentes nos Estados Unidos, na Europa, no apão e no mun do em desenvolvimento, mas, de modo geral, a ação política tanto facilitou o crescimento quanto moderu o conito. Na maior par te da Europa, o Estado se responsabilizou pelas políticas de bem estar e por boa parte dos serviços básicos (transporte e energia, por exemplo) Em alguns países como na Itália, na Áustria e na Inglaterra, o setor público atuou também na indústria pesada e, assim, subsidiou amplamente o setor privado, garantindo a ofer ta de insumos básicos a preços favorecidos Nos Estados Unidos, a corrida espacial e a manutenção do aparelho militar mais po deroso do mundo uncionaram, durante décadas, tanto como su portes da demanda quanto como fatores de inovação tecnológi ca A maior parte dessas inovações foi incorporada nos bens de uso corrente No Terceiro Mundo, não há caso de industrialização bem sucedida sem a intervenção do Estado. Negar o papel desempe-
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A idéia de responsabilidade social aponta a liberdade como produto da ação públca e, em certos aspectos, como tarefa de governo. A liberdade, pode alguém argumen tar, é um insumo da polítca democrática moderna Pode ser, mas é também um pro duto da máquna polítca e esse resultado, na descrição de John Rawls, é impensável sem condições mínimas de gualdade Essas condições são tanto morais quanto materais e não são garanti das pelo mercado Rawls não é contrário ao mercado, nem de fende planejamento direto e abrangente pelo governo Este pode regular as condições dos negócios meramente "ajustando certos elementos sob seu controle, como o total do investmento, a taxa de juros, a quantdade de moeda e ass' im por diante 8 O mer cado tende a ser vantaoso sob vários aspectos e é compatível com liberdades guais e justa igualdade de oportunidade, quando exilem as necessárias instituições de fundo. Mas não resolve, soz nho, nem o problema do mínmo socal, nem o da justça distr butiva. Estas questões devem ser tratadas politicamente, como funções de governo. Uma discussão mnuciosa é dedcada ao as sunto em Uma Teoria da Justiça Numa resenha de Poitica Liberaism, o professor ohn Gray, de Oxford, lamenta que John Rawls não tenha levado em conta, ao rever sua teoria, os acontecimentos internaconais dos últimos anos. "Um letor cuidadoso, escreve Gray, "poderia termnar Poitica Liberaism sem perceber que os últmos anos testemunharam, no colapso sovétco, um evento da hstóra com parável, em importânca, à queda do Impéro Romano e vital mente importante para debates sobre justça econômca que eram, habitualmente, uma preocupação central dos filósofos políti cos. 9 A censura não tem a menor justificatva. O fim do regime soviétco, a falência do comunsmo no Leste europeu, o avanço do capitalsmo na China e a rearticulação do captal são eventos da maior mportância, sm, mas não tornam obsoleta nenhuma das questões dscutdas em Uma eoria da Justiça e em Poitica Liberaism Ao contráro: a difusão do neoliberalismo torna an da mais oportuna a reafirmação dos valores essenciais das demo cracas modernas as mportante para a questão dos dretos - e isto o professor John Gray parece não perceber - é a nova ordem econômica mundial. 8. A Theory of Justice, op ct, p 273 9 "Can we agree to disagree?, in The New York Times (Book Review), 69
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Os chamados direitos de segunda geração concentraram boa parte do conflito social durante mais de cem anos, desde a meta de do século passado 10 Muta gente morreu até os diretos so ciais se tornarem uma noção corrente mesmo em países do Ter cero Mundo. Nunca foram mplantados de forma plena e nds cutível, é certo, mas tornaramse parte de um sstema de valores penosamente construído Moldados para regular as relações de classe sob a tutela do Estado, esses valores estão em xeque Reforma da previdênca, redução das garantas ao desempregado, "exiblização das re lações de trabalho tornaramse, em pouco tempo, palavras de ordem toleráveis até para socialstas de carteirnha Estes po dem justifcarse invocando a conveniência de proteger o em prego. Os empregadores poderam, muito mais simplesmente, mencionar as novas condções mundiais de competição. De sua perspectiva, o nível de emprego não é uma condção, mas uma conseqüênca Como enfrentar esta questão na ordem econômica emergen te? Esta é a pergunta relevante, quando se trata do problema dos direitos. A ruína dos Estados comunistas não é ponto relevante Importante, mesmo, como desaio para os trabalhadores, é o novo trunfo do capitalismo, um regime agora em nova fase. Esta mudança, é claro, pode representar uma dificuldade, quando se procura discutir a questão da ustiça e dos dretos a partr da perspectva rawlsiana. Mas não desqualifca os proble mas vinculados aos valores democrátcos modernos. Transfere a pergunta, porém, para outro nível: como garantir os dretos de segunda geração, e talve algu ns de tercera, quando o capital as sume um caráter transnacional? A questão não parece admitir, a curto prazo, uma resposta simples e clara. Se o capital ganha dimensões mundias, de um modo nunca antes observado, parece prematuro, no entanto, f a lar na morte do Estado e na falência da noção de soberania. Ain da este ano, um diretor do Banco Central da Alemanha falou em soberania monetária, ao responder a um comentáro de um fun conáro do Banco da França Estranha resposta, aparentemen te, quando as políticas monetária e cambial se tornam fráges, mais do que nunca, diante das manobras nternaconas dos gran des grupos O fato, no entanto, não pode ser desprezado, assim como não se podem desconhecer as diferentes políticas de câmbio 0. Nobero Bobbo A Era do Direitos Rio de Janeio, toa Camus, 99
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adotadas no Brasil, na Argenina e no México. São poicas so beranas, no senido mais tradicional do ermo. Aé quando e em que medida essas e outras poicas nacio nais poderão ser mantidas, diane da nova condição do capiais mo? Rober Reich formua uma questão fundamena para o de bate, ao indagar sobre a idenidade americana: "quem é nós? O verbo na terceira pessoa é noavelmente expressivo. Se não se pode faar em "produto americano, e se o capial, a rigor, não em nacionaidade nós "é o que sobra: a força de trabaho com suas ambições de emprego, de segurança e de um padrão de vida compatve com os vehos sonhos Tavez aé essa concepção seja iusória e não reste, afinal, mais do que a universalidade da cas se trabahadora por oposição à universaidade do capia. A idéia em mais de um sécuo e virou inscrição de túmuo num cemié rio ondrino, mas nunca pareceu tão provocanemente próxima. Cidadania nacional ou mundia, suas caracerísticas êm de incuir de uma perspeciva rawlsiana ano a iguadade forma quano as condições materiais indispensáveis à busca dos fins par ticuares. Se a cidadania em de preencher esse dupo critério, quem, no Brasil, pode ser chamado cidadão? Pela conagem mais fácil o Brasi é uma das maiores democracias do mundo, com cerca de 90 mihões de pessoas habiliadas a voar O ítuo de eleitor, porém é só um dos papéis que vinculam o brasieiro ao sisema dos direios Ouro documento importan e é a carteira de trabalho. Em 1990, segundo o IBGE, 4,2% dos empregados não tinham carteira de trabaho assinada Esta vam, porano, excluídos de uma série de benefícios dependentes de uma documenação em ordem, como a aposentador ia por tem po de serviço. Poderiam naturamene, buscar a defesa de seus interesses nos tribunais. Poderiam? Segundo pesquisa do IBGE, enre 983 e 988, 8,6 milhões de pessoas estiveram envolvidas em confitos de direitos. Dessas, porém 55% não recorreram à Jusiça Pouco mais de 40% resolveram seus probemas por con a própria. A maioria dos brasieiros não tem acesso ao serviço judicia Falta dinheiro, ou informação, ou condições de enfren ar processos muio demorados Ou falta simplesmene, confian ça na Justiça No início dos anos 60, era moda, na esquerda brasieira, fa lar com desprezo das garanias formais ("iberdades burguesas). Imporava cuidar dos direitos maeriais, radicionamente nega dos às massas desprotegidas Na década seguine menos de dez anos depois de insaado o governo militar, dificimente se en conraria quem negasse o vaor das iberdades burguesas A expe-
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periência da censura, da prisão arbirária, da recusa do habeas corpu, da ortura, dos governanes imposos e de odo ipo de opressão havia ensinado, pelo meio mais dooroso, o valor das garanias individuais. Essas garantias, porém, coninuam sendo essenciamente "iberdades burguesas São exceentes para quem pode alcançálas. Difíci, porém, é explicar sua imporância a quem da cidadania só em o uo de eleitor, porque mal sabe er, não ganha para alimenar a famíia, não em careira assina da e só ineressa à Justiça quando se transforma em réu