INDICE
I - A INDÚSTRIA DAS INDÚSTRIAS EM TRANSIÇÃO II - ASCENSÃO E QUEDA DA PRODUÇÃO EM MASSA III - O SURGIMENTO DA PRODUÇÃO ENXUTA IV - ADMINISTRANDO A FÁBRICA V - PROJETANDO O AUTOMÓVEL VI - COORDENANDO A CADEIA DE SUPRIMENTO VII - TRATANDO COM OS CONSUMIDORES VIII - GERENCIANDO A EMPRESA ENXUTA IX - CONFUSÃO ACERCA DA DIFUSÃO X - COMPLETANDO A TRANSIÇÃO XI – EPÍLOGO XII - A PRODUÇÃO ENXUTA NO BRASIL XIII – BIBLIOGRAFIA BIBLIOGRAFIA..................... ..................................... .................. I – A INDÚSTRIA DAS INDÚSTRIAS EM TRANSIÇÃO Um dia a indústria automobilística chegou a ser chamada de “a indústria das indústrias”. O que levou os EUA a dominarem a economia do planeta foi o fato de serem eles os criadores do modelo de produção em massa, após a Primeira Guerra Mundial. Já os japoneses, após a Segunda Guerra Mudial, foram os pioneiros no conceito da produção enxuta, modelo que atualmente interessa indústrias de todos os países do mundo. O livro aborda principalmente a indústria automobilística para explicação do tema principal pois, com termos simples e concretos, transmite o conceito de produção enxuta e de que forma ela pode se espalhar pelo mundo. A produção em massa foi desenvolvida para reduzir o custo que um processo artesanal agre agrega gava va à seus seus prod produt utos os,, poré porém m o fato fato de não não pode poderr vari variar ar seu seu prod produt uto o era era uma uma de suas suas carac caracter teríst ística icass negati negativa vas. s. Já a produ produção ção enxu enxuta ta busc busca a a varie varieda dade de de produ produtos tos aliad aliada a à a alta alta produtividade, porém com custos menores ainda e na busca incessante da ausência de defeitos. As empresas que adotam este conceito de produção têm em seu maior ganho a satisfação satisfação e o comprometimento de seus colaboradores, que movidos freqüentemente pelos novos desafios a que são submetidos, sentindo-se valorizados pelos vários conhecimentos adquiridos ao longo do tempo. As origens artesanais da indústria automobilística aconteceram na década de 1880 e por volta de 1915 sofreu a transição para a produção em massa, quando a produção artesanal deparou com problemas que não conseguiu superar. Já a produção enxuta nasceu por volta de 1950, no Japão, consolidando-se rapidamente, mas mesmo assim demorou para ser percebido pelo resto do mundo. II – ASCENSÃO E QUEDA DA PRODUÇÃO EM MASSA Alguns trabalhadores das indústrias automobilísticas, em sua era artesanal, podiam esperar administrarem suas próprias oficinas, tornando-se empreendedores autônomos trabalhando para firmas de montagem. Estas organizações eram extremamente descentralizadas, pois a maioria das peças
provinham de pequenas oficinas. Eles também não conseguiam fabricar dois produtos idênticos, visto que as técnicas artesanais produziam variações por sua própria natureza, e os custos de produção eram elevados e não diminuíam com o volume. Tudo isto dava margem à intensa concorrência. Atualmente pouquíssimas são as indústrias automobilísticas que persistem neste ultrapassado modelo de produção. Um exemplo é a Aston Martin, voltada para pequenos nichos do mercado, cujos consumidores optam pela personalização. Porém empresas como esta precisaram se aliar às grandes indústrias para assim absorver conhecimentos de controles de emissão e segurança, por exemplo. O modelo de produção em massa foi criado por Henry Ford, e suas técnicas conseguiram reduzir drasticamente os custos na produção de automóveis, aumentando ao mesmo tempo a qualidade deste produto. A chave para este modelo de produção consistia na completa e consistente intercambiabilidade das peças e na facilidade de ajustá-las entre si, e para conseguir isto Ford insistiu que o mesmo sistema de medidas fosse usado para todas as peças ao longo de todo o processo de fabricação, criando uma padronização que se converteu em uma redução nos custos de montagem(relação de causa e efeito). O próximo passo de Ford foi a introdução da linha de montagem móvel, visto que isto eliminava a necessidade de um trabalhador se deslocar, reduzindo assim drasticamente o tempo de fabricação de um veículo. Ford levou a idéia da divisão do trabalho às últimas conseqüências, visto que o montador da linha de produção em massa de Ford tinha apenas uma tarefa: ajustar duas porcas em dois parafusos ou, talvez, colocar uma roda em cada carro. Não tinha ele de solicitar peças, ir atrás das ferramentas, reparar seu equipamento, inspecionar a qualidade ou mesmo entender o que os operários ao seu redor estavam fazendo, como acontecia na mesma fábrica em anos anteriores, na época da produção artesanal. Este salto levou ao aparecimento de novos especialistas, os engenheiros de fabricação e engenheiros industriais, cuja missão fundamental consistia em projetar tarefas, peças e ferramentas que pudessem ser manuseadas pelos trabalhadores desqualificados que formavam o grosso da nova força de trabalho na indústria automobilística. Ford no início não passava de um mero montador, mas seu desejo era o de integrar verticalmente a empresa, produzindo tudo aquilo de que precisava por conta própria, sem depender de fornecedores externos, para que ele pudesse possuir o controle da qualidade, da entrega e também do preço destes itens. O problema desta total integração vertical é que ela trouxe consigo uma burocracia em tal escala, a ponto de trazer novos problemas, sem solução à vista. Já no início dos anos 30 Ford havia estabelecido três sistemas de fabricação totalmente integrados na Inglaterra, Alemanha e França, manufaturando produtos especiais de acordo com o gosto de cada país, administrados por gerentes nativos. O sucesso de seus automóveis baseava-se nos baixos preços, que não paravam de cair, sendo resultado principalmente do aumento do volume de produção. Porém, ainda na década de 30, Ford se agarrou ao conceito da “mão visível”, e não mais queria depender de empresas externas mas agregar todos os itens necessários à produção de um automóvel dentro de suas fábricas. Chegou a pensar em produzir absolutamente tudo, desde alimento, passando por tratores, até aviões, em grande quantidade e de forma padronizada, poderia reduzir substancialmente os custos dos produtos. A Ford Motor Company, apesar de seu sucesso, sofria de problemas organizacionais, mas Henry Ford se recusava a reconhecê-los. Ao contrário, a General Motors quando foi presidida por Alfred Sloan, passou por uma estruturação organizacional, criando divisões descentralizadas gerenciadas objetivamente pelos números. Estas idéias gerenciais básicas solucionaram os últimos prementes problemas que impediam a proliferação da produção em massa, porém os trabalhadores de chão-defábrica continuaram a ser vistos como meras peças intercambiáveis do sistema de produção, culminando no final dos anos 30 em um movimento sindical em busca da igualdade e justiça. Tal como nos EUA, as indústrias européias experimentaram nos anos 50 o que os EUA haviam experimentado nos anos 30, empregando grande número de imigrantes nas tarefas intercambiáveis de montagem, monótonas, começando então a se tornar desestimulante para seus trabalhadores que começaram a lutar pela redução da jornada de trabalho. III – O SURGIMENTO DA PRODUÇÃO ENXUTA Em 1950, o jovem engenheiro japonês Eiji Toyoda, sobrinho do fundador da Toyota Motor Company, concebeu o que a Toyota veio a chamar de Sistema de Produção Toyota, posteriormente conhecida como Produção Enxuta. Um dos passos fundamentais, que inclusive acabou surgindo por acaso no meio de uma profunda crise financeira na Toyota, foi o compromisso da companhia em propor um acordo com seus trabalhadores que, dentre vários benefícios, os principais eram o emprego vitalício e o aumento crescente de acordo com o tempo de serviço. Em troca a companhia pediu aos seus funcionários que estivessem comprometidos com a qualidade do trabalho que eles executavam. 2
No conceito de produção em massa o importante era continuar a produzir. Um veículo poderia perfeitamente continuar na linha de montagem, mesmo com uma peça mal-alinhada, pois na idéia de Ford, este defeito poderia ser perfeitamente corrigido em um dos vários departamentos de retrabalho antes da expedição deste veículo. No entanto, nenhum dos re-trabalhos efetuados agregavam valor aos veículos, descobriram os japoneses. A partir disto, Eles fizeram várias modificações nas linhas de produção, entre elas a posição do supervisor desapareceu e em seu lugar surgiu o líder de equipe que executava o trabalho com o grupo. Além disto, qualquer funcionário da linha de produção poderia parar a linha para que o problema não apenas fosse consertado, mas também estudado através do sistema de solução de problemas chamado ‘5 porquês’, de forma que este problema não mais acontecesse. Foi dado também aos funcionários a abertura necessária para que eles sugerissem melhorias aos engenheiros. Outros passos foram dados para ajustar ainda mais as empresas japonesas no conceito de produção enxuta, e um dos primeiros consistiu em organizar os fornecedores em níveis funcionais, sendo que os de primeiro nível participavam integralmente do desenvolvimento de novos produtos. O próximo passo foi a implementação audaciosa do conceito ‘just-in-time’, cujo risco principal era a falta de peças/produtos que poderia resultar na parada da linha de produção inteira, porém os japoneses consideraram que era este risco que faria com que os funcionários desenvolvessem as habilidades de prever os problemas, antes que eles se tornassem graves a tal ponto. Tudo isto fez com que a rede enxuta de fornecedores se tornasse um importante elemento do sistema de produção enxuta. Os ocidentais se enganaram ao afirmar que o sucesso das indústrias automobilísticas japonesas se devia à produção padronizada em altíssimos volumes. Os números desmentem esta afirmação, para cada modelo de carro japonês fabrica-se 125 mil unidades por ano, contra 200 mil unidades por ano dos modelos ocidentais. Porém, um modelo japonês ‘vive’ somente 4 anos, contra 10 anos de um modelo ocidental. Juntam-se à tudo isto a tática ‘agressiva’ de vendas, onde os japoneses buscavam não somente a venda de um automóvel, mas a fidelidade do cliente, estava então concebido a ‘produção enxuta’, e todo este sucesso está levando as empresas ocidentais a se tornarem rapidamente ‘enxutas’. IV – ADMINISTRANDO A FÁBRICA Grande parte do trabalho na indústria automobilística implica em montagem, em razão do grande número de peças em um carro. No final dos anos 80 as indústrias de produção em massa estavam lotados de trabalhadores indiretos, circulando pelos largos corredores, que não agregam valor ao produto(faxineiros, mecânicos a caminho de consertar um problema numa máquina: desinteresse). Na mesma época, as indústrias japonesas(produção enxuta) possuíam um grande número de robôs de soldagem e pintura. Quase ninguém nos corredores estreitos, e quase todos os trabalhadores estavam realmente agregando valor ao carro. Em uma simples comparação, estas diferenças trazem vantagens para a indústria japonesa como a redução do trabalho pela metade, e os defeitos à um terço, além da quase extinção dos estoques. Isto apenas prova que a produtividade tem pouca ou quase nenhuma relação com qualidade. Realmente constatou-se que o pensamento de que quanto maior a qualidade menor seria a produtividade é um mito, contrariando vários autores sobre a indústria japonesa. Outro fato a ser observado é que a organização enxuta precisa anteceder a automação de alta tecnologia de processos, caso contrário as fábricas de alta tecnologia mal organizadas acabam adicionando tantos técnicos indiretos e pessoal de manutenção extra quanto trabalhadores diretos que são removidos das tarefas manuais de montagem. A fábrica realmente enxuta transfere o máximo de tarefas e responsabilidades para os trabalhadores que realmente agregam valor ao carro, e possui um sistema de detecção de defeitos que rapidamente relaciona cada problema, uma vez descoberto, a sua derradeira causa. A produção em massa não passa da produção enxuta burocratizada, onde ninguém toma iniciativa ou assume responsabilidade pela contínua melhoria do sistema. V – PROJETANDO O AUTOMÓVEL Em 1981 a General Motors vislumbrou ser ameaçada pelos concorrentes(Ford, japoneses) caso não reduzisse o tempo de lançamento de um novo modelo para pelo menos 5 anos, o que iria necessitar da colaboração de pessoas de vários setores da companhia por um longo período de tempo sob uma única coordenação, o que resultou em um fracasso pois o projeto foi concluído dois anos depois do prazo inicialmente estabelecido. Já a Honda iniciou em 1985 um modelo diferente de desenvolvimento, uma vez que as pessoas que iriam colaborar para este desenvolvimento se desligavam de suas atividades diárias para se dedicarem única e exclusivamente ao desenvolvimento, e além disto havia um gerente de projeto para quem estes colaboradores respondiam. Em 1989 a Honda lançou o novo modelo do Accord, fruto do projeto que foi concluído no prazo estimado, e desde 3
então este tem sido o modelo de maior vendagem nos Estados Unidos, posição que, nos 80 anos precedentes, havia sempre sido ocupada por um produto da GM ou Ford. Concluímos então que a real magnitude da diferença de desempenho entre a produção enxuta e em massa é a diferença de quase o dobro no trabalho de engenharia e economia de um terço no tempo de desenvolvimento. As diferenças principais entre os dois métodos de produção são encontradas nas áreas a seguir: Liderança, trabalho em equipe, comunicação e desenvolvimento simultâneo. As companhias que dominaram o projeto enxuto em todo o mundo a partir dos anos 80 tem historicamente oferecido ao mercado produtos com maior qualidade, mais variedade, substituindo-os com maior freqüência do que os competidores de produção em massa. Os japoneses também erram: No final dos anos 70, convictos de que os preços dos combustíveis continuaria subindo, eles haviam investido milhões em unidades fabris de motores pequenos e econômicos. Como o preço dos combustíveis caiu na década de 80, eles precisaram descobrir com urgência meios viáveis de não perder o investimento efetuado e atender o desejo do consumidor: motores potentes. Chegaram então à algumas conclusões que permitiriam o aumento de potência, como por exemplo: Injeção eletrônica, turbo compressor, quatro válvulas por cilindro, entre outras. Além disto, há uma pesquisa incessante por inovações tecnológicas que possam ser incluídas nos automóveis, como a autopilotagem, mas coisas deste tipo ainda estão longe de se tornarem realidade. VI – COORDENANDO A CADEIA DE SUPRIMENTO Um modelo típico de automóvel compõe-se de mais de 10 mil peças, cada uma tendo de ser projetada e produzida por alguém. Organizar este imenso trabalho constitui provavelmente o maior desafio na fabricação de um veículo motorizado. Henry Ford imaginou ter solucionado o problema na época da Primeira Guerra Mundial, decidindo fazer ele mesmo, dentro de sua companhia. Nos anos 20, Alfred Sloan já pensava um pouco diferente: Faça tudo na própria companhia, mas crie divisões descentralizadas como centros de lucros independentes. Nos anos 50, Henry Ford II teve uma idéia aparentemente nova: enviava a seus fornecedores desenhos detalhados das peças para que estes propusessem um preço por peça. A oferta mais barata era contemplada com um contrato de um ano. Nos anos 80 as companhias de produção em massa de todo o mundo estavam usando ambos os enfoques. Os grandes produtores enxutos japoneses envolvem menos de 300 fornecedores em cada projeto (número bem menor do que os mil a 2,5 mil nos produtores em massa ocidentais), e em sua maioria são fornecedores que já fornecem peças para os modelos que estão em linha, fazendo parte do grupo de fornecedores da montadora. A forma de seleção não é a comparação de preço mas o relacionamento passado e o histórico de bom desempenho, e o grande diferencial deste sistema em relação às indústrias de produção em massa do ocidente é que neste último há um círculo vicioso de desconfiança entre fornecedor e indústria, já no oriente há um círculo virtuoso de cooperação. Foi grande a transformação no relacionamento entre indústria e fornecedores, e a principal delas é que as indústrias de produção em massa começaram a optar por comprar de outra companhia ao invés de produzir internamente(Outsource), entre várias outras mudanças que aconteceram neste período como a redução do tempo entre entregas de componentes(just-in-time), porém isto não representa que estão caminhando em direção ao suprimento enxuto. Trata-se de uma tentativa de reduzir os estoques da montadora, transferindo-os para os fornecedores, que absorvem o ônus dos estoques. Isto quer dizer que o tradicional sistema de suprimentos em massa são conduzidos aos seus limites extremos, sob pressão, ao invés de mudar fundamentalmente a maneira como o sistema funciona. O progresso na direção do suprimento enxuto continua bloqueado pela relutância das montadoras ocidentais em abrir mão do poder de barganha com o qual têm contado há tanto tempo. VII – TRATANDO COM OS CONSUMIDORES Desde a época de Henry Ford as indústrias de certa forma obrigam as revendas a comprarem antecipadamente seus produtos, engordando seus estoques e só então revendendo para o consumidor final. Os revendedores tem pouco incentivo em compartilhar informações sobre seus clientes com o fabricante, pelo contrário, sua atitude é “aqui na loja quem manda sou eu”, uma atitude similar a do relacionamento entre a montadora e seus fornecedores de componentes. Na Europa não é diferente, em quase todos os demais produtos de consumo (exceto veículos) a Comunidade Européia obriga que as fábricas permitam a suas representantes venderem marcas dos competidores. As revendas ocidentais têm por hábito a contratação de vendedores mesmo que estes nunca tenham vendido carro em suas vidas. Apenas exigem experiência em técnicas de vendas, e uma vez a venda concretizada “transfere” a responsabilidade para outros setores, como o financeiro e 4
posteriormente para manutenção. Já a estratégia de relacionamento oriental é diferente, as montadoras possuem suas próprias redes de revendas e contratam principalmente recém-graduados de universidades a cada primavera, que só irão para as revendas após um treinamento intensivo, que não aborda somente as técnicas de vendas mas o conhecimento do produto que elas irão vender, que se repetirá a cada ano. O momento da venda é visto no ocidente como uma oportunidade de se extrair o máximo de uma transação isolada entre dois estranhos, sem qualquer comprometimento ou vínculo subseqüente. Já no sistema japonês, o objetivo é maximizar a entrada de dinheiro de um cliente a longo prazo, fazendo com que este continue se sentindo parte da “família” do revendedor, que fique com a impressão de que foi bem tratado e que pagou um preço justo pelo veículo. Isto define o sistema de vendas japonês como ativo(ou venda agressiva) e o ocidental como passivo. Além disto, o produtor enxuto trata o comprador como parte do processo de produção, por isto a companhia não mede esforços para jamais perder um cliente. Outra característica deste sistema de vendas é que ele é enxuto, o sistema de distribuição completo contém três semanas de suprimentos de unidades acabadas, a maioria já vendida. VIII – GERENCIANDO A EMPRESA ENXUTA Pelo tipo de negociação que fazia, vendendo seus carros à vista mais rapidamente do que seus fornecedores cobravam seu dinheiro, Henry Ford conseguiu se manter completamente autosuficiente por muito tempo. Atualmente as ações de praticamente todas as companhias automobilísticas ocidentais e produtores japoneses enxutos são transacionadas nas bolsas de valores, mas a semelhança fica por aqui. As indústrias ocidentais disponibilizam ações à qualquer um, inclusive ao governo, mas está vulnerável à fuga imediata destes investidores a qualquer sinal de problemas. Já as indústrias japonesas utilizam um conceito de grupos, disponibilizando suas ações somente à outras empresas com quem possuem alguma ligação. Este sistema oriental é paciente e extremamente orientado para o longo prazo. As indústrias japonesas procuram projetar suas unidades fabris nos mercados em que ela está entrando(Estados Unidos e Europa) de forma a estarem próxima de seus fornecedores locais e em lugares onde se consegue contratar profissionais com certa facilidade. Além disto, sua idéia é conseguir realizar todas as etapas do processo de desenvolvimento, produção, montagem e vendas de um veículo em um só local ou região, isto ao mesmo tempo em várias regiões/países de forma a não sofrer um forte impacto de possíveis crises econômicas que possam, por exemplo, afetar a exportação. Os japoneses sofreram uma barreira comercial na América do Norte, pois foram informados de que teriam de reduzir as vendas de carros a uma fração do que vendiam. Para isto eles aumentaram os preços até atingirem o nível exigido, porém isto acabou se tornando um estímulo pois apesar de diminuir o número de carros vendidos, seus lucros subiram de forma exorbital permitindo que eles abaixassem seus preços no mercado japonês, chegando a vender abaixo do custo, para assegurar que os importadores ocidentais tivessem pouco sucesso, mesmo na ausência de qualquer barreira comercial. Apesar de uma forte relutância inicial, os japoneses mostraram-se propensos a globalizar, processo este já iniciado no final dos anos 80 por empresas como a Ford e GM, deixando para trás somente as empresas européias. Somente quando dominarem os métodos da produção enxuta, estarão os europeus aptos a revitalizarem sua presença industrial na América do norte e leste asiático, mas poderá ser tarde demais. Na maioria das companhias ocidentais, grande parte da atividade não está bem focalizada. Projetistas desenham produtos que jamais obterão o sinal verde, muita gente perde tempo apagando incêndios. As melhores companhias japonesas, ao contrário, acreditam firmemente que alguém não diretamente trabalhando num produto com vistas ao mercado não lhe está agregando valor. Portanto, envolver o máximo de empregados possível no desenvolvimento e produção é vital. As companhias não devem perder de vista o produto que o consumidor comprará. É preciso manter os colaboradores atualizados para assim cultivar uma vasta rede de canais horizontais de informação. O mundo inteiro deveria adotar a produção enxuta, e o mais rápido possível . IX – CONFUSÃO ACERCA DA DIFUSÃO Ao mesmo tempo em que Ford e Sloan demoliam uma indústria, a de produção artesanal, estavam construindo a segunda, a indústria de produção em massa, sem resistência interna. Somente quando a produção em massa começou a migrar para fora dos Estados Unidos é que eles encontraram resistência. Atualmente esta cena se repete com a troca do conceito de produção em massa pelo conceito de produção enxuta. Há uma grande dificuldade das companhias e trabalhadores existentes 5
adotarem novos caminhos experimentados em outros países, principalmente no Japão, que faz com que o atraso nesta transição dure décadas. A incapacidade de crescimento da economia européia, implicação principal do fato de a produção em massa não ter progredido, foi uma das causas subjacentes da guerra. Da mesma forma, grande parte do milagre econômico europeu dos anos 50 e 60 não passou da adoção retardada da produção em massa, que em meados da década de 60 estava plenamente dominada, substituindo definitivamente o processo de produção artesanal, feito que durou 50 anos. O desafio de sobrepor a produção em massa pela produção enxuta é muito maior do que a substituição anterior(artesanal pela em massa), pois uma das tendências naturais desta atual sobreposição é o desaparecimento de empregos. No começo dos anos 80 os novos peregrinos industriais faziam o contrário do que Eiji Toyoda fez na década de 50, indo pessoalmente até o Japão para conhecer o conceito de produção enxuta. Mais especificamente, os executivos da Ford visitaram as instalações da Mazda e após meses de cuidadoso trabalho de análise chegaram à conclusão de que a Mazda podia construir seu modelo 323 com apenas 60% do trabalho da Ford para fabricar seu Escort, vendido no mesmo segmento de mercado. Além disto, a quantidade de erros de fabricação da Mazda era bem menor. Igualmente impressionante, a Mazda conseguia desenvolver novos produtos bem mais rapidamente e com bem menos trabalho do que a Ford, e trabalhava muito mais entrosada com seus fornecedores. Já nos Estados Unidos, a grave crise da Ford que, em 1982, ameaçava a própria sobrevivência da companhia, estava quebrando a resistência do pensamento antigo e dos interesses entrincheirados. Subitamente, empregados em todos os níveis da companhia estavam propensos a não pensarem mais em suas carreiras individuais ou nos interesses de seus departamentos, começando a pensar em como salvar a companhia. Essa situação é a definição exata da crise criativa, e as notícias dos peregrinos de Hiroshima chegaram exatamente no momento certo. Nesta mesma década a Ford conseguiu implementar vários elementos da produção enxuta, e os resultados logo se fizeram sentir sobre o mercado. Existem apenas duas maneiras de a produção enxuta se difundir pelo mundo: Ou os produtores enxutos japoneses a espalham, ou os produtores em massa norte-americanos e europeus a adotam por iniciativa própria. Enxuto não é sinônimo de japonês! A diferença não está em os gerentes serem japoneses, mas no fato de possuírem coletivamente anos de experiência e know-how em fazerem funcionar consistentemente a produção enxuta. A produção enxuta é inerentemente um sistema de obrigações recíprocas. Os trabalhadores compartilham seu destino com seus empregadores, e os fornecedores com as montadoras. Isto é exatamente o oposto do que acontece no sistema de produção em massa, pois os trabalhadores não se iludem de que possam sempre contar com seus empregadores. Da mesma forma, os fornecedores das montadoras de produção em massa não se iludem de que, em épocas difíceis, possam compartilhar os problemas. A regra é “cada um por si”. Para o sistema de produção enxuta ter sucesso é necessário possuir os “generalistas dedicados”, inclinados a aprender várias habilidades e aplicá-las num ambiente de equipe. Há, porém, problemas caso o desempenho brilhante na equipe qualifique os trabalhadores para uma atuação ainda melhor e mais prolongada na mesma equipe, tornando cada vez mais difícil abandoná-la. Em vista disto, existe o perigo de que empregados, sentindo-se aprisionados em organizações enxutas, escondam seus conhecimentos, ou até sabotem ativamente o sistema. X – COMPLETANDO A TRANSIÇÃO O maior obstáculo no caminho para um mundo enxuto é a resistência das poderosas corporações de produção em massa, remanescentes da era industrial anterior. Para enxergar a necessidade de mudar para o sistema enxuto, todo produtor em massa precisa de um competidor enxuto bem próximo. Isto por si só não será suficiente, precisando a maioria dos produtores em massa vivenciar uma crise(crise criativa), como a Ford em 1982, para realmente mudarem. O segundo maior obstáculo é o pensamento ultrapassado sobre a economia mundial. Além disto, o triunfo da produção enxuta criou novo patamar de qualidade de produtos, que nenhum produtor poderá superar simplesmente reduzindo preços e salários. Até o começo da década de 90, o Brasil possuía um histórico de estagnação por alguns motivos aqui relatados. O principal motivo para isto tinha sido a imposição do governo para que a indústria introduzisse motores movidos a álcool, concentrando as energias do desenvolvimento de produtos das indústrias numa tecnologia que não encontro mercado em nenhuma outra parte no mundo. Os produtores enxutos precisam ensinar ao Brasil o caminho para a fabricação de nível internacional, uma vez que a fábrica de motocicletas Honda demonstrou claramente que a produção enxuta pode funcionar aqui, mesmo sob as condições mais difíceis. 6
A Austrália talvez seja o caso mais difícil de país com uma indústria de veículos motorizados pequena e altamente desenvolvida, mas com mercado doméstico insuficiente e falta de perspectiva regional. O obstáculo final para um mundo enxuto são os próprios produtores enxutos japoneses. Autoridades governamentais, gerentes e trabalhadores no Ocidente percebem que os produtores enxutos japoneses oferecem duas classes de “cidadãos” em suas organizações: uma para trabalhadores japoneses e uma segunda para estrangeiros; uma para fornecedores japoneses e outra para fornecedores estrangeiros; uma para membros japoneses dos grupos keiretsu, mas simplesmente nenhuma para companhias estrangeiras. Esta cidadania de segunda classe começa a se afigurar inaceitável aos olhos dos ocidentais mediante o aparentemente inexorável avanço das companhias japonesas. Deve ficar claro que o problema não é o fato de gerentes ou fornecedores serem ou não japoneses, mas seu grau de entendimento da produção enxuta e de comprometimento em fazê-la funcionar. Infelizmente, no momento, a maior parte dos gerentes no mundo que conhecem os métodos enxutos e estão comprometidos com eles são japoneses. Somente um compromisso público e enfático com tais inovações organizacionais finais, a que as indústrias ocidentais também precisam aderir, assegurará o triunfo da produção enxuta, para as companhias japonesas e para todo o mundo. XI – EPÍLOGO Ford e Sloan foram os primeiros a aperfeiçoar o sistema completo de produção, abrangendo operações fabris, coordenação dos fornecedores, gerência do empreendimento total, já utilizado pela indústria de bicicletas na década de 1890 e pela indústria frigorífica, que inclusive foi pioneira nas linhas móveis de desmontagem, para corte de carcaças. Porém, acoplaram-lhe nova concepção do mercado e novo sistema de distribuição. Assim, a indústria automobilística veio a ser o símbolo global da produção em massa, sistema este que algumas décadas depois foi adotado por praticamente todos os ramos industriais de grandes volumes. Na Europa, a idéia da produção em massa foi problemática não só para a indústria automobilística, mas para todas as indústrias. Somente após a Segunda Guerra Mundial a produção em massa passou a integrar plenamente a paisagem industrial européia. O caos do pós-guerra no Japão criou um ambiente fértil para novos pensamentos. Diversas técnicas embutidas por Eiji Toyoda e Taiichi Ohno em seu sistema de produção enxuta vinham sendo simultaneamente experimentadas por outras indústrias. Seu êxito residiu na junção de todas as peças, criando o sistema completo da produção enxuta, do planejamento de produtos, através de todas as etapas da fabricação e coordenação do sistema de suprimentos, até o consumidor. Deste modo, a indústria automobilística transformou mais uma vez o mundo, tornando-se o símbolo global da nova era da produção enxuta. A produção enxuta reúne o melhor da produção artesanal e da produção em massa: a capacidade de reduzir custos unitários e aumentar tremendamente a qualidade, ao mesmo tempo oferecendo uma variedade crescente de produtos e um trabalho cada vez mais estimulante. Estima-se que estamos para a produção enxuta assim como a produção em massa estava nos anos 20. No entanto, acredita-se que no final a produção enxuta irá suplantar tanto a produção em massa como os últimos baluardes da produção artesanal em todas as áreas do esforço industrial, para se tornar o padrão universal de sistema de produção no século XXI. Será um mundo bem diferente, e bem melhor para se viver. XII – A PRODUÇÃO ENXUTA NO BRASIL Alberto Santos Dumont foi um pioneiro importador de veículos motorizados, pois em 1891 trouxe para o Brasil seu Peugeot. Nesta época, ir de São Paulo ao Rio de Janeiro provocavam quase tanto deslumbramento quanto a travessia de avião do Atlântico. O conde Francisco Matarazzo, a mais expressiva liderança industrial da época, além de ser o proprietário de uma limousine da marca Fiat, ainda era seu revendedor exclusivo no Brasil. A Ford instalou sua primeira unidade de montagem no Brasil em 1919, utilizando principalmente mão-de-obra migrante da Europa, que havia sido atraída pelo sucesso do café. Os kits encaixotados vinham por navio de Detroit através do porto de Santos e os automóveis Ford eram montados um a um na fábrica do bairro do Ipiranga em São Paulo. Em 1923 era a vez da General Motors que deu preferência aos veículos comerciais. A rodovia Rio-São Paulo, unindo as duas cidades mais importantes do país, foi inaugurada apenas em 1928, constituindo-se na primeira grande rodovia nacional, ainda de terra batida. A Segunda Guerra foi particularmente traumática para a frota de veículos do país, pois a importação de veículos foi cessada. Como conseqüência, de 1930 a 1945, diminuiu a frota em circulação e aumentou a idade média dos veículos. Após a Segunda Guerra, houve uma febre de 7
importação de veículos para atender a demanda reprimida nestes anos. Assim, o Brasil não foi um ator importante durante os primeiros 50 anos da história da indústria automobilística mundial, constituindose apenas em um mero importador de veículos e realizando algumas atividades simples de montagem e produção de peças e componentes para reposição em pequena escala. Porém equivocaram-se aqueles que achavam que produzir no Brasil fosse mera utopia, pois alguns anos depois o Brasil não apenas ficou auto-suficiente na produção de veículos como também passou a exportar para diversos países. Os lemas “queimar etapas” e “50 anos em 5” inseridos no Plano de Metas de Juscelino Kubitschek implicitamente propunham ao país a entrada direta no sistema de produção em massa, sem passar portanto, pelo sistema artesanal de produção automobilística. A constituição da indústria automobilística brasileira estimulou outros países a adotarem semelhante processo. Em pouco tempo o Brasil assumiu posição de destaque internacional, tornandose o 10º produtor do mundo em 1971, ascendendo ao 9º lugar 3 anos depois, posição em que se manteve até 1977. Infelizmente a indústria automobilística brasileira ainda possuía grandes diferenças se comparados seus processos de montagem e qualidade dos produtos com os veículos de outros países. A vida útil de um modelo projetado e fabricado no Brasil era em média de 15 anos, contra 4 dos outros países. O nível de automatização e robotização também era bastante inferior, e o número de defeitos para cada 100 veículos e o tempo médio de montagem de 1 veículo era muito maior do que a média mundia. No final dos anos 80 a Volkswagem começou a exportar uma versão do Voyage(Fox) para os Estados Unidos, porém não teve sucesso pois seu produto era muito inferior em qualidade, mesmo quando comparado à produtos produzidos em outros países em desenvolvimento. Somente após a abertura de importação e do fim da reserva de mercado é que os automóveis nacionais começaram a receber tecnologia (injeção eletrônica), e uma grande esperança para que a produção enxuta ingresse no país será a vinda de montadoras japonesas. A difusão da produção enxuta no Brasil é possível, necessária e fundamental para superar o atraso e a estagnação. A transição no Brasil vai ser difícil, mas no mundo da produção automotiva, empresas e países buscam adotar o sistema da produção enxuta como forma de sobreviver na competição global. XIII – BIBLIOGRAFIA WOMACK, James P. – A Máquina que Mudou o Mundo – Rio de Janeiro - Campus. 1992.
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