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O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Quem vender, expuser à venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem, será solidariamente responsável com o contrafator, nos termos dos artigos precedentes, respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior (art. 104 da Lei n. 9.610/98).
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Capa: Nilton Masoni
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Fechamento desta edição: 24.03.2017
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Produção Digital: Equiretech
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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ H229i Harada, Kiyoshi, 1941ICMS : doutrina e prática / Kiyoshi Harada. -- 1. ed. -- São Paulo : Atlas, 2017 Inclui bibliografia e índice ISBN 978-85-97-01200-2
1. Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços. 2. Direito tributário. I. Título. 17-40652
CDU: 34:351.713
Dedico esta obra à minha esposa, FELÍCIA, companheira inseparável que compartilha comigo todos os momentos de alegria e de sucesso; aos meus filhos, MARCELO e MARISTELA; aos meus netos, FELIPE, LUIZ e MELISSA; ao meu genro, FERNANDO, e à minha nora, RAQUEL, razões da minha luta diária .
Agradeço à minha assistente, Dra. Fabiane Louise Taytie, pelos valiosos trabalhos de revisão. São Paulo, novembro de 2016.
O Autor
OBRAS DO AUTOR
I – LIVROS INDIVIDUAIS 1. Fato gerador . Suas consequências: incidência e não incidência. São Paulo: Resenha Tributária, 1975. 2. Dois temas de direito tributário . São Paulo: Resenha Tributária, 1976. 3. ICM : direito a crédito na isenção e no diferimento. São Paulo: Resenha Tributária, 1979. 4. Sistema tributário na Constituição de 1988 : tributação progressiva. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2007. 5. ITR e IPTU – ITBI – FINSOCIAL – IVV . São Paulo: Resenha Tributária, 1991. v. 8 (Outros Tributos). 6. Sistema tributário do município de São Paulo . 2. ed. São Paulo: RT, 1993. 7. Compêndio de direito financeiro. São Paulo: Resenha Tributária, 1994. 8. Direito financeiro e tributário . 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. 9. Código tributário nacional . 22. ed. São Paulo: Rideel, 2016. 10. Desapropriação: doutrina e prática. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. 11. Dicionário de direito público . 2. ed. São Paulo: MP, 2006. 12. Responsabilidade fiscal . São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. 13. Da liminar em matéria tributária. 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. 14. Direito tributário municipal . 4. ed. São Paulo: Atlas, 2012 15. Prática do direito tributário e financeiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004. v. 1. 16. Prática do direito tributário e financeiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005. v. 2. 17. Prática do direito tributário e financeiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2008. v. 3. 18. Direito urbanístico. São Paulo: NDJ, 2005 (esgotado). 19. Aspectos tributários da nova lei de falências . Curitiba: Juruá, 2005. 20. Direito tributário. São Paulo: MP, 2006. 21. ISS: doutrina e prática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014 22. Prática do direito tributário e financeiro. São Paulo: Rideel, 2011. v. 4. 23. Código Tributário Nacional comentado. Coautoria com Marcelo Kiyoshi Harada. São Paulo: Rideel, 2012. 24. Prática do direito tributário e financeiro. Curitiba: Edição por Demanda, 2012. v. 5. 25. Crimes contra ordem tributária . Coautoria com Leonardo Musumecci Filho e Gustavo Polido. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 2015. 26. IPTU : doutrina e prática. São Paulo, 2012. 27. Prática do direito tributário e financeiro. Curitiba: Edição por Demanda, 2013. v. 6. 28. Prática do direito tributário e financeiro. Curitiba: Edição por Demanda, 2014. v. 7. 29. Contribuições sociais : doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2015. 30. Prática do direito tributário e financeiro. Curitiba: Edição por Demanda, 2015. v. 8. 31. Prática do direito tributário e financeiro. Curitiba: Edição por Demanda, 2016. v. 9.
II – OBRAS COLETIVAS 1. Desapropriação em São Paulo (coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Resenha Tributária, 1985. v. I. 2. Desapropriação em São Paulo (coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Resenha Tributária, 1985. v. II. 3. Desapropriação em São Paulo (coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Resenha Tributária, 1986. v. III. 4. Desapropriação em São Paulo (coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Resenha Tributária, 1987. v. IV. 5. Direito penal tributário contemporâneo: estudos de especialistas (coord. Antonio Cláudio Mariz de Oliveira e outro). São Paulo: Atlas, 1995. p. 63-76. 6. Temas de processo civil (Coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000. 7. Temas de direito tributário (coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000. 8. IPTU : aspectos jurídicos relevantes (coord. Marcelo Magalhães Peixoto). São Paulo: Quartier Latin, 2002. p. 340-358. 9. IPI : aspectos jurídicos relevantes (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e outros). São Paulo: MP, 2003. p. 239-245. 10. ISS : Lei complementar 116/03 (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e outro). Curitiba: Juruá, 2004. p. 619-637. 11. Tributação, justiça e liberdade (coord. Marcelo Magalhães Peixoto). Curitiba: Juruá, 2005. p. 355-370. 12. Processo judicial tributário (coord. Ives Gandra da Silva Martins). São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 229-248. 13. Imunidade tributária (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e outro). São Paulo: MP, 2005. p. 205212. 14. Direito penal tributário (coord. Marcelo Magalhães Peixoto e outros). São Paulo: MP, 2005. p. 211-220.
15. Princípios constitucionais tributários (coord. Carlos Mário da Silva Veloso e outros). São Paulo: Lex Editora, 2005. p. 679-691. 16. Parcerias público-privadas (coord. Sérgio Augusto Zampol Pavani e outro). São Paulo: MP, 2006. p. 205-222. 17. Principais aspectos da Lei 11.196/05: A ‘MP do Bem’ (coord. Ives Gandra da Silva Martins e outro). São Paulo: MP, 2006. p. 109-116. 18. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza (Coord. Ives Gandra da Silva Martins e outro). São Paulo: MP, 2006. p. 267-280. 19. Incentivos fiscais (coord. Ives Gandra da Silva Martins e outros). São Paulo: MP, 2006. p. 245252. 20. Direito imobiliário. (coord. José Roberto Neves Amorim e Rubens Carmo Elias Filho). São Paulo: Elsevier, 2008. p. 310-22. 21. As grandes transformações do processo civil brasileiro (coord. Carlos Alberto Salles). São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 457-475. 22. O nikkei no Brasil . Obra coletiva (Coord. Kiyoshi Harada). 3. ed. São Paulo: Cadaris, 2013. p. 23-82. 23. Lei de responsabilidade fiscal . 10 anos de vigência – questões atuais (Coord. Fernando Facury Scaff e outro). São Paulo: Conceito, 2010. p. 147-168. 24. Sigilos bancário e fiscal (Coord. Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho e outro). Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 331-349. 25. Orçamentos públicos e direito financeiro (Coord. José Maurício Conti e outro). São Paulo: RT, 2011. p. 1255-1273. 26. Doutrinas essenciais – Direito tributário (Org. Ives Gandra da Silva Martins e outros). São Paulo: RT, v. V, p. 99-105; 371-381; 511-518; 875-882; 1161-1170. 27. Tratado de direito municipal (Coord. Ives Gandra da Silva Martins e outro). São Paulo: Quartier Latin, 2012. v. I, p. 464-480. 28. Direito tributário – artigos selecionados em homenagem aos 40 anos do Centro de Extensão universitária (Org. Ives Gandra da Silva Martins). São Paulo: RT, 2012. v. II, p. 289-302; 373-382. 29. Direito financeiro, econômico e tributário . Homenagem a Regis Fernandes de Oliveira (Coord. Estevão Horvath e outros). São Paulo: Quartier Latin, 2014. 30. 10 anos de vigência da lei de recuperação e falência . (Coord. Carlos Henrique Abrão e outros). São Paulo: Saraiva, 2015. p. 449-469. 31. 60 anos de bunkyo : passado, presente e futuro. (Coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Cadaris, 2015. p. 109-159; 193-199; 285-297 e 319-328. 32. Juristas do mundo. (Coord. Léo da Silva Alves). Porto (POR): Editora Rede Publicações Jurídicas, 2016. p. 277-284.
33. Direito financeiro na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal . (Coord. Marcus Lívio Gomes e outros). Curitiba: Juruá, 2016. p. 239-255; 34. Impeachment instrumento da democracia (Coord. Ives Gandra da Silva Martins e outros). São Paulo: Editora IASP, 2016. 35. Parlamentarismo, realidade ou utopia? (Coord. Ives Gandra da Silva Martins e outro). São Paulo: Editora Tutu, 2016. p. 260-275; 36. Intercâmbio cultural Brasil-Japão. (Coord. Kiyoshi Harada). São Paulo: Cadaris, 2016. p. 2548; 264-266; e 736-741.
III – ARTIGOS, MONOGRAFIAS E PARECERES 1. Mais de quinhentos e cinquenta artigos, monografias e pareceres nas áreas do Direito Administrativo, Financeiro e Tributário, publicados nas diversas Revistas Jurídicas e Boletins especializados. 2. Mais de setenta e cinco artigos de cunho jurídico publicados nos principais jornais da Capital.
PREFÁCIO
Esta obra é a 6.ª da série “Doutrina e prática” que vimos escrevendo ao longo do tempo e é dedicada ao estudo sistemático do ICMS, o imposto de maior arrecadação do País, chegando próximo de 20% do total dos R$ 2 trilhões arrecadados no ano de 2015. Como o próprio nome indica – ICMS – doutrina e prática –, o livro promove a abordagem desse imposto não apenas do ponto de vista teórico e doutrinário, mas também sob o prisma pragmático, apresentando-se como uma ferramenta útil aos operadores do Direito em geral, notadamente àqueles voltados para o estudo e a aplicação das normas tributárias, quer rememorando noções teóricas, quer oferecendo soluções para casos intrincados, sem pronunciamento definitivo da urisprudência. O ICMS é o único imposto que, pela sua peculiaridade de ser um tributo de vocação nacional inserido na competência impositiva dos Estados por razões de política tributária, mereceu estruturação exaustiva na Constituição que estatuiu princípios e normas a ele aplicáveis. Também mereceu uma regulamentação específica por lei complementar, nesse particular, acompanhado pela legislação do ISS, revogando aquelas normas previstas no Código Tributário Nacional, no que andou bem o legislador. Por isso, a legislação do ICMS, pode-se dizer, em sua maior parte está inserida no Direito Constitucional Tributário. É a partir de princípios e regras constitucionais que promovemos o estudo sistemático desse imposto para, depois, adentrarmos no exame da lei de regência nacional do ICMS, a Lei Complementar 87/96. A obra é dividida em oito capítulos. Os três primeiros capítulos cuidam do estudo crítico e sistematizado do ICMS à luz da Carta Política de 1988 e da Lei Complementar 87/96, precedido do exame prévio do antigo ICM sob a égide de ordem constitucional antecedente. O capítulo 4 aborda os regimes de diferimento e de suspensão do ICMS, ao passo que os capítulos 5 e 6 versam sobre estudos específicos relativos à tributação de serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e à guerra fiscal, respectivamente. O capítulo 7 contém estudos exaustivos sobre quatro temas em que grassam sérias controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais, apontando soluções que, no nosso entender, harmonizam-se com os preceitos constitucionais tributários. Finalmente, no capítulo 8 inserimos as Súmulas do STF e do STJ pertinentes ao ICMS.
SUMÁRIO
1
ORIGEM DO IMPOSTO 1.1 Intr odução 1.2 O ICM à luz das Constituições de 1967 e de 1969 1.3 Conceito de “circulação de mercadorias”
2
O ICMS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 2.1 Conceito de operações relativas à circulação de mercadorias e de prestação de serviços de transportes interestadual e intermunicipal e de comunicação 2.1.1 Conceito de operações relativas à circulação de mercadorias 2.1.2 Conceito de prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal 2.1.3 Conceito de prestação do serviço de comunicação 2.1.3.1 Campo de tributação do serviço de comunicação pelo ICMS 2.1.3.2 O conteúdo do serviço de comunicação 2.2 A não cumulatividade do ICMS (art. 155, § 2.º, I, da CF) 2.2.1 Introdução 2.2.1.1 Imposto de incidência monofásica e de incidência plurifásica 2.2.1.2 Imposto não cumulativo pelo emprego do mecanismo de compensação difere do imposto sobre o valor agregado 2.2.1.3 A neutralidade fiscal 2.2.2 Natureza jurídica do crédito do imposto 2.2.3 Flexibilização do princípio da não cumulatividade 2.3 Efeitos da isenção e da não incidência (art. 155, § 2.º, II, da CF) 2.3.1 Direito a crédito no diferimento 2.4 A seletividade do imposto em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços (art. 155, § 2.º, III, da CF) 2.5 As alíquotas do ICMS nas operações e prestações interestaduais e de exportação (art. 155, § 2.º, IV, da CF) 2.6 Atribuições do Senado Federal previstas no inciso V, do § 2.º, do art. 155 da CF 2.7 Exame do inciso VI do § 2.º do art. 155 da CF 2.8 Exames dos incisos VII e VIII do § 2.º do art. 155 da CF
2.9
Exame do inciso IX 2.9.1 Exame do inciso IX, a, do § 2.º do art. 155 da CF 2.9.2 Exame do inciso IX, b, do § 2.º do art. 155 da CF 2.10 Exame do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF 2.10.1 Exame do inciso X, a, do § 2.º do art. 155 da CF 2.10.2 Exame do inciso X, b, do § 2.º, do art. 155 da CF 2.10.3 Exames do inciso X, c e d, do § 2.º do art. 155 da CF 2.11 O exame do inciso XI do § 2.º do art. 155 da CF 2.12 Exame do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF 2.12.1 Atribuições da Lei Complementar previstas no inciso XII, a, b, c, e e f, do § 2.º do art. 155 da CF 2.12.2 Atribuições da Lei Complementar previstas no inciso XII, g, do § 2.º, do art. 155 da CF 2.12.3 Atribuição da Lei Complementar prevista no inciso XII, h, do § 2.º, conjugado com os §§ 4.º e 5.º do art. 155 da CF 2.12.4 A tributação por dentro: exame da letra i do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF 2.12.4.1 Generalidades 2.12.4.2 Exame da letra i do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF 2.13 Exame do § 3.º do art. 155 da CF
3
COMENTÁRIOS À LEI COMPLEMENTAR 87, DE 13.09.1996
4
OS REGIMES DE DIFERIMENTO E DE SUSPENSÃO DO ICMS 4.1 Diferimento do imposto 4.2 Suspensão do imposto
5
A TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TRANSPORTES INTERMUNICIPAIS E INTERESTADUAIS
6
A GUERRA FISCAL E AS TENTATIVAS LEGISLATIVAS PARA SUA CESSAÇÃO
7
EXAME DE TEMAS CONTROVERTIDOS 7.1 Fatos geradores confrontantes 7.2 Regime jurídico-tributário do produto industrializado por encomenda 7.2.1 Embalagens personalizadas 7.2.2 Elevadores personalizados 7.3 Valor adicionado do ICMS
7.4
8
Incidência do ICMS no leasing por ocasião da opção de compra
SÚMULAS PERTINENTES AO ICMS 8.1 Súmulas vinculantes do STF 8.2 Súmulas do STF 8.3 Súmulas do STJ
REFERÊNCIAS
1 ORIGEM DO IMPOSTO 1.1
INTRODUÇÃO
O atual Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação de Serviços (ICMS) tem origem no Sistema Tributário introduzido pela Reforma Tributária prevista na Emenda Constitucional 18, de 1965, que não chegou a entrar em vigor porque ele foi logo substituído pelo novo Sistema Tributário incorporado pela Constituição de 1967, a qual restabeleceu a discriminação constitucional de rendas tributárias, enumerando os impostos cabentes de forma privativa a cada um dos entes políticos componentes da Federação. Dispunha a Emenda 18/65 na seção IV pertinente a Impostos sobre a produção e a Circulação: Art. 12. Compete aos Estados o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por comerciantes, industriais e produtores. § 1.º A alíquota do imposto é uniforme para todas as mercadorias, não excedendo, nas operações que se destinem a outro Estado, o limite fixado em resolução do Senado Federal, nos termos do disposto em lei complementar. § 2.º O imposto é não cumulativo, abatendo-se, em cada operação, nos termos do disposto em lei complementar, o montante cobrado nas anteriores, pelo mesmo ou outro Estado, e não incidirá sobre venda a varejo, diretamente ao consumidor, de gêneros de primeira necessidade, definidos como tais por ato do Poder Executivo Estadual. Art. 13. Compete aos Municípios cobrar o imposto referido no artigo com base na legislação estadual a ele relativa, e por alíquota não superior a 30% (trinta por cento) da instituída pelo Estado. Parágrafo único. A cobrança prevista neste artigo é limitada às operações ocorridas no território do Município, mas independente da efetiva arrecadação, pelo Estado, do imposto a que se refere o artigo anterior.
Dispunha, ainda, o caput do art. 15: Art. 15. Compete aos Municípios o imposto sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência tributária da União e dos Estados. O antigo ICM incidia exclusivamente sobre operações relativas à circulação de mercadorias realizadas por comerciantes, industriais e produtores, o que excluía as pessoas físicas que não exercem a atividade comercial, industrial ou produtora com habitualidade. Apesar de constar no art. 15 a tributação de serviços de qualquer natureza, também em relação à União e aos Estados, o texto da Emenda 18/65 em nenhum momento fez referência a essa tributação, de sorte a incidir a regra do art. 5.º da Emenda segundo o qual “os impostos componentes do sistema tributário nacional são exclusivamente os que constam desta Emenda, com as competências e limitações nela previstas”. A tributação dos serviços de comunicação e de transportes interestadual e intermunicipal de passageiros somente veio a ser inserida na competência impositiva da União com o advento da Constituição de 1967. A Constituição de 1988 transferiu essa competência para os Estados. Embora tenha sido introduzida a categoria de lei complementar pela Emenda 18/65, a não incidência do imposto, na verdade, imunidade objetiva do ICM, em relação aos gêneros de primeira necessidade referida no § 2.º do art. 12, ficou a cargo do Executivo a definição de seu conteúdo. Não se vislumbrava, na época, o surgimento da guerra fiscal entre os Estados, o que aconteceu logo após a entrada em vigor com o advento da Constituição de 1967. Por derradeiro, a previsão de cobrança do ICM pelos Municípios, com a alíquota não superior a 30%, prevista no art. 13, não chegou a acontecer, porque o Ato Complementar 31, de 28.12.1966, considerando a necessidade de adequar esse imposto ao novo Sistema Tributário previsto no Projeto de Constituição de 1967 que já havia sido aprovado pelo Congresso Nacional, determinou, pelo seu art. 1.º, a partilha do ICM na proporção de 80% para o Estado e 20% para os Municípios.
1.2
O ICM À LUZ DAS CONSTITUIÇÕES DE 1967 E DE 1969 Prescrevia a Constituição de 1967 em seu art. 24: Art. 24. Compete aos Estados e ao Distrito Federal decretar impostos sobre: […] II – operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes.1
[…] § 4.º A alíquota do imposto a que se refere o n.º II será uniforme para todas as mercadorias; o Senado Federal, através de resolução tomada por iniciativa do Presidente da República, fixará as alíquotas máximas para as operações internas, para as operações interestaduais e para as operações de exportação para o estrangeiro. 2 § 5.º O imposto sobre circulação de mercadorias é não cumulativo, abatendo-se, em cada operação, nos termos do disposto em lei, o montante cobrado nas anteriores, pelo mesmo ou outro Estado, e não incidirá sobre produtos industrializados e outros que a lei determinar, destinados no exterior. A Constituição de 1969 (Emenda 1/69), por sua vez, dispôs em seu art. 23: Art. 23. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: […] II – operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes, impostos que não serão cumulativos e dos quais se abaterá, nos termos do disposto em lei complementar, o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado. […] § 5.º A alíquota do imposto a que se refere o item II será uniforme para todas as mercadorias nas operações internas e interestaduais; o Senado Federal, mediante resolução tomada por iniciativa do Presidente da República, fixará as alíquotas máximas para as operações internas, as interestaduais e as de exportação. A Constituição Federal de 1969 fundiu as redações do caput do art. 24 e do § 5.º da Constituição de 1967 reduzindo os dois textos em um só na forma do inciso II do art. 23 da nova ordem constitucional. Preservou, outrossim, o princípio da uniformidade de alíquotas para todas as mercadorias, acrescentando a expressão “nas operações internas e interestaduais”, a nosso ver, de forma desnecessária. Essencialmente, ficaram mantidas as características do ICM na passagem da Constituição de 1967 para a Constituição de 1969. Em ambos os textos não se podia fazer incidir o imposto sobre operações realizadas por pessoas físicas, sem o caráter de habitualidade, limitada que estava a incidência do ICM às operações realizadas por produtores, industriais e comerciantes. Regulando a não cumulatividade do ICM previsto no inciso II do art. 23 da Constituição de 1969, o § 1.º do art. 3.º do Decreto-lei 406, de 31.12.1968, na verdade, lei complementar porque disciplina a matéria prevista no § 1.º do art. 18 da Constituição Federal, reza que:
§ 1.º A lei estadual disporá de forma que o montante devido resulte da diferença a maior, em determinado período, entre o imposto referente às mercadorias saídas do estabelecimento e o pago relativamente às mercadorias nele entradas. O saldo verificado em determinado período a favor do contribuinte transfere-se para o período ou período seguintes. O imposto não cumulativo – que se contrapõe ao imposto cumulativo, o qual incide sucessivamente em todas as operações tributáveis, por meio de uma alíquota fixa, sobre o valor global de cada uma delas (incidências em cascata) – caracteriza-se ou pela única incidência sobre o valor total da mercadoria, ou, então, pelas múltiplas incidências sobre os valores acrescidos em cada uma das operações. Na primeira hipótese, o fato gerador do imposto acontece uma única vez, por exemplo, na saída da mercadoria com destino a consumidor final . Na segunda hipótese, o fato gerador ocorre em diversas etapas do ciclo de comercialização das mercadorias, incidindo, porém, o imposto apenas sobre o valor acrescido em cada uma dessas operações. O valor já tributado, bem como o valor do imposto nele incorporado, não são alcançados pela tributação, a exemplo do que se verifica no imposto cumulativo. O ICM é um imposto de caráter não cumulativo, classificável na segunda das modalidades referidas. Realmente, por imposição constitucional, o montante do imposto cobrado nas operações anteriores pelo mesmo ou outro Estado deverá ser abatido do imposto apurado nas saídas de mercadorias. Daí a inconstitucionalidade de leis estaduais, vedando o “crédito” do ICM pago em outro Estado, ensejando o reaparecimento das “guerras tributárias” entre os Estados, existentes antes da Reforma Tributária. O nosso legislador, inspirado no sistema do tributo francês, “la taxe sur le valeur ajoutée”, instituiu a não cumulatividade do ICM pelo emprego do mecanismo de dedução dos impostos pagos nas operações anteriores. Em termos de direito positivo, não há incidência do imposto sobre o valor acrescido ou agregado, mas sobre o valor total de cada operação. O montante do imposto devido é que resulta da diferença a maior, em um determinado período, entre o imposto pago nas entradas de mercadorias no estabelecimento e aquele incidente nas saídas de mercadorias do mesmo estabelecimento. De fato, o art. 2.º do Decreto-lei 406/68 determina que a base de cálculo do imposto é “o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria” (operação interna) e não o valor desta menos o valor da operação de que decorreu a entrada dessa mesma mercadoria, como deveria ser caso se tratasse de um autêntico imposto sobre o valor acrescido.
A não cumulatividade do ICM, portanto, não resulta da definição do fato gerador da obrigação tributária porque a base de cálculo, 3 um de seus aspectos integrativos, é o valor da operação de que decorre a saída da mercadoria. O critério adotado pela nossa legislação, de diferença a maior, como se vê do § 1.º do art. 3.º do Decreto-lei 406/68, atua por meio de operações contábeis fiscais de “crédito” e “débito” do imposto, correspondendo o saldo a favor da Fazenda, o ICM a ser recolhido relativamente ao período apurado, e o saldo do contribuinte, o ICM a ser transferido para o período seguinte. Melhor explicando: O contribuinte apura em certo período, normalmente de 30 dias, segundo as legislações da maioria dos Estados, o valor do imposto pago relativamente a todas as mercadorias entradas em seu estabelecimento, contabilizando-as como seu crédito em relação à Fazenda. Por outro lado, apura o valor do imposto incidente 4 sobre todas as mercadorias saídas de seu estabelecimento, no mesmo período, contabilizando-os como seu débito em relação à Fazenda. Confrontando-se esses dois lançamentos contábeis, “a crédito” e “a débito”, resultará uma diferença que, se a favor da Fazenda (diferença a maior), constituirá o imposto devido, no período apurado. Se a diferença for a favor do contribuinte (diferença a menor), constituirá o crédito a ser transferido para o período seguinte, ou períodos subsequentes até que resulte na diferença a maior. Como se vê, o cálculo do imposto não é efetuado “operação sobre operação”. O cálculo é feito pela diferença entre o imposto pago na entrada de mercadorias, em um período determinado, e aquele incidente sobre as múltiplas operações de saídas (que podem não se referir às mesmas mercadorias entradas no período) ocorridas naquele mesmo espaço de tempo. Inexiste, portanto, um elo entre a entrada de determinada mercadoria e a saída dessa mesma mercadoria. O que existe é uma cadeia de “créditos” e “débitos” a serem contabilizados periodicamente, de modo a estabelecer um vínculo entre os contribuintes, possibilitando o controle, entre eles, do imposto devido. Pelo mecanismo contábil fiscal, do ponto de vista econômico-financeiro, obtém-se idêntico resultado do imposto não cumulativo, na sua modalidade de incidência única, isto é, o total do imposto pago em relação a uma determinada mercadoria, ao longo do seu curso de comercialização, equivale exatamente à aplicação de sua alíquota sobre o valor final da operação de saída com destino a consumidor. Concluindo, a não cumulatividade do ICM não decorre da definição da hipótese de incidência da obrigação tributária, mas da sistemática de apuração periódica do imposto devido, por meio de operações contábeis fiscais de “crédito” e “débito” do imposto. Inexiste, por sua vez, qualquer ligação entre determinada mercadoria entrada no estabelecimento de um contribuinte, com imposto pago, e a sua saída (daquela mercadoria) do mesmo estabelecimento, com imposto a pagar, porque a sua apuração não é feita “imposto sobre imposto incidente sobre cada operação”, como já vimos.
1.3
CONCEITO DE “CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS”
Examinemos, agora, o conceito de “circulação de mercadorias”. É um conceito de Direito Privado, misto ou autônomo? Como ramo jurídico autônomo, ainda que para fins didáticos, o Direito Tributário apresenta institutos peculiares, mas integrando ele à grande “Árvore Jurídica”, muitas vezes nele encontramos, além dos princípios gerais de Direito, categorias já disciplinadas por outros ramos do Direito, categorias que atendem a sua finalidade. Assim, o Direito Tributário se utiliza de institutos estruturados pelo Direito Privado, como veículo de incidência tributária. Nesses casos, a estrutura de Direito Privado desses institutos é vinculante dentro do Direito Tributário. É o caso, por exemplo, do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, previsto no art. 63 do CTN. Realmente, a lei instituidora do referido imposto, Lei 5.143, de 20.10.1966, aplica os conceitos de operações de crédito e de seguro, já firmados no Direito comum, sem qualquer modificação. Outras vezes, o Direito Tributário adota institutos de Direito Privado com pequenas alterações adequando-os à finalidade tributária, ensejando o aparecimento de institutos mistos. As partes não modificadas integram o Direito Tributário e são vinculantes dentro dele. É o caso, por exemplo, do “balanço fiscal”. Outras vezes, ainda, o Direito Tributário cria institutos próprios. Tendo o legislador a liberdade na escolha dos fatos sobre que deva incidir o tributo, obedecidas as regras de repartição de competências legiferantes, pode criar conceitos próprios, quando a relação ou fato a ser configurado não foi ainda categorizado pelo Direito comum, ou, ainda, quando já categorizado, a figura for inadequada à finalidade tributária. Daí as categorias ou conceitos autônomos do Direito Tributário. 5 Tais conceitos são facilmente encontráveis, por exemplo, na legislação do Imposto de Renda. Sabido que o Direito Tributário se utiliza de categorias ou conceitos de Direito Privado, mistos ou autônomos, em qual dessas hipóteses se enquadra o conceito de “circulação de mercadorias”? A exata fixação do conceito de “circulação de mercadorias”, para o efeito do imposto de que estamos tratando, tem sido uma das tarefas mais árduas, dividindo as opiniões de juristas e estudiosos que trataram da matéria. Para José Nabantino Ramos – que cuidou da matéria à luz dos conceitos tradicionais, com a invocação do elemento histórico, consistente na análise dos debates travados no Parlamento, por ocasião da discussão do projeto de Reforma Tributária (Emenda 18), com apoio na doutrina de Almeida Nogueira –, a expressão “circulação de mercadorias” deve ser tomada em sua acepção econômica. Em consequência, para haver circulação é preciso que haja transferência da propriedade ou posse da mercadoria. Considerar circulação a transferência de mercadoria de um determinado
estabelecimento para outro, do mesmo titular, seria, para o citado autor, o mesmo que afirmar que o dinheiro circula quando Pedro o passa da mão esquerda para a mão direita. 6 Pontes de Miranda também entende que a circulação de mercadoria sempre envolve transferência de propriedade ou posse. O conceito adotado é o da circulação jurídica, e não o da circulação física. Para esse renomado jurista: O imposto sobre circulação é o imposto sobre o negócio jurídico bilateral, consensual, da compra-e-venda, e sobre qualquer outro negócio jurídico bilateral, ou unilateral, de que se irradie circulação. Não atinge desde logo o contrato de comissão de venda se não há tradição da posse imediata ou mediata da mercadoria. 7 O conceito de circulação jurídica é adotado pela grande parte dos estudiosos e tem encontrado ressonância no Judiciário. 8 Na verdade, o problema não deve ser analisado apenas em termos de circulação jurídica ou circulação física, devendo a expressão “circulação de mercadorias” ser interpretada de forma integrada com a expressão “operações”, pois a Constituição Federal não se refere ao imposto sobre circulação, mas sobre “operações relativas à circulação de mercadorias”. A comissão elaboradora da Reforma Tributária fez as seguintes considerações em torno do assunto: A nova estruturação começa, de acordo com uma das diretrizes básicas do sistema projetado, por desvincular o imposto dos negócios específicos de compra e venda ou de consignação. Em lugar de referir essas duas modalidades, atribui-se ao imposto incidência genérica sobre operações relativas à circulação de mercadorias, qualificada, porém, às realizadas por comerciantes, industriais e produtores, de modo a preservar a natureza mercantil do tributo, de resto já indicada pela identificação da circulação como sendo a de mercadorias.9 Para o saudoso jurista, Rubens Gomes de Souza, relator da comissão elaboradora da Reforma Tributária, constitui fato gerador do ICM a “saída física da mercadoria de estabelecimento comercial, industrial ou produtor, sendo irrelevante o título envolver ou não uma transmissão de propriedade”. Acrescenta o jurista que a saída física tributada é aquela que configura “uma etapa no processo de circulação da mercadoria, assim entendido o complexo das sucessivas transferências desta, desde o seu produtor, expressão que inclui o fabricante, e o importador, até o seu consumidor final”.10 Do exposto podemos concluir que a expressão “operações relativas à circulação de
mercadorias” configura um conceito autônomo, próprio do Direito Tributário, conceito esse que implica o reconhecimento dos seguintes requisitos: a) Saída física da mercadoria de estabelecimento comercial, industrial ou produtor (circulação física ou jurídica) promovida por comerciante, industrial ou produtor, ou ainda por pessoas a eles legalmente equiparadas, entendendo-se como promotor da saída não só aquele que a executa materialmente, como também aquele que lhe dá a causa jurídica. b) Saída física que corresponde ao curso de mercadoria, desde a fonte de produção, expressão que inclui a importação, até o consumo final, sendo irrelevantes que nessas etapas em direção ao consumo ocorram, ou não, transferências de propriedade ou posse. Esclarecendo: Apenas a saída de mercadoria é tributada dado o caráter mercantil do imposto. Como a Constituição Federal não descreveu o que seja mercadoria, entende-se que acolheu o conceito tradicional, de forma que nenhuma lei tributária poderia defini-la de maneira diferente (art. 110 do CTN). Na conceituação tradicional, mercadoria é espécie do gênero coisa. Todas as coisas móveis, consideradas objeto da circulação comercial, tomam o nome específico de mercadorias. A diferença entre coisa e mercadoria não é de substância, mas apenas de destinação. 11 Consideramos como um dos elementos componentes do fato gerador do ICM a saída física, e não apenas aquela que implica a transferência de propriedade ou posse (circulação jurídica). Como, então, explicar a hipótese de incidência prevista no § 1.º do art. 2.º do Decreto-lei 406, de 31.12.1968, em que não ocorre a saída física, bastando a mera transferência da propriedade de mercadoria quando esta não transitar pelo estabelecimento do transmitente? Rubens Gomes de Souza, estudando a questão à luz do § 1.º do art. 52 12 do CTN, disse o seguinte: […] ainda neste caso, o fato gerador é a saída de mercadoria, à qual a lei apenas assimila a transmissão da sua propriedade, quando ela não transite pelo estabelecimento do transmitente. Assim, a determinante do dispositivo não é o fato de a mercadoria ser alienada, mas o fato de não transitar pelo estabelecimento do alienante, isto é, de não sair fisicamente desse estabelecimento, mas de outro. 13 A hipótese em análise deve ser examinada em consonância com o disposto no art. 6.º do citado Decreto-lei, que considera contribuinte do imposto aquele que promove a saída da mercadoria (ainda que não execute materialmente a operação de saída), aquele que importa etc. De fato, a hipótese visada pelo § 1.º do art. 2.º do Decreto-lei 406/68 é a da mercadoria que se
encontra, por exemplo, depositada em um armazém-geral, caso em que a transmissão de propriedade dessa mercadoria se opera mediante simples endosso no respectivo warrant , sem que ela transite pelo estabelecimento do transmitente. Fez-se mera substituição do fato – trânsito da mercadoria – pelo ato – transmissão de propriedade da mercadoria. Verifica-se que o legislador não pretendeu transformar o preto no branco por meio de uma ficção jurídica. Dando prevalência, no caso, ao ato urídico, dentro de um quadro de tributo nitidamente mercantil, o legislador não violou quaisquer princípios constitucionais explícitos ou implícitos nem pode a equiparação ser acoimada de ilegítima, no plano pré-jurídico. Muito ao contrário, nesse último plano, a equiparação dá à norma urídica tributária o necessário embasamento ético-moral na medida em que impede a evasão legal do imposto por parte de alguns comerciantes, industriais ou produtores, contribuintes do mesmo imposto. Finalmente, a saída física tributada é apenas aquela que configura etapa no processo de circulação de mercadorias desde a fonte de produção até o consumo final, não importando o título urídico que desencadeia a marcha das mercadorias em direção ao consumo. Examinados os elementos que integram a conceituação constitucional do imposto, e tendo em vista o disposto no art. 1.º, inciso I, do Decreto-lei 406/68, podemos afirmar que o fato gerador do ICM, em termos analíticos, é: A saída de mercadoria (circulação física ou jurídica) – que configura etapa no seu curso desde a fonte de produção, esta abrangendo também a importação, até o consumo final – de estabelecimento produtor, comercial ou industrial, promovida ou ocasionada por produtor, comerciante ou industrial, ou ainda, por pessoas a eles legalmente equiparadas. Assim definido o fato gerador do ICM, compreende-se por que em algumas saídas de mercadorias, sem que importe em transferência de sua propriedade ou posse (circulação física), elas são tributadas nos termos da legislação (ex.: remessa de mercadoria de um para outro estabelecimento de mesma empresa), 14 e, inversamente, intributáveis são as saídas de bens com transferência de sua propriedade ou posse (circulação jurídica), como é o caso, por exemplo, da venda de bens integrantes do ativo fixo, do comodato etc. Esse posicionamento também é prestigiado pelo Excelso Pretório Nacional.15 O exame de vários de seus acórdãos permite concluir que aquela Alta Corte de Justiça deixou sinalizada a tese de que a “circulação de mercadoria” não significa apenas a circulação jurídica, mas qualquer circulação física, desde que represente uma etapa no processo de movimentação da mercadoria em direção ao consumo. É certo, porém que o STF não chegou a definir uma posição clara a respeito, bem como que inúmeros outros de seus acórdãos acolhem a tese da circulação jurídica. Voltaremos ao tema quando examinarmos o atual ICMS à luz da Constituição de 1988.
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14
15
Cf. redação dada pelo Ato Complementar 40, de 30.12.1968. Cf. redação dada pelo Ato Complementar 40, de 30.12.1968. Para Ruy Barbosa Nogueira, a base cálculo é um dos componentes do elemento valorativo ou quantitativo do fato gerador, ou seja, é a expressão econômica do fato gerador (Cf. Direito tributário comparado . São Paulo, Saraiva, p. 153). Incidência econômica. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Da interpretação e da aplicação das leis tributárias . 2. ed. São Paulo: RT, p. 60-61. RAMOS, José Nabantino. O conceito de circulação. RDP , São Paulo: RT, v. 2, p. 36-38. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967 . São Paulo: RT, t. II, p. 491. RE 70.616/SP, RTJ 58/360; RE 72.541/MG, RTJ 61/230; RE 72.412/SP, RTJ 61/804; RE 74.852/SP, RTJ 64/538; RE 55.434/SP, RTJ 67/439. REFORMA TRIBUTÁRIA NACIONAL. Comissão do Ministério da Fazenda. Publicação, n. 17, Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, p. 48, 1966. SOUZA, Rubens Gomes de. IVC, ICM e Conferência de Bens Móveis ao Capital de Sociedade. RDP , v. 2, p. 143-144. CARVALHO DE MENDONÇA J. X. de. Tratado de direito comercial brasileiro . v. V, Livro III, § 24. Revogado pelo Decreto-lei 406/68. SOUZA, Rubens Gomes de. IVC, ICM e Conferência de Bens Móveis ao Capital de Sociedade. RDP , v. 2, p. 142. Na vigência do ICMS, o STJ editou a Súmula 166, prescrevendo que não há ocorrência do fato gerador nessa hipótese. É certo, porém, que essa Súmula é anterior ao advento da LC 87, de 13.09.1996, que em seu art. 12, I, prescreve que ocorre o fato gerador “no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”. RE 67.844/SP, RTJ 53/191; RE 70.613/SP, RTJ 58/360; RE 70.538/GB, RTJ 58/665; RE 74.363/SP, RTJ 64/232.
2 O ICMS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Na Constituição de 1988, o antigo ICM ganhou ampliação do seu campo de incidência, passando a abranger os serviços de transportes intermunicipais e interestaduais e o de comunicação, como veremos. Contrariamente ao que dispunham as ordens constitucionais antecedentes em relação ao antigo ICM, a Carta Política de 1988, no tocante ao ICMS, procedeu à estruturação detalhada desse imposto. Pelo inciso II do art. 155, o ICMS foi inserido na competência tributária dos Estados e do Distrito Federal. Os §§ 2.º, 3.º, 4.º e 5.º, cada um deles contendo inúmeros incisos e letras, completam a regulamentação minuciosa desse imposto, pouco deixando à colaboração dos legisladores infraconstitucionais. Os legisladores estaduais sofrem, ainda, as limitações impostas pela lei de regência nacional do ICMS, Lei Complementar 87, de 13.09.1996, além das resoluções do Senado Federal elaboradas naqueles casos previstos na Constituição. Todo esse aparato legislativo tornou-se necessário por ter atribuído aos Estados e ao Distrito Federal um imposto de vocação nacional decorrente dos reflexos econômico-financeiros entre os Estados que resultam do sistema de compensação de créditos gerados no mesmo ou em outro Estado, assim como da política de desoneração tributária. Reproduzimos a seguir os preceitos constitucionais concernentes a esse imposto previsto no art. 155 da Constituição: Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de
1993.) […] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) I – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal: II – a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação: a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores; III – poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços; IV – resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação; V – é facultado ao Senado Federal: a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução de iniciativa de um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros; b) fixar alíquotas máximas nas mesmas operações para resolver conflito específico que envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros; VI – salvo de deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do disposto no inciso XII, g , as alíquotas internas, nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, não poderão ser inferiores à previstas para as operações interestaduais; VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.) a) (Revogada.); (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.) b) (Revogada.); (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.) VIII – a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.) a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda
Constitucional n.º 87/2015.) b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.) IX – incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) b) sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios; X – não incidirá: a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003.) b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica; c) sobre o ouro, nas hipóteses definidas no artigo 153, § 5.º; d) nas prestações de serviços de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003.); XI – não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos; XII – cabe à lei complementar: a) definir seus contribuintes; b) dispor sobre substituição tributária; c) disciplinar o regime de compensação do imposto; d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços; e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, “a”; f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias;
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados; h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, “b”; (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) (Vide Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) § 3.º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o artigo 153, I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) § 4.º Na hipótese do inciso XII, “h”, observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) I – nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) II – nas operações interestaduais, entre contribuintes, com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, o imposto será repartido entre os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas operações com as demais mercadorias; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) III – nas operações interestaduais com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, destinadas a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) IV – as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2.º, XII, “g”, observando-se o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas por produto: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou ad valorem, incidindo sobre o valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em condições de livre concorrência; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.)
c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no artigo 150, III, “b”. § 5.º As regras necessárias à aplicação do disposto no § 4.º, inclusive as relativas à apuração e à destinação do imposto, serão estabelecidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do § 2.º, XII, “g”. (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) […] É curioso observar desde logo que nenhum outro imposto mereceu tanto detalhamento no texto constitucional como o ICMS de competência impositiva dos Estados. Isso se deve ao fato de que esse imposto se reveste caráter nacional exigindo edição de normas constitucionais e legais, em nível de lei complementar, para assegurar o princípio da unidade nacional tendo em vista o envolvimento de uma série de situações como a garantia do crédito do imposto pago na operação anterior em qualquer Estado, as isenções, os diferentes tipos de incentivos fiscais, as operações interestaduais etc. No tocante a esse imposto,3 não tem aplicação a tese sustentada por José Souto Maior Borges, segundo a qual o poder de tributar envolve o poder de isentar que “não passa do verso e reverso da mesma medalha”.1 Todo esse conjunto de normas constitucionais condiciona a ação do legislador ordinário, federal ou estadual, de sorte que qualquer estudo aprofundado do ICMS deve partir do exame dos dispositivos constitucionais pertinentes. É o que faremos analisando cada uma dessas normas em confronto com as normas dos demais instrumentos legislativos, como aquelas inseridas na Lei Complementar 87/96, nos Convênios celebrados entre os Estados e nas resoluções do Senado Federal. Aqui há, portanto, um limite legal e constitucional para cada Estado eleger a sua política tributária para implementar as funções do sistema tributário que, no dizer de Alcides Jorge Costa, se resumem em três: a função estabilizadora, a função redistributiva e a função desenvolvimentista. 2
2.1
CONCEITO DE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTES INTERESTADUAL E INTERMUNICIPAL E DE COMUNICAÇÃO
Prescreve o inciso II do art. 155 da CF que cabe aos Estados instituir impostos sobre “operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem
no exterior”. Quanto ao conceito de serviços de transporte, não há maiores dificuldades porque os serviços são nominados, isto é, abrangem apenas os transportes intermunicipais e interestaduais. Também não há dificuldades na interpretação da parte final do texto que se refere às operações e às prestações que se iniciam no exterior. Basta ter em mente o transporte por qualquer via que tenha início no exterior terminando em território nacional. Quanto ao serviço de comunicação, podem restar, ainda, dúvidas sobre alguns de seus aspectos. Veremos melhor o conceito de comunicação após o exame do conceito de circulação de mercadorias.
2.1.1
Conceito de operações relativas à circulação de mercadorias
Ao se examinar o conceito de circulação de mercadorias é oportuno recapitularmos o conceito de mercadoria. O que é mercadoria? É diferente de um bem material, de um objeto? A palavra mercadoria tem origem latina. Vem de mercatura. Conforme Pedro Nunes, é “toda coisa móvel, corpórea ou incorpórea, apreciável e transmissível, capaz de constituir objeto de comércio ou de especulação: os frutos e produtos da natureza, em espécie ou manufaturados, títulos de crédito, marcas de fábrica etc.”. 3 Ao contrário do atual ICMS, o antigo ICM tributava somente a mercadoria como bem corpóreo. Agora, a energia elétrica é submetida à tributação pelo Estado por meio do ICMS. Entre um bem corpóreo, um objeto ou coisa e uma mercadoria não há diferença do ponto de vista substancial, apenas quanto à sua destinação. Um bem material, objeto ou coisa, uma vez destinado à venda, ou seja, submetido ao ato de mercancia, toma o nome de mercadoria. Uma caneta, por exemplo, é mercadoria para o lojista que a vendeu, mas é mera coisa ou objeto para mim que a adquiri para uso próprio. Daí o conceito de “operações relativas à circulação de mercadorias”, expressando sempre uma circulação jurídica, isto é, uma operação que implica transferência de propriedade ou de posse, como a compra e venda. Não prevaleceu na jurisprudência atual a doutrina do saudoso Rubens Gomes de Souza, relator da Comissão da Reforma Tributária, para quem o fato gerador do ICM é “a saída física da mercadoria de estabelecimento comercial, industrial ou produtor, sendo irrelevante o título jurídico de que tal saída decorra e bem assim o fato desse título envolver ou não uma transmissão de propriedade”. Esclarecia o eminente doutrinador que a saída física tributada é aquela que configura “uma etapa no processo de circulação de mercadoria, assim entendido o complexo das sucessivas transferências desta, desde o seu produtor, expressão que inclui o fabricante, e o importador, até o seu consumidor final”. 4 Na vigência da ordem constitucional antecedente, o STF chegou a sinalizar a compatibilidade da tese esposada por Rubens Gomes de Souza com o texto
constitucional então vigente, conforme se depreende da ementa a seguir transcrita: ICM. Saída de equipamentos (bombas, elevadores etc.) mediante comodato: não incidência. Motivação. II. A saída a que se refere a lei federal, ainda que o explicite o diploma local, “a qualquer título”, para permitir a incidência, é a que configura etapa do processo de circulação da mercadoria, integrando o complexo de sucessivas transferências desta, desde o produtor até o consumidor. III. Exegese do art. 24, II, da Constituição de 1967 e arts. 24, § 5.º, da vigente; 52, 54, 58 e 110 do CTN, frente ao art. 2.º da Lei Estadual n. 1 165/1966. Recurso conhecido e provido (RE 70538, Rel. Min. Thompson Flores, Tribunal Pleno, j. 24.03.1971, DJ 1.º.10.1971). Entretanto, o Supremo Tribunal Federal não chegou a firmar uma posição definitiva a respeito até que a questão de interpretação de norma infraconstitucional, como a envolvida na ementa retrorreferida, passou para a competência do Superior Tribunal de Justiça, que surgiu com o advento da Constituição de 1988. Apesar de o texto constitucional vigente não mais fazer referência a operações relativas à circulação de mercadorias realizadas por “produtores, industriais e comerciantes”, o caráter mercantil do imposto ficou evidenciado pela expressão “operações relativas à circulação de mercadorias”, isto é, só são relevantes juridicamente as operações que digam respeito à “circulação de mercadorias”, e não qualquer operação que implique, por exemplo, mero deslocamento físico da mercadoria. Circulação de algo objeto de comércio (mercadoria) só pode ser aquela que implica transferência de sua propriedade ou posse. Dizer que uma mercadoria circula quando se desloca de um lugar para outro de um estabelecimento comercial ou industrial do mesmo titular é o mesmo que afirmar que o dinheiro circula quando alguém muda esse dinheiro do bolso esquerdo para o seu bolso direito. No dizer de Edvaldo Brito: […] há de ser fato gerador do ICMS aquele acontecimento volitivo propulsor de uma operação mercantil que, em regra, é uma saída física de mercadoria de um estabelecimento comercial, industrial ou produtor, promovida, respectivamente, por uma pessoa que seja comerciante, industrial ou produtor com a intenção de passá-la à disposição de outra pessoa. A categoria, supraidentificada, decorre do conceito formulado pela norma constitucional que debuxa a hipótese desse fato gerador, dando ao seu elemento material a natureza de operação mercantil . Portanto, qualquer ato jurídico que não se enquadrar como tal categoria não operará os efeitos de fato gerador do ICMS .5 De fato, a partir do momento em que a Constituição qualificou a operação como aquela referente
à circulação de mercadorias que corresponde exatamente à operação de natureza mercantil, nenhum ato jurídico ou fato que expressar uma transação mercantil terá o condão de deflagrar o fato gerador do ICMS. Assim, padece do vício de inconstitucionalidade o inciso I do § 1.º do art. 2.º da Lei Complementar 87, de 13.09.1996, que elege como sujeito passivo do ICMS uma pessoa física não contribuinte habitual do imposto. O art. 4.º dessa Lei Complementar prescreve que “contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria…”. Alguns autores de renome enxergam inconstitucionalidade nesse dispositivo, porque somente o comerciante, o produtor ou o industrial pode ser contribuinte desse imposto de natureza mercantil. Não vislumbramos vício de inconstitucionalidade nesse art. 4.º, pois, se houver a habitualidade ou uma transação em volume incompatível com a condição de simples consumidor, estaremos diante de uma operação comercial praticada por quem não está legalmente habilitado mediante inscrição no registro de comércio. Não se podem tributar o comerciante regular e quem pratica atos de comércio sem estar devidamente autorizado na forma da lei. Na seara do Direito Tributário, a validade, invalidade, nulidade, anulabilidade ou mesmo um ato judicialmente anulado são irrelevantes por força do disposto no art. 118 do CTN: Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I – da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; II – dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos. Muitos doutrinadores de peso enxergam nesse dispositivo uma incompatibilidade com a norma do art. 116 do CTN que versa sobre o momento em que se tem por ocorrido o fato gerador, distinguindo a situação de fato (inciso I) da situação de direito (inciso II). Não encontramos no texto do art. 118 qualquer contradição em relação ao preceito do art. 116 do CTN. É preciso que se faça uma interpretação sistemática para bem alcançar o conteúdo da norma sob comento. Consoante já escrevemos: Os arts. 116 e 118 cuidam de coisas distintas. O primeiro versa sobre o plano de existência/validade da norma, ao passo que o segundo versa sobre o plano da eficácia ou da aplicação da norma. Ao comentarmos o art. 101 do CTN fizemos a distinção entre vigência e eficácia da norma, bem como sobre o plano de existência/validade da norma do plano de vigência da lei. Sustentamos que a lei declarada inconstitucional em caráter incidental, e não no exercício do controle concentrado de constitucionalidade, a decisão judicial surte efeito apenas intra partes, podendo aquela lei considerada inconstitucional continuar sendo aplicada em relação aos que não foram partes no processo. Somente a
Resolução do Senado Federal tem o condão de suspender a aplicação da lei considerada inconstitucional (art. 52, X, da CF). Significa que a decisão judicial não atingiu o plano de existência/validade da lei, nem alcançou o plano de vigência, mas apenas o plano da eficácia intra partes. Daí a insustentabilidade da posição dos doutrinadores clássicos para quem lei inconstitucional é ato ou lei inexistente que não produz qualquer efeito. Tanto produz que seus efeitos são modulados. E mais, o art. 118, de certa forma, compatibilizase, também, com o art. 109 do CTN que permite à legislação tributária conferir efeitos tributários distintos daqueles resultantes dos princípios gerais de direito privado utilizados para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas. Por isso, uma escritura pública de compra e venda devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente enseja a ocorrência do fato gerador do ITBI. Ulterior reconhecimento de sua nulidade nenhum efeito provoca na área do direito tributário. Outrossim, quando examinamos o art. 117 do CTN frisamos que o implemento da condição resolutiva é irrelevante para o direito tributário. Enfim, impõe-se uma interpretação sistemática do Código Tributário Nacional levando em conta o conjunto de suas normas.6 Entretanto, a tese da circulação jurídica a exigir transferência de propriedade como condição para a caracterização do fato gerador do ICMS sofreu um abalo com o advento da Emenda Constitucional 33/2001, que conferiu a seguinte redação à alínea “a”, do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF: IX – incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço. O texto original referia-se à incidência do imposto sobre a mercadoria importada do exterior, “ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento”. Tratava-se de mera incorporação na Constituição de 1988 do texto da EC 23/83, que surgiu como uma reação do Legislativo contra a jurisprudência do STF que firmara entendimento contra a tributação de bem de consumo ou aquele integrante do ativo fixo. As novas expressões mais amplas inseridas pela EC 33/2001 – “bem ou mercadoria”, “ainda que não seja contribuinte habitual do imposto” e “qualquer que seja a sua finalidade” – acabaram por balançar a firme jurisprudência do STF vigente. Até o advento da EC 33/2001 era tranquila a jurisprudência do STF quanto a não incidência do
ICMS nas operações de importação de bens por pessoas físicas ou jurídicas que não sejam contribuintes do imposto.7 Essa nova redação conferida à alínea a do inciso IX retrorreferido surgiu como uma nova reação do legislador Constituinte Derivado ao posicionamento adotado pela Corte Suprema acerca da não incidência do imposto sobre os bens importados para uso próprio. Contudo, após o advento da EC 33/2001, o STF passou a entender que a não incidência do ICMS sobre as operações de leasing previstas no inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96 não tem aplicação em relação ao leasing internacional, apesar de aquele texto normativo não fazer qualquer distinção conforme se pode verificar: Art. 3.º O imposto não incide sobre: […] VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário. No nosso entender, a EC 33/2001 ampliou o campo de incidência do ICMS nas importações, não mais limitadas a mercadorias , pelo que qualquer pessoa física ou jurídica que promova a importação de bens passa a ser contribuinte do ICMS, independentemente de haver ato de mercancia ou não, bastando a simples entrada de um bem a qualquer título. Essa reação afrontosa do legislador Constituinte Derivado, que, na realidade, infringe o princípio da separação dos poderes, gerou uma enorme discussão jurisprudencial, com reflexo na área de serviços especificados na lista nacional, que estão fora do campo de incidência do ICMS. O imposto estadual só pode incidir sobre a prestação do serviço de comunicação e dos serviços de transportes interestadual e intermunicipal, ainda que iniciados no exterior. Assim, surgiu no STF a tese de que o inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96 só tem aplicação no âmbito do leasing interno. Transcrevemos, para maior clareza, trecho do voto da Ministra Relatora, condutor da decisão majoritária: O exame desse dispositivo revela que, nessa circunstância, a imposição de ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. A Constituição Federal elegeu o elemento fático “entrada de mercadoria importada” como caracterizador da circulação jurídica da mercadoria ou do bem, e dispensa indagações acerca dos contornos do negócio jurídico realizado no exterior. Veja-se que, a par de incidir sobre “operações relativas a circulação de mercadorias”, fez o constituinte de 1988 constar do texto constitucional a expressa ressalva da incidência sobre a “entrada” do bem “importado” (RE 206.069, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ
1.º.09.2005). Interpretar o disposto na letra a do inciso IX do § 2.º de forma isolada, sem conexão com o caput do art. 155, inciso II, da CF, conduz à bitributação jurídica, pois a entrada do bem importado configura fato gerador do imposto de importação (art. 19 do CTN), conforme sustentado pela Ministra Denise Arruda em sua decisão monocrática: […] Não há circulação de mercadoria no caso de bem adquirido em operação de arrendamento mercantil. Destarte, o disposto no art. 3.º, inciso VIII, da LC 87/96 não faz qualquer restrição para a não incidência do ICMS sobre se o bem arrendado provém ou não do exterior. Deveras, a única diferença é que o bem adquirido do exterior, em regra, subsumese ao imposto de importação, cuja finalidade extrafiscal traça uma linha divisória com o ICMS (REsp 622.283/SP, Rel. Min. Denise Arruda, j. 15.03.2006). E mais, o leasing nacional ou internacional, pouco importa, só se sujeita à incidência do ISS, pois a Constituição vigente não ressalvou a bitributação jurídica nesse particular, a exemplo do que havia feito originalmente em relação à venda a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel inserido tanto na competência tributária do Estado (ICMS) como na competência tributária do município (IVV). Hoje, não há mais possibilidade de qualquer bitributação jurídica. O leasing internacional sujeita-se apenas ao ISS nos termos do art. 1.º, § 1.º; da LC 116/2003, e item 15.09 da lista anexa c.c. o art. 156, III, da CF. Nesse sentido é a jurisprudência do STJ, que editou a Súmula 138, segundo a qual incide o ISS. Outrossim, existem decisões afastando a incidência do ICMS especificamente sobre as operações de leasing internacional.8 O Supremo Tribunal Federal também reviu o seu posicionamento anterior, passando a sustentar que não incide o ICMS na importação de aeronave e/ou peças ou equipamentos de aeronaves sob o regime de leasing , porque esse regime não implica posterior transferência do domínio ao arrendatário, e a circulação de mercadoria é pressuposto da incidência do ICMS, conforme ementa a seguir: Recurso extraordinário. ICMS. Não incidência. Entrada de mercadoria importada do exterior. Art. 155, II, da CB. Leasing de aeronaves e/ou peças ou equipamentos de aeronaves. Operação de arrendamento mercantil. 1. A importação de aeronaves e/ou peças ou equipamentos que as componham em regime de leasing não admite posterior transferência ao domínio do arrendatário. 2. A circulação de mercadoria é pressuposto de incidência do ICMS. O imposto – diz o artigo 155, II, da Constituição do Brasil – é sobre “operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior”. 3. Não há operação relativa à circulação de mercadoria sujeita à incidência do ICMS em operação de arrendamento mercantil contratado pela indústria aeronáutica de grande porte para viabilizar o uso, pelas companhias de navegação aérea, de aeronaves por ela construídas. 4. Recurso extraordinário do Estado de São Paulo a que se nega provimento e recurso extraordinário de TAM – Linhas Aéreas S.A. que se julga prejudicado (RE 461968, Rel. Min. Eros Grau, DJe 087, 24.08.2007, e DJ 24.08.2007). A nosso ver, o legislador Constituinte Derivado, ao promulgar a EC 33/2001, não instituiu, nem pretendeu fazê-lo, a bitributação jurídica (ICMS/II ou ICMS/ISS). Visou, tão somente, esvaziar a tese da não incidência do ICMS na importação de bens. Ocorre que, mesmo após a reversão da tese da tributação do leasing internacional pelo ICMS, o que se deu no julgamento do RE 461.968, DJe 24.08.2007, a discussão em torno da nova redação conferida à letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF continuou sustentando que a imposição do ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. Em outras palavras, a circulação jurídica, assim entendida como operação que implique transferência de propriedade, é irrelevante para fins de tributação do ICMS com base na nova redação conferida pela EC 33/2001. Para bem diferenciar antes e depois da emenda, o STF editou a Súmula 660 nos seguintes termos: Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. De fato, nada impede de o legislador Constituinte Derivado criar um quarto imposto estadual com o nome de ICMS, porém diferente daquele previsto no inciso II do art. 155 da CF, ou com qualquer outro nome, como “ICMS incidente sobre bens importados do exterior”, na esteira do que ocorreu com o PIS/Pasep-importação e Cofins-importação. O que o legislador Constituinte Derivado não pode é lançar a confusão sustentando que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF não precisa expressar circulação de mercadorias. Ora, dizer que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF (circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior) incide também na entrada de bem ou mercadorias importados do exterior, independentemente de sua finalidade, é o mesmo que afirmar que aquele ICMS não se caracteriza pela circulação jurídica, transformando-o em um autêntico imposto sobre transporte ou de deslocamento físico da mercadoria.
Se se tratar de ICMS referido no inciso II do art. 155, não se pode desconsiderar o aspecto da circulação jurídica a exigir transferência de propriedade, o que não acontece com o leasing internacional que, como o dissemos, caracteriza o fato gerador do ISS, e não do ICMS, ainda que haja a previsão de opção de compra e venda, que é elemento estrutural do leasing financeiro. De fato, o leasing financeiro, por expressa disposição legal (Lei 6.099/74 com as alterações de Lei 7.132/83 e Resolução 2.309/96 do Banco Central), pressupõe a existência de tríplice opção conferida ao arrendatário: (a) devolver o bem arrendado ao arrendador no final do prazo contratual; (b) prorrogar o contrato de arrendamento ao final do prazo pactuado; (c) exercer a opção de compra ao final do prazo contratual. Se faltar a cláusula de opção de compra pelo valor residual garantido, não se tratará de leasing financeiro. Logo, exercida a opção de compra, que faz parte integrante e indissociável do leasing financeiro ensejador da incidência do ISS, não poderá haver incidência do ICMS à sombra do obscuro art. 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/96, que invadiu a competência impositiva municipal, estendendo o campo da incidência do ICMS para além dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Ademais, quando o arrendatário exercer a opção de compra, necessariamente no final do prazo de arrendamento mercantil, não mais haverá mercadoria a ser vendida, como bem asseverou o ulgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,9 nem base de cálculo do ICMS porque o valor residual já foi pago de forma parcelada com as prestações mensais a cargo do arrendatário. A Súmula 263 do STJ foi cancelada posteriormente pela Corte Especial que passou a entender que o valor residual pode ser pago no decorrer do contrato de leasing , sem que implique operação de compra e venda a descaracterizar o leasing , uma vez que a Resolução 2.309/96 do Banco Central permite tal faculdade. Como assevera José Eduardo Soarez de Melo, “considerando que a LC 116/03 reiterou a incidência do ISS sobre o leasing (item 15.09), sem nenhuma ressalva de incidência do ICMS, podese entender que restaria prejudicado o preceito da LC 87/96 (art. 3.º, VIII), que dispusera sobre a tributação estadual”.10 No julgamento do RE 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, em que foi reconhecida a existência de repercussão geral da matéria constitucional debatida, o STF encerrou definitivamente a controvérsia, decidindo, por maioria de votos, vencidos o Ministro Relator e o Ministro Teori Zavascki, que não há incidência do ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, nos termos da ementa a seguir: Recurso extraordinário. Constitucional e tributário. ICMS. Entrada de mercadoria importada do exterior. Art. 155, II, CF/88. Operação de arrendamento mercantil
internacional. Não incidência. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 1. O ICMS tem fundamento no art. 155, II, da CF/88, e incide sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. 2. A alínea “a” do inciso IX do § 2.º do art. 155 da Constituição Federal, na redação da EC 33/2001, faz incidir o ICMS na entrada de bem ou mercadoria importados do exterior, somente se de fato houver circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda). 3. Precedente: RE 461968, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 30.05.2007, DJe 23.08.2007, onde restou assentado que o imposto não é sobre a entrada de bem ou mercadoria importada, senão sobre essas entradas desde que elas sejam atinentes a operações relativas à circulação desses mesmos bens ou mercadorias. 4. Deveras, não incide o ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, salvo na hipótese de antecipação da opção de compra, quando configurada a transferência da titularidade do bem. Consectariamente, se não houver aquisição de mercadoria, mas mera posse decorrente do arrendamento, não se pode cogitar de circulação econômica. 5. In casu, nos termos do acórdão recorrido, o contrato de arrendamento mercantil internacional trata de bem suscetível de devolução, sem opção de compra. 6. Os conceitos de direito privado não podem ser desnaturados pelo direito tributário, na forma do art. 110 do CTN, à luz da interpretação conjunta do art. 146, III, combinado com o art. 155, inciso II e § 2.º, IX, “a”, da CF/88. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento (RE 540.829/SP-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 16.06.2015). À primeira vista, parece impressionante a tese sustentada pelo eminente Ministro Relator Gilmar Mendes, segundo o qual: O ICMS não pode ser visto, atualmente, como um imposto incidente apenas sobre operações mercantis e alguns serviços, mas também como um imposto que incide sobre importações. Poder-se-ia ter-lhe conferido nova denominação, mas o Constituinte Derivado optou por manter a tradicional nomenclatura. Em tese, está correto o eminente Ministro. Certamente, nada impede de o Constituinte Derivado prever a instituição de um quarto imposto para os Estados, pois o princípio da não bitributação urídica é um princípio implícito que decorre da discriminação constitucional de impostos. Isso aconteceu em relação ao PIS/Pasep-importação e a Cofins-importação em que a EC 42/2003 acrescentou o inciso IV ao art. 195 da CF, prevendo a contribuição “do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar”. Com fundamento nesse inciso IV do art. 195 da CF, a União instituiu o PIS/Pasep-importação e a
Cofins-importação pela MP 164, de 29.01.2004 convolada na Lei 10.865/2004 com pequenas alterações. Nos termos do art. 3.º dessa Lei, essas contribuições não incidem sobre a totalidade da receita bruta do contribuinte, como ao PIS/Pasep e Cofins tradicionais, mas apenas sobre a “entrada de bens estrangeiros no território nacional ou o pagamento, o crédito, a entrega, o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no exterior como contra prestação do serviço prestado”. Uma coisa é a faculdade de o Constituinte Derivado alargar o rol de impostos conferidos privativamente a cada entidade política, que não se confunde com o exercício da competência tributária residual conferida apenas à União, com as limitações predeterminadas (art. 154 da CF), e outra coisa bem diversa é o Constituinte Derivado conferir competência tributária privativa para o Estado instituir determinado imposto, no caso, o ICMS, com as características previstas no inciso II do art. 155 e ao mesmo tempo pelo seu § 2.º descaracterizar o ICMS previsto no caput , fazendo incidir o aludido imposto sobre mera entrada de bens ou mercadoria sem que haja “operação relativa à circulação de mercadorias” que na interpretação do STF implica operação de compra e venda, ou seja, circulação jurídica. Alterando o elemento nuclear ou material do fato gerador do ICMS – circulação jurídica –, esse imposto deixará de ser aquele referido no inciso II do art. 155 da CF, pouco importando a denominação mantida. ICMS sem circulação jurídica não é aquele ICMS previsto no caput do art. 155 da CF. Como imposto novo, não poderá prescindir de lei ordinária que o institua, definindo o respectivo fato gerador como “a entrada de bens ou mercadorias importados do exterior por pessoa física ou jurídica”. E não poderá incluir a operação de arrendamento mercantil procedente do exterior, sob pena de invadir a esfera de competência do Município. Além disso, cabe à lei complementar proceder à definição prévia do fato gerador de impostos previstos na Constituição (art. 146, III, “a”, da CF). Por tudo isso, entendemos que o STF deu a única interpretação possível ao disposto na letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF, exigindo a circulação jurídica do bem ou mercadoria importada do exterior como condição da incidência do ICMS previsto no caput do art. 155 da CF. Confiante nessa tese, em 27.05.2004, ajuizamos a favor de um cliente, contra a Fazenda do Estado de São Paulo, ação declaratória de inexigibilidade de crédito tributário pago pelo regime de parcelamento, cumulada com a ação de repetição (Proc. 583.53.2004.016797-2), julgada procedente, reconhecendo a nulidade do pedido de parcelamento e ordenando a restituição do ICMS pago. Entretanto, o TJSP reformou essa escorreita decisão monocrática, julgando a ação improcedente. Interposto o recurso especial perante o STJ, o recurso foi provido restabelecendo-se na íntegra a decisão de primeira instância (REsp 1.34895/SP). A Fazenda do Estado ingressou com o recurso extraordinário contra a decisão proferida pelo STJ. Entretanto, o STJ sobrestou o andamento do recurso extraordinário tendo em vista que o STF reconheceu a existência de repercussão geral no RE
540.829/SP. No julgamento final, o Colendo STF, contra votos dos Ministros Gilmar Mendes e Teori Zavascki, acolheu a tese de não incidência do imposto no leasing internacional, porque mera entrada de bem importado do exterior sem que haja circulação jurídica não caracteriza o ICMS previsto no inciso II do art. 155 da CF. Com a decisão final do STF em sede de repercussão geral, restou prejudicado o recurso extraordinário da Fazenda.
2.1.2
Conceito de prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal
Esse tema não oferece maiores dificuldades. Basta se lembrar do caráter mercantil do imposto para colocar a salvo de tributação o transporte de carga própria, como decidiu reiteradamente o STF à época em que o imposto sobre o serviço de transporte era da competência da União. Não há razão para alterar aquele entendimento consagrado pela Corte Suprema só pelo fato de a competência impositiva ter se deslocado para o âmbito dos Estados. Só é preciso considerar que são tributáveis apenas e tão somente os serviços de transporte interestadual e intermunicipal, ainda que esses serviços tenham se iniciado no exterior. Demais serviços e também os de transporte intramunicipal são de competência tributária dos Municípios. Logo, o valor dos serviços tributados pelos Municípios não pode integrar a base de cálculo do ICMS. Nesse sentido, preleciona Hugo de Brito Machado: “Daí ser inadmissível a inclusão, mesmo através de lei complementar, do valor de determinados serviços na base de cálculo do ICMS”. 11 Assinale-se, contudo, desde logo, que a letra b, inciso IX, do § 2.º, do art. 155 da CF ressalva a tributação do valor total da operação quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos municípios, como veremos quando comentarmos as diversas alíneas do citado inciso IX. Outra observação que se impõe de início é a de que os serviços de transportes interestaduais e intermunicipais não mereceram uma regulamentação específica pela Lei Complementar 87/96, de sorte a possibilitar a aplicação das alíquotas interestaduais e a aplicação do princípio da não cumulatividade que pressupõe destaque do ICMS a ser compensado nas operações subsequentes. Voltaremos ao exame dessa questão quando tratarmos dos dispositivos da Lei Complementar 87/96.
2.1.3
Conceito de prestação do serviço de comunicação
Antes examinarmos propriamente o conceito de comunicação, é conveniente fazermos uma prévia delimitação do campo de abrangência do imposto sobre comunicação nos termos desenhados
pela Constituição que abarca toda a comunicação operada no âmbito do território estadual.
2.1.3.1
Campo de tributação do serviço de comunicação pelo ICMS
A Constituição Federal dispõe, de forma expressa, no art. 155, inciso II, que compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre “operações relativas à circulação de mercadoria e sobre prestações de serviços de transporte, interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior ”. Por sua vez, dispõe o art. 156, inciso III, da CF que compete aos Municípios instituir impostos sobre “serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II , delimitados em lei complementar”. Resulta da conjugação dos dois textos constitucionais que ao Estado-membro cabe instituir o ICMS sobre os serviços de transportes interestadual e intermunicipal e de comunicação. Ao Município ficou reservada a competência impositiva em relação ao transporte intramunicipal, como vimos. O mesmo não aconteceu em relação ao serviço de comunicação. Os textos constitucionais fixaram a competência impositiva do Estado-membro e do Município com lapidar clareza, de modo a não possibilitar o levantamento de qualquer dúvida a respeito, que pudesse interferir na discriminação constitucional de rendas tributárias. Entretanto, está surgindo, aos poucos, a estranha doutrina sustentando tratar-se de erro técnico do legislador constituinte o fato de não ter ressalvado da competência estadual o serviço de comunicação local, isto é, a comunicação intramunicipal, porque o serviço estaria sendo prestado dentro dos limites municipais. Asseveram os defensores dessa tese que o problema poderia ser contornado com a interpretação sistemática da Constituição Federal, levando em conta a autonomia municipal. Anteriormente ao advento da Lei Complementar 116/2003, que rege o ISS em âmbito nacional, argumentavam que o item 98 da lista anexa à Lei Complementar 56/87 definia a competência municipal nas “comunicações telefônicas de um aparelho para outro aparelho dentro do mesmo município”. No entanto, a Lei Complementar 56/87 foi sancionada à época de vigência da Constituição Federal de 1967/1969 que não cuidava da tributação de serviços pelos Estados. De fato, prescrevia o art. 23, inciso II, da Emenda 1/69: Art. 23. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: […] II – operações relativas à circulação de mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes, impostos que não serão cumulativos e dos quais se abaterá, nos termos do
disposto em lei complementar, o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado. A Constituição de 1988 inovou na questão da partilha da competência tributária. Inseriu na competência impositiva dos Estados os serviços que menciona e aqueles não especificados na lista de serviços cabentes aos municípios (art. 155, § 2.º, IX, “b”, da CF). A interpretação sistemática da Constituição Federal de 1988 leva exatamente à conclusão oposta. A partilha tributária é uma questão essencialmente política. O legislador constituinte é absolutamente livre para deferir a essa ou àquela entidade política esse ou aquele imposto. A Assembleia Nacional Constituinte é soberana para decidir a respeito. O imposto sobre transmissão de bens imóveis e de direitos a ele relativos, por exemplo, já esteve na competência municipal; depois, passou para a competência do Estado-membro; agora, pela Carta Política de 1988, esse imposto foi desmembrado, ficando uma parte com o Estado-membro (art. 155, I) e outra parte para o Município (art. 156, II). A outorga de competência impositiva, por meio de espécie tributária chamada imposto, há de ser expressa, quer para evitar bitributação jurídica e prevenir conflitos de competência tributária, quer para resguardar o princípio federativo de convivência harmônica das entidades componentes da Federação brasileira. Tão importante o princípio constitucional da discriminação de rendas tributárias, assegurador da autonomia político-administrativa dos entes federados, que o art. 110 do CTN prescreveu: Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. Logo, se o legislador competente utilizou a expressão serviços de comunicação para definir competência tributária do Estado-membro, não há como tentar adjetivar aquela expressão (serviços de comunicação intermunicipal ou interestadual) para diminuir a competência estadual e ampliar a competência municipal, incorrendo em dupla inconstitucionalidade. Nenhuma norma constitucional pode ser interpretada de forma a esvaziar, total ou parcialmente, o conteúdo de outra norma constitucional. Não há nem pode existir competência implícita para instituir determinado imposto. Por isso, assinalamos no nosso livro que o item 98 da lista anexa à LC 56/87 não foi recepcionado pela Constituição de 1988.12 Ademais, pretender interpretar o texto constitucional a partir de legislação infraconstitucional equivaleria à subversão completa da hierarquia de leis. É o
item de serviço, previsto na lei complementar, que deve ser interpretado de conformidade com o texto constitucional superveniente. Nunca o contrário. Na precisa lição de José Eduardo Soares de Melo: A Lei Complementar não pode, de nenhum modo, conter disposição em sentido diverso do preceituado pela Constituição, face o princípio da supremacia desta e o sistema escalonado de normas. Objetiva explicitar a norma constitucional, caracterizando-se como lei nacional que fundamenta, inspira e permeia as legislações (federal, estadual e municipal), não possuindo efetivo caráter inovatório, mas meramente regulatório, tornando os comandos constitucionais claros, práticos e operacionais. 13 Ante o exposto, não há como pretender excluir da incidência do ICMS a prestação de serviço de comunicação, tal qual decorre da outorga constitucional. Irrelevante o fato de que a comunicação local não extravasa os limites de um município, pois o critério adotado pelo legislador constituinte foi outro. Ademais, não se pode negar que esse serviço de comunicação ocorre no território do Estado-membro, que abarca os territórios municipais. Entender de outra forma, data venia, é enxergar um problema que não existe no texto constitucional.
2.1.3.2
O conteúdo do serviço de comunicação
O conteúdo do serviço de comunicação está definido no art. 60 da Lei 9.472, de 16.07.1997, da mesma forma que o seu art. 61 define o conteúdo do serviço de valor adicionado, in verbis: Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. § 1.º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. § 2.º Estação de telecomunicações é o conjunto de equipamentos ou aparelhos, dispositivos e demais meios necessários à realização de telecomunicação, seus acessórios e periféricos, e, quando for o caso, as instalações que os abrigam e complementam, inclusive terminais portáteis. Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de
informações. § 1.º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição. § 2.º É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações. Os dispositivos legais retrotranscritos são de uma clareza lapidar, não restando quaisquer dúvidas a respeito do serviço de comunicação, que pressupõe um prestador do serviço e um tomador desse serviço. Não se confunde a prestação de serviço de comunicação, objeto de tributação pelo ICMS, com o ato de estabelecer uma comunicação que está fora do campo de incidência de qualquer imposto, ICMS ou ISS, porque essa comunicação não se reveste de caráter mercantil. Comunicar-se por telefone, por e-mail ou verbalmente não gera efeito tributário algum. Fazer comunicação é bem diferente de prestar serviço de comunicação. Na comunicação telefônica entre duas pessoas não há prestação do serviço de comunicação, isto é, não há um prestador de serviço e um tomador de serviço que caracterizam o serviço tributável. Anteriormente ao advento da Lei Complementar 116/2003, no que diz respeito aos serviços de informática, só eram tributadas as atividades de programação e de processamento de dados. No dizer de Mikhailov, citado por Alexandre Freire Pimentel, informática […] é a disciplina científica que investiga a estrutura e a propriedade das informações científicas, bem como as regularidades da informação científica, sua teoria, história, metodologia e organização. O objetivo da informática consiste em desenvolver métodos e meios ótimos de apresentação (registro), coleção, processamento analítico-sintético, armazenamento, recuperação e disseminação da informação científica. 14 Hoje, a lista anexa na nova lei de regência nacional do ISS prevê oito tipos de serviços que se enquadram no conceito de informática traduzindo uma obrigação de fazer (itens 1.01 a 1.08). Sabe-se que, na ausência de normas expressas para tributar todos os serviços de informática, os Estados -membros vinham tentando cobrar o ICMS dos provedores de acesso à Internet, como se o não exercício da competência tributária por uma entidade política legitimada pelo texto constitucional pudesse implicar o exercício dessa competência por um outro ente político não legitimado pela Constituição. Ora, o provedor de acesso não se caracteriza como prestador do serviço de comunicação limitando-se a permitir ao usuário navegar pelos sites da Internet recebendo imagens, mensagens,
informações do transmissor ( site visitado) valendo-se da rede de comunicações operada por concessionárias dos serviços de comunicação. Por isso, os provedores de acesso não precisam de concessão do governo federal para atuar. O que o provedor de acesso faz limita-se a prestar um serviço de valor adicionado nos termos do art. 61, § 1.º, da Lei 9.472/97. Entretanto, a discussão jurisprudencial perdurou por um longo tempo, até que o Superior Tribunal de Justiça, por maioria de votos, pacificou o entendimento de sua primeira sessão, afirmando a tese da não incidência do ICMS, conforme ementa a seguir: Embargos de divergência. Recurso especial. Tributário. Serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet. Artigos 155, II, da Constituição Federal, e 2.º, II, da LC n. 87/96. Serviço de valor adicionado. Artigo 61 da Lei n. 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações). Norma n. 004/95 do Ministério das Comunicações. Proposta de regulamento para o uso de serviços e redes de telecomunicações no acesso a serviços Internet, da Anatel. Artigo 21, XI, da Constituição Federal. Não incidência de ICMS. Da leitura dos artigos 155, inciso II, da Constituição Federal, e 2.º, inciso III, da Lei Complementar n. 87/96, verifica-se que cabe aos Estados e ao Distrito Federal tributar a prestação onerosa de serviços de comunicação. Dessa forma, o serviço que não for prestado de forma onerosa e que não for considerado pela legislação pertinente como serviço de comunicação não pode sofrer a incidência de ICMS, em respeito ao princípio da estrita legalidade tributária. Segundo informações da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel, “a Internet é um conjunto de redes e computadores que se interligam em nível mundial, por meio de redes e serviços de telecomunicações, utilizando no seu processo de comunicação protocolos padronizados. Os usuários têm acesso ao ambiente Internet por meio de Provedores de Acesso a Serviços Internet. O acesso aos provedores pode se dar utilizando serviços de telecomunicações dedicados a esse fim ou fazendo uso de outros serviços de telecomunicações, como o Serviço Telefônico Fixo Comutado” (“Acesso a Serviços Internet”, Resultado da Consulta Pública 372 – Anatel). A Proposta de Regulamento para o Uso de Serviços e Redes de Telecomunicações no Acesso a Serviços Internet, da Anatel, define, em seu artigo 4.º, como Provedor de Acesso a Serviços Internet – PASI, “o conjunto de atividades que permite, dentre outras utilidades, a autenticação ou reconhecimento de um usuário para acesso a Serviços Internet”. Em seu artigo 6.º determina, ainda, que “o Provimento de Acesso a Serviços Internet não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor e seus clientes como usuários dos serviços de telecomunicações que lhe dá suporte”.
Por outro lado, a Lei Federal n. 9.472/97, denominada Lei Geral de Telecomunicações, LGT, no § 1.º de seu artigo 61, dispõe que o serviço de valor adicionado “não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição”. O caput do mencionado artigo define o referido serviço como “a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações”. O serviço prestado pelo provedor de acesso à Internet não se caracteriza como serviço de telecomunicação, porque não necessita de autorização, permissão ou concessão da União, conforme determina o artigo 21, XI, da Constituição Federal. Não oferece, tampouco, prestações onerosas de serviços de comunicação (art. 2.º, III, da LC n. 87/96), de forma a incidir o ICMS, porque não fornece as condições e meios para que a comunicação ocorra, sendo um simples usuário dos serviços prestados pelas empresas de telecomunicações. Na lição de Kiyoshi Harada, “o provedor de acesso à internet libera espaço virtual para comunicação entre duas pessoas, porém quem presta o serviço de comunicação é a concessionária de serviços de telecomunicações, já tributada pelo ICMS. O provedor é tomador de serviços prestados pelas concessionárias. Limita-se a executar serviço de valor adicionado, isto é, serviços de monitoramento do acesso do usuário à rede, colocando à sua disposição equipamentos e softwares com vistas à eficiente navegação”. O serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet cuida, portanto, de mero serviço de valor adicionado, uma vez que o prestador se utiliza da rede de telecomunicações que lhe dá suporte para viabilizar o acesso do usuário final à Internet, por meio de uma linha telefônica. Conforme pontifica Sacha Calmon, “o serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet é um Serviço de Valor Adicionado, não se enquadrando como serviço de comunicação, tampouco serviço de telecomunicação. Este serviço apenas oferece aos provedores de Acesso à Internet o suporte necessário para que o Serviço de Valor Adicionado seja prestado, ou seja, o primeiro é um dos componentes no processo de produção do último”. Nessa vereda, o insigne Ministro Peçanha Martins, ao proferir voto-vista no julgamento do recurso especial embargado, sustentou que a provedoria via Internet é serviço de valor adicionado, pois “acrescenta informações através das telecomunicações. A chamada comunicação eletrônica, entre computadores, somente ocorre através das chamadas linhas telefônicas de qualquer natureza, ou seja, a cabo ou via satélite. Sem a via telefônica
impossível obter acesso à Internet. Cuida-se, pois, de um serviço adicionado às telecomunicações, como definiu o legislador. O provedor é usuário do serviço de telecomunicações. Assim o diz a lei”. Conclui-se, portanto, que, nos termos do artigo 110 do Código Tributário Nacional, não podem os Estados ou o Distrito Federal alterar a definição, o conteúdo e o alcance do conceito de prestação de serviços de conexão à Internet, para, mediante Convênios Estaduais, tributá-la por meio do ICMS. Como a prestação de serviços de conexão à Internet não cuida de prestação onerosa de serviços de comunicação ou de serviços de telecomunicação, mas de serviços de valor adicionado, em face dos princípios da legalidade e da tipicidade fechada, inerentes ao ramo do direito tributário, deve ser afastada a aplicação do ICMS pela inexistência na espécie do fato imponível. Segundo salientou a douta Ministra Eliana Calmon, quando do julgamento do recurso especial ora embargado, “independentemente de haver entre o usuário e o provedor ato negocial, a tipicidade fechada do Direito Tributário não permite a incidência do ICMS. Embargos de Divergência improvidos (EREsp 456650/PR, Rel. Min. José Delgado, Rel. p/ Acórdão Min. Franciulli Netto, DJ 20.03.2006).
2.2
A NÃO CUMULATIVIDADE DO ICMS (ART. 155, § 2.º, I, DA CF)
2.2.1
Introdução
O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e Comunicação, conhecido pela sigla ICMS, previsto no art. 155, II, da CF de 1988 difere do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias, ICM, previsto na ordem constitucional antecedente, não só pela inclusão de serviços nominados na competência impositiva estadual, como também pela flexibilização do princípio da não cumulatividade do imposto em relação às hipóteses de isenção e de não incidência legalmente qualificada. Daí a necessidade de analisar a questão do crédito do imposto à luz da nova realidade constitucional com abandono da jurisprudência anterior e, também, de forma distinta em relação ao diferimento do imposto que não está abrangido pela regra constitucional de exceção ao princípio da não cumulatividade. É o que faremos a seguir.
2.2.1.1
Imposto de incidência monofásica e de incidência plurifásica
O ICMS classifica-se como imposto sobre o consumo à medida que tem como base os gastos e despesas incorridas pelos consumidores. A doutrina denomina esse tipo de imposto como forma de tributação indireta, porque o contribuinte repassa o valor do tributo pago ao consumidor, impropriamente chamado de contribuinte de fato. O imposto sobre consumo pode ser de incidência monofásica, isto é, ele é arrecadado no início do ciclo econômico ou no final do ciclo produtivo, ou seja, no momento do consumo final. Ele pode ser, também, de incidência plurifásica, à medida que pode incidir em todas as fases do ciclo econômico, desde a fonte produtora até o consumo final, como acontecia com o antigo Imposto sobre Vendas e Consignações (IVC) ocasionando o indesejável efeito de incidência em cascata. Esse imposto estruturado na Constituição de 1988 é de incidência plurifásica de caráter não cumulativo. De fato, o ICMS incide, de regra, em todas as etapas do ciclo produtivo, mas determinando a compensação do que for devido em cada operação de circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas operações anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou Distrito Federal. Com esse mecanismo de compensação, o legislador constituinte visou afastar o caráter regressivo do imposto (efeito cascata) privilegiando o aspecto da neutralidade tributária nas etapas de circulação de mercadorias e de prestação de serviços. A compensação do imposto cobrado no mesmo ou outro Estado demonstra a vocação nacional do ICMS. Entretanto, contrariando a praxe de outros países, o Brasil inseriu esse imposto de maior arrecadação no âmbito nacional na competência impositiva dos Estados, comprometendo a sua eficiência e trazendo inúmeros problemas de difícil solução, como a Guerra Fiscal entre os Estados, consoante veremos mais adiante.
2.2.1.2
Imposto não cumulativo pelo emprego do mecanismo de compensação difere do imposto sobre o valor agregado
O princípio da não cumulatividade do ICMS pelo mecanismo de compensação do que foi pago na operação, como previsto na Constituição Federal, afasta o conceito de imposto sobre o valor agregado em que a incidência do imposto ocorre apenas sobre o valor acrescido em cada operação. Entretanto, o resultado aritmético é idêntico em ambas as modalidades de tributação. No Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) o que se tributa não é o valor total da operação de circulação de mercadorias ou da prestação de serviços, como acontece com o nosso ICMS, mas somente o valor que o contribuinte agrega ao valor das mercadorias ou serviços, isto é, tributa-se tão só o valor
acrescido em cada etapa da circulação de bens materiais e imateriais. Um exemplo ajudará compreender melhor a diferença entre as duas modalidades de tributação. I – Na modalidade de tributação não cumulativa por compensação temos o seguinte: a) na primeira etapa de circulação, do produtor ao atacadista: mercadoria no valor de R$ 100,00 à alíquota de 18% resulta no imposto de R$ 18,00; b) na segunda etapa, do atacadista para varejista: mercadoria no valor de R$ 120,00 a alíquota de 18% resulta no imposto de R$ 21,60. Imposto a pagar = valor do “b” menos o valor do “a” = R$ 21,60 – R$ 18,00 = R$ 3,60, que é o valor do imposto a recolher; c) na terceira etapa, do varejista para o consumidor final: mercadoria no valor de R$ 150,00 à alíquota de 18% resulta no imposto de R$ 27,00. Imposto a pagar = valor do “c” menos o valor do “b” = R$ 27,00 – R$ 21,60 = R$ 5,40 que é o imposto a recolher. Total do imposto pago até o final do ciclo econômico = R$ 18,00 + R$ 3,60 + R$ 5,40 = R$ 27,00. II – Na modalidade de tributação pelo Valor Agregado a) na primeira etapa de circulação, do produtor ao atacadista: mercadoria no valor de R$ 100,00 à alíquota de 18% resulta no imposto de R$ 18,00 a ser recolhido; b) na segunda etapa de circulação, do atacadista para varejista: mercadoria no valor de R$ 120,00 incidindo a alíquota de 18% sobre o valor acrescido de R$ 20,00 resulta no imposto de R$ 3,60 a ser recolhido; c) na terceira etapa de circulação, do varejista para o consumidor final: mercadoria no valor de R$ 150,00 incidindo o imposto sobre o valor acrescido de R$ 30,00 à alíquota de 18% resulta no imposto no valor de R$ 5,40 a ser recolhido. Total do imposto pago até o final do ciclo econômico = R$ 18,00 + R$ 3,60 + R$ 5,40 = R$ 27,00. Como se verifica, o resultado financeiro do encargo tributário é idêntico nas duas modalidades de tributação: a não cumulativa que se obtém pelo mecanismo de compensação do imposto pago na operação anterior (ICMS) e aquela que resulta a incidência do imposto apenas sobre o valor
acrescido em cada etapa de circulação (IVA). Confrontando-se as duas modalidades do imposto do tipo plurifásico percebe-se uma nítida vantagem econômica do IVA sobre o ICMS. No IVA há um tratamento isonômico a todos os produtos, independentemente do maior ou menor ciclo de circulação das mercadorias, prevenindo-se contra a indesejável verticalização dos agentes econômicos. Além disso, a tributação pelo valor acrescido em cada operação permite a repartição do encargo financeiro do imposto por todo o ciclo de produção e circulação, desde a fonte produtora até o final consumo, resultando em uma tributação neutra à medida que propicia a faculdade de escolha dos consumidores e produtores. Isso acaba criando uma relação de interdependência entre os contribuintes, fazendo com que todos eles tenham maior interesse em escriturar corretamente as suas operações comerciais. Do ponto de vista jurídico, a legislação do IVA é simples e transparente, facilitando o trabalho da fiscalização e arrecadação e propiciando o fácil controle de evasão fiscal baseado em escrituração contábil fiscal levada a efeito sob a égide da interdependência e cooperação entre agentes econômicos na manutenção de um sistema de contabilização que reflita a realidade das operações efetivadas. O imposto não cumulativo pelo emprego do mecanismo de compensação do imposto pago na operação anterior, como o adotado em nosso país (ICMS), além de propiciar legislações infraconstitucionais complexas e dúbias, causa distorções econômicas que afetam o princípio da neutralidade fiscal.
2.2.1.3
A neutralidade fiscal
O que significa neutralidade fiscal? Significa a adoção de uma política fiscal que afasta o fenômeno da tributação como meio de interferir nas decisões dos agentes econômicos, ou pelo menos exercer o mínimo de influência possível, uma vez que a tributação, ainda que não planejada para surtir efeitos extrafiscais, sempre acaba por direcionar as atividades dos empresários. O que não é saudável para a economia sob o regime de iniciativa privada é o dirigismo fiscal. Há dois aspectos relevantes que devem ser observados no princípio da neutralidade fiscal: o da eficiência econômica, que tem como pressuposto a maior produtividade baseada nos mecanismos de mercado, sem qualquer interferência do poder público, refletido no princípio da livre concorrência; o segundo aspecto é o da equidade, que está relacionado ao direito legislado no sentido de não promover discriminação, nem restrição legal. Os incentivos fiscais para “vestir um santo e desvestir vários outros”, muito em voga entre nós, é afrontoso a esse princípio, acabando por comprometer o princípio da eficiência econômica. Uma isenção, por exemplo, no meio do ciclo de comercialização de mercadoria para favorecer este ou aquele setor da economia causa uma distorção econômica muito grande, à medida que acarreta a anulação e o estorno dos créditos de impostos referentes às etapas anteriores ao da isenção. O mesmo acontece com a substituição tributária, como veremos mais adiante. Advirta-se, no entanto, que as distorções decorrentes de incentivos fiscais generalizados
decorrem do desrespeito pelo legislador infraconstitucional de preceitos constitucionais voltados exatamente para preservar a neutralidade fiscal em situações específicas. Senão, vejamos: Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo. Art. 151. É vedado à União: I – instituir tributo que não seja uniforme em todo o Território Nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País. Lamentavelmente, o que se verifica na prática é a concessão ou a ampliação de incentivos fiscais diversos (isenções totais ou parciais, redução de base de cálculo, diminuição de alíquotas etc.) para favorecer regiões altamente desenvolvidas do ponto de vista socioeconômico e, também, aqueles que interferem no princípio da livre concorrência, pedra de toque o regime econômico da livre-iniciativa adotado pela Constituição (art. 170, caput e inciso IV). Esses incentivos fiscais, às vezes, outorgados de forma casuística ofendem o princípio da universalidade da tributação e o da generalidade da tributação. Todos os bens e serviços devem ser tributados, assim como todas as pessoas físicas e jurídicas com capacidade contributiva devem pagar tributos para atender ao princípio da isonomia. Onde todos pagam impostos, todos pagam pouco.
2.2.2
Natureza jurídica do crédito do imposto
A não cumulatividade do ICMS, que no entender do Supremo Tribunal Federal é uma mera técnica de tributação, consiste na compensação do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou Distrito Federal. Efetivamente em relação ao imposto previsto no inciso II do art. 155 da CF, ICMS, dispõe o inciso I do § 2.º do referido artigo: I – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.
O imposto é apurado pelo confronto entre aquele creditado na entrada de mercadoria ou prestação de serviço e aquele devido pela saída de mercadorias ou prestação de serviços dentro de determinado período. A diferença a maior representa o imposto a ser pago nesse período e a diferença a menor constitui crédito a ser transferido para o período seguinte. Não há vinculação entre a mercadoria que ingressou no estabelecimento do contribuinte e aquela que saiu do mesmo estabelecimento. A compensação do imposto ocorre entre o imposto creditado pela entrada de determinada mercadoria e o imposto resultante da saída dela ou de outra mercadoria, ou da prestação de serviço de comunicação ou de transporte interestadual ou intermunicipal. Logo, o crédito do imposto é de natureza financeira e não física, isto é, o confronto em determinado período para apuração do valor devido se faz imposto sobre imposto, e não base sobre a base, como no PIS/Cofins não cumulativo. Disso decorre que é inconstitucional a vedação de crédito do imposto incidente na entrada de bens para compor o ativo fixo da empresa, assim como a sua sujeição a um determinado prazo de carência, ou a possibilidade de sua compensação apenas de forma parcelada, mensalmente, dentro de determinado período prefixado, como prescreve a legislação infraconstitucional. É irrelevante saber se um bem adquirido para integrar o ativo fixo de uma empresa caracteriza ou não uma mercadoria, ou seja, um bem objeto de comercialização, vale dizer, alvo de circulação. O que é relevante juridicamente é o fato de que o imposto, por expressa determinação constitucional, a partir da Emenda Passos Porto, incorporada no texto da Constituição de 1988, passou a incidir sobre a aquisição de bens para integrar o ativo fixo. Relevante juridicamente é o fato de que o bem adquirido sujeitou-se à incidência do imposto, o que assegura, ipso facto, a apropriação integral do crédito a ser compensado no mês de competência. Observe-se que a Constituição Federal não fez qualquer restrição à utilização do crédito do imposto resultante dessa aquisição, como ocorreu em relação às hipóteses de isenção e de não incidência expressa. Finalmente, esclareça-se que a expressão “montante cobrado” não significa imposto efetivamente recolhido, mas simplesmente imposto incidente na operação de circulação, ou seja, imposto destacado na nota fiscal. Quanto a isso, doutrina e jurisprudência são unânimes desde o início da implantação do ICM, hoje, ICMS. Aliás, o adquirente da mercadoria ou tomador do serviço não teria condições de saber se o vendedor ou o prestador de serviço recolheu ou não ao erário o imposto incidente sobre a circulação de mercadoria ou do serviço.
2.2.3
Flexibilização do princípio da não cumulatividade
O princípio da não cumulatividade não é absoluto. Aliás, em termos de direito nada é absoluto.
Nos termos do inciso II do § 2.º do art. 155 da CF: II – a isenção e a não incidência, salvo determinação em contrário da legislação: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores. O texto constitucional refere-se à isenção e à não incidência, mas nenhuma restrição fez no tocante ao diferimento do imposto, pelo que a questão do direito a crédito do imposto deverá merecer exame de forma diferente para cada instituto ou categoria jurídica, como faremos nos tópicos seguintes. Importante ter em mente que essa restrição constitucional não figurava na ordem constitucional antecedente, razão pela qual durante a sua vigência houve intermináveis discussões acerca do direito a crédito nessas duas hipóteses supramencionadas, bem como na hipótese de diferimento do imposto.
2.3
EFEITOS DA ISENÇÃO E DA NÃO INCIDÊNCIA (ART. 155, § 2.º, II, DA CF) O inciso II do § 2.º do art. 155 da CF prescreve: § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] II – a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação: a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores. Antes de mais nada, convém conceituar essas categorias jurídicas referidas no inciso II.
A isenção, como dispensa do pagamento do tributo devido, segundo proclamação da doutrina clássica, apesar do disposto no inciso I do art. 175 do CTN e da aceitação desse conceito pelo STF, vem sendo duramente criticada pelos defensores da moderna teoria do Direito Tributário, segundo a qual a norma jurídica definidora da isenção implica, ipso facto, restrição da norma jurídica definidora do fato gerador da obrigação tributária. Em outras palavras, as situações abstratamente
descritas na hipótese de isenção são aquelas excluídas das situações abstratas descritas na hipótese de incidência tributária. A não incidência pura é o fato de o objeto não estar abrangido pelo campo de tributação delimitado pela norma jurídica definidora da hipótese de incidência tributária. a não incidência legalmente qualificada equivale excluir determinadas situações descritas do campo de tributação abrangido pela norma que define o fato gerador da obrigação tributária. Dito de outra forma, a não incidência expressa significa exclusão, por declarada determinação legal, de certas situações do campo abrangido pela norma definidora da hipótese de incidência tributária. Do exposto, resulta que a isenção e a não incidência surtem o mesmo efeito, isto é, não há surgimento da obrigação tributária excluída de antemão pela norma isentiva ou pela norma de não incidência. Nas duas hipóteses não há ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Daí o mesmo tratamento dado pela Constituição Federal a ambas as categorias jurídicas. Na isenção e na não incidência o direito a crédito do ICMS depende do que dispuser a legislação tributária. Não cabe ao contribuinte ou responsável tributário pleitear o direito de crédito contra a lei de cada Estado, invocando o princípio da não cumulatividade, que sofreu restrições de natureza constitucional, como se verifica da transcrição retro do inciso II. Uma isenção ou uma não incidência expressa, tratando-se de modalidade de imposto não cumulativo de incidência plurifásica, só surtirá benefício ao contribuinte se outorgada no início ou no final da etapa de circulação. Se conferida no meio desse ciclo de comercialização, por exemplo, na terceira etapa, haverá um efeito contrário ao esperado pela isenção. O contribuinte da etapa seguinte não fará jus ao crédito do imposto, que simplesmente deixou de ser destacado na nota fiscal, e ainda terá que “estornar” os créditos referentes a todas as etapas que antecederam a isenção ou a não incidência. E esse “estorno” é automático, decorrendo da simples não escrituração do crédito na entrada da mercadoria isenta. Melhor explicando, o imposto que deixou de ser destacado na operação isenta, no caso, na terceira etapa do ciclo de comercialização, corresponde àquele que vinha se acumulando desde a primeira operação de circulação de mercadoria até a operação de saída isenta. Não fosse a regra constitucional que determina a anulação do “crédito relativo às operações anteriores”, o contribuinte da etapa subsequente à da isenção (quarta etapa) teria direito ao crédito pertinente às duas primeiras etapas, só deixando de fazer jus ao crédito da operação isenta, no caso, da terceira etapa. Por isso, escrevendo à luz da ordem constitucional antecedente em que não havia a restrição ao princípio da não cumulatividade, afirmávamos: Todavia, as dificuldades não cessaram em razão da má compreensão do instituto da isenção, inserido dentro do mecanismo de tributo não cumulativo, o qual exige um tratamento diverso daquele dispensado tradicionalmente. Na verdade, quase todas as
isenções não atingiram os objetivos colimados. Se a incidência acarreta o fenômeno da repercussão do imposto, a isenção, ignorando a sistemática do ICM, acarreta repercussão ao inverso, isto é, o suposto beneficiado pela isenção acaba levando um prejuízo econômico, suportando uma carga fiscal maior do que se devido fosse o imposto. É o caso, por exemplo, do Decreto n.º 52.604, de 7.1.1971, que lastreado em Convênio firmado, em 15 de dezembro de 1970, na cidade do Rio de Janeiro, concedeu isenção nas saídas de matérias-primas com destino a estabelecimentos de fabricantes, para serem utilizadas na industrialização de rações animais, concentrados e suplementos. Tal isenção veio prejudicar as indústrias de óleos vegetais, que eram e são as tradicionais fornecedoras de matérias-primas (farelos, tortas de soja, de amendoim, de milho etc.). Esses industriais de óleos vegetais em decorrência da isenção se viram obrigados a estornar in totum o crédito decorrente da aquisição de produtos primários in natura (soja, amendoim, milho etc.), muito embora parte da industrialização resultasse em produtos tributados (óleos de soja, de amendoim, de milho etc.), sob pena de arcarem com pesadíssimas multas. Passaram-se mais de dois anos até que as autoridades fazendárias se convenceram da inutilidade de tal isenção, aliás, perturbadora do mercado de óleos vegetais, e firmaram um novo Convênio, na cidade do Rio de Janeiro, em 7 de fevereiro de 1973, dispensando-se a exigência do estorno do crédito fiscal relativo às mercadorias entradas para a fabricação de produtos que integrassem rações animais e concentrados. Desta forma, após tantas experiências frustradas, completou-se o ciclo necessário de isenções para o pleno atingimento da finalidade visada, qual seja, o incentivo à agricultura em geral, e, em especial, à avicultura, obtendo-se o barateamento daqueles produtos utilizados no meio rural. 15 Atualmente, não se pode discutir a exigência de estorno do crédito do ICMS na hipótese de isenção e da não incidência, porque a Constituição fez a ressalva quanto ao princípio da não cumulatividade do imposto nessas duas hipóteses, o que não acontece com o diferimento a seguir examinado.
2.3.1
Direito a crédito no diferimento
Diferimento vem da palavra diferir, que significa adiar, dilatar, procrastinar, delongar. Tem, também, o sentido de discordar, divergir, diferenciar etc. No entanto, o termo diferimento em termos de Direito Tributário é utilizado no primeiro sentido. O diferimento tem origem no Ato Complementar 31, de 28.12.1966, promulgado com base na legislação excepcional, em vista da alteração do sistema de cobrança da parcela do ICM pertencente aos Municípios preconizada no Projeto de Constituição de 1967, já aprovado pelo Congresso
Nacional. O Presidente da República objetivou antecipar, nesse particular, para 1.º.01.1967, os efeitos da nova Constituição que acabou sendo promulgada em 24.01.1967. De fato, dispunha o art. 4.º do citado Ato Complementar: Art. 4.º No caso de diferimento ou antecipação de incidência do imposto que importe no seu recolhimento em Município diferente daquele em que ocorreu o fato gerador, a legislação estadual estabelecerá as normas necessárias ao resguardo dos créditos correspondentes aos Municípios de origem ou destino, conforme o caso. Da leitura desse texto resulta com lapidar clareza que o diferimento do imposto não pode ser entendido como transferência do momento da ocorrência do fato gerador do tributo para etapa ou etapas posteriores. O diferimento implica simplesmente a transferência para etapa posterior do recolhimento do imposto, pelo que pressupõe a prévia constituição da obrigação tributária principal pela ocorrência do fato gerador. Não implica, pois, alteração da sistemática do ICMS, qual seja incidência múltipla sobre o valor total de cada operação de saída, com a dedução do imposto pago nas operações anteriores. O diferimento distingue-se da moratória em que há adiamento do prazo de pagamento do imposto sem alteração do sujeito passivo natural. No diferimento, há mudança desse sujeito passivo por força de lei. A lei, por meio do diferimento, estabelece a exclusão de responsabilidade do contribuinte pelo pagamento do crédito tributário, atribuindo-a a terceiro, denominado responsável, nos termos do art. 121, II, c.c. o art. 128 do CTN. Do exposto, podemos conceituar o diferimento do ICM, hoje, ICMS, como transferência da obrigação de pagar o imposto devido em determinada operação de saída da mercadoria, para o momento da ocorrência do fato gerador na posterior operação de saída, cujo contribuinte fica também com a obrigação de pagar o imposto devido na operação anterior, por expressa determinação legal. Melhor explicitando, o sujeito passivo da etapa de comercialização de mercadoria para a qual foi diferido o imposto reveste a condição de responsável em relação ao imposto devido na operação anterior, ao mesmo tempo em que se posiciona como contribuinte (sujeito passivo natural) relativamente à sua operação de saída (incidência econômica do imposto sobre o valor acrescido nessa operação). É sabido que nenhum comerciante revende a mercadoria pelo mesmo valor da sua aquisição. O diferimento não se confunde, pois, com a isenção ou a não incidência expressa. No primeiro caso, há a incidência do imposto, cujo pagamento é postergado para o momento da ocorrência do fato gerador da operação subsequente ou para a última etapa de circulação da mercadoria, conforme dispuser a lei. No segundo caso, não há incidência do imposto, pelo que na saída de mercadoria com
isenção ou com a não incidência qualificada não há destaque do imposto que possa ser escriturado como crédito por ocasião de sua entrada no estabelecimento do adquirente. Daí o nosso entendimento no sentido de que na hipótese de diferimento deve ser assegurado o direito a crédito do imposto, pois as restrições ao princípio da não cumulatividade previstas nas letras a e b do inciso II do § 2.º do art. 155 da CF nenhuma pertinência têm com a figura do diferimento. Outrossim, já verificamos que a compensação “com o montante cobrado nas operações anteriores”, como prescrita no inciso II do art. 155 da CF não significa imposto efetivamente recolhido ao erário, mas tão só imposto incidente na operação de circulação de mercadorias ou serviços, mesmo porque o contribuinte que se apropria do crédito do imposto não teria como saber se o vendedor efetuou ou não o recolhimento do ICMS destacado na nota fiscal. Exatamente por tais razões, o STF, examinando um caso de ICMS incidente na aquisição de álcool anidro feita pelas usinas sob o regime de diferimento em que o imposto é transferido do produtor para o distribuidor, ante o pleito da distribuidora batendo-se pela tese do direito a crédito à luz do princípio da não cumulatividade do imposto, reconheceu, por unanimidade, a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, conforme ementa a seguir: Recurso extraordinário com agravo. Tributário. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS. Aquisição de mercadoria com diferimento. Direito a creditamento do tributo. Vedação. Hipótese de substituição tributária para trás. Alegada violação ao princípio da não cumulatividade. ADI 4.171. Repercussão geral reconhecida (RE 781926 RG/GO, Rel. Min. Luiz Fux, j. 21.11.2013, DJe 044, public. 06.03.2014). O Ministro Relator salientou que se trata de “uma substituição tributária para trás, consistindo em mera técnica de tributação, não se confundindo com isenção, imunidade ou não incidência, uma vez que a incidência resta efetivamente configurada, todavia o pagamento é postergado”. Realmente, o diferimento é uma categoria jurídica que não se confunde com a isenção ou com a não incidência legalmente qualificada, pelo que a jurisprudência formada em torno delas não tem aplicação em relação às operações realizadas sob o regime de diferimento. A não cumulatividade do PIS/Cofins a que alude o § 12 do art. 195 da CF também teve reconhecida a repercussão geral, por maioria de votos, conforme ementa a seguir: Extraordinário com agravo. Tributário. Princípio da não cumulatividade. Art. 195, § 12, CF/88. PIS. Cofins. Artigo 3.º, notadamente inciso II e §§ 1.º e 2.º, das Leis n.ºs 10.833/2003, 10.637/2002. Artigo 31, § 3.º, da Lei 10.865/2004. Relevância da matéria e transcendência de interesses. Repercussão geral reconhecida (ARE 790928/PE, Rel. Min.
Luiz Fux, DJe 28.10.2014).
2.4
A SELETIVIDADE DO IMPOSTO EM FUNÇÃO DA ESSENCIALIDADE DAS MERCADORIAS E DOS SERVIÇOS (ART. 155, § 2.º, III, DA CF)
O inciso III do § 2.º do art. 155 da CF prescreve que o ICMS “poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços”. Cumpre esclarecer, de início, que não se trata de imposto seletivo, pois o imposto recai sobre todas as mercadorias e sobre os três tipos de serviços cabentes ao Estado, especificados no inciso II do art. 155 da CF. Trata-se, pois, de um imposto de alíquotas seletivas. Alguns estudiosos enxergam no citado inciso III do § 2.º do art. 155 da CF uma norma de estrutura, e não de conduta, pelo que entendem que a seletividade do ICMS integraria o próprio processo legislativo, de modo a tornar obrigatória a fixação, pelo legislador ordinário, de alíquotas seletivas. Como se sabe, normas de comportamento ou de conduta são as que têm por objeto a conduta das pessoas no relacionamento intersubjetivo, ao passo que as normas de estrutura são aquelas voltadas para estabelecer o processo de criação de outras normas. Exemplificando, normas de conduta são aquelas representadas pela legislação tributária da União, Estados e Municípios, enquanto normas de estrutura são aquelas que definem a competência tributária dos entes políticos, como as dos arts. 153, 155 e 156 da CF. A lapidar clareza do texto constitucional – poderá ser seletivo – não deixa margem de dúvida quanto à faculdade de o legislador ordinário estabelecer alíquotas seletivas em função da essencialidade das mercadorias e serviços. Diferente a hipótese da seletividade do IPI, pois o incido I do § 3.º do art. 153 da CF prescreve que o imposto previsto no inciso IV (IPI) será seletivo, em unção da essencialidade do produto . Aqui, sim, não há opção do legislador infraconstitucional, devendo implementar as alíquotas seletivas em função da essencialidade dos produtos. Contudo, o preceito do inciso III sob análise configura uma norma de natureza programática, e sobre ela afirmamos o seguinte: Se, de um lado, o preceito programático não gera direito subjetivo para o contribuinte que não poderá bater às portas do Judiciário pleiteando que determinado imposto ajuste-se ao seu perfil econômico, de outro, esse preceito produz efeito pelo seu aspecto negativo, à medida que confere ao contribuinte a faculdade de exigir que o poder tributante não pratique atos que o contravenha.16
Segue-se que o legislador ordinário está proibido pela Constituição Federal de instituir alíquotas mais elevadas do ICMS em relação a mercadorias e serviços essenciais. No entanto, os Estados resolveram tributar o fornecimento de energia elétrica com uma alíquota exacerbada por ser uma tributação rendosa e de fácil arrecadação. É verdade que não há definição legal do que sejam mercadorias e serviços essenciais, mas é verdade, também, que a Constituição não conferiu ao legislador ordinário margem de liberdade para adoção de critério político destoante do conceito de essencial, de necessário e de indispensável em termos de realidade social vivenciada em nosso país. O conceito de essencialidade varia no tempo e no espaço para alcançar os diferentes estágios de civilização, abarcando não apenas as necessidades biológicas, como saúde, alimentação, vestuário, habitação, mas também tudo aquilo que é exigido no mundo atual como um pressuposto de um padrão de vida digna e decente no conceito da maioria de determinada população. Entre nós, basta imaginar um blackout por apenas 24 horas para que possamos ter a ideia do quão essencial é a energia elétrica para a moderna sociedade em que vivemos. A melhor forma de descobrir a violação do princípio da seletividade é examinando a legislação e confrontando mercadorias e serviços com as respectivas alíquotas. A seletividade do imposto, a nosso ver, serve como instrumento da extrafiscalidade no sentido de favorecer o consumo de mercadorias consideradas essenciais e procurar desestimular o consumo das mercadorias não essenciais ou supérfluos. Por isso, não concordamos com os doutrinadores que defendem a seletividade como meio para observar o princípio da capacidade contributiva. No tocante à venda de energia elétrica, a legislação do Estado de São Paulo (Lei 6.734, de 1.º.03.1989, com alterações posteriores) prevê as seguintes alíquotas: a) 12% em relação ao consumo residencial de até 200 kWh por mês; b) 25% em relação ao consumo residencial acima de 200 kWh por mês; c) 12% em relação à energia utilizada no transporte público; e d) 12% em relação à energia utilizada em propriedade rural onde haja exploração agrícola ou pastoril e inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS. Salta aos olhos que a alíquota de 25%, prevista na letra b retro, desatende à faculdade estabelecida no preceito constitucional sob análise, porque a presumível capacidade contributiva do consumidor de energia elétrica domiciliar é irrelevante para implementação da alíquota seletiva. O que importa é apenas a sua seletividade em função da essencialidade da mercadoria e do serviço. Como é possível sustentar que a energia elétrica é essencial para quem apresenta baixo consumo e não o é para quem tem um elevado consumo? No estágio atual da civilização, a energia elétrica é sempre um bem essencial. Sua ausência acarretaria a paralisação do processo produtivo nem haveria circulação de riquezas. A energia elétrica é a força motriz que gera o desenvolvimento econômico-social. A energia elétrica não comporta gravame maior em relação a outros bens tributados pelo ICMS que são mercadorias e serviços conforme mandamento constitucional, e não mercadorias ou serviços.
Logo, impõe-se o confronto do conjunto de mercadorias e serviços para eleger o critério da seletividade em função da essencialidade desses bens. Não pode o Estado em nome de uma política tributária assentada no critério da arrecadação mais rendosa e a custo zero, insusceptível de sonegação, sobrecarregar o consumo de energia elétrica e o serviço de comunicação igualmente atingido pela exacerbação da carga tributária, invertendo e pervertendo o princípio da seletividade do imposto em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. Cabe ao Supremo Tribunal Federal decidir em definitivo sobre a inconstitucionalidade lapidar dessa esdrúxula tributação que atenta contra o princípio da razoabilidade, um limite imposto à ação do próprio legislador. A Corte Suprema reconheceu a repercussão geral sobre o tema constitucional em questão conforme ementa a seguir: Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços. Energia elétrica. Serviços de telecomunicação. Seletividade. Alíquota variável. Artigos 150, inciso II, E 155, § 2.º, inciso III, da Carta Federal. Alcance. Recurso extraordinário. Repercussão geral configurada. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à constitucionalidade de norma estadual mediante a qual foi prevista a alíquota de 25% alusiva ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços incidente no fornecimento de energia elétrica e nos serviços de telecomunicação, em patamar superior ao estabelecido para as operações em geral – 17% (RE 714139/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 26.09.2014). Enquanto a Alta Corte não decide o tema sob repercussão geral, os consumidores continuarão arcando com o repasse do encargo financeiro do imposto pago pelas distribuidoras. E aqui é oportuno esclarecer que o Estado não pode, também, estabelecer uma alíquota maior em relação aos veículos importados, pois a procedência do veículo não é fator determinante da essencialidade ou não do veículo. A questão que se coloca é a de saber se o veículo é ou não um bem essencial. A exacerbação da carga tributária em relação ao veículo procedente do exterior viola não apenas inciso III do § 2.º do art. 155 da CF, como também afronta o art. 152 da CF que veda “aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino”. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça conforme ementa a seguir: Tributário. IPVA. Alíquota. Carro importado. A Constituição Federal, artigos 150 e 152, proíbe os Estados de estabelecer alíquotas diferenciadas do IPVA para carros importados. Recurso provido” (Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 10.906/RJ, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 05.06.2000).
2.5
AS ALÍQUOTAS DO ICMS NAS OPERAÇÕES E PRESTAÇÕES INTERESTADUAIS E DE EXPORTAÇÃO (ART. 155, § 2.º, IV, DA CF) O art. 155, § 2.º, inciso IV, da CF dispõe: IV – resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação.
Compete ao Senado Federal estabelecer as alíquotas do ICMS aplicáveis nas operações e prestações interestaduais e de exportação. Essa faculdade conferida ao Senado Federal objetiva mitigar o princípio da tributação do ICMS na origem para favorecer os Estados destinatários, que se limitam a tributar a margem de lucro acrescida na operação de revenda no mercado interno. Nos termos da Resolução 22/98 em vigor, as alíquotas interestaduais variam de 7% a 12%, conforme o Estado de destino. Isso significa que o Estado destinatário, em qualquer hipótese, poderá tributar 6% no mínimo, sem prejuízo de incidência do imposto sobre a base de cálculo acrescida na operação de revenda. Pelo art. 1.º do Projeto de Resolução sob exame, a alíquota interestadual máxima passa a ser de 11%, vale dizer, deixa para os Estados destinatários a margem de tributação de no mínimo 7%. Contudo, por força da morosidade legislativa, essa alíquota foi prejudicada pois sua vigência estava com o termo final previsto para 31.12.2014. De 1.º.01 até 31.12.2015 essa alíquota máxima será de 10%. A cada exercício vai se reduzindo a alíquota interestadual até que a partir de 1.º.01.2021 passará a ser de 4%. No ato de aprovação final do texto deverá haver adequação dos prazos tendo em vista o prazo decorrido na tramitação do projeto senatorial. A Resolução em tela institui uma forma gradual de transição do regime de tributação na origem para o regime de tributação no destino, com o nítido propósito de acabar com as chamadas guerras fiscais. Por esse novo regime, o Estado que conceder benefícios fiscais à margem da LC 24/75 arcará com os prejuízos decorrentes da redução da arrecadação tributária, ao contrário do que acontece no regime atual, em que o Estado que outorga benefícios fiscais unilateralmente só aufere vantagens, prejudicando os demais Estados. Entretanto, os §§ 1.º, 2.º, 3.º e 4.º estabelecem exceções, algumas delas casuísticas, tornando a legislação do ICMS super complexa. Isso onera os custos das empresas e reflete na competitividade mundial de nossos produtos e serviços. O § 1.º estabelece que nas operações interestaduais realizadas nas regiões Sul e Sudeste,
destinadas às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e ao Estado de Espírito Santo, a alíquota será: a) de 6% de 1.º.01 até 31.12.2014; b) de 5% de 1.º.01 até 31.12.2015; c) de 4% a partir de 1.º.01.2016. O § 2.º dispõe que nas operações inversas, isto é, aquelas realizadas nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e no Estado de Espírito Santo, destinadas às regiões Sul e Sudeste, a alíquota será de: a) 11% no período de 1.º.01 a 31.12.2014; b) 10% no período de 1.º.01 de 31.12.2015; c) 9% no período de 1.º.01 a 31.12.2016; d) 8% no período de 1.º.01 a 31.12.2017; e) 7% a partir de 1.º.01.2018. O § 3.º prescreve o regime diferenciado para o gás natural nacional ou importado do exterior, em que a alíquota será: a) de 7% nas operações originadas nas regiões Sul e Sudeste, exceto no Estado de Espírito Santo, destinadas às regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, inclusive o Estado de Espírito Santo; b) de 12%, nas demais situações. O § 4.º estabelece para as operações originadas na Zona Franca de Manaus a alíquota de 12%, observadas as prescrições aí previstas. O § 5.º prevê para as operações interestaduais realizadas entre a Zona Franca de Manaus e as Áreas de Livre-Comércio mencionadas no § 4.º a aplicação das alíquotas estabelecidas nos incisos I a VIII do caput retromencionados. O art. 2.º exclui do regime previsto no art. 1.º (alíquotas de 11% a 4%) as operações interestaduais com bens e mercadorias importadas do exterior disciplinadas pela Resolução 13, de 25.04.2012, bem como as operações interestaduais de serviços de transporte aéreo de passageiro, carga e mala postal, disciplinadas pela Resolução 95, de 13.12.1996. Finalmente, o art. 3.º dispõe que a produção de efeitos dessa Resolução fica condicionada, cumulativamente, à aprovação de lei complementar que:
I – disponha sobre a concessão de auxílio financeiro pela União aos Estados e ao Distrito Federal, e aos respectivos municípios, para compensar as eventuais perdas de arrecadação decorrentes da aplicação do disposto nesta Resolução, e sobre instituição de aporte de recursos para o fundo de desenvolvimento regional, ambos considerados transparências obrigatórias; II – defina em três quintos o quórum necessário para fins de celebração, no âmbito do Confaz, de um convênio pelo qual sejam convalidados os efeitos de todos os incentivos e benefícios fiscais ou financeiros concedidos por todos os Estados e o Distrito Federal, em desacordo com a deliberação prevista no art. 155, § 2.º, inciso XII, “g”, da CF, até a data da publicação dessa Resolução. Foi editada a MP 683, de 13.07.2015, instituindo o Fundo de Desenvolvimento Regional e Infraestrutura (FDRI), vinculado ao Ministério da Fazenda. No entanto, a sua constituição ficou condicionada à: I – instituição e arrecadação de multa de regularização cambial tributária relativa a ativos mantidos no exterior ou internalizados; II – implementação pelo Senado Federal da Resolução, cujo projeto foi retroexaminado; III – celebração do Convênio entre os Estados e Distrito Federal convalidando os incentivos e benefícios fiscais outorgados unilateralmente pelos Estados sem a intermediação do Confaz. Para dificultar a situação, a MP 683/2015 não foi convertida em lei em tempo hábil e, por conseguinte, perdeu sua vigência em 10.11.2015. Os efeitos do Projeto de Resolução 1/2013 dependem, ainda, de anistia dos incentivos e benefícios fiscais concedidos à margem da LC 24/75 e da instituição e constituição do FDRI. Por sua vez, a constituição do FDRI depende de prévia aprovação do Projeto de Resolução 1/2013 do Senado Federal. Esse cipoal de normas dispersas em diferentes instrumentos legislativos, porém interdependentes, torna a legislação do ICMS bastante complexa, confusa e insegura, o que às vezes nos faz pensar que não vale a pena manter o ICMS, um imposto de vocação nacional, na competência impositiva dos Estados. Em uma das pretendidas reformas tributárias houve a tentativa de federalização desse imposto. Assim que surgiram as discussões a respeito, os governadores fizeram uma grande pressão e os condutores da reforma foram obrigados a incluir a previsão de um ICMS estadual a ser instituído sempre que a arrecadação tributária estadual pelo novo regime situar-se aquém daquela propiciada
no regime anterior. Outras exigências foram feitas pelos governantes estaduais e municipais em nome dos princípios pr incípios da cautela, da contracautela, contracautela, da prudên pr udência cia e outros mais. mais. Com a in i nvenção e invocação i nvocação de tantos princípios, a pretendida reforma não saiu do papel. Por isso, o governo central vem se ocupando em fazer minirreformas que mais prejudicam os contribuintes do que propiciam um sistema tributário tributário simples, simples, transparente transparente e menos menos oneroso oneroso em term termos os de obrigações, principal pr incipal e acessória aces sórias. s. Um novo pacto federativo em torno da divisão do bolo tributário só será possível, a nosso ver, no bojo de uma Assembleia Nacional Constituinte.
2.6
ATRIBUIÇÕES DO SENADO FEDERAL PREVISTAS NO INCISO V, DO § 2.º, DO ART. 155 DA CF Dispõe o art. 155, § 2.º, inciso V, da Constituição: V – é facultado facultado ao Senado Federal: Federal : a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução de iniciativa de um terço e aprovada pela maioria aiori a absolut abso lutaa de seus mem membros; bros; b) fixar fixar alíquotas máximas áximas nas mesmas esmas operações para resolver resol ver conflito conflito específico especí fico que envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros.
O ICMS, apesar de ser um imposto de competência impositiva dos Estados, provoca efeitos econômico-financeiros em todo o território nacional em virtude do princípio da não cumulatividade que permite compensar, em cada operação de circulação de mercadorias e da prestação de serviços, o montante do imposto pago no mesmo ou em outro Estado, como vimos anteriormente. Para harmonizar os efeitos desse imposto em todo o território nacional, o legislador constituinte cometeu ao Senado Federal, órgão neutro, a tarefa de elaborar um regramento uniforme aplicável em âmbito nacional.
2.7
EXAME DO INCISO VI DO § 2.º DO ART. 155 DA CF Dispõe o art. 155, § 2.º, inciso i nciso VI, VI, da Constitu Constituição ição Federal: Fe deral: VI – salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do disposto no inciso XII, g , as alíquotas internas, nas operações relativas à circulação de
mercadorias e nas prestações de serviços, não poderão ser inferiores às previstas para as operações interestaduais. Como regra geral, as alíquotas internas do ICMS não poderão ser inferiores àquelas previstas para as operações interestaduais. interestaduais. Con Contu tudo, do, esse próprio própri o inciso permite permite qu quee os Estados e o Distrito Federal deliberem de forma diferente de acordo com a lei complementar referida na letra g , do inciso XII, do § 2.º, do art. 155 da CF. Os Estados e o Distrito Federal Federa l estat es tatuem uem matérias pertinentes pertinentes a isenções i senções e incen i ncentivos tivos fiscais fiscai s dos ICMS por meio de convênios celebrados com a intermediação do Confaz e posteriormente por eles ratificados. Por ora, a lei complementar referida no texto sob comento é a Lei Complementar 24, de 07.01.1975. Voltaremos ao assunto mais adiante quando tratarmos dessa questão.
2.8
EXAMES DOS INCISOS VII E VIII DO § 2.º DO ART. 155 DA CF
Dispõem os incisos VII e VIII do § 2.º do art. 155 da CF com a redação conferida pela EC 87, de 16.04.2015: VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual interestadual e caberá caber á ao Estado de localização local ização do destinatário o imposto imposto corresponden corr espondente te à diferença entre entre a alíquota interna interna do Estado destin des tinatário atário e a alíquot al íquotaa int i nterestadual; erestadual; a) (Revog ( Revogada.) ada.) (Redação ( Redação dada pela Emenda Emenda Constitu Constitucional cional n.º 87, de 16.04.2015.) b) (Revogada.) (Redação dada pela pel a Emenda Emenda Const Constitu itucional cional n.º 87, de 16.04.2015.) VIII – a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; b) ao remetent remetente, e, quando quando o destinatário destinatário não for contribuin contribuinte te do imposto. imposto. Esses dois incisos devem merecer uma interpretação conjugada. Por ocasião do advento da Constituição de 1988, não havia, ainda, operações denominadas e-commerce, isto é, vendas não presenciais feitas a distância por meio de redes de comput computador. ador. Com a avanço tecnológico, tecnológico, é possível possív el a um consum consumidor situado situado em um um Estado do Nordeste, por exemplo, exemplo, fazer uma uma compra de um estabelecimento localizado em um Estado do Sul, recebendo diretamente a mercadoria adquirida, sem qualquer intermediação de loja ou comerciante estabelecido em seu Estado. Antes, era rara a
hipótese de um consumidor fixado em um determinado Estado deslocar-se para outro Estado a fim de efetuar compras. Por isso, a Constituição de 1988 dispôs no § 2.º, inciso VII, que nas operações interestaduais feitas com consum consumidores idores localizados local izados em outro outro Estado adotar-se-á: ado tar-se-á: a) alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto; b) alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte do imposto. O inciso VIII, por sua vez, dispunha que a diferença do imposto na hipótese “a” caberá ao Estado da localização do destinatário. Entretanto, a popularização do uso do computador ao longo dos anos mudou completamente o cenário. As vendas não presenciais cresceram vertiginosamente nos Estados produtores, tendo como adquirentes os consumidores localizados nos Estados do Norte, Nordeste, Centro-Oeste, além do Distrito Federal e Espírito Santo. Governadores desses Estados e do Distrito Federal, sentindo a perda de arrecadação arreca dação do ICMS, ICMS, com intensidade intensidade cada vez maior, maior, se uniram e conseguiram conseguiram firmar firmar o Protocolo 21/2011 que equiparava a uma operação entre contribuintes a venda não presencial feita por um estabeleciment estabelecimentoo localizado local izado em um determinado determinado Estado para o consum consumidor final final estabelecido estabeleci do em outro Estado, com o objetivo de enquadrar a operação na revogada letra “a” do inciso VII do § 2.º do art. 155 da CF e, por conseguinte, apropriar-se da diferença do imposto. Assim, iniciou-se a guerra gu erra fiscal por iniciativa i niciativa dos consum consumidores que aderiram aderira m ao sistem si stemaa e-commerce. O referido Protocolo era formal e materialmente inconstitucional, e como tal veio a ser declarada a sua inconstitucionalidade (ADIs 4.628 e 4.713). No entanto, aquele Protocolo inspirou a ação do Congresso Nacional que elaborou a Proposta de Emenda Constitucional nesse sentido, a qual acabou sendo aprovada e promulgada promulgada sob o n.º 87, em 16.04.2015. Essa EC 87/2015 alterou o inciso VII do § 2.º do art.155 da CF, conforme transcrição retro, acabando com a distinção entre destinatário contribuinte e não contribuinte do ICMS. O inciso VIII também sofreu alteração a fim de atribuir a responsabilidade pelo recolhimento da diferença do imposto resultante da alíquota interna e da alíquota interestadual ao destinatário da mercadoria, se contribuinte do ICMS, e ao remetente da mercadoria, quando o destinatário não for contribuinte do imposto. Diferentemente das demais guerras fiscais, essa não foi provocada pela ação unilateral dos governantes estaduais, pois não houve instituição de qualquer incentivo ou benefício fiscal. Houve apenas mudança de hábitos dos consumidores, favorecidos pelo avanço tecnológico na área da informática. A Emenda 87 acabou com essa guerra fiscal. Entretanto, a redação inserida no seu art. 3.º está
gerando dúvidas sobre a época certa da entrada em vigor do novo regime. Esse artigo tem a seguinte redação: Art. 3.º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos no ano subsequente e após 90 (noventa) dias desta. Ora, considerando que a Emenda foi promulgada no ano de 2015, o “ano subsequente” a que se refere o texto texto retrotranscrito corresponderá corre sponderá ao ano de 2016. Contudo, uma interpretação sistemática conduzirá ao entendimento de que o novo regime tributário entrará em vigor em 90 dias a contar da data da publicação da Emenda, como prescrito na parte final final do dispositivo. dispos itivo. E mais, o art. 2.º, que introduziu introduziu o art. 99 ao AD ADCT CT,, previu a repartição entre o Estado de origem e o Estado de destino do imposto que resultar da diferença entre a alíquota interna interna e a alíquota interestadual interestadual de forma forma gradual, começando começando a partir par tir de 2015 na base de 20% para o Estado de destino e 80% para o Estado de origem, até que em 2019 o Estado de destino passará a perceber 100% da diferença. Por isso, entendemos equivocada a tese defendida por alguns especialistas no sentido de que o novo regime só poderá entrar em vigor em 2016. Outrossim, não há que falar em majoração do ICMS, ICMS, pois essa es sa é uma uma atribuição do legislador ordinário, e não do legislador l egislador Con Constitu stituint intee Derivado. Deri vado. O destinatário dos dispositivos da Emenda não é o contribuinte, mas entidades políticas tributantes. Aliás, a sustentação da tese do atropelo ao princípio da anterioridade conduz à inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 87 por adentrar no núcleo protegido por cláusula pétrea, posição que ninguém ninguém defende. de fende.
2.9
EXAME DO INCISO IX Dispõe o art. 155, § 2.º, inciso i nciso IX, IX, da Constitu Constituição Federal: Federal : IX – incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuint contribuintee habitual habitual do imposto, imposto, qualquer qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço; (Redação ( Redação dada pela Emenda Emenda Constitu Constitucional cional n.º 33, 3 3, de 2001.) b) sobre sobr e o valor total total da operação, oper ação, quando quando mercador mercadorias ias forem fornecidas fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios.
Examinemos separadamente as duas alíneas desse inciso constitucional que versam sobre distintas hipóteses de incidência do ICMS.
2.9.1
Exame do inciso IX , a, do § 2.º do art. 155 da CF
A nova redação conferida pela EC 33, de 11.12.2001, à alínea a do inciso IX retrotranscrito trouxe uma alteração na jurisprudência do STF acerca do fato gerador do ICMS, passando a prescindir do requisito da circulação jurídica, isto é, de uma operação mercantil traduzida por troca de titularidade ou posse da mercadoria. A discussão acerca da incidência ou não do ICMS no leasing internacional teve início com base no disposto no art. 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/96, lei de regência nacional do ICMS, vazado nos seguintes termos: Art. 3.º O imposto não incide sobre: […] VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário. À luz desse dispositivo, a jurisprudência do STF fixou o entendimento de que não incide o imposto na importação de equipamento objeto de contrato de arrendamento mercantil, consignando que o fato gerador do ICMS somente ocorrerá quando o bem arrendado incorporar-se ao patrimônio de arrendatário, caracterizando, nessa hipótese, a circulação mercantil. Outrossim, o STF firmou posição acerca da não incidência do ICMS na importação de veículo por pessoa física para uso próprio (RE 203.075). Posteriormente, foi editada a Súmula 660 do STF com a seguinte redação: Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. A exemplo do que aconteceu com a Emenda Passos Porto, que enterrou nada menos que três teses consolidadas pelo STF, o legislador Constituinte Derivado reagiu ao entendimento da Corte Suprema, alterando por via da EC 33/2001 a redação da letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF nos termos retrotranscritos. Essa emenda ampliou o campo de incidência do ICMS nas importações, não mais limitadas a mercadorias, e qualquer pessoa física ou jurídica que promova a importação de bens passa a ser
contribuinte do ICMS, independentemente de ato de mercancia ou não, bastando a simples entrada de um bem a qualquer título. Essa reação afrontosa do legislador Constituinte Derivado, que, na realidade, infringe o princípio da separação dos poderes, gerou uma enorme discussão jurisprudencial, com reflexo na área de serviços especificados na lista nacional, que estão fora do campo de incidência do ICMS. O imposto estadual só pode incidir sobre a prestação do serviço de comunicação e dos serviços de transportes interestadual e intermunicipal, ainda que iniciados no exterior. Assim, surgiu no STF a tese de que o inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96 só tem aplicação no âmbito do leasing interno (RE 206.069). Transcrevamos, para maior clareza, trecho do voto da Ministra Relatora Ellen Gracie, condutor da decisão majoritária: O exame desse dispositivo revela que, nessa circunstância, a imposição de ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. A Constituição Federal elegeu o elemento fático “entrada de mercadoria importada” como caracterizador da circulação jurídica da mercadoria ou do bem, e dispensa indagações acerca dos contornos do negócio jurídico realizado no exterior. Veja-se que, a par de incidir sobre “operações relativas a circulação de mercadorias”, fez o constituinte de 1988 constar do texto constitucional a expressa ressalva da incidência sobre a “entrada” do bem “importado”. Conforme já comentamos no item 2.1.1, interpretar o disposto na letra a do inciso IX do § 2.º de forma isolada, sem conexão com o caput do art. 155, inciso II, da CF, conduz à bitributação jurídica, pois a entrada do bem importado configura fato gerador do imposto de importação (art. 19 do CTN) conforme sustentado pelo STJ no REsp 622283. Além disso, o leasing nacional ou internacional, pouco importa, só se sujeita à incidência do ISS, pois a Constituição vigente não ressalvou a bitributação jurídica nesse particular, a exemplo do que havia feito originalmente em relação à venda a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel que estava inserido tanto na competência tributária do Estado (ICMS) como na competência tributária do município (IVV). Hoje, não há mais possibilidade de qualquer bitributação urídica. O leasing internacional sujeita-se apenas ao ISS nos termos do art. 1.º, § 1.º, da Lei Complementar 116/2003 e item 15.09 da lista anexa c.c o art. 156, III, da CF. No nosso entender, o legislador Constituinte Derivado, ao promulgar a EC 33/2001, não instituiu, nem pretendeu fazê-lo, a bitributação jurídica (ICMS/II, ou ICMS/ISS); visou, tão somente, esvaziar a tese da não incidência do ICMS na importação de bens. Entretanto, mesmo após a reversão da tese da tributação do leasing internacional pelo ICMS, o
que se deu no julgamento do RE 461.968, DJe 23.08.2007, a discussão em torno da nova redação conferida à letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF continuou sustentando que a imposição do ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. Em outras palavras, a circulação jurídica, assim entendida como operação que implique transferência de propriedade, é irrelevante para fins de tributação do ICMS com base na nova redação conferida pela EC 33/2001. Para bem diferenciar antes e depois da emenda, o STF editou a Súmula 660 nos seguintes termos: Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. Consoante já dissemos anteriormente, nada impede de o legislador Constituinte Derivado criar um quarto imposto estadual com o nome de ICMS, porém diferente daquele previsto no inciso II do art. 155 da CF, ou com outro nome qualquer, por exemplo, “ICMS incidente sobre bens importados do exterior”, na esteira do que ocorreu com PIS/Pasep-importação e Cofins-importação. Com efeito, as enumerações do art. 155 da CF não são imutáveis porque elas não estão protegidas pelo núcleo das cláusulas pétreas. O que o legislador Constituinte Derivado não pode é lançar a confusão, sustentando que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF não expressa circulação de mercadorias. Ora, dizer que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF (circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior) incide também na entrada de bem ou mercadorias importados do exterior, independentemente de sua finalidade, é o mesmo que afirmar que aquele ICMS não se caracteriza pela circulação jurídica, transformando-o em um autêntico imposto sobre transporte ou de deslocamento físico de mercadorias. Se se tratar de ICMS referido no inciso II do art. 155, não se pode desconsiderar o aspecto da circulação jurídica, a exigir transferência de propriedade, o que não acontece com o leasing internacional que, como o dissemos, caracteriza o fato gerador do ISS, e não do ICMS, ainda que haja a previsão de opção de compra e venda, que é elemento estrutural do leasing financeiro. De fato, o leasing financeiro de que estamos falando, por expressa disposição legal (Lei 6.099/74 com as alterações de Lei 7.132/83 e Resolução 2.309/96 do Banco Central), pressupõe a existência de tríplice opção conferida ao arrendatário: (a) devolver o bem arrendado ao arrendador no final do prazo contratual; (b) prorrogar o contrato de arrendamento ao final do prazo pactuado; (c) exercer a opção de compra ao término do prazo contratual. Se faltar a cláusula de opção de compra pelo valor residual garantido, não se tratará de leasing financeiro.
Logo, exercida a opção de compra, que faz parte integrante e indissociável do leasing financeiro, ensejador da incidência do ISS, não poderá haver incidência do ICMS à sombra do obscuro art. 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/96, que invadiu a competência impositiva municipal, estendendo o campo da incidência do ICMS para além dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Ademais, quando o arrendatário exercer a opção de compra, necessariamente no final do prazo de arrendamento mercantil, não mais haverá mercadoria a ser vendida, como bem asseverou o ulgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, 17 nem base de cálculo do ICMS, porque o valor residual já foi pago de forma parcelada com as prestações mensais a cargo do arrendatário. A Súmula 263 do STJ foi cancelada posteriormente pela Corte Especial, que passou a entender que o valor residual pode ser pago no decorrer do contrato de leasing , sem que implique operação de compra e venda a descaracterizar o leasing , uma vez que a Resolução 2.309/96 do Banco Central permite tal faculdade. Como assevera José Eduardo Soarez de Melo, […] considerando que a LC 116/03 reiterou a incidência do ISS sobre o leasing (item 15.09), sem nenhuma ressalva de incidência do ICMS, pode-se entender que restaria prejudicado o preceito da LC 87/96 (art. 3.º, VIII), que dispusera sobre a tributação estadual.18 No julgamento do RE 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, em que foi reconhecida a existência de repercussão geral da matéria constitucional debatida, o STF encerrou definitivamente a controvérsia decidindo, por maioria de votos, vencidos o Ministro Relator e o Ministro Teori Zavascki, que não há incidência do ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, nos termos da ementa transcrita no item 2.1.1. Antes dessa decisão da Corte Suprema, havíamos sustentado a tese da intributabilidade do leasing internacional pelo ICMS, interpondo recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, por maioria de votos, havia reformado a escorreita decisão de primeira instância que havia reconhecido a não incidência do ICMS e, por conseguinte, havia julgado procedente a ação de repetição de indébito do imposto pago por meio de parcelamento. O Ministro Relator proferiu decisão monocrática nos termos a seguir transcritos: Recurso Especial 1.134.895/SP (2009/0067489-0) Relator: Ministro Hamilton Carvalhido Recorrente: BHS Brazilian Helicopter Services Táxi Aéreo Ltda.
Advogado: Felicia Ayako Harada e outro(s) Recorrido: Fazenda do Estado de São Paulo Procurador: Maria Emília Trigo Gonçalves da Costa e outro(s) Decisão Recurso especial interposto por BHS Brazilian Helicopter Services Taxi Aéreo Ltda., com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, impugnando acórdão da Terceira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, rejeitando os embargos infringentes opostos pela ora recorrente, manteve o entendimento de que incide o ICMS na importação de aeronave por contrato de arrendamento mercantil ( leasing ) sem opção de compra. Além da divergência jurisprudencial, a insurgência especial está fundada na violação do artigo 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/96, cuja letra é a seguinte: “Art. 3.º O imposto não incide sobre: […] VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário; […]” E teria sido violado, porque: “[…] Ao rejeitar os embargos infringentes da ora recorrente, decidindo que incide ICMS na operação de leasing internacional de aeronave por ela realizada, o V. Acórdão recorrido violou expressamente a norma contida no art. 3.º, VIII, da LC n.º 87/96, que reza: […] Esclareça-se que a referida norma encontra-se de acordo com o art. 146, I, da CF que atribui à Lei Complementar competência para regular conflitos de competência em matéria tributária entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios c/c o art. 152 da CF que veda aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços de qualquer natureza em razão de sua procedência ou destino. Encontrando-se o disposto no art. 3.º, VIII, da LC n.º 87/96 em perfeita harmonia com a Carta Maior, obrigatória a sua observância pela recorrida, sendo-lhe vedada a exigência de ICMS nas operações de leasing internacional, haja vista que o referido dispositivo legal não distingue a operação de leasing nacional da operação internacional, para fins de isenção, sendo defeso ao aplicador restringir o alcance da referida norma. […]” (fl. 785). Recurso tempestivo, respondido (fls. 830/843) e admitido na origem (fls. 845/846).
Tudo visto e examinado, decido. Conheço do recurso, porque tempestivo, regularmente deduzido e prequestionados os dispositivos de lei federal apontados como violados, não havendo falar, ademais, em reexame do contexto fáctico-probatório dos autos. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que não incide ICMS nas operações de importação de aeronaves, realizadas por meio de arrendamento mercantil, dada a impossibilidade de aquisição do bem ao final do contrato. Nesse sentido: Tributário. Agravo regimental no recurso especial. Importação de aeronave. Arrendamento mercantil leasing . ICMS. Não incidência. Precedentes. 1. As Turmas que compõem a Primeira Seção do STJ possuem entendimento pacificado no sentido de que não incide ICMS na importação de aeronaves e de peças de reposição, em regime de leasing. 2. “Mesmo após a alteração que a EC 33/2001 promoveu no art. 155, § 2.º, ‘a’, da Constituição da República, tem-se que nos contratos de leasing , por não existir a circulação jurídica da mercadoria, não incide o ICMS. A propriedade do bem permanece com o arrendante, sendo que a mera circulação física da mercadoria não configura o fato gerador daquele tributo” (AgRg nos EDcl no REsp 851386/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 1.º.02.2007). 3. Agravo regimental não provido (AgRg no REsp 1114607/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1.ª Turma, j. 17.12.2009, DJe 02.02.2010 – grifos nossos ). Processual civil e tributário. Agravo regimental. ICMS. Não incidência. Importação . Leasing. Aeronaves, equipamentos e peças. Aquisição por empresa de transporte aéreo. Precedentes do STF. 1. Ao decidir o RE 206.069/SP, relativo à importação, sob o regime de leasing , de bem destinado ao ativo fixo, o STF entendeu pela incidência do ICMS. 2. Posteriormente, no julgamento do RE 461.968/SP, a Corte Suprema afastou a incidência do tributo estadual no caso de importação de aeronaves, equipamentos e peças por empresas de transporte aéreo. Na oportunidade, o acórdão enfatizou ser fato notório que os contratos de leasing firmados por essas empresas não preveem a aquisição do bem ao final do ajuste, o que impediria a cobrança do ICMS. Ademais, o Relator, Ministro Eros Grau, ressaltou que não se contradizia o precedente anterior (RE 206.069/SP), pois aquele se referia a bem que, por se destinar ao ativo fixo, seria necessariamente adquirido ao final do contrato de leasing , situação que permite a tributação estadual já no momento de sua entrada no País. 3. A interpretação da legislação infraconstitucional, em especial a do art. 3.º, VIII, da LC
87/96, deve-se adequar à jurisprudência do STF referente aos dispositivos constitucionais relacionados (art. 155, II, § 2.º, IX, “a”, da CF). Nesse sentido, na hipótese de importação sob o regime de leasing : a) incide o ICMS quando se tratar de bem destinado ao ativo fixo; e b) não incide o ICMS no caso de aeronaves, equipamentos e peças adquiridos por empresas de transporte aéreo. 4. Agravo regimental não provido (AgRg no Ag 1109146/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2.ª Turma, j. 04.08.2009, DJe 27.08.2009 – grifos nossos). Tributário. Importação de aeronave. ICMS. Não incidência . Questão pacificada pela Primeira Seção (EREsp 783.814/RJ). 1. A Primeira Seção desta Corte pacificou a sua jurisprudência no sentido de que não incide ICMS nas operações de importação de aeronaves realizadas por meio de arrendamento mercantil, dada a impossibilidade de aquisição do bem ao final do contrato e, portanto, a ausência de circulação de mercadoria, pressuposto da incidência do tributo em questão. 2. Orientação firmada pelo STF no RE 461.968/SP. 3. Recurso especial provido (REsp 1108161/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, 2.ª Turma, j. 03.09.2009, DJe 24.09.2009 – grifos nossos). Processual civil e tributário. Violação a súmula jurisprudencial. Impossibilidade. Ausência de prequestionamento. Súmula 211/STJ. ICMS . Importação de aeronave. Leasing . Súmula 83/STJ. 1. Súmula de jurisprudência não se subsume ao conceito de legislação federal, pelo que é imprópria a arguição no recurso especial de ofensa à Súmula 266/STF. 2. A leitura do acórdão recorrido revela que a Corte de origem não enfrentou o tema levantado com lastro no art. 6.º da Lei 1.533/51, o que configura ausência de prequestionamento, nos termos da Súmula 211/STJ. 3. Seguindo a orientação do Supremo Tribunal Federal, a jurisprudência desta Corte cristalizou-se no sentido de que o ICMS não incide sobre a importação de aeronave sob o regime de arrendamento mercantil ( leasing ). Aplicação da Súmula 83/STJ. 4. Precedentes: EREsp 783.814/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 15.09.2008; AgREsp 1.035.589/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 27.03.2009; AgREsp 1.050.622/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 07.04.2009; AgREsp 1.067.128/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 29.10.2008. 5. Recurso especial não conhecido (REsp 786.355/MG, Rel. Min. Castro Meira, 2.ª Turma, j. 23.06.2009, DJe 04.08.2009 – grifos nossos). E o acórdão recorrido divergiu desse entendimento, ao estabelecer que: “Mas o que caracteriza o tributo é a ocorrência de todo tipo de operações jurídicas, independentemente da natureza de cada uma delas, que implicam em circulação de
mercadorias, ainda que não necessariamente impliquem em mudança de titularidade, mas tão somente da posse. […] Ora, se o contrato de arrendamento mercantil é operação jurídica de substrato econômico que implica em circulação de mercadoria, havendo disposição constitucional expressa no sentido de que a entrada de mercadoria, a qualquer título, do exterior, implica na incidência do ICMS – induvidoso que essas operações devam ser tributadas pelo ICMS. É bem verdade que, na hipótese do contrato de arrendamento mercantil, não há necessariamente transferência de titularidade dominial de mercadoria. Bem por isso, não se pode afirmar que em todo contrato de arrendamento mercantil, com circulação de mercadoria, deva haver incidência de ICMS. Mas naquelas hipóteses em que esse contrato implicar na entrada do bem ou mercadoria do estabelecimento, provindos do exterior, a operação, por expressa previsão constitucional, será tributada pelo ICMS. […] Não se ignora, è evidência, a disposição da LC 87/96 em seu art. 3.º, VIII, a pretender excluir a incidência da tributação ao negócio jurídico do arrendamento mercantil. Essa disposição, todavia, é inócua uma vez que colide e de maneira direta com o perfil constitucional do tema, especialmente o art. 155, IX, letra ‘a’ (redação dada pela EC 33/01) que é expresso quanto a incidência: […]” (fls. 739/752 – grifos nossos). Pelo exposto, com fundamento no artigo 557, parágrafo 1.º-A, do Código de Processo Civil, dou provimento ao recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 25 de fevereiro de 2010. Ministro Hamilton Carvalhido, Relator Contra a decisão monocrática do Ministro Relator, a Fazenda do Estado ingressou com o recurso extraordinário, cujo andamento foi sobrestado pelo STJ, tendo em vista que o STF reconheceu a existência de repercussão geral no RE 540.829/SP. No julgamento final, o Colendo STF, contra votos dos Ministros Gilmar Mendes e Teori Zavascki, acolheu a tese de não incidência do imposto no leasing internacional, restando prejudicado o recurso extraordinário da Fazenda. A reação do legislador Constituinte Derivado, por meio da EC 33/2001, contra a soberana decisão da Corte Suprema causou grande insegurança jurídica pela polêmica instaurada perante o STF, que levou mais de uma década para afastar em definitivo as dúvidas dela decorrentes.
2.9.2
Exame do inciso IX , b, do § 2.º do art. 155 da CF
A alínea b do inciso IX igualmente suscita algumas dúvidas. Alguns autores de renome entendem que o dispositivo sob comento se refere a serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicação, abrangidos pela tributação do ICMS. Ora, não faz sentido o legislador constituinte fazer referência à incidência do imposto que já está expressamente inserida na competência impositiva do Estado. O dispositivo seria ocioso e uma das técnicas de interpretação é exatamente a de evitar interpretação que resulte na ociosidade de determinada norma interpretanda. A toda evidência, o dispositivo em tela está se referindo às hipóteses de prestação de serviços como atividade-meio no fornecimento de mercadorias. Sãos os casos, por exemplo, de colocação de tapetes, cortinas, divisórias, vidros, placas de gesso etc. com o material fornecido pelo prestador de serviço, cuja finalidade é a venda desses produtos. É o caso, também, da instalação de aparelhos de ar-condicionado com os equipamentos vendidos pelo prestador de serviço. Na prática, há muita divergência doutrinária e jurisprudencial quando o serviço é executado como uma atividade-meio, e não como uma atividade-fim, hipótese em que a tributação compete ao Município por meio do ISS.
2.10
EXAME DO INCISO X DO § 2.º DO ART. 155 DA CF
Dispõe o art. 155, § 2.º, inciso X, da Constituição Federal: X – não incidirá: a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003.) b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica; c) sobre o ouro, nas hipóteses definidas no art. 153, § 5.º; d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003.) Examinemos separadamente cada uma dessas alíneas.
2.10.1 Exame do inciso X , a, do § 2.º do art. 155 da CF A alínea a dispõe que o ICMS não incidirá sobre operações que destinem mercadorias para o exterior nem sobre os serviços prestados a destinatários no exterior, assegurando-se a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores. Em sua redação original, essa alínea a se referia à não incidência sobre operações que destinem ao exterior rodutos industrializados, excluídos os semielaborados definidos em lei complementar . É noção pacificada na doutrina que a não incidência constitucionalmente qualificada é sinônimo de imunidade tributária. Na realidade, o legislador Constituinte Derivado, ao dar nova redação à alínea a por meio da EC 42, de 19.12.2003, constitucionalizou a não incidência prevista na Lei Kandir, que é bem mais abrangente. Logo, na hipótese, o legislador ordinário não poderá exercer a faculdade prevista no inciso II do § 2.º do art. 155 da CF. Desde a vigência da redação original do texto constitucional, que circunscrevia a não incidência à exportação de produtos industrializados, excluídos os semielaborados, a Corte Suprema reconhecia o caráter de imunidade conforme proclamado em sua Súmula 536, pelo que não fica na faculdade do legislador ordinário permitir ou não a manutenção do crédito, pois imunidade é uma categoria constitucional que não se confunde com a isenção e a não incidência que atuam no campo da aplicação das leis tributárias, e não no campo de definição de competência tributária.
2.10.2 Exame do inciso X , b, do § 2.º, do art. 155 da CF A alínea b dispõe que o ICMS não incidirá “sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica”. No entendimento da Corte Suprema, a não incidência prevista na alínea b não expressa caso de imunidade como na alínea anterior. Ela representa uma norma de não incidência propriamente dita para favorecer o Estado destinatário dos referidos produtos. Por isso, ela não alcança a compra de combustível para circulação, por configurar uma operação interna. O objetivo da não incidência é o de beneficiar o Estado consumidor que fica com a faculdade de tributar pela alíquota cheia (alíquota interna), e não o de favorecer o consumidor de combustível. Fosse uma imunidade objetiva, o consumidor se beneficiaria na compra do combustível de outro Estado, hipótese em que seria inconstitucional a sua tributação na entrada. No entanto, a jurisprudência do STF orientou-se no sentido de que a norma constitucional limita-se a prescrever a não incidência na saída para outro Estado, a fim de propiciar ao Estado onde ocorre o consumo uma tributação mais vantajosa. Nesse sentido, os inúmeros acórdãos proferidos pela Suprema Corte do País, 19 cuja ementa de um deles transcrevemos para melhor compreensão:
Tributário. ICMS. Lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos, derivados do petróleo. Operações interestaduais. Imunidade do art. 155, § 2.º, X, b, da Constituição Federal. Benefício fiscal que não foi instituído em prol do consumidor, mas do Estado de destino dos produtos em causa, ao qual caberá, em sua totalidade, o ICMS sobre eles incidente, desde a remessa até o consumo. Consequente descabimento das teses da imunidade e da inconstitucionalidade dos textos legais, com que a empresa consumidora dos produtos em causa pretendeu obviar, no caso, a exigência tributária do Estado de São Paulo. Recurso conhecido, mas desprovido (RE 198088/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 17.05.2000, DJ 05.09.2003). Na prática, surge uma dúvida quanto a não incidência na operação de saída do álcool anidro, considerando que o texto constitucional sob exame se limita a combustíveis derivados de petróleo, que sabidamente são originários de fontes não renováveis. Em razão da restrição do texto constitucional em vigor, entendemos não servir de parâmetro a antiga jurisprudência da Corte Suprema baseada no art. 21, VIII, da Carta Política antecedente que se referia a lubrificantes e combustíveis líquidos ou gasosos e de energia elétrica . Foi à luz desse texto constitucional que o STF proferiu o acórdão cuja ementa segue transcrita: Imposto único sobre lubrificantes e combustíveis. O álcool anidro destinado a composição de gasolina automotiva e combustível líquido e, como tal, está unicamente sujeito ao imposto de que trata o art. 21, VIII, da Constituição Federal, excluída, portanto, a incidência do ICM sobre as operações realizadas com esse produto. Recurso extraordinário não conhecido (RE 92739/RJ, Rel. Min. Leitão de Abreu, j. 10.10.1980, DJ 12.12.1980). De fato, afirmar que o álcool anidro é combustível líquido é bem diferente de dizer que o álcool anidro é derivado de petróleo. Essa questão merece um exame mais aprofundado do Supremo Tribunal Federal tendo em vista o princípio da isonomia, assim como o objetivo do preceito constitucional sob exame é favorecer os Estados consumidores. Por ocasião dos comentários à Lei Complementar 87/96, voltaremos ao exame dessa matéria de não incidência e do regime de substituição tributária, que conduz à obrigatoriedade de o remetente desses produtos proceder ao recolhimento do imposto a favor do Estado de destino.
2.10.3 Exames do inciso X , c e d, do § 2.º do art. 155 da CF A alínea c afasta a incidência do ICMS sobre o ouro quando definido em lei como ativo
financeiro ou instrumento cambial com o propósito de afastar a bitributação jurídica, pois nas condições retromencionadas haverá incidência do IOF de competência impositiva da União (§ 5.º do art. 153 da CF). A alínea d , por sua vez, visa incentivar o serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita. Se a gratuidade estiver se referindo à radiodifusão sonora, a norma é dispensável, pois estaria correspondendo à figura do rádio amador que no passado, quando os locais distantes não estavam interligados por redes telefônicas, pessoas abnegadas prestavam os serviços de comunicação de forma gratuita nos momentos difíceis decorrentes de catástrofes da natureza ou de doenças graves de pessoas de determinada família que não teriam como se comunicar com demais familiares. Nessas hipóteses, independentemente de preceito constitucional sob exame, não há como pretender a cobrança de um imposto de natureza mercantil.
2.11
O EXAME DO INCISO XI DO § 2.º DO ART. 155 DA CF
Dispõe o art. 155, § 2.º, inciso XI, da Constituição Federal: XI – não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos. O legislador constituinte elegeu uma regra excepcional excluindo o montante do imposto pago a título de IPI da base de cálculo do ICMS sempre que a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configurar fato gerador de ambos os impostos. Daí por que na generalidade dos casos doutrina e jurisprudência permitem incluir na base de cálculo de determinado imposto o montante de outro imposto incidente, bem como a inclusão do próprio valor do imposto em sua base de cálculo, como acontece com os todos os impostos calculados por dentro. Dessa forma, o ICMS de 18% incidente na generalidade dos casos corresponde na realidade à alíquota de 21,951%, e a alíquota de 25% incidente nas operações de venda de energia elétrica e nas de prestação de serviços de comunicação equivale a uma alíquota real de 33,333%, que passa desapercebida pelo consumidor.
2.12
EXAME DO INCISO XII DO § 2.º DO ART. 155 DA CF
Dispõe o inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF:
XII – cabe à lei complementar: a) definir seus contribuintes; b) dispor sobre substituição tributária; c) disciplinar o regime de compensação do imposto; d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços; e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, “a”; f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias; g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados; h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b; (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) Esse inciso XII arrola exaustivamente as matérias que cabem à lei complementar disciplinar, quais sejam: a) definir seus contribuintes; b) dispor sobre substituição tributária; c) disciplinar o regime de compensação do imposto; d) fixar, para efeito de sua cobrança, a definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços; e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, a; f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação, para o exterior, de serviços e de mercadorias; g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do DF, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos ou revogados;20 (h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b;21 i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. 22 As matérias elencadas nas letras a a i estão sob reserva de lei complementar, inserindo-se na previsão dos incisos I a III do art. 146 da CF. Nenhuma lei ordinária no que tange a essas matérias poderá regular de forma diferente da estabelecida em lei complementar. Sendo o ICMS um imposto de vocação nacional, mas inserido na competência impositiva dos Estados por uma questão de
política tributária, cabia a uma lei de natureza nacional editar normas comuns aplicáveis às legislações estaduais. Essa é a Lei Complementar 87/96, que será analisada em capítulo à parte. No item seguinte, examinaremos brevemente as atribuições da lei complementar em relação às matérias previstas nas alíneas a a f . Quanto às alíneas g, h e i, nos ocuparemos com maior detença.
2.12.1 Atribuições da Lei Complementar previstas no inciso XII , a, b, c, e e f , do § 2.º do art. 155 da CF A alínea a submete a definição de contribuintes ao regime de lei complementar para dar uniformidade às legislações estaduais, visto que na operação de circulação de mercadorias surgem sempre duas pessoas relacionadas com o fato gerador da obrigação tributária: o vendedor, sujeito passivo natural que pratica o ato tipificado na lei tributária, e o comprador, que de qualquer modo contribui para a ocorrência do fato gerador e pode, por essa razão, ser nomeado como o responsável tributário nos termos do art. 128 do CTN. A alínea b atribui à lei complementar a tarefa de disciplinar a substituição tributária que outra coisa não é senão a imputação de responsabilidade pelo pagamento do tributo a uma terceira pessoa vinculada ao fato gerador da obrigação tributária. Existe a chamada substituição tributária para trás, utilizada normalmente por razões de praticidade, ou em virtude de o contribuinte, sujeito passivo natural que praticou o ato previsto na norma de incidência tributária, não possuir um estabelecimento apropriado para exploração de sua atividade. São os casos de vendas de produtos agrícolas pelos agricultores a comerciantes atacadistas que ficam responsáveis pelas obrigações tributárias daqueles agricultores vendedores. Nessas hipóteses, o ICMS é pago na entrada das mercadorias. Não há maiores problemas, visto que, nesses casos, o fato gerador da obrigação tributária já ocorreu. Não se confunde com a figura do diferimento que pressupõe a transferência da obrigação de pagar o imposto devido em determinada operação da saída da mercadoria para o momento da ocorrência do fato gerador na posterior operação de saída mercadoria, cujo contribuinte fica com o encargo de pagar também o imposto devido na etapa anterior. No entanto, existe a chamada substituição tributária para frente em que se atribui ao contribuinte a responsabilidade pelo pagamento do tributo que seria devido na etapa posterior de circulação de mercadoria. Ocorre uma verdadeira antecipação do valor do tributo que somente seria devido na futura ocorrência do fato gerador. Há, na verdade, uma violação do próprio conceito de tributo que é um dos raros conceitos determinados em matéria de direito; quem paga um tributo tem o direito de saber exatamente quanto deve pagar, e quem exige o pagamento tem o dever de informar o valor exato do tributo devido. Ora, cobrar um tributo por conta da ocorrência de um fato gerador futuro não propiciará o cálculo de um valor certo e determinado porque a base de cálculo do imposto só transparece no momento da ocorrência do fato gerador. Por
conseguinte, as legislações partiram para a fixação da base de cálculo do imposto da ulterior etapa do ciclo de comercialização, que é uma base de cálculo presumida. Essa substituição tributária foi incorporada ao texto constitucional pela Emenda 3, de 17.03.1993, que acrescentou o § 7.º do art. 150 da CF sob a denominação de “fato gerador presumido”, expressão responsável pelas maiores confusões doutrinárias e jurisprudenciais, vedando a restituição imediata e preferencial de que cuida o § 7.º, sempre que o “fato gerador” presumido vier a ocorrer, ainda que com base de cálculo bem menor do que aquela adotada na tributação antecipada. Voltaremos ao assunto quando comentarmos o art. 10 da Lei Complementar 87/96, que assegura a restituição imediata em 90 dias. A menos que as palavras mudem de sentido, o prazo de 90 dias é incompatível com a palavra imediata. Alías, por ironia, a ampliação do poder tributário para alcançar fatos geradores futuros veio ocorrer exatamente na Seção II, que cuida especificamente Das limitações do Poder de Tributar (art. 150 da CF). O regime de compensação do ICMS também ficou sob reserva de lei complementar, conforme alínea c do inciso XII sob exame. É que, segundo o princípio da não cumulatividade, previsto no inciso I do § 2.º do art. 155 da CF, o montante do imposto cobrado nas operações anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal será compensado. A ressalva do inciso II do § 2.º, que impede a compensação nos casos de isenção e de não incidência, não chega a interferir no tratamento uniforme das legislações estaduais, porque nenhum Estado valeu-se da faculdade aí estabelecida para validar o crédito nas hipóteses previstas. Pelo contrário, todos os Estados partiram para ampliação das hipóteses de anulação de créditos com suposto amparo no art. 8.º da Lei Complementar 24/75. A alínea d atribuiu à lei complementar a fixação para efeito de cobrança do ICMS e a definição do estabelecimento responsável, do local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços. Essa questão diz respeito ao aspecto espacial do fato gerador da obrigação tributária que define em regra o sujeito ativo do imposto. O princípio da territorialidade das normas tributárias estaduais e municipais sofre flexibilização nas hipóteses e nos termos do art. 102 do CTN. De conformidade com a alínea e, a exclusão de incidência do ICMS nas operações de exportações para o exterior também ficou sob reserva de lei complementar. Surte o mesmo efeito de uma imunidade, mas com ela não se confunde, pois a não incidência tributária não tem sede constitucional. O texto constitucional limita-se a determinar que a lei complementar exclua a incidência do imposto. A lei complementar referida no texto sob exame é a Lei Kandir, isto é, a Lei Complementar 87/96, cujo objetivo principal foi desonerar as exportações em geral. Em relação às mercadorias, não há maiores problemas, mas, no tocante aos serviços, a lei complementar não pode dispensar o mesmo tratamento sob pena de tornar difícil a sua compreensão à medida que serviços não comportam propriamente uma exportação que dá a ideia de um transporte. Nos serviços de transporte, por exemplo, quem viaja é o passageiro, não o serviço. Finalmente, a alínea f inseriu na competência da lei complementar a previsão dos casos de
manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias. Já vimos no item 2.10.1 que a alínea a do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF, na redação dada pela EC 42, de 19.12.2003, constitucionalizou a não incidência prevista na Lei Kandir, conferindo-lhe o status de imunidade proclamada pelo STF desde a vigência da redação original que se referia à não incidência sobre operações que destinem ao exterior produtos industrializados, excluídos os semielaborados definidos em lei complementar . De fato, prescreve a Súmula 536 do STF: São objetivamente imunes ao imposto sobre circulação de mercadorias os produtos industrializados, em geral, destinados à exportação, além de outros, com a mesma destinação, cuja isenção a lei determinar. A Lei Complementar 87/96 dispõe nos §§ 1.º e 2.º do art. 25 a forma de utilização dos créditos gerados pelas operações de exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias.
2.12.2 Atribuições da Lei Complementar previstas no inciso XII , g, do § 2.º, do art. 155 da CF A Constituição Federal dispõe na alínea g sob exame que cabe à lei complementar “regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados”. Essa matéria foi colocada sob reserva de lei complementar tendo em vista o caráter nacional do ICMS, como antes salientamos. Se cada unidade da Federação adotasse uma política tributária que bem lhe aprouvesse para fins de atrair investimentos em seu território, acabaria por colocar em risco a federação, a qual é princípio fundamental. Por isso mesmo esse objetivo nacional permanente não poderá ficar sujeito à situação conjuntural do momento, devendo ser preservado em qualquer circunstância, sob pena de descaracterizar a Federação brasileira. A Lei Complementar 24/75, parcialmente recepcionada pelo art. 155, XII, g , da CF, dispôs que as isenções só podem ser concedidas e revogadas por convênios firmados por todos os Estadosmembros e pelo Distrito Federal, nos termos do seu art. 1.º, caput , in verbis: Art. 1.º As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados pelos Estados e pelo Distrito Federal segundo esta Lei. O parágrafo único desse artigo determina a aplicação do caput às seguintes hipóteses:
I – à redução da base de cálculo; II – à devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros; III – à concessão de créditos presumidos; IV – a quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiros-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus. […] O art. 8.º dessa LC 24/75, por sua vez, prescreve: Art. 8.º A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente: I – a nulidade do ato e a ineficiência do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria; II – a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente. Parágrafo único. Às sanções previstas neste artigo poder-se-ão acrescer a presunção de irregularidade das contas correspondentes ao exercício, a juízo do Tribunal de Contas da União, e a suspensão do pagamento das quotas referentes ao Fundo de Participação, ao Fundo Especial e aos impostos referidos nos itens VIII e IX, do artigo 21 da Constituição Federal. Com base nesse art. 8.º, o fisco paulista vem exigindo o estorno do crédito e o pagamento do ICMS em relação às mercadorias procedentes de Estados-membros que concedem incentivos fiscais unilateralmente. O Comunicado CAT 36, de 29.07.2004, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, colocou nada menos do que 11 Estados-membros na lista negra. As mercadorias procedentes desses Estados-membros não têm os créditos do ICMS reconhecidos, devendo o destinatário (comprador) paulista recolher os impostos que os remetentes deixaram de pagar. Mais recentemente, o Comunicado CAT 14, de 24.03.2009, disp ôs sobre incentivo fiscal do denominado “Pró-Emprego” instituído pelo Estado de Santa Catarina, também prejudicando os contribuintes paulistas. Entendemos que apenas os incentivos fiscais consistentes na isenção e na não incidência expressa podem dar ensejo à vedação da compensação com o montante devido nas operações subsequentes, bem como acarretar a anulação do crédito relativo às operações anteriores, nos exatos termos do art. 155, § 2.º, II, da CF. Aliás, esse dispositivo é uma transposição do que estava
prescrito na Emenda Passos Porto, EC 23/83, que veio à luz para derrubar três teses do STF. Uma delas dizia respeito ao direito de crédito na importação de bens de capital. Salientamos que a Lei Complementar 24/75 é anterior à EC 23/83, cujos textos foram incorporados na Constituição de 1988 no que diz respeito à flexibilização do princípio constitucional da não cumulatividade do ICMS. Diante disso, pergunta-se, podem a lei complementar, os convênios, as leis ordinárias, as portarias, os comunicados do CAT, introduzir novas hipóteses de vedação e anulação do crédito do ICMS? A resposta é não. Nada pode se sobrepor ao princípio da supremacia da Constituição. A Constituição elegeu o princípio da não cumulatividade como regra geral, sendo exceção as duas hipóteses elencadas, de forma taxativa, no inciso II do § 2.º do art. 155 da CF: a ocorrência da isenção e da não incidência expressa em uma das etapas de circulação da mercadoria ou do serviço. Logo, os inúmeros incentivos fiscais previstos na LC 24/75, como redução da base de cálculo, concessão de crédito presumido, incentivo financeiro ou quaisquer outros incentivos que resultem na redução ou eliminação direta ou indireta do encargo tributário, não foram recepcionados pela Constituição de 1988, aliás, nem pela EC 23/83. Portanto, esses incentivos não podem implicar estorno de crédito do ICMS. Decisões do STF amparam esse nosso entendimento, conforme ementas a seguir: ICMS. Princípio da não cumulatividade. Mercadoria usada. Base de incidência menor. Proibição de crédito. Inconstitucionalidade. Conflita com o princípio da não cumulatividade norma vedadora da compensação do valor recolhido na operação anterior. O fato de ter-se a diminuição valorativa da base de incidência não autoriza, sob o ângulo constitucional, tal proibição. Os preceitos das alíneas “a” e “b” do inciso II do § 2.º do artigo 155 da Constituição Federal somente têm pertinência em caso de isenção ou não incidência, no que voltadas à totalidade do tributo, institutos inconfundíveis com o benefício fiscal em questão” (RE 161.031/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 06.06.1997). No caso, houve o voto vencido do Min. Ilmar Galvão, que equiparava a redução da base de cálculo à isenção parcial de sorte a ancorar a exigência do estorno de crédito do ICMS no inciso II do § 2.º do art. 155 da CF. Constitucional. Tributário. ICMS. Base de cálculo. Redução. Crédito. Princípio da não cumulatividade da CF, art. 155, § 2.º, I. I – O princípio da não cumulatividade consiste no realizar o abatimento, na operação posterior, do imposto incidente e pago na operação anterior. CF, art. 155, § 2.º, I. Impossibilidade da vedação do crédito em razão da redução da base de cálculo do imposto.
II – RE provido. Não provimento do agravo (RE 355.422/MG, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 28.10.2004). Agravo regimental no recurso extraordinário. Tributário. Lei estadual. Redução da base de cálculo. Benefício fiscal. Crédito. Vedação. Princípio da não cumulatividade. Observância. Lei estadual. Benefício fiscal outorgado ao contribuinte. Crédito decorrente da redução da base de cálculo do tributo. Vedação. Impossibilidade. A Constituição Federal somente não admite o lançamento do crédito nas hipóteses de isenção ou não incidência. Precedente do Tribunal Pleno. Agravo regimental não provido (RE 240.395/RS, Rel. Min. Maurício Correa, DJ 02.08.2002). Constitucional. Tributário. ICM. Lei estadual: redução da base de cálculo: benefício fiscal. Crédito: princípio da não cumulatividade. CF, art. 155, § 2.º, I. Vedação do crédito pela lei estadual: impossibilidade. Precedentes do STF. Agravo não provido (RE 367.504/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 26.03.2004). No mesmo sentido: RREE 355.422 e 298.941. É verdade que há uma tendência em equiparar a redução da base de cálculo à redução de alíquota com o fito de legitimar o estorno do crédito do ICMS, sob o fundamento de que desobedeceu a alíquota mínima interestadual, que tem natureza constitucional (art. 155, § 2.º, IV, da CF). A exemplo da equiparação da base de cálculo à isenção parcial, voto vencido no Plenário da Corte Suprema, essa equiparação à redução de alíquota não deve, também, prevalecer. Não se podem definir as categorias jurídicas ou institutos jurídicos, como queiram, a partir dos efeitos produzidos, sob pena de ferir o princípio constitucional da segurança jurídica (art. 5.º da CF). Não se cria nem se majora tributo por analogia, matéria sob reserva de lei em sentido estrito, pelo que repudiamos, também, a instituição ou majoração de tributo por medida provisória. O disposto no inciso II do § 2.º do art. 155 da CF é uma exceção ao princípio constitucional da não cumulatividade do ICMS. Por tal razão, deve ser interpretado restritivamente. É a regra elementar de hermenêutica. Se equipararmos à isenção total ou parcial toda a gama de incentivos previstos na Lei Complementar 24/75, acabaremos por transformar o ICMS em um tributo cumulativo em que a não cumulatividade será uma exceção. Haverá inversão do princípio constitucional. Se o legislador constituinte utilizou-se dos institutos da isenção e da não incidência expressa, em sua conceituação tradicional, para limitar o direito ao crédito do ICMS, os conceitos desses institutos não podem ser alterados por legislação infraconstitucional e muito menos pelo aplicador do direito. Nenhuma decisão judicial pode elastecer o conceito tradicional de isenção definido no art. 175 do CTN como forma de extinção do crédito tributário, pois é sabido que o Judiciário não pode agir como legislador positivo. Ademais, o art. 111 do CTN determina interpretação literal de norma
que disponha sobre isenção, daí a impossibilidade de ler isenção parcial onde está escrito redução da base de cálculo. Nem se pode ler redução de alíquota onde está prescrita a redução da base de cálculo. Aliás, tanto são diferentes a base de cálculo e a alíquota, embora ambas integrem o aspecto quantitativo do fato gerador, que o § 1.º do art. 153 da CF, nos chamados impostos regulatórios (II, IE, IOF e IPI), faculta ao Poder Executivo, atendidos as condições e os limites fixados em lei, alterar as alíquotas. Não pode o Executivo modificar a base de cálculo dos impostos referidos a pretexto de que provoca idêntico efeito da alteração de alíquotas. Os contribuintes paulistas, que estão sendo punidos por causa desses incentivos fiscais outorgados por outros Estados-membros, sem que nenhuma responsabilidade possa lhes ser imputada à luz dos textos constitucionais e do próprio art. 128 do CTN, devem questionar na Justiça a exigência de estorno e pagamento do ICMS. Os incentivos fiscais são concedidos pelos Estados no interesse próprio, isto é, para atrair os investimentos empresariais e promover o desenvolvimento econômico no âmbito de seus respectivos territórios. Assim, atenta contra o princípio da moralidade pública responsabilizar os contribuintes de boa-fé na hipótese de declaração de inconstitucionalidade. Roque Antonio Carrazza é enfático ao afirmar que o contribuinte de boa-fé não deve ser prejudicado por esses incentivos fiscais outorgados unilateralmente por diferentes Estados burlando a determinação constitucional que exige a sua aprovação por convênio: As vantagens no campo do ICMS, obtidas enquanto a legislação estadual não for declarada inconstitucional, devem ser preservadas. Afinal, as empresas não podem ser punidas, justamente por haverem se norteado na bússola da legislação da própria entidade tributante. Nunca é demais insistir que o Estado deve inspirar confiança nas pessoas e, portanto, não pode punir os que, munidos de boa-fé, agem em consonância com o que a lei estabelece. Ainda que esta lei venha a ser declarada inconstitucional. 23 De qualquer forma, a dupla sanção prevista no art. 8.º da Lei Complementar 24/75 não pode subsistir em face do ordenamento jurídico-constitucional vigente. O inciso I do art. 8.º prevê a nulidade do ato e a ineficácia do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria, o que está de conformidade com o texto constitucional. O inciso II desse mesmo artigo estabelece a exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente. Esse inciso não tem amparo na Constituição. Exigir do contribuinte do Estado destinatário o pagamento do ICMS que não foi pago pelo contribuinte do Estado de origem não faz sentido, pois é neste que o imposto é pago. O que o Estado de destino deve
fazer em face de um incentivo fiscal que entenda ser inconstitucional é ajuizar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra o Estado de origem. O imposto deve ser exigido do contribuinte do Estado de origem após a declaração de inconstitucionalidade do incentivo fiscal concedido, gerando, ipso facto, o direito de crédito em relação ao contribuinte do Estado de destino. A verdade é que a glosa de crédito do ICMS por ato do Executivo ou do Legislativo, prescindindo da ADI, ofende o princípio da separação dos Poderes. Com esse fundamento, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu o mandado de segurança, conforme ementa a seguir: Tributário. ICMS. Operações interestaduais. Comunicado CAT 36/2004 que impede apropriação de crédito em operações interestaduais praticadas com determinados Estados da federação. Sentença terminativa do feito. Reforma – art. 155, § 2.º, inciso XII, alínea “g”, da Constituição Federal exige edição de lei complementar para a concessão de benefícios fiscais, não financeiros. Inaptidão de ato infralegal fazer as vezes de meio de impugnação à constitucionalidade de leis, na medida em que pretendeu antecipar o resultado de ADIns apostas contra as leis que instituíram tais benefícios. Concessão de Segurança. Recurso provido” (Ap. Mandado de Segurança 518.847.5/5-00, Rel. Des. Nogueira Diefenhaler, j. 23.07.2007). O STF, por sua vez, reconheceu a existência de repercussão geral sobre essa matéria, a fim de saber se os Estados têm autonomia administrativa e legislativa para glosar créditos do ICMS decorrentes de incentivos fiscais irregularmente concedidos, mas que não foram objetos de pronunciamento judicial, conforme ementa a seguir: Constitucional. Tributário. ICMS. Guerra fiscal. Cumulatividade. Estorno de créditos por iniciativa unilateral de ente federado. Estorno baseado em pretensa concessão de benefício fiscal inválido por outro ente federado. Arts. 1.º, 2.º, 3.º, 102 e 155, § 2.º, I, da Constituição Federal. Art. 8.º da LC 24/1975. Manifestação pela existência de repercussão geral da matéria (RE 628075-RG/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 13.10.2011, DJe-228, divulg. 30.11.2011, public. 1.º.12.2011). Outrossim, seria desejável que o STF mudasse a atual orientação de aplicar o art. 12 da lei de regência de matéria nas ADIs versando sobre inconstitucionalidade dos incentivos fiscais concedidos unilateralmente por diversos Estados-membros. A concessão de liminar suspendendo no nascedouro o incentivo fiscal inconstitucional certamente provocará uma reorientação política dos governantes que passarão a agir dentro do permitido por normas constitucionais e complementares.
Preocupados com esses incentivos fiscais concedidos sem a intermediação do Confaz pelos diversos Estados da Federação, os senhores Senadores estão debatendo o PLS n° 240/2006 que flexibiliza as normas da Lei Complementar 24/75, que exigem a unanimidade dos Estados representados no Confaz para aprovação do incentivo, e da aprovação de quatro quintos para sua revogação total ou parcial (§ 2.º do art. 2.º). A convocação de todos os Estados é obrigatória e a reunião do Confaz só se realizará com a presença de representantes da maioria dos Estados (art. 2.º, § 1.º). Pela proposta legislativa em discussão, tanto a concessão como a revogação do incentivo fiscal dependerão do voto de três quintos dos Estados representados no Confaz. Temos seríssimas dúvidas quanto à eficácia da medida legislativa em debate no Senado Federal. Em razão do forte centralismo do nosso Regime Republicano, pouca coisa resta para a ação independente dos governantes regionais. Daí a busca de mecanismos tributários para atrair os investimentos nos Estados que governam. A maior parte das atividades dos governantes se resume na elaboração de planos de incentivos, inclusive, os de natureza tributária para alavancar a economia do Estado.24 Cada governante quer fortalecer economicamente seu Estado, pouco se importando com o agravamento do desnível regional, que é um problema de alçada do governo federal. Assim, não é exatamente a rigidez da norma da Lei Complementar 24/75 que tem conduzido à execução da política de concessão de benefícios fiscais de forma unilateral. De fato, se todos os Estados da Federação concederem o mesmo benefício fiscal do ICMS, os empresários não mais terão motivo para investir neste ou naquele Estado incentivado, senão em função da logística que envolve a existência de uma boa infraestrutura, mercado consumidor elevado, redução do custo de transporte etc. Produzir em distantes regiões não desenvolvidas para colocar seus produtos nos grandes centros urbanos não mais será compensador, pelo contrário, trará, com certeza, prejuízos de monta. Por isso, acreditamos que os incentivos fiscais do ICMS, por decisão unilateral dos governantes, continuará gerando as guerras fiscais. Como é sabido, o Supremo Tribunal Federal julgou em bloco 14 ADIs em 1.º.06.2011, declarando a inconstitucionalidade dos incentivos fiscais concedidos unilateralmente por diferentes Estados, sem proceder à modulação de efeitos. O efeito ex tunc, após uma década de discussão, acarretou gravíssimos problemas financeiros a contribuintes que se limitaram a usufruir dos incentivos fiscais que lhes foram outorgados pelos diferentes Estados. Os contribuintes de boa-fé prejudicados certamente baterão às portas do Judiciário para serem ressarcidos dos prejuízos. Em razão dessa injusta situação gerada, foi apresentado ao Congresso Nacional o PLC 238/2013 inserindo normas para convalidar os incentivos concedidos irregularmente, objetivando anular os
efeitos das decisões proferidas pela Corte Suprema. Essa convalidação, segundo o citado PLC, far-se-ia mediante aprovação de novo convênio em que seria exigida a manifestação favorável de no mínimo 3/5 das unidades federadas e 1/3 das unidades federadas integrantes de cada uma das cinco regiões do País (art. 1.º). Prescrevia o art. 2.º que bastava o projeto entrar em discussão no Congresso Nacional para afastar qualquer ação fiscal tendente à recuperação do crédito tributário que deixou de arrecadar em função dos incentivos concedidos irregularmente. Contudo, o Confaz, atropelando o processo legislativo, reuniu-se em Brasília em 29.04.2014 e celebrou o Convênio 70/2014, concedendo anistia a créditos tributários relativos a incentivos fiscais oferecidos sem sua intermediação e que haviam sido declarados inconstitucionais pelo STF. É patente a inconstitucionalidade formal e material desse convênio. Ante a iminência de o STF editar a Súmula Vinculante versando a inconstitucionalidade do benefício fiscal do ICMS concedido sem a intermediação do Confaz, vozes se levantaram. O Senado Federal pediu a sustação do processo de edição dessa Súmula Vinculante alegando que desde 2012 está debatendo e discutindo proposta legislativa para reformular a Lei Complementar 24/75, como se ela fosse a responsável pela concessão de benefícios fiscais inconstitucionais. Partes dos tributaristas também se posicionou contra porque, com a Súmula Vinculante, todos os tribunais deveriam considerar inconstitucionais os benefícios fiscais concedidos à margem do texto constitucional. Ora, a inconstitucionalidade do incentivo fiscal só pode ser atacada pelo ente político interessado perante a Corte Suprema, por meio de ADI. Logo, a Súmula Vinculante só teria o condão de dispensar o STF do julgamento moroso examinando o mérito da lei viciada, podendo ser decidida liminarmente e sustando desde logo os seus efeitos. Essa súmula poderia ser editada com efeito prospectivo para que alcance ocorresse apenas em relação a incentivos fiscais irregulares concedidos a partir de sua edição, a qual, nesses termos, dispensará, inclusive, a providência legislativa retrorreferida – PLC 238/2013 – para convalidar os incentivos fiscais declarados inconstitucionais. Assim, a resistência retratada é sinal indicativo de que ninguém tem interesse em acabar com a guerra fiscal. A única maneira de colocar um ponto final nessas guerras fiscais consiste na reformulação da LC 24/75, inserindo, de um lado, um dispositivo prescrevendo a nulidade das isenções, incentivos ou benefícios fiscais concedidos em desacordo com a lei complementar, sujeitando o beneficiário ao pagamento do imposto não pago com os acréscimos legais, e, de outro lado, prescrever em relação: (a) à entidade federativa responsável pela concessão a aplicação do impedimento previsto no inciso
I do § 3.º do art. 2325 da Lei Complementar 101, de 04.05.2000 (LRF), pelo prazo de quatro anos; (b) aos os agentes públicos responsáveis pela concessão do incentivo fiscal a aplicação da pena de perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos e multa civil de até três vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido, mediante aditamentos aos arts. 10 e 12 da Lei 8.429/92, que define os atos de improbidade administrativa. Assim, ofertamos por intermédio do Conselho Superior de Direito da Fecomercio um substitutivo ao PLC em estudo no Congresso Nacional introduzindo o art. 4.º, versando sobre a nulidade do incentivo fiscal concedido em desacordo com a Lei Complementar e impondo sanções ao contribuinte, à entidade política e ao agente público responsável, e o art. 5.º introduzindo alterações na Lei 8.429/92, que define os atos de improbidade, nos seguintes termos: Art. 4.º A concessão de isenções, incentivos ou benefícios fiscais em desacordo com esta Lei Complementar implica, cumulativamente, ineficácia da lei e nulidade do ato concessivo, sujeitando: I – o contribuinte beneficiário ao pagamento do imposto não pago e acréscimos legais; II – a entidade federativa responsável pela concessão ao impedimento previsto no inciso I, do § 3.º do art. 23 da Lei Complementar n.º 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), pelo prazo de 4 (quatro) anos; III – os agentes públicos responsáveis pela concessão às penas previstas no inciso IV, do art. 12 da Lei n.º 8.429, de 02 de junho de 1992 e demais cominações legais aplicáveis. Art. 5.º A Lei n.º 8.429, de 02 de junho de 1992, passa a vigorar acrescida: (a) da Seção II-A e do art. 10-A: “Seção II-A – Dos Atos de Improbidade Administrativa Decorrentes de Concessão ou Aplicação Indevida de Isenções, Incentivos e Benefícios Fiscais Art. 10-A Constitui ato de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão no sentido de conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõe a Lei Complementar que regula o disposto na alínea g , do inciso II, do § 2.º, do art. 155 da Constituição.” (b) do inciso IV ao art. 12: Art. 12. […] IV – na hipótese do art. 10-A, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos e multa civil de até três vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido.
2.12.3
Atribuição da Lei Complementar prevista no inciso XII , h, do § 2.º, conjugado com os §§ 4.º e 5.º do art. 155 da CF
Essa alínea h foi introduzida pela EC 33, de 11.12.2001, e determina que a lei complementar defina os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X , b. Em outras palavras, no tocante aos combustíveis e lubrificantes definidos em lei complementar, a imunidade do inciso X, letra b, ficaria suspensa. Se entendida esta como uma garantia fundamental, tal qual proclamada pela Corte Suprema nos autos da ADI 937-7, Rel. Min. Sydney Sanches, 26 ela não poderia ser suspensa ou suprimida por uma Emenda Constitucional. Por isso, Hugo de Brito Machado acoima de inconstitucional a tributação desses produtos na entrada no Estado de destino. São suas palavras: A Lei Complementar 87/96 contornou a imunidade em tela. Quando o adquirente é comerciante, mandou aplicar o regime de substituição tributária, e quando o adquirente é consumidor final, atribuiu a este a qualidade de contribuinte, definindo como fato gerador do imposto a entrada do produto no território do Estado respectivo. Flagrante, sem dúvida, é a inconstitucionalidade das normas que determinam, seja a que título for, a incidência de imposto em hipótese de imunidade. Quando o fazem de forma oblíqua, como é o caso da substituição tributária, configuram verdadeira fraude à Constituição.27 Entretanto, como vimos anteriormente, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a aludida norma da letra b do inciso X em questão expressa hipótese de não incidência propriamente dita, estatuída pelo legislador constituinte em benefício não do consumidor, mas do Estado destinatário que poderá tributar pela alíquota cheia (alíquota interna) por ocasião do ingresso daqueles produtos em seu território. Se se tratasse de imunidade objetiva, teria razão o ilustre professor Hugo de Brito Machado, mas não o é. Realmente, o § 4.º do art. 155 da CF dispõe: § 4.º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) I – nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) II – nas operações interestaduais, entre contribuintes, com gás natural e seus derivados, e
lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, o imposto será repartido entre os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas operações com as demais mercadorias; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) III – nas operações interestaduais com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, destinadas a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) IV – as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2.º, XII, g , observando-se o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas por produto; (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou ad valorem, incidindo sobre o valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em condições de livre concorrência; (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no artigo 150, III, b. (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) Por fim, o § 5.º submete à disciplina da lei complementar a elaboração de regras para a aplicação do disposto no § 4.º, in verbis: § 5.º As regras necessárias à aplicação do disposto no § 4.º, inclusive as relativas à apuração e à destinação do imposto, serão estabelecidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do § 2.º, XII, g . (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) Essas normas evidenciam o propósito de o legislador constituinte favorecer o Estado de destino desses produtos, onde ocorrer efetivamente o seu consumo. Essa matéria será abordada com maior profundidade quando do exame da Lei Complementar 87/96.
2.12.4 A tributação por dentro: exame da letra i do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF Essa alínea i comete à lei complementar a tarefa de fixar a base de cálculo, de modo que o
montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço .
2.12.4.1
Generalidades
Como é do conhecimento geral, o STF no julgamento do RE 240.785, Rel. Min. Marco Aurélio, por 6 votos a 4, já havia se posicionado pela exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, porque o imposto não pode ser abrangido pelo conceito de faturamento,28 que é o fato gerador da Cofins. Tentando reverter a situação, o governo ingressou com a Adecon 18-5, que tem preferência no ulgamento. Por 9 votos a 2 foi concedida medida liminar para suspender por 180 dias todos os processos versando sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. Esse prazo de suspensão foi renovado duas vezes por outros 180 dias sem que houvesse o julgamento da Adecon. Em 25-03-2010 foi prorrogada a vigência da liminar por mais 180 dias pela última vez. Se for ulgada procedente, implicará proclamação de improcedência do pedido manifestado no RE 240.785, revertendo a votação majoritária no sentido da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. Julgada improcedente a Adecon e provido o recurso extraordinário, haverá repercussão em cascata impondo a revisão no sistema de cálculo de todos os tributos indiretos, cujos valores, além de incidirem sobre si próprios, compondo a base de cálculo dos próprios tributos, integram, ainda, a base de cálculo de outros tributos, a menos que haja clara previsão constitucional em sentido contrário, como é o caso do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF, que exclui expressamente o valor do IPI da base de cálculo do ICMS. Em razão da paralisação do julgamento da Adecon, após três sucessivas prorrogações da liminar concedida, o STF procedeu ao julgamento final do RE 240.785, Rel. Min. Marco Aurélio, no qual 6 votos já haviam sido colhidos no sentido da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, e por maioria de votos (7 x 2) 29 deu provimento ao recurso extraordinário, decidindo pela impropriedade de tomar o valor de determinado tributo como base de cálculo de outro tributo ( DJe 16.12.2014), conforme ementa nos seguintes termos: Tributo. Base de incidência. Cumulação. Impropriedade. Não bastasse a ordem natural das coisas, o arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro. Cofins. Base de incidência. Faturamento. ICMS. O que relativo a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços não compõe a base de incidência da Cofins, porque estranho ao conceito de faturamento (RE 240785/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 08.10.2014, DJe-246 16.12.2014).
A questão decidida pelo STF não se limita ao refazimento da base de cálculo da Cofins. Por isso, o rombo da receita tributária da União será bem maior do que o estimado pelo governo. Haverá reflexos, também, nas esferas estadual e municipal atingindo a base de cálculo dos impostos indiretos (ICMS e ISS). Como já escrevemos, o imposto indireto é aquele em que o ônus financeiro do tributo é transferido ao consumidor final, por meio do fenômeno da repercussão econômica. 30 Por isso, o valor de tributos indiretos, a exemplo do valor da folha de pagamento e do valor da matéria-prima, entra na composição do preço das mercadorias e dos serviços que agrega, ainda, o valor pertinente à margem de lucro. Na prática, até os tributos diretos que não comportam, em princípio, o fenômeno da repercussão econômica estão sendo repassados a consumidores. É comum, por exemplo, nos consultórios odontológicos haver variação de preço conforme o cliente exija ou não a competente nota fiscal ou recibo equivalente a título de tratamento dentário. Essa tributação por dentro, em que o imposto recai sobre si próprio, implica aumento da alíquota real. O ICMS, por exemplo, que tem a alíquota legal de 18%, se calculado por dentro, como determina a legislação tributária, corresponderá a uma alíquota real de 20,48%. O PIS/Cofins-importação, por exemplo, que incide sobre o valor aduaneiro acrescido do valor do ICMS (18%) e sobre si próprio (9,25%) perfaz uma carga tributária legal de 27,25%. Como os cálculos são feitos por dentro, a carga tributária final representa uma alíquota real de 37,46%, que dá uma diferença de 10,21% ignorada pelo consumidor. Esse critério nebuloso de calcular o valor do tributo atenta contra o princípio da transparência tributária inserto no § 5.º do art. 150 da CF. Embora não tenha sido reconhecida a existência de repercussão geral na decisão proferida no RE 240.785, de fato houve reflexo nas instâncias ordinárias reconhecendo a exclusão do ICMS e do ISS da base de cálculo da Cofins por simetria, tornando bastante controvertida essa questão. Na verdade, o único caso de exclusão expressa na Constituição Federal é o do valor do IPI da base de cálculo do ICMS, “quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos” (art. 155, § 2.º, XI).31 Aparentemente, esse texto constitucional configura uma exceção, sendo a regra geral a inclusão do valor do tributo na base de cálculo de outro tributo. É o entendimento a que conduzem as regras da hermenêutica. Contudo, na realidade, não é bem assim. A partir de questionamentos feitos pelos contribuintes, a jurisprudência vem decidindo caso a caso, sem um critério uniforme, a respeito dessa matéria tão controvertida. Tem decidido pela exclusão em determinada hipótese e pela inclusão em outras hipóteses. O exame desses julgados não permite identificar um critério objetivo e seguro para fixar a tese da
exclusão ou da inclusão. No caso da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, por exemplo, argumentou-se que o valor do ICMS não é abrangido pelo conceito de faturamento sobre o qual incide a Cofins, decidindo-se afinal pela exclusão do valor do ICMS da base de cálculo da Cofins, como vimos. Apesar de o ICMS estar agregado ao preço da mercadoria ou do serviço, a exemplo de outros tributos indiretos, considerou-se o seu caráter tributário, que é inegável. O ICMS por definição legal é um imposto, e não uma mercadoria ou serviço. Logo, o valor do ICMS não poderia compor a base de cálculo desse imposto. Entretanto, na verdade, não apenas o valor do ICMS, mas também os valores da mão de obra e até a margem de lucro do agente econômico estão incluídos no preço representativo do faturamento. Outrossim, como sabemos, o valor dos tributos indiretos compõem a política de fixação de preços dos serviços e mercadorias. Dentro daquela orientação traçada no RE 240.785, os Tribunais Regionais Federais vêm excluindo também o ISS da base de cálculo da Cofins e do PIS. De fato, o princípio é o mesmo. No RE 559.607/RG decidiu-se pela exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofinsimportação dentro da mesma linha de argumentação desenvolvida no RE 240.785/MG, conforme ementa a seguir: Repercussão geral. Contribuição para o PIS e Cofins. Importação. Desembaraço aduaneiro. Base de incidência. Surge a repercussão geral da matéria versada no extraordinário no que o acórdão impugnado implicou a declaração de inconstitucionalidade da expressão “acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições”, contida no inciso I do artigo 7.º da Lei n.º 10.865/2004, considerada a letra “a” do inciso III do § 2.º do artigo 149 da Constituição Federal. Repercussão geral. Consequências. Matéria da competência da Justiça Federal. Uma vez assentando o Supremo, em certo processo, a repercussão geral do tema veiculado, impõe-se a devolução à origem de todos os demais que hajam sido interpostos na vigência do sistema, comunicando-se a decisão aos Presidentes do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, bem como aos Coordenadores das Turmas Recursais, para que suspendam o envio, à Corte, dos recursos que tratem da questão, sobrestando-os. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, nos termos do voto do Relator, solucionando questão de ordem, reconheceu a repercussão geral da matéria versada no extraordinário quanto à declaração de inconstitucionalidade, constante do acórdão impugnado, da
expressão “acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições”, contida no inciso I do artigo 7.º da Lei n.º 10.865/2004, considerada a letra “a” do inciso III do § 2.º do artigo 149 da Constituição Federal. Determinou a devolução à origem de todos os demais recursos idênticos, que tenham sido interpostos na vigência do sistema da repercussão geral, e a comunicação da decisão aos presidentes do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais, da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, e dos coordenadores das Turmas Recursais, para que suspendam o envio ao Supremo Tribunal Federal dos recursos que versem a matéria, sobrestando-os. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausente, justificadamente, o Ministro Eros Grau. Plenário, 26.09.2007 (RE 559607-RG/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe-031, divulg. 21.02.2008, public. 22.02.2008). Como reflexo do pronunciamento da Corte Suprema, um juiz federal de Osasco concedeu medida liminar para excluir o ICMS e o ISS da base de cálculo da contribuição social incidente sobre a receita bruta, a nova modalidade de contribuição social é decorrente da substituição da contribuição social incidente sobre a folha de remuneração. Argumentou-se que o valor do ISS e do ICMS não corresponde à receita bruta, o que, em termos de linguagem comum, parece óbvio. No pagamento do ICMS há saída de dinheiro, e não entrada. Particularmente, somos simpáticos a essa tese, nesse caso específico, porque o governo federal, a pretexto de exoneração da carga tributária representada pela contribuição social sobre a folha, vem procedendo à substituição gradativa pela contribuição incidente sobre a receita bruta, 32 relativamente a diversos setores da economia, aleatoriamente eleitos como contribuintes da nova modalidade de tributação. Isso tem acarretado um aumento brutal da carga tributária em relação às empresas que ostentam uma receita bruta desproporcional ao custo da mão de obra, decorrente, talvez, da utilização de modernos meios de produção, comercialização ou prestação de serviços. Outrossim, no RE 582.525, depois de reconhecida a repercussão geral, o Plenário do STF decidiu que o IRPJ incide sobre a CSLL (art. 1.º da Lei 9.613/96), conforme ementas a seguir: “Constitucional. Tributário. Cosntribuição social sobre o lucro e imposto sobre a renda. Dedução do valor equivalente à contribuição social sobre o lucro da base de dálculo da CSLL e do IRPJ. Manifestação encaminhada pela presença do requisito da repercussão geral” (RE 582.525-6, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 16-5-2008). Constitucional. Tributário. Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer natureza devido pela Pessoa Jurídica (IRPJ). Apuração pelo regime de lucro real. Dedução do valor pago a
título de contribuição social sobre o lucro líquido. Proibição. Alegadas violações do conceito constitucional de renda (art. 153, III), da reserva de lei complementar de normas gerais (art.. 146, III, a), do princípio da capacidade contributiva (art. 145, § 1.º) e da anterioridade (arts. 150, III, a, e 195, § 7.º). 1. O valor pago a título de contribuição social sobre o lucro líquido – CSLL não perde a característica de corresponder a parte dos lucros ou da renda do contribuinte pela circunstância de ser utilizado para solver obrigação tributária. 2. É constitucional o art. 1.º e par. ún. da Lei 9.316/1996, que proíbe a dedução do valor da CSLL para fins de apuração do lucro real, base de cálculo do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ. Recurso extraordinário conhecido, mas ao qual se nega provimento” (RE 582.525, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 07.02.2014). Ora, assim como o ICMS não configura faturamento para ser alcançado pela Cofins, a CSLL não constitui um acréscimo patrimonial a propiciar sua tributação pelo imposto de renda. O pagamento de um tributo pode decorrer de uma renda auferida, mas o seu pagamento não representa uma renda. Prevaleceu, entretanto, a tese de que a CSLL não significa uma despesa operacional, porém uma parte do lucro real reservada ao custeio da Previdência Social. O argumento não nos convence. Uma coisa é dizer que a CSLL decorre do lucro auferido, outra coisa bem diversa é considerar o pagamento da CSLL como uma renda passível de tributação pelo imposto de renda. O mesmo raciocínio que levou à exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins deveria prevalecer em relação à exclusão da CSLL da base de cálculo do imposto de renda. Na realidade, a CSLL, a exemplo de outras despesas como salários, aluguéis, valores de outros tributos indiretos etc., representa um custo para a obtenção do resultado líquido. O certo é que a CSLL não é uma renda, mas um encargo tributário do contribuinte do imposto de renda. Cotejando-se os argumentos despendidos no RE 240.785/MG, no RE 559.607 em caráter de repercussão geral e no RE 582.525, também em caráter de repercussão geral, fica bem difícil encontrar um critério objetivo das hipóteses de exclusão e de inclusão do valor de determinado tributo na base de cálculo de outro tributo. E mais, no RE 582525/RG reconheceu-se a constitucionalidade da inclusão do valor da CSLL na base de cálculo para apuração da própria contribuição social, e não apenas a sua inclusão na base de cálculo do IRPJ. Por tais razões, aproveitando o momento atual em que se pretende implementar uma reforma tributária, sugerimos a aprovação de uma PEC inserindo o § 8.º no art. 150 da CF, vedando a inclusão do valor do tributo na sua própria base de cálculo e na de outro tributo, revogando-se o inciso XI do § 2.º do art. 155 e a letra “i” do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF, com a seguinte redação: § 8.º É vedada a inclusão do valor do tributo na sua própria base de cálculo, bem como a
sua inclusão na base de cálculo de outro tributo sempre que a situação configurar fato gerador de ambos ou mais tributos. A tributação por fora vem de encontro ao princípio da transparência tributária previsto no § 5.º desse art. 150 e tem por finalidade dificultar a ação do sonegador. Dispõe o referido parágrafo: § 5.º A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidem sobre mercadorias e serviços. Outrossim, a exclusão do valor do tributo da base de cálculo de outro tributo, na hipótese de configuração de fato gerador de ambos ou mais tributos, representa um imperativo de justiça fiscal. Finalmente, o anteprojeto da PEC proposto visa conferir segurança jurídica e desafogar o Judiciário com as discussões da espécie que vêm aumentando dia a dia. A questão da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, que atualmente é a receita bruta, está sendo discutida no RE 574.706, em que foi reconhecida a existência de repercussão geral conforme ementa a seguir: Reconhecida a repercussão geral da questão constitucional relativa à inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins e da contribuição ao PIS. Pendência de julgamento no Plenário do Supremo Tribunal Federal do Recurso Extraordinário n. 240.785 (RE 574.706/RG, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe-088, 16.05.2008). Na sessão plenária do dia 15-03-2017, em apertada votação de 6x4, deu-se provimento ao recurso extraordinário para determinar a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. Sob o mesmo argumento utilizado nesse recurso extraordinário, poderá ser questionada a inclusão do ICMS e do IPI na mesma base de cálculo da COFINS. Outrossim, a não exclusão da CSLL da base de cálculo do imposto de renda como decidiu o STF também deverá ser revista sob o mesmo fundamento adotado no RE com repercussão geral. Enfim, enquanto não se adotar a sistemática de tributação por fora, essa discussão sobre a inclusão ou a exclusão do valor do tributo na sua base de cálculo ou na de outros tributos não terá fim. Consoante verificamos, o RE 240.785 referido na ementa já foi definitivamente julgado. Como houve alteração da composição do Plenário do STF, não se pode dizer que o resultado será necessariamente o mesmo alcançado no bojo do RE 240.785. Há, ainda, que se ponderar que a Adecon 18-5 tem preferência no julgamento tendo em vista tratar-se de ação de natureza coletiva. Contudo, essa ação encontra-se paralisada desde 12.12.2014 em virtude de sucessivos e intermináveis pedidos de admissão de amicus curiae. No caso em tela essa figura processual tem propiciado a ação de inimigos da Corte por implicar protelação no julgamento de uma questão que
interessa de perto a toda a sociedade, que continua vivendo em clima de total insegurança jurídica. E mais, o dispositivo legal que fundamentava a Adecon 18-5 (inciso I do § 2.º do art. 3.º da Lei 9.718, de 27.11.1988) não está mais em vigor. Em costumeira reação legislativa contra decisões da Corte Suprema, o art. 52 da Lei 12.973, de 13.05.2014, alterou o art. 3.º da Lei 9.718/98 que define o conceito de faturamento, in verbis: Art. 3.º O faturamento a que se refere o art. 2.º compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-lei n.º 1.598 de 25 de dezembro de 1977. E o art. 12 desse Decreto-lei prescreve: Art. 12. A receita bruta compreende: (Redação dada pela Lei n.º 12.973, de 2014.) I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria; (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) II – o preço da prestação de serviço em geral; (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) III – o resultado auferido nas operações de conta alheia; e (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) IV – as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendida nos incisos I a III. (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) § 1.º A receita líquida será a receita bruta diminuída de: (Redação dada pela Lei n.º 12.973, de 2014) I – devoluções e vendas canceladas; (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) II – descontos concedidos incondicionalmente; (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) III – tributos sobre ela incidentes; e (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014) IV – valores […] […] § 4.º Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário. (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014.) § 5.º Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput , observado o disposto no § 4.º. (Incluído pela Lei n.º 12.973, de 2014.) Isso significa que os valores do ICMS e do ISS serão incluídos na base de cálculo da Cofins, ressalvada apenas a hipótese do § 4.º.
Não há dúvida que esse dispositivo sob comento veio à luz para tentar contornar a decisão da Corte Suprema proferida no RE 240.785/MG, que criou uma hipótese excepcional de exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. Trata-se, na verdade, de uma tentativa vã, pois a Corte Suprema não admite a ampliação do conceito das categorias jurídicas utilizadas pela Constituição para definir a competência tributária. Em outras palavras, o conceito de faturamento ou de receita bruta é o que decorre do direito privado, não podendo sofrer alteração de seu conteúdo para os efeitos tributários, conforme prescreve o art. 110 do CTN: Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. Para contornar a decisão do STF, que o Legislativo entende como equivocada, seria necessária a alteração conceitual do que seja faturamento por via de uma emenda constitucional. Com certeza, esse assunto voltará a ser rediscutido perante o STF.
2.12.4.2 Exame da letra i do inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF A Emenda Constitucional 33, de 11.12.2001, veio acrescer a letra i ao inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF nos seguintes termos: XII – cabe à lei complementar: […] i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. Qual a exegese desse dispositivo constitucional? Em primeiro lugar, o preceito constitucional sob exame exige prévia regulamentação da matéria por lei complementar de sorte a assegurar a uniformidade da inclusão do valor do ICMS na base de cálculo do imposto incidente por ocasião do desembaraço aduaneiro de bens ou mercadorias ou no momento em que se tem por consumada a importação de serviços. Submeteu-se essa regulamentação ao princípio de reserva de lei complementar de aplicação no âmbito nacional, coibindo a iniciativa de leis estaduais. A inclusão do valor do ICMS na sua base de cálculo passou a ser prevista no inciso I do § 1.º do art. 13 da Lei Complementar 87/96, com a redação dada pela Lei Complementar
114, de 16.12.2002, in verbis: § 1.º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V 33 do caput deste artigo: I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle. Em segundo lugar, o advérbio “também” está a indicar que a inclusão do valor do ICMS na base de cálculo do próprio ICMS é a regra geral que passou a ser estendida para as hipóteses de importação de bens e mercadorias e de serviços. Logo, somente uma regra excepcional expressa poderia implicar exclusão do valor do ICMS da base de cálculo desse imposto. Não há na Constituição nem na lei complementar a previsão dessa hipótese excepcional de exclusão. Por isso, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a tributação por dentro, isto é, a incidência do imposto sobre si próprio, conforme se verifica da ementa a seguir: Constitucional. Tributário. Base de cálculo do ICMS: inclusão no valor da operação ou da prestação de serviço somado ao próprio tributo. Constitucionalidade. Recurso desprovido (RE 212.209/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim, j. 23.06.1999, DJ 14.02.2003). Se o valor do ICMS pode compor a base de cálculo desse mesmo imposto, parece-nos razoável sustentar que ele pode integrar a base de cálculo de outros tributos na falta de expressa previsão constitucional em sentido contrário. Assim sendo, a atual jurisprudência do STF, firmada no bojo do RE 240.785/MG, merece uma reflexão maior por ocasião do julgamento do RE 574.706/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, em que se reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional discutida. Acrescente-se que, como vimos no RE 582525/RG, a Corte Suprema reconheceu a constitucionalidade da inclusão do valor da CSLL na base de cálculo da própria contribuição social, validando a chamada tributação por dentro em que o tributo incide sobre si próprio.
2.13
EXAME DO § 3.º DO ART. 155 DA CF
Dispõe o § 3.º do art. 155 da CF: § 3.º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o artigo 153,
I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País (Redação conferida pela EC 33/2001). Em sua redação original, o texto referia-se a “nenhum outro tributo”, pelo que no início surgiram dúvidas quanto à incidência ou não de contribuição social sobre as operações referidas nesse § 3.º. Entretanto, antes da alteração da redação que trocou a palavra “tributo” pela palavra “imposto”, o STF já havia decidido que o texto constitucional, na realidade, se referia a outros impostos dentro da tradição do nosso direito de submeter a tributação de energia e derivados do petróleo ao chamado imposto único. Na Constituição de 1988, a tradição não foi observada em sua inteireza, à medida que ela sujeitou esses produtos à tributação, também do imposto sobre a importação e do imposto sobre a exportação. Outrossim, é de lembrar que, ao submeter o fornecimento de energia elétrica à tributação do ICMS, o legislador constituinte alterou a conceituação tradicional de mercadoria sempre entendida como um bem material objeto de comércio e passível de tradição. De fato, a Constituição somente autoriza os Estados a tributar os serviços de transportes interestadual e intermunicipal e de comunicação. Logo, se for entendido que o fornecimento de energia elétrica configura uma prestação de serviço, o ICMS incidente sobre o fornecimento de energia elétrica seria inconstitucional. Donde se conclui tratar-se de circulação de mercadoria, única exegese possível para legitimar a cobrança do ICMS sobre o fornecimento de energia elétrica. Apesar de permanecer como uma tributação por dentro, a Lei 14.147, de 21.06.2010, obriga as concessionárias fornecedoras de energia elétrica e prestadoras do serviço de comunicação a consignar no campo próprio da fatura (conta de luz/telefone) o demonstrativo do cálculo do ICMS, vindo ao encontro do princípio da transparência tributária inserido no § 5.º do art. 150 da CF. Como aparecem na conta a quantidade de kWh consumido, o valor de cada kWh, a alíquota legal (18% ou 25% conforme a hipótese) e o valor do ICMS, torna-se fácil calcular a alíquota real aplicada, ou seja, alíquota de 21,951% ou de 33,333%, conforme a alíquota legal adotada seja de 18% ou de 25%. Essa transparência fiscal fez que vários consumidores ingressassem em juízo pleiteando a restituição das diferenças. Parte desse consumidores logrou vitória no Judiciário, outra parte não. A verdade é que toda tributação do ICMS é feita por dentro resultando na diferença entre a alíquota prevista em lei e aquela realmente aplicada. Única forma de acabar com essa obscuridade que impede o consumidor de saber o preço das mercadorias e dos serviços antes da tributação é utilizar a técnica de tributação por fora, que torna praticamente impossível a sonegação fiscal, pois no ato de venda o preço da mercadoria, pertencente ao comerciante, já é separado, do valor do tributo, pertencente ao fisco. Os países do Primeiro Mundo adotam essa técnica de tributação transparente.
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BORGES, José Souto Maior. Isenções tributárias. 2. ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980. p. 2. COSTA, Alcides Jorge. Algumas ideias sobre uma reforma do sistema tributário brasileiro. In: NOGUEIRA, Ruy Barbosa (Coord.). Direito tributário atual . São Paulo: Resenha Tributária, 1987/1988. v. 7/8, p. 1756. NUNES, Pedro. Dicionário de tecnologia jurídica . 5. ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1961. p. 177. SOUZA, Rubens Gomes de. Reforma tributária nacional, Comissão do Ministério da Fazenda. Publicação n.º 17, Rio de janeiro: Fundação Getulio Vargas, p. 48, 1966. BRITO, Edvaldo. O ICMS e a LC 87/96 . Obra coletiva. Coordenação de Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 1996. p. 49. HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. Código Tributário Nacional comentado . 2. ed. São Paulo: Rideel, 2016. p. 160. RE 203.075. REsp 622283/SP, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 05.04.2006; REsp 113.4895/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 03.03.2010. Ap. Civ. 57.384-5/SP, Rel. Des. Guerrieri Rezende, JTJ 218, Lex, p. 74-78, jul. 1999. MELO, José Eduardo Soarez de. ISS : aspectos teóricos e práticos. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 105. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 377. Cf. nosso Direito municipal . São Paulo: Atlas, 2001. p. 59. BRITO, Edvaldo. O ICMS e a LC 87/96 . Obra coletiva. Coordenação de Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 1996. p. 79. PIMENTEL, Alexandre Freire. Direito cibernético: um enfoque teórico e lógico-aplicativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 30. Cf. nosso ICM : direito a crédito na isenção e no diferimento. São Paulo: Resenha Tributária, 1979. p. 35-36. Cf. nosso Direito financeiro e tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 413. Ap. Civ. 57.384-5/SP, Rel. Des. Guerrieri Rezende, JTJ . 218, Lex, p. 74-78, jul. 1999. MELO, José Eduardo Soarez de. ISS : aspectos teóricos e práticos. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 105. RE 358.956-3/RJ, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 117, divulg. 26.06.2008, public. 27.06.2008. No mesmo sentido: RE 198.088, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 05.09.2003; RE 338.681, AgRg-ED, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 03.02.2006; RE 201.703, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 14.12.2001; AI no 749.431- AgR, Rel. Min. Eros Grau, DJe 191, 09.10.2009; AI 801149, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 112, divulg. 18.06.2010. Ver Lei Complementar 24, de 07.01.1975. Acrescentada pela EC 33, de 11.12.2001. Acrescentada pela EC 33, de 11.12.2001. Essa Emenda recepcionou o disposto no inciso I do § 1.º do art. 13 da LC 87/96. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS . 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 401. O PLS 240/2006 foi arquivado em dezembro de 2014. Proibição de receber transferências voluntárias, isto é, recursos financeiros transferidos a título de cooperação. RTJ 151/755. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 391. Atualmente, receita bruta. Foram vencidos os Ministros Eros Grau e Gilmar Mendes. Cf. nosso Direito financeiro e tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 339. Posteriormente, a EC 33/2001 para a hipótese de importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço para efeito de cálculo do ICMS, como veremos mais adiante. A Constituição Federal refere-se à receita ou faturamento que não são expressões equivalentes. “V – na hipótese do inciso IX do artigo 12, a soma das seguintes parcelas: a) valor da mercadoria ou bem constante dos documentos de importação, observado o disposto no art. 14; [...] Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento: [...]
X – do desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do exterior.”
3 COMENTÁRIOS À LEI COMPLEMENTAR 87, DE 13.09.1996
Art. 1.º Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
Como se sabe, o novo Sistema Tributário Nacional implantado pela Constituição de 1988 entrou em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da sua promulgação, mantido, até então, o da Constituição de 1967 na redação dada pela Emenda 1/69 e alterações posteriores, conforme proclamado no art. 34 do ADCT. De conformidade, ainda, com o disposto no § 8.º desse mesmo artigo, se, no prazo de sessenta dias contados da promulgação da Constituição, não for editada a lei complementar necessária à instituição do ICMS, os Estados e o Distrito Federal, mediante convênio celebrado nos termos da Lei Complementar 24, de 07.01.1975, fixarão normas para regular provisoriamente a matéria. A provisoriedade durou sete anos e onze meses, quando veio à luz a Lei Complementar 87, de 13.09.1996, que passou a reger em âmbito nacional a instituição e a cobrança do ICMS. É o que está proclamado no art. 1.º sob comento. Art. 2.º O imposto incide sobre: I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares; II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores; III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza; IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios; V – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
§ 1.º O imposto incide também: I – sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade; (Redação dada pela LC n.º 114, de 16.12.2002.) II – sobre o serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior; III – sobre a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde estiver localizado o adquirente. § 2.º A caracterização do fato gerador independe da natureza jurídica da operação que o constitua.
O art. 2.º define o fato gerador do ICMS em seus diversos incisos e parágrafos. Examinemos separadamente cada preceito.
Inciso I Esse inciso inclui, entre as operações de circulação de mercadorias sujeita à imposição do imposto estadual, o fornecimento de alimentação e bebida em bares, restaurantes e estabelecimentos similares. No início, houve interminável discussão doutrinária quanto à competência impositiva: ICMS ou ISS? O debate extrapolou o âmbito das refeições fornecidas em bares ou restaurantes para alcançar aquelas fornecidas em hospitais para os pacientes internados, dividindo as opiniões pela tributação apenas pelo ISS porquanto aquelas refeições faziam parte do tratamento médicohospitalar. Outros pregavam a tributação mista, separando a diária da internação com o valor das refeições que ficariam sujeitas ao ICMS. Hoje, a matéria está pacificada pela tese da incidência apenas do ICMS nas operações de fornecimento de refeições, em bares, restaurantes e estabelecimentos similares que não constam da lista de serviços, apesar de esses fornecimentos implicarem prestação de serviços. Aplica-se no caso o disposto na letra b do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF que prevê a incidência do ICMS quando as mercadorias forem fornecidas com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios. De fato, a tributação do ISS abrange a prestação do serviço de hotelaria, que pode implicar o fornecimento de alimentação, conforme previsão do item 9.01 da lista anexa à Lei Complementar 116, de 31.07.2003, que assim prescreve: 9.01 – Hospedagem de qualquer natureza em hotéis, apart-service condominiais, flat, apart-hot éis , hotéis residência, residence-service, suite service, hotelaria marítima, motéis, pensões e congêneres; ocupação por temporada com fornecimento de serviço (o valor da alimentação e gorjeta, quando incluído no preço da diária, fica sujeito ao Imposto Sobre Serviços).
A Lei Complementar 116/2003 cumpre a contento a sua missão de dirimir conflitos de competência tributária prevista no art. 146, I, da CF.
Inciso II Esse inciso cuida da tributação das prestações de serviços de transportes interestadual e intermunicipal, por qualquer via (terrestre, marítima ou aérea), de pessoas, bens, mercadorias ou valores. No entanto, como veremos mais adiante, o legislador ordinário, acostumado a lidar com o antigo ICM, não se deu conta da incorporação dos serviços de transportes interestadual e intermunicipal e de comunicação na esfera impositiva dos Estados e do Distrito Federal, deixando de regular adequadamente o novo imposto, pelo que faltou densidade jurídica suficiente para aplicação plena do princípio da não cumulatividade e das alíquotas interestaduais no que tange às prestações de serviços. Isso gerou e continua gerando dúvidas e incertezas para as empresas que operam no setor de transportes interestaduais e intermunicipais. Por hora, lembremos que o STF, por maioria de votos, declarou inconstitucional a cobrança do ICMS incidente sobre os serviços de transporte aéreo intermunicipal e interestadual de passageiros e sobre serviços de transportes aéreos internacional de cargas, por não possibilitar a aplicação de alíquotas interestaduais, nem permitir a compensação do imposto pago por ocasião da emissão do bilhete (ADI 1600, Rel. Min. Sydney Sanches, Rel. para Acórdão Min. Nelson Jobim, DJ 26.06.2003). Todavia, em relação ao transporte terrestre interestadual e intermunicipal de passageiros, o STF, por maioria de votos, julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade intentada pela Confederação Nacional de Transporte que buscava o mesmo resultado alcançado na ADI 1600 (ADI 2669, Rel. Min. Nelson Jobim, DJe 19.02.2014). Na verdade, a tese é a mesma numa e noutra hipótese, tanto é que o Ministro Nelson Jobim, no julgamento da adi 1600, havia afirmado que a hipótese versada naqueles autos valia, também, em relação a transportes terrestres. Só se pode entender que a Corte Suprema no interregno de quase doze anos entre um julgamento e outro alterou seu entendimento motivado pela mudança de composição da Corte.
Inciso III O inciso III elege como fato gerador do ICMS as prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza. Aqui duas observações se impõem. A primeira diz respeito à distinção entre prestação do serviço de comunicação e a comunicação em si, isto é, fazer comunicação. O fato de alguém comunicar-se com outro alguém por qualquer meio (telefone fixo ou móvel, e-mail , bip, pager etc.) não tem a menor relevância jurídica, visto que o fato gerador é a prestação do serviço de comunicação que não se
confunde com o objeto do ICMS que é a comunicação. Não há nem pode existir prestação de serviço a si próprio por absoluta ausência de um dos elementos essenciais do fato gerador, que é o elemento quantitativo, a base de cálculo do imposto. A outra observação diz respeito ao campo de abrangência do serviço de comunicação, não importando tratar-se de comunicação local, isto é, aquela em que o ponto inicial e o ponto final estejam localizados no mesmo território municipal. Alguns autores fazem analogia com a tributação dos serviços de transportes em que o transporte local ficou inserido na competência tributária dos Municípios. Não se pode buscar uma competência implícita dos Municípios contra uma competência expressa dos Estados.
Inciso IV Esse inciso dispõe sobre a tributação de serviços não especificados na lista que acompanham o fornecimento de mercadorias, que têm matriz constitucional na letra b do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF. Essa hipótese é comum nas atividades de industrialização por encomenda, bem como na execução dos serviços de instalação de aparelhos de ar-condicionado e similares com o material fornecido pelo vendedor. No que tange à embalagem personalizada, o STF, em sede de medida cautelar nos autos da ADI 4389, acolheu por unanimidade o entendimento segundo o qual incide apenas o ICMS na “industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria” (ADI 4389, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 25.05.2011). Na realidade, a embalagem personalizada, dentro da conceituação clássica, não se apresenta como uma mercadoria, porque ela não é objeto de atos de mercancia. Essas embalagens não são expostas à venda nem há mercado para isso. Elas limitam-se a embalar o produto vendido, na maioria das vezes, para comodidade do consumidor, como no caso de embalagens fornecidas por supermercados. Outras vezes, elas assumem o caráter de insumo, que é o nome dado a um bem ou serviço utilizado na produção de outro bem ou serviço. O conceito de insumo sempre esteve ligado à atividade industrial significando aquilo que integra o novo produto ou é consumido no processo de industrialização. No entanto, a ideia básica reside no fato de que o insumo é um produto indispensável à industrialização. Essa indispensabilidade se faz presente, também, na circulação de determinadas mercadorias. Impossível, por exemplo, vender leite natural ou em pó sem a respectiva embalagem. A mesma coisa acontece com os produtos de higiene e remédios, até mesmo por exigência da Anvisa. Assim, é perfeitamente possível falar em insumo no processo de circulação de mercadorias que, repita-se, não é o caso das embalagens personalizadas, cuja ausência não impossibilita a venda de produtos nos supermercados. No que tange ao serviço de composição gráfica, por encomenda o STF firmou posição no sentido de incidência apenas do ISS. 1 O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, editou a Súmula
156 do seguinte teor: A prestação do serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita, apenas, ao ISS. Em vez de generalizar, a tese deveria examinar cada caso concreto para saber se é a hipótese de incidência do ICMS ou do ISS. Voltaremos a examinar essa matéria no item 7.2.
Inciso V O inciso sob exame insere na competência tributária dos Estados aquelas hipóteses em que há fornecimento de mercadorias com prestação de serviços tributáveis pelos Municípios, mas que, por expressa determinação da lei de regência nacional do ISS, que atualmente é a Lei Complementar 116/2003, ficaram sujeitas à incidência do ICMS. Esse inciso V não oferece maiores dificuldades porque os diversos itens de serviços previstos na lista anexa à Lei Complementar 116/2003 apontam as mercadorias sujeitas ao ICMS. São os casos, por exemplo, da execução dos serviços de construção civil em que as mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços ficam sujeitas ao ICMS (item 7.02); os serviços de lubrificação, limpeza, lustração, revisão, carga e recarga, conserto, restauração, blindagens, manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores, elevadores ou de qualquer objeto, com exceção das peças e partes empregadas que ficam sujeitas ao ICMS (item 14.01); as peças usadas no recondicionamento de motores (item 14.03).
§ 1.º, inciso I Esse inciso foi acrescido pela Lei Complementar 114, de 16.12.2002. Aludido acréscimo ocorreu em função da Emenda Constitucional 33, de 11.12.2001, que introduziu a letra a no inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF para alcançar pela tributação do ICMS a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, contribuinte ou não do imposto, e qualquer que seja a sua finalidade, bem como para tributar o serviço prestado no exterior. Essa adição trouxe muitas dúvidas e incertezas, e em relação à tributação dos serviços (de transporte e de comunicação) prestados no exterior viola patentemente o princípio da territorialidade das leis. A tributação de bem importado para qualquer finalidade por uma pessoa que não é contribuinte habitual do ICMS descaracteriza, na verdade, o caráter mercantil do imposto. Entretanto, a Corte Suprema entendeu no primeiro momento que incide o ICMS na entrada de bem em decorrência da operação de leasing internacional, não se aplicando a não incidência prevista no inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96, que seria reservado apenas às operações de leasing dentro do País. 2 Contudo, editou a Súmula 660 com
o seguinte enunciado para bem separar antes e depois da EC 33/2001: Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. No entanto, aquele entendimento esposado no RE 206.069 foi revisto pelo STF que firmou a tese da não incidência do ICMS na importação de aeronaves e/ou peças ou equipamentos de aeronaves sob o regime de leasing , porque ele não implica posterior transferência do domínio ao arrendatário, sendo a circulação de mercadoria (circulação jurídica) da essência do ICMS. É o que se depreende da ementa do Acórdão a seguir transcrita: Recurso extraordinário. ICMS. Não incidência. Entrada de mercadoria importada do exterior. Art. 155, II, da CB. Leasing de aeronaves e/ou peças ou equipamentos de aeronaves. Operação de arrendamento mercantil. 1. A importação de aeronaves e/ou peças ou equipamentos que as componham em regime de leasing não admite posterior transferência ao domínio do arrendatário. 2. A circulação de mercadoria é pressuposto de incidência do ICMS. O imposto – diz o artigo 155, II, da Constituição do Brasil – é sobre “operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior”. 3. Não há operação relativa à circulação de mercadoria sujeita à incidência do ICMS em operação de arrendamento mercantil contratado pela indústria aeronáutica de grande porte para viabilizar o uso, pelas companhias de navegação aérea, de aeronaves por ela construídas. 4. Recurso Extraordinário do Estado de São Paulo a que se nega provimento e Recurso Extraordinário de TAM – Linhas Aéreas S.A. que se julga prejudicado (RE 461968, Rel. Min. Eros Grau, j. 30.05.2007, DJ 24.08.2007). De fato, tributar simples entrada de um bem importado do exterior sem que houvesse circulação de mercadoria representada pela troca de titularidade ou de posse seria reconhecer a existência de bitributação jurídica, pois a entrada de bem importado no Território Nacional é fato gerador do imposto de importação (art. 19 do CTN), de competência tributária da União (art. 153, I, da CF). É claro que o legislador Constituinte Derivado pode instituir a favor do Estado um imposto novo, como ocorreu em relação a Cofins e PIS/Pasep incidente sobre bens ou serviços importados do exterior, conforme art. 195, inciso IV, da CF acrescido pela EC 42/2003. O que não pode é o Poder Reformador determinar que o ICMS previsto inciso II, caput , do art. 155 da CF prescinde de circulação de mercadoria, pois o parágrafo ficaria em confronto com o caput . Por isso, o STF no RE 540.829 reconheceu a existência de repercussão geral e decidiu o mérito
dessa repercussão, por maioria de votos, firmando definitivamente a tese pela não incidência do ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, contra os votos do Ministro Relator Gilmar Mendes e do Ministro Teori Zavascki, conforme se depreende da ementa a seguir: Recurso extraordinário. Constitucional e tributário. ICMS. Entrada de mercadoria importada do exterior. Art. 155, II, CF/88. Operação de arrendamento mercantil internacional. Não incidência. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 1. O ICMS tem fundamento no artigo 155, II, da CF/88, e incide sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. 2. A alínea “a” do inciso IX do § 2.º do art. 155 da Constituição Federal, na redação da EC 33/2001, faz incidir o ICMS na entrada de bem ou mercadoria importados do exterior, somente se de fato houver circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda). 3. Precedente: RE 461968, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 30.05.2007, DJe 23.08.2007, onde restou assentado que o imposto não é sobre a entrada de bem ou mercadoria importada, senão sobre essas entradas desde que elas sejam atinentes a operações relativas à circulação desses mesmos bens ou mercadorias. 4. Deveras, não incide o ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, salvo na hipótese de antecipação da opção de compra, quando configurada a transferência da titularidade do bem. Consectariamente, se não houver aquisição de mercadoria, mas mera posse decorrente do arrendamento, não se pode cogitar de circulação econômica. 5. In casu, nos termos do acórdão recorrido, o contrato de arrendamento mercantil internacional trata de bem suscetível de devolução, sem opção de compra. 6. Os conceitos de direito privado não podem ser desnaturados pelo direito tributário, na forma do art. 110 do CTN, à luz da interpretação conjunta do art. 146, III, combinado com o art. 155, inciso II e § 2.º, IX, “a”, da CF/88. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento (RE 540829, Rel. Min. Gilmar Mendes, Rel. p/ Acórdão, Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 11.09.2014, DJe-226 divulg. 17.11.2014, public. 18.11.2014). Nesse julgamento o Ministro Relator, Gilmar Mendes, sustentou: O ICMS não pode ser visto, atualmente, como um imposto incidente apenas sobre operações mercantis e alguns serviços, mas também como um imposto que incide sobre importações. Poder-se-ia ter-lhe conferido nova denominação, mas o Constituinte Derivado optou por manter a tradicional nomenclatura. Conforme já afirmamos, nada impedia de o legislador Constituinte Derivado instituir a favor dos
Estados um quarto imposto incidente sobre os bens importados a qualquer título, pois o princípio da não bitributação jurídica é um princípio implícito que decorre da discriminação constitucional de impostos (arts. 153, 155 e 156 da CF), não se constituindo em uma garantia constitucional protegida em nível da cláusula pétrea. Tanto é assim que já tivemos a introdução na esfera da União do Imposto Provisório Sobre a Movimentação Financeira (IPMF) posteriormente convolado em Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF). Uma coisa é a faculdade de o Constituinte Derivado alargar o rol de impostos cabentes aos Estados e outra bem diversa é o mesmo legislador Constituinte Derivado manter o ICMS com as características marcantes do inciso II do art. 155 da CF, entre as quais o aspecto mercantil do imposto, e ao mesmo tempo prescrever em seu § 2.º que aquele ICMS, quando resultar de operação de importação de bens ou mercadorias, prescinde do caráter mercantil. Ora, alterado o aspecto material do fato gerador – operação relativa à circulação urídica –, o imposto deixará de ser aquele previsto no inciso II do art. 155 da CF.
§ 1.º, inciso II A primeira parte do inciso II referente a serviço prestado no exterior não tem matriz constitucional e viola o princípio da territorialidade das normas. A lei brasileira não pode tributar fatos ocorridos no exterior, salvo convenção ou tratado internacional em sentido contrário. A alternativa prevista na segunda parte desse inciso “ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior” está correta. Um serviço de transporte, por exemplo, que tenha iniciado no exterior só se tem por consumado quando chegar ao destino no território brasileiro.
§ 1.º, inciso III Esse inciso decorre da disposição da letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF, segundo a qual não incidirá o ICMS “sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica”. Já vimos que aqueles autores que enxergam na referida norma de não incidência uma imunidade objetiva segundo a doutrina vigorante, que considera como caso de imunidade a não incidência constitucionalmente qualificada, sustentam a inconstitucionalidade desse inciso legal. Argumentam, e com razão, que, se a Constituição imunizou a saída daqueles produtos para outros Estados, não poderia o legislador ordinário tributar a entrada daqueles mesmos produtos procedentes de outros Estados. De fato, se a saída de determinado produto é imune, não se pode tributar na sua entrada. No entanto, já esclarecemos por ocasião do exame daquela norma constitucional que no entender do Supremo Tribunal Federal não se trata de um caso de imunidade, porém de não incidência
propriamente dita, com o fito de favorecer os Estados destinatários onde ocorre o consumo daqueles produtos. Entretanto, essa não incidência não alcança aqueles produtos destinados a consumidor final como se depreende de seu texto aqui reproduzido para melhor exame: III – sobre a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização , decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde estiver localizado o adquirente. Logo, não há incidência do ICMS quando o lubrificante é destinado à industrialização ou à comercialização, incidindo apenas quando destinado ao consumidor final, em perfeita consonância com a disposição constitucional do inciso I do § 4.º do art. 155 da CF. De fato, se o produto for destinado à comercialização no Estado destinatário, o ICMS será integralmente cobrado nesse Estado por ocasião da revenda; se designado à industrialização – seja o produto consumido no processo de industrialização, seja o custo daquele item, procedente de outro Estado, acrescido ao novo produto –, o ICMS comporá o custo do produto industrializado, sendo o imposto inteiramente recolhido por ocasião de sua comercialização. Daí a razão da não incidência do imposto na saída desses produtos para outro Estado, sempre que destinados à comercialização ou à industrialização.
§ 2.º Esse dispositivo deve ser interpretado conforme a Constituição que exige como condição para incidência do ICMS uma operação de natureza mercantil. Realmente, a Corte Suprema vem decidindo que a importação de bens realizados por pessoa jurídica que não seja contribuinte do ICMS não se sujeita ao pagamento do imposto. Com esse entendimento, o STF excluiu da incidência do ICMS a importação de aparelho de mamografia, feita por pessoa jurídica, para utilização em exames radiológicos.3 Logo, a natureza jurídica da operação, ao contrário do disposto na norma interpretada, é relevante para a incidência do ICMS. O fato gerador do ICMS pressupõe sempre uma operação mercantil. O que se pode dizer é que a definição do fato gerador é interpretada com a abstração da validade jurídica dos atos efetivamente praticados, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos e dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos, conforme prescreve o art. 118 do CTN. Contudo, isso é bem diferente da irrelevância jurídica da natureza da operação que constitua o fato gerador, como proclamada nesse § 2.º objeto de análise. Art. 3.º O imposto não incide sobre:
I – operações com livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão; II – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semielaborados, ou serviços; III – operações interestaduais relativas a energia elétrica e petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, quando destinados à industrialização ou à comercialização; IV – operações com ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial; V – operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei complementar; VI – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de espécie; VII – operações decorrentes de alienação fiduciária em garantia, inclusive a operação efetuada pelo credor em decorrência do inadimplemento do devedor; VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário; IX – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de bens móveis salvados de sinistro para companhias seguradoras. Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a: I – empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; II – armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.
Inciso I Esse inciso limita-se a reproduzir com o nome de não incidência a imunidade prevista no art. 150, IV, d , da CF. Como se sabe, a imunidade é a denominação que se dá à hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada. Essa imunidade é de natureza objetiva, não interessando o conteúdo do livro, jornal ou periódico. Livro significa porção de cadernos manuscritos ou impressos e cosidos ordenadamente. Periódico outra coisa não é senão uma publicação que aparece em tempos determinados ou em intervalos iguais, contendo informações de caráter geral. Por isso, os antigos catálogos telefônicos encontravam-se sob a proteção da imunidade conforme jurisprudência do STF. 4 Hoje, a doutrina especializada é unânime em reconhecer a imunidade do livro eletrônico (CD-ROM e disquetes), porque a nova realidade decorrente da ciência da informática propicia igualmente a transmissão de ideias, cumprindo a mesma finalidade do livro tradicional. Conforme escrevemos, a imunidade sob análise tem como “objetivo incentivar a cultura em geral e garantir a livre manifestação do pensamento e do direito de crítica”. 5 Por isso, essa imunidade é protegida em nível de cláusula pétrea.
Inciso II Esse inciso legal foi editado na vigência da alínea a do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF em sua redação original, que imunizava as operações que destinassem ao exterior produtos
industrializados, com exceção dos semielaborados definidos em lei. Esse dispositivo legal deve ser interpretado à luz da redação atual daquela alínea a conferida pela Emenda Constitucional 42/2003, que desonera da tributação as operações que destinem mercadorias para o exterior, e os serviços prestados a destinatários no exterior, assegurando-se a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações anteriores. A redação original do texto constitucional ensejou edição de normas infraconstitucionais objetos de discussões acaloradas em torno da expressão “semielaborados”. O Convênio MF/Confaz-ICMS 66, de 14.12.1988, baseado no § 8.º do art. 34 do ADCT, considerou semielaborados os produtos não destinados a consumo direto, ou seja, aqueles destinados à nova etapa de industrialização, assegurando aos Estados a determinação de níveis adequados de tributação dos semielaborados (art. 3.º, § 1.º). Posteriormente, foi firmado o Convênio 7/89 que listou os produtos semielaborados para efeito de exclusão do benefício fiscal, de conformidade com a Nomenclatura Brasileira de Mercadorias (NBM). Finalmente, sobreveio a Lei Complementar 65, de 14.04.1991, que definiu o que se entende por produtos semielaborados nos seguintes termos: Art. 1.º É compreendido no campo de incidência do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal, e de comunicação (ICMS) o produto industrializado semielaborado destinado ao exterior: I – que resulte de matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral sujeita ao imposto quando exportada in natura; II – cuja matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral não tenha sofrido qualquer processo que implique modificação da natureza química originária; III – cujo custo da matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral represente mais de sessenta por cento do custo do correspondente produto, apurado segundo o nível tecnológico disponível no País. O art. 2.º dessa Lei Complementar delegou ao Confaz a tarefa de nominar os produtos industrializados semielaborados. Houve vários questionamentos judiciais em torno do novo conceito de semielaborados que resultaram na rápida edição do Convênio 15, de 25.04.1991, que ratificou os produtos semielaborados constantes dos Convênios 66/88 e 7/89. A Lei Kandir, Lei Complementar 87/96, por meio do dispositivo legal sob comento, incluiu os produtos industrializados semielaborados no âmbito da não incidência tributária. A referida não incidência expressa veio a ser constitucionalizada pela Emenda Constitucional 42/2003. Contudo, até o advento da Emenda 42/2003, vários questionamentos judiciais ocorreram
impugnando as normas dos Convênios citados, bem como estabelecendo discussões em torno da cumulatividade ou não dos requisitos dos incisos I, II e III do art. 1.º da Lei Complementar 65/91. A urisprudência do STF afasta a tese no sentido da validade da delegação contida no art. 2.º da Lei Complementar 65/91, conforme ementa a seguir: Tributário. ICMS. Art. 155, § 2.º, X, a, da CF. Lei Complementar n.º 65/91. Inconstitucionalidade declarada pelo STJ, do seu artigo 2.º – que teria delegado ao Confaz competência para relacionar os produtos semielaborados sujeitos ao tributo, quando destinados ao exterior –, bem como do Convênio ICMS n.º 15/91, vazado no referido dispositivo. O texto constitucional, no ponto, não incumbiu o legislador complementar de relacionar os produtos semielaborados sujeitos ao ICMS quando destinados ao Exterior, mas apenas de defini-los. De outra parte, a lei complementar, no caso, não delegou ao Confaz competência normativa, mas, tão somente, a de relacionar os produtos compreendidos na definição, à medida que forem surgindo no mercado, obviamente, para facilitar a sua aplicação. Tanto assim, que previu a atualização do rol, “sempre que necessário”, providência que, obviamente, não exige lei ou mesmo decreto. Inconstitucionalidades não configuradas. Recurso conhecido e provido (RE 240.186, Rel. Min. Ilmar Galvão, Plenário, DJ 28.02.2003). No que tange aos requisitos exigidos para configuração de produtos semielaborados, o entendimento consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça foi no sentido de que os incisos I a III do art. 1.º da Lei Complementar 65/91 devem ser interpretados em sua globalidade, e não isoladamente (REsp 149.533 e REsp 178.856). O Ministro Marco Aurélio, relator da ADI 600/DF, impetrada pelo Governador do Estado de Minas Gerais, também manifestou o mesmo entendimento ao afirmar no trecho de seu voto o seguinte: […] É que, não se considerando cumulativas as exigências dos incisos, deixa de haver justificativa para a previsão dos requisitos constantes dos incisos II e III. O simples fato de o produto industrializado semielaborado estar sujeito a incidência desde que resulte de matéria-prima de origem animal, vegetal ou mineral sujeita ao imposto quando exportada in natura revela, de per si, abrangência, a tornar supérfluos os dois incisos seguintes, no que impõe a necessidade de as citadas matérias-primas não terem sofrido qualquer processo que haja implicado modificação da natureza química originária (inciso II) e de apresentarem no custo do produto mais de 60% (inciso III).
Cumpre lembrar que, na vigência da Constituição de 1967, que em seu art. 24, § 5.º dispunha sobre a não incidência do ICM “sobre as operações que destinem ao exterior produtos industrializados e outros que a lei indicar”, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 536 do seguinte teor: São objetivamente imunes ao Imposto de Circulação de Mercadorias os produtos industrializados, em geral, destinados à exportação, além de outros, com a mesma destinação, cuja isenção a lei determinar. O texto da atual Constituição reproduz o dispositivo da Constituição de 1967 explicitando a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto pago nas operações e prestações anteriores. Cumpre lembrar, por fim, que a exoneração tributária em relação às operações que destinem mercadorias ao exterior e prestações de serviços a destinatários localizados no exterior do País decorre da necessidade de estimular a indústria nacional, assegurando às empresas industriais as condições de concorrência internacional de nossos produtos. Como essa imunidade provoca queda de arrecadação nos Estados, o art. 91 do ADCT, acrescido pela EC 42/2003, estatuiu o mecanismo de compensação aos Estados e ao Distrito Federal mediante entrega pela União do “montante definido em lei complementar, de acordo com critérios, prazos e condições nela determinados, podendo considerar as exportações para o exterior de produtos primários e semielaborados, a relação entre as exportações e as importações, os créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e a efetiva manutenção e aproveitamento do crédito do imposto a que se refere o art. 155, § 2.º, X, a” (art. 3.º da EC 42/2003).
Inciso III Esse inciso limita-se a reproduzir o disposto na letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF que dispõe sobre a não incidência do imposto na saída dos produtos aí referidos para o outro Estado, quando destinados à sua comercialização ou à sua industrialização, ou seja, empregados nos processo de industrialização. Já verificamos que a não incidência aí mencionada não configura uma imunidade, mas caso de não incidência do ICMS propriamente dita, com o fito de beneficiar o Estado destinatário, e não o consumidor. Por essa razão, aqueles produtos aí mencionados (energia elétrica, petróleo, lubrificantes etc.) são tributados por ocasião da entrada no Estado destinatário, conforme previsão do inciso III do § 1.º do art. 2.º da LC 87/96, retroexaminado. Entretanto, o imposto vem sendo recolhido na saída do produto do Estado remetente, por força da substituição tributária para frente prevista no § 1.º do art. 9.º a ser comentado mais adiante.
Inciso IV Esse inciso reproduz a não incidência prevista na letra c do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF. O ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial, sujeita-se exclusivamente ao IOF, conforme analisado anteriormente. Trata-se de uma ficção jurídica, pois sabidamente o outro é um bem corpóreo que, quando destinado a atos de mercancia, toma o nome de mercadoria. A definição por lei é indispensável para dirimir conflito de competência impositiva entre Estado e União, por isso alguns autores sustentam que essa definição deve ocorrer por lei complementar, que é o instrumento normativo capaz de cumprir essa missão, nos termos do art. 146, I, da CF. O certo é que a determinação de regulamentação legal já está contida na lei complementar, não fazendo sentido que uma lei complementar remeta a outra lei complementar para a tarefa de fazer a definição determinada no texto constitucional.
Inciso V Esse inciso cuida da não incidência na saída de mercadorias destinadas à utilização na prestação de serviços pelo próprio autor da saída. É o caso típico em que a saída da mercadoria não constitui um objetivo final de venda, mas de sua utilização na atividade-fim que é a de prestar o serviço de competência impositiva municipal nos termos da Lei Complementar 116/2003. É o caso, por exemplo, da instalação e montagem de aparelhos com material fornecido pelo prestador de serviço, previstas no item 14.06 da lista anexa à Lei Complementar 116/2003, in verbis: 14.06 – Instalação e montagem de aparelhos, máquinas e equipamentos, inclusive montagem industrial, prestados ao usuário final, exclusivamente com material por ele fornecido. Nesse caso, pouco importa saber se o fornecedor de aparelhos, máquinas e equipamentos é uma pessoa física ou pessoa jurídica que exerce atividade comercial. Se o móvel da sua atividade for a prestação de serviços especificados na lista de serviços, com o emprego de material por ele fornecido, haverá tão somente a incidência do ISS. Diferente a hipótese de industrialização por encomenda, por exemplo, de um elevador personalizado com a obrigação de o fabricante instalar esse elevador no prédio em construção previamente examinado e estudado por ele. Nesse sentido, o móvel da atuação não é a prestação de serviço, mas a fabricação e venda do elevador sob o regime de encomenda prévia em que há inclusive a obrigação de entregar o equipamento instalado no prédio, conforme pactuado no contrato. Nessa hipótese, haverá a incidência apenas do ICMS, ainda que o serviço de instalação do elevador tenha previsão na lista de serviços. Nas operações mistas, normalmente, o imposto é devido ao Município (ISS) ou ao Estado
(ICMS), salvo raras hipóteses de tributação mista expressamente previstas na legislação, possibilitando a tributação em separado tanto pelo Estado como pelo Município. São os casos dispostos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa à LC 116/2003, como seguem: 7.02 – Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). 7.05 – Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). No caso o item 14.06, haverá incidência apenas do ISS, e o valor dos materiais fornecidos comporá a base de cálculo para apuração do ISS. Se ocorrer a industrialização do elevador por encomenda, o preço da prestação da mão de obra para instalação dele comporá a base de cálculo do ICMS. É o que dispõe, por exemplo, a legislação do ICMS do Estado de São Paulo, Decreto 45.490/2000, em perfeita harmonia com a LC 116/2003, que dirime o conflito de competência ICMS/ISS: Artigo 37. Ressalvados os casos expressamente previstos, a base de cálculo do imposto nas hipóteses do artigo 2.º é: […] § 1.º Incluem-se na base de cálculo: […] 5 – a importância cobrada a título de montagem e instalação, nas operações com máquina, aparelho, equipamento, conjunto industrial e outro produto, de qualquer natureza, quando o estabelecimento remetente ou outro do mesmo titular tenha assumido contratualmente a obrigação de entregá-lo montado para uso, observado o disposto no artigo 126. Verifica-se, portanto, que existe um conjunto normativo disciplinando a competência para a tributação das operações de circulação de mercadorias, das prestações de serviços e das operações mistas, que não se confundem com tributação mista. Como visto, nas operações mistas, de regra, ou o imposto é devido ao Município (ISS), ou ele é devido ao Estado (ICMS). No entanto, a Lei Complementar 116/2003, em alguns casos de operações mistas, adotou, excepcionalmente, o regime de tributação mista, isto é, cobrança pelas duas entidades
políticas, como são os casos dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços retrorreferida.
Inciso VI É caso típico de não incidência legalmente qualificada para deixar bem claro que na hipótese não ocorre o fato gerador da obrigação tributária apesar da transferência de propriedade de uma para outra pessoa física ou jurídica. No caso, a mudança de titularidade não é da mercadoria ou do produto, mas do estabelecimento industrial, comercial ou de qualquer outra espécie no qual estejam contidos os estoques de mercadorias ou produtos. Na hipótese de venda de estabelecimento comercial ou industrial, o sucessor, pessoa natural ou jurídica de direito privado, assume a responsabilidade pelo pagamento dos tributos relativos ao estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato, nos termos do art. 133 do CTN. A respeito, remetemos o leitor ao nosso Código Tributário Nacional comentado .6
Inciso VII Cuida de não incidência do imposto nas operações de alienação fiduciária em garantia, abarcando, também, a operação efetuada pelo credor em decorrência da inadimplência do devedor. Na compra de um veículo, por exemplo, é comum o consumidor, que não dispõe de recursos financeiros próprios, obter de um estabelecimento financeiro o montante necessário para adquiri-lo, dando esse mesmo veículo em garantia do pagamento do mútuo. Dessa forma, esse bem, cuja propriedade assim foi obtida, fica vinculado ao contrato de financiamento até o final da quitação do mútuo. No contrato de alienação fiduciária em garantia, o devedor faz a transferência ao credor de uma propriedade resolúvel de um bem infungível como garantia de débito. Acontece exatamente o contrário na compra e venda com reserva de domínio. Nessa operação, não há incidência do imposto, nem por ocasião da eventual ação de depósito ou de busca e apreensão para reaver do fiduciante inadimplente o bem dado em garantia.
Inciso VIII Nas operações de arrendamento mercantil ( leasing ), que não se confundem com locações de bens móveis, não há incidência de ICMS porque são operações expressamente previstas na Lei Complementar 116/2003, submetendo-as à tributação municipal pelo ISS, conforme item 15.0 da lista de serviços. Quanto a isso, nenhuma dúvida pode pairar. Entretanto, a parte final desse inciso que submete à tributação do ICMS a operação de venda do bem arrendado ao arrendatário nos parece
inconstitucional. A competência do Estado é apenas para instituir os serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicação. A previsão da letra b do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF para o Estado poder tributar o “valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços, não compreendidos na competência tributária dos Municípios”, não ampara a tributação pretendida pelo inciso legal sob comento. É preciso interpretar o contrato de arrendamento mercantil em sua integridade, sem fazer interpretações isoladas a partir do destaque de um dos elementos que compõem o complexo contrato de leasing . Não se trata de um contrato de locação de bem móvel nem de financiamento que, no dizer do Supremo Tribunal Federal, é elemento nuclear do contrato de arrendamento mercantil a autorizar a tributação pelo ISS (RE 592.905/SC). No julgamento do RE 592.905, de que foi relator o Ministro Eros Graus, ficou bem evidenciado o caráter de contrato complexo, mas autônomo do contrato de leasing , conforme se verifica do trecho do voto adiante transcrito: […] no arrendamento mercantil ( leasing financeiro), contrato autônomo que não é misto, o núcleo é o financiamento; não uma prestação de dar. E o financiamento é serviço sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do lease-back . A palavra núcleo utilizada pela Corte Suprema só pode ser entendida como sinônimo de elemento preponderante na formação do contrato autônomo de leasing . O financiamento isoladamente considerado constitui fato gerador do IOF, conforme inciso I do art. 63 do CTN, de tributação privativa da União (art. 153, V, da CF). Considerando que a bitributação jurídica é vedada pela Constituição, salvo nos casos expressos no próprio texto constitucional, o financiamento não pode ser eleito como veículo de incidência tributária do IOF e do ISS ao mesmo tempo. Para fins tributários, o contrato de leasing está tipificado na Lei 6.099, de 12.09.1974, alterada pela Lei 7.132, de 26.10.1983. A conjugação do parágrafo único do art. 1.º com o art. 5.º dessa Lei define com precisão o que seja arrendamento mercantil. Senão, vejamos: Parágrafo único. Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta. (Redação dada pela Lei n.º 7.132, de 1983.) Art. 5.º Os contratos de arrendamento mercantil conterão as seguintes disposições: a) prazo do contrato;
b) valor de cada contraprestação por períodos determinados, não superiores a um semestre; c) opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do arrendatário; d) preço para opção de compra ou critério para sua fixação, quando for estipulada esta cláusula. Parágrafo único. Poderá o Conselho Monetário Nacional, nas operações que venha a definir, estabelecer que as contraprestações sejam estipuladas por períodos superiores aos previstos na alínea b deste artigo. (Parágrafo incluído pela Lei n.º 7.132, de 1983.) Do exame dos textos legais transcritos depreende-se que o arrendamento mercantil caracterizase como um contrato de natureza complexa e autônoma que envolve a compra de um bem segundo as especificações do arrendatário mediante financiamento do respectivo preço com as três faculdades inerentes a esse tipo de contratado a serem exercitadas a critério do arrendatário: a) devolução do bem arrendado no final do prazo contratual; b) a renovação do contrato de arrendamento mercantil; e c) a compra do bem arrendado pelo valor preestabelecido na opção de compra ou pelo valor que resultar do critério estabelecido para fixação do valor. Faltante a cláusula de opção de compra a ser exercida no final do prazo contratual, descaracteriza-se o arrendamento mercantil a que se refere o item 15.09 da lista anexa à Lei Complementar 116/2003, in verbis: 15.09 – Arrendamento mercantil ( leasing ) de quaisquer bens, inclusive cessão de direitos e obrigações, substituição de garantia, alteração, cancelamento e registro de contrato, e demais serviços relacionados ao arrendamento mercantil ( leasing ). Ora, não consta nesse item 15.09 aquela ressalva prevista no inciso VIII do art. 3.º da Lei Complementar 87/96 sob análise, que dispõe sobre a não incidência do ICMS sobre “operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ou ao arrendatário”. Tratando-se de leis de igual hierarquia – a LC 87/96 e a LC 116/2003 –, deve-se entender que a parte final do inciso VIII do art. 3.º da Lei Complementar 87/96 não mais subsiste. Só não nos referimos à revogação porque a Lei Complementar 95/98, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos, aboliu a figura da revogação tácita. Entender de forma contrária seria o mesmo que admitir que a Lei Complementar 87/96 tem o condão de alterar parcialmente a competência tributária municipal que deriva diretamente do texto constitucional.
José Eduardo Soares de Melo também é da mesma opinião quando afirma: A pretendida segregação de atividades no leasing constitui deformação jurídica, por se tratar de negócio em que não se pode cogitar de desmembramento das figuras que o integram (locação mercantil e financeira), o que repeliria a exigência exclusiva do ISS. Ademais, a LC 87/96 somente poderia dispor sobre operações comerciais e serviços de transporte interestadual e intermunicipal, e de comunicação (art. 155, II, CF), e, nunca, anular obliquamente a competência municipal. 7 No sentido da inocorrência do fato gerador do ICMS na venda do bem arrendado no final do prazo contratual, já decidiu o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme ementa a seguir: ICMS – Importação de aeronave – Contrato de arrendamento mercantil ( leasing ) – Não caracteriza o fato imponível do ICMS. I – Os bens importados em decorrência do leasing não se destinam ao consumo, nem ao ativo fixo do importador, porque continuam integrando o patrimônio do arrendante. II – Em que pese a circunstância de o art. 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar n.º 87, de 1996, prescrever que, ao fazer a opção de compra, o arrendatário estaria sujeito à incidência do ICMS, tal mandamento contraria a sistemática do leasing , pois, ao ser exercida a opção de compra, não há mais mercadoria e, como se isto não bastasse, não ocorre nenhuma operação mercantil, mas tão somente uma operação de financiamento (TJSP, AC 57.384-5/SP, Rel. Des. Guerrieri Rezende, JTJ 218/74-78).
Inciso IX Esse inciso coloca a salvo de tributação pelo ICMS a transferência de bens móveis salvados de sinistro para as companhias de seguro. O dispositivo refere-se à transferência de bens salvados de sinistro para a companhia seguradora que, na hipótese de perda total do bem assegurado para a respectiva indenização, exige do segurado a transferência de propriedade desse bem. Durante vários anos travou-se intensa discussão jurisprudencial acerca da incidência ou não do imposto por ocasião da venda do bem salvado de sinistro por parte da companhia seguradora. A Súmula Vinculante 32 do STF veio afastar definitivamente essa controvérsia no sentido da inexigibilidade do ICMS, nos seguintes termos: O ICMS não incide sobre alienação de salvados de sinistro pelas seguradoras.
Parágrafo único O parágrafo único do art. 3.º sob comento contém duas hipóteses de não incidência do imposto promovendo uma equiparação com a hipótese do inciso II que dispõe sobre a não incidência das operações e prestações destinadas ao exterior. A primeira hipótese cuida de saída de mercadoria com destino à empresa exportadora, inclusive trading ou outro estabelecimento da mesma empresa com o objetivo de exportação para o exterior. Tal estabelecimento a que alude o inciso I desse parágrafo único é aquele voltado exclusivamente para o comércio exterior. Uma empresa pode ter vários estabelecimentos com inscrições estaduais autônomas, umas voltadas para o mercado interno e outras para o mercado externo. No início da vigência do antigo ICM, a legislação do Estado de São Paulo exonerava do imposto as exportações promovidas pelas empresas que promoviam exclusivamente as exportações, o que causava problemas fiscais de monta, visto que normalmente as empresas que lidavam com as exportações promoviam também as importações. Dessa forma, posteriormente, a legislação foi alterada para permitir a exoneração tributária sempre que as exportações fossem feitas por meio de empresas que operação exclusivamente com o comércio exterior, ou por meio de um estabelecimento voltado exclusivamente para a exportação para o exterior, possibilitando que a empresa abrisse uma filial exclusivamente para esse fim. A segunda hipótese de não incidência prevista no inciso II desse parágrafo único diz respeito à remessa de mercadoria para armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro. Armazém alfandegado é o local onde as mercadorias a serem exportadas ou aquelas importadas ficam estocadas até o momento de seu desembaraço aduaneiro. A observância das normas fiscais é de inteira responsabilidade do armazém alfandegado que precisa de autorização específica para operar. O entreposto aduaneiro tem o mesmo significado de armazém alfandegado. Uma mercadoria remetida ao armazém alfandegado ou a entreposto aduaneiro só pode dele sair para o exterior do País. Art. 4.º Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. Parágrafo único. É também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial: (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) I – importe mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja a sua finalidade; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) II – seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior; III – adquira em licitação mercadorias ou bens apreendidos ou abandonados; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) IV – adquira lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização. (Redação dada pela LC 102, de 11.07.2000.)
Caput A definição de contribuinte do imposto está sob reserva de lei complementar consoante art. 146, inciso III, letra a, da CF. Em razão da natureza mercantil do ICMS, o contribuinte, conforme define o art. 4.º sob comento, só pode ser a pessoa física ou jurídica que pratique ato de mercancia, circunstância revelada pela sua habitualidade ou pelo volume da operação de circulação de mercadoria ou de prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. O caput do art. 4.º tem matriz constitucional no inciso II do art. 155 da CF que se refere a “operações relativas à circulação de mercadorias” a indicar a natureza mercantil do imposto, isto é, atos de mercancia próprios de comerciantes.
Parágrafo único Esse parágrafo na redação dada pela Lei Complementar 114, de 16.12.2002, veio equiparar à situação de contribuinte pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou finalidade: I – importe mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja a sua finalidade. Esse dispositivo é inconstitucional por estar em confronto com o inciso II do art. 155 da CF que se refere às operações relativas à circulação de mercadorias que pressupõe operação de compra e venda. Se uma pessoa jurídica importa um produto para uso próprio, não há operação de circulação de mercadorias. No início da vigência da EC 33/2001, que alterou a redação da letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF, o STF chegou a reconhecer a sua constitucionalidade (RE 439.796), sendo que na matéria versada, incidência ou não do imposto, foi reconhecida a repercussão geral (RE 594996). Contudo, no julgamento do RE 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 16.06.2015, ficou decidido que a incidência do imposto determinada pela EC 33/2001 só será possível se na entrada de bem ou mercadorias importados do exterior “houver circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda)”. II – seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior. A conjunção alternativa “ou” está a indicar claramente duas situações distintas: (a) serviço cuja prestação se tenha iniciado no exterior; (b) serviço prestado no exterior. No que tange a serviços iniciados no exterior, porque contratados por pessoa localizada em nosso território, nenhuma dúvida há quanto à incidência do imposto. No serviço de transporte internacional isso é comum. Entretanto, no que tange à hipótese b que corresponde à primeira parte do inciso legal interpretado, não há como deixar de reconhecer que se trata um caso típico de tributação do fato gerador ocorrido no exterior.
Ora, pelo princípio da territorialidade das normas, a lei brasileira não pode tributar um fato gerador ocorrido no território estrangeiro, salvo no caso de existência de tratado ou convenção internacional nesse sentido, o que é comum apenas na área do imposto de renda para suavizar a bitributação. Posto que a competência impositiva estadual limita-se aos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, não há como conciliar a primeira parte do incido II sob comento com a exigência da ocorrência do fato gerador no território brasileiro como condição para o exercício da competência tributária. Diferente das hipóteses de serviços tributados pelos Municípios que em alguns casos, por exemplo, de serviço laboratorial executado no exterior pode ser tributado pelo fisco municipal competente. Sobre o assunto assim escrevemos: É o caso, por exemplo, de envio pelo tomador aqui situado de material para ser examinado em laboratório localizado no exterior do País, o qual, após analisado o material, remete o seu resultado final para o tomador. O efeito imediato do serviço só se produzirá com a verificação do resultado final do exame pelo tomador, momento em que se tem por ocorrido o fato gerador. Nessa hipótese o imposto pode ser exigido do tomador na qualidade de responsável tributário, nos termos do inciso I, do § 2.º, do art. 6.º da LC 116/03, desde que a lei do Município competente atribua ao tomador a responsabilidade pelo pagamento do imposto na hipótese em questão. 8 O imposto sob comento é o de prestação de serviços como referido no inciso II do art. 155 da CF. Por imperativo constitucional, o imposto somente pode gravar a efetiva prestação do serviço, nunca o serviço em si, de sorte a possibilitar a tributação do consumidor do serviço. Sem que o tomador tenha a efetiva fruição do serviço que lhe é prestado, não há ocorrência do fato gerador. No caso discutido, não há como uma pessoa aqui situada usufruir do serviço de comunicação ou de transporte executado no exterior. Se essa pessoa é quem paga o serviço executado no exterior a favor de quem quer que seja é uma questão que não tem relevância no direito tributário brasileiro. Esse serviço será certamente tributado no exterior se lá existir um imposto similar ao nosso. III – adquirir em licitação mercadorias ou bens apreendidos ou abandonados. A questão deve ser analisada à luz da legislação estadual aplicável em cada caso concreto. Normalmente as legislações estaduais contemplam a incidência do imposto no caso sob exame, quer seja o adquirente pessoa jurídica, quer seja ele pessoa física com habitualidade ou sem habitualidade e, também, sem intuito comercial. É o que dispõe, por exemplo, o art. 2.º, inciso VII, da Lei 5.900, de 27.12.1996, que regula o ICMS no Estado de Alagoas considerando ocorrido o fato gerador do ICMS no momento da aquisição em licitação pública de mercadoria ou bens importados do exterior ou apreendidos ou abandonados. A mesma lei reputa como contribuinte, no caso, o adquirente qualquer pessoa física com ou sem habitualidade, conforme prescrição do inciso III do § 1.º do art.
18 da citada Lei. Entendemos que as legislações estaduais, bem como o inciso legal sob comento, devem ser interpretados com restrição. Se o adquirente for o consumidor final, não haverá circulação de mercadoria e por conseguinte não implicará incidência do ICMS ao teor da jurisprudência do STF retromencionada. As decisões administrativas em sentido contrário deverão se adequar à urisprudência dos Tribunais Superiores que passa a ser vinculante de conformidade com o novo Código de Processo Civil. IV – adquira lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização. No item 2.10.2, verificamos que o entendimento da Corte Suprema sobre a exegese da letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF é no sentido de que a aludida norma expressa trata-se de caso típico de não incidência tributária com a finalidade precípua de favorecer o Estado destinatário dos referidos produtos. Daí a tributação apenas de produtos destinados a consumidor final localizado em outro Estado, porque nesse caso não haverá operação interna a ensejar cobrança do imposto. A tributação somente alcança a compra de aludidos produtos destinados à circulação. De fato, se o combustível ou outro produto referido na norma sob comento for destinado à comercialização, haverá revenda no mercado interno, hipótese em que o Estado destinatário tributará por alíquota cheia, deixando de aplicar a alíquota interestadual. O mesmo acontece em relação ao produto remetido a outro Estado para industrialização, hipótese em que esse produto será consumido no processo de industrialização ou se agregará ao novo produto resultante da industrialização. Numa e noutra hipótese, o valor do produto adquirido (insumos) restará integrado ao preço final do produto acabado a ser comercializado no Estado de destino. Nenhuma dúvida paira sobre a interpretação desse inciso legal. O grande problema surge quando da aplicação do regime de substituição tributária por ocasião de vendas desses produtos a consumidores finais localizados em outro Estado, como veremos no tópico pertinente. Art. 5.º Lei poderá atribuir a terceiros a responsabilidade pelo pagamento do imposto e acréscimos devidos pelo contribuinte ou responsável, quando os atos ou omissões daqueles concorrerem para o não recolhimento do tributo.
Trata-se de uma reprodução imperfeita do disposto no art. 128 do CTN pelo qual a lei poderá atribuir a terceiros a responsabilidade pelo pagamento do crédito tributário quando vinculado ao fato gerador da respectiva obrigação tributária, excluindo a responsabilidade do contribuinte total ou parcialmente ou atribuindo-a em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da obrigação referida. Como se sabe, o sujeito passivo natural é denominado contribuinte, ao passo que o sujeito passivo, cuja responsabilidade deriva de expressa disposição legal sem que revista a condição de
contribuinte, é chamado de responsável tributário (incisos I e II do parágrafo único do art. 121 do CTN). Logo, é impróprio falar em terceiros responsáveis pelo pagamento de imposto e acréscimos devidos pelo contribuinte ou responsável. O responsável tributário só pode ser a terceira pessoa vinculada ao fato gerador da obrigação tributária, do contrário estaríamos diante de uma responsabilidade tributária objetiva. Em uma operação de compra e venda o sujeito passivo natural é o vendedor que se posiciona como contribuinte. No entanto, a lei, por razões de ordem prática, pode atribuir ao comprador a responsabilidade pelo pagamento do imposto devido pelo vendedor, porque o citado comprador tem relação direta na operação de compra e venda que provoca a ocorrência do fato gerador do ICMS. Art. 6.º Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que assumirá a condição de substituto tributário. (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) § 1.º A responsabilidade poderá ser atribuída em relação ao imposto incidente sobre uma ou mais operações ou prestações, sejam antecedentes, concomitantes ou subsequentes, inclusive ao valor decorrente da diferença entre alíquotas interna e interestadual nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, que seja contribuinte do imposto. § 2.º A atribuição de responsabilidade dar-se-á em relação a mercadorias, bens ou serviços previstos em lei de cada Estado. (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.)
Caput A norma não oferece maiores dificuldades de interpretação. É condição indispensável que o terceiro responsabilizado pelo pagamento do imposto devido por outrem seja contribuinte do imposto, ou que ele seja depositário a qualquer título do produto ou mercadoria objeto de tributação. Em qualquer hipótese, o responsável tributário por substituição do contribuinte deve ter uma vinculação com a situação que configura o fato gerador do ICMS. O depositário, por exemplo, que não é dono da mercadoria de que tem a guarda, promove a entrega dessa mercadoria por ordem e conta do depositante, sujeito passivo natural da obrigação tributária.
§ 1.º Esse parágrafo faculta à legislação estadual promover a substituição tributária para frente, para trás ou concomitante relativamente ao ICMS devido em uma ou mais operações e prestações, inclusive sobre o imposto decorrente da diferença entre alíquotas interna e interestadual, sempre que se tratar de operações e prestações de bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado.
§ 2.º A substituição tributária somente poderá ocorrer relativamente a mercadorias, bens e serviços previstos em lei de cada Estado. Só que essa liberdade do legislador estadual é limitada pelo que dispuser o convênio específico celebrado pelos Estados interessados, conforme prescrição do art. 9.º comentado mais adiante. Art. 7.º Para efeito de exigência do imposto por substituição tributária, inclui-se, também, como fato gerador do imposto, a entrada de mercadoria ou bem no estabelecimento do adquirente ou em outro por ele indicado.
Para autores que entendem que a não incidência do imposto de que estamos tratando corresponde a uma imunidade, porque tem sede na Constituição, a norma sob comento seria inconstitucional. De fato, se é imune a saída de mercadoria de um Estado para outro, por óbvio não se pode tributar a sua entrada. Não há nem pode haver saída de um estabelecimento sem que exista entrada em outro estabelecimento. A hipótese sob análise não é de imunidade, mas de não incidência constitucionalmente qualificada para favorecer o Estado onde se realiza o consumo, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal em reiterados acórdãos. Por isso, o fato gerador tem por ocorrido na entrada da mercadoria no estabelecimento do comprador ou qualquer outro estabelecimento por ele indicado. Art. 8.º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será: I – em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído; II – em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes: a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário; b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço; c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes. § 1.º Na hipótese de responsabilidade tributária em relação às operações ou prestações antecedentes, o imposto devido pelas referidas operações ou prestações será pago pelo responsável, quando: I – da entrada ou recebimento da mercadoria, do bem ou do serviço; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) II – da saída subsequente por ele promovida, ainda que isenta ou não tributada; III – ocorrer qualquer saída ou evento que impossibilite a ocorrência do fato determinante do pagamento do imposto. § 2.º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máxima, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido. § 3.º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importador, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço. § 4.º A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei. § 5.º O imposto a ser pago por substituição tributária, na hipótese do inciso II do caput , corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a
respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto. § 6.º Em substituição ao disposto no inciso II do caput , a base de cálculo em relação às operações ou prestações subsequentes poderá ser o preço a consumidor final usualmente praticado no mercado considerado, relativamente ao serviço, à mercadoria ou sua similar, em condições de livre concorrência, adotando-se para sua apuração as regras estabelecidas no § 4.º deste artigo. (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.)
Caput A base de cálculo é um dos aspectos quantitativos do fato gerador que, com a alíquota aplicável, possibilitará calcular o montante do imposto devido em cada caso. Está sob reserva de lei complementar nos termos da letra a do inciso III do art. 146 da CF. Relativamente à hipótese do inciso I, isto é, no tocante às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, a base de cálculo não oferecerá maiores dificuldades, pois, nesse caso, adotar-seá o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído. O inciso II cuida de operações ou prestações subsequentes utilizando-se três variáveis para se encontrar a base de cálculo para fins de substituição tributária. As hipóteses das letras a e b não oferecem dúvidas por se tratar de valores conhecidos ou conhecíveis. A letra c refere à adição da margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes. É aqui que residem as arbitrariedades das legislações estaduais em geral. Alguns produtos, como são os casos de remédios, sofrem um acréscimo de 50% do valor do fabricante para ser aditado para fins de encontro da base de cálculo na substituição tributária. Esse fato inviabilizou, por exemplo, a atividade das distribuidoras independentes de remédios. A substituição tributária para frente outra coisa não é senão uma técnica de antecipação da arrecadação tributária. Dir-se-á que a base de cálculo extrapolada tem amparo no § 7.º do art. 150 da CF, que introduziu por meio da Emenda 3/93 o chamado fato gerador presumido, na verdade, base de cálculo presumido que tem trazido muita insegurança jurídica e prejuízo irreversível ao contribuinte por substituição, o qual não mais consegue obter de volta o valor pago a mais pela aplicação da base de cálculo fora da realidade do mercado. Realmente, o Supremo Tribunal Federal interpretando aquele § 7.º do art. 150 da CF firmou no bojo da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 1.851/AL) a tese no sentido de que na hipótese de revenda do produto por valor menor do que aquele que serviu de base para a tributação antecipada não há que falar em restituição da diferença, porque no caso teria ocorrido o fato gerador presumido. Há uma inexplicável confusão entre o elemento nuclear do fato gerador – hipótese de incidência tributária – e o elemento quantitativo do fato gerador representado pela base de cálculo. Parece elementarmente sabido que, se existem duas bases de cálculo, uma presumida e outra real, conduzindo a dois valores diferentes, estamos diante de dois fatos geradores. No caso, a base de cálculo presumida não ocorreu concretamente, impondo-se o ajuste do valor do ICMS pago antecipadamente à realidade do fato gerador ocorrido efetivamente por ocasião da venda da
mercadoria ao consumidor final. Contudo, o STF, mediante interpretação literal da expressão “caso não se realize o fato gerador presumido”, tem negado a restituição sempre que o fato gerador ocorre em extensão menor do que aquele presumido. Nesse sentido, a ementa a seguir transcrita: Ação direta de inconstitucionalidade. ICMS. Regime de substituição tributária. Cláusula segunda do Convênio ICMS n.º 013/97, de 21.03.97, e parágrafos 6.º e 7.º do artigo 498 do Decreto n.º 35245/91, com a redação do artigo 10 do Decreto n.º 37.406/98, do Estado de Alagoas. Pretendida afronta ao parágrafo 7.º do artigo 150 da Constituição. Regulamento estadual que estaria, ainda, em choque com os princípios do direito de petição e do livre acesso ao Judiciário. Plausibilidade da alegação de ofensa, pelo primeiro dispositivo impugnado, à norma do parágrafo 7.º do art. 150 da Constituição Federal, o mesmo efeito não se verificando relativamente aos dispositivos do Regulamento alagoano, que se limitaram a instituir benefício fiscal condicionado, que o STF não pode transformar em incondicionado, como pretendido pelo Autor, sob pena de agir indevidamente como legislador positivo. Tributário. ICMS. Substituição tributária. Cláusula segunda do Convênio 13/97 e §§ 6.º e 7.º do art. 498 do DEC. n.º 35.245/91 (redação do art. 1.º do Dec. n.º 37.406/98), do Estado de Alagoas. Alegada ofensa ao § 7.º do art. 150 da CF (redação da EC 3/93) e ao direito de petição e de acesso ao Judiciário. Convênio que objetivou prevenir guerra fiscal resultante de eventual concessão do benefício tributário representado pela restituição do ICMS cobrado a maior quando a operação final for de valor superior ao do fato gerador presumido. Irrelevante que não tenha sido subscrito por todos os Estados, se não se cuida de concessão de benefício (LC 24/75, art. 2.º, § 2.º). Impossibilidade de exame, nesta ação, do decreto, que tem natureza regulamentar. A EC n.º 03/93, ao introduzir no art. 150 da CF/88 o § 7.º, aperfeiçoou o instituto, já previsto em nosso sistema jurídico-tributário, ao delinear a figura do fato gerador presumido e ao estabelecer a garantia de reembolso preferencial e imediato do tributo pago quando não verificado o mesmo fato a final. A circunstância de ser presumido o fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do tributo, dado tratar-se de sistema instituído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado por lei complementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa que a aproxima o mais possível da realidade. A lei complementar, por igual, definiu o aspecto temporal do fato gerador presumido como sendo a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte substituto, não deixando margem para cogitar-se de momento diverso, no futuro, na conformidade, aliás, do previsto
no art. 114 do CTN, que tem o fato gerador da obrigação principal como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. O fato gerador presumido, por isso mesmo, não é provisório, mas definitivo, não dando ensejo a restituição ou complementação do imposto pago, senão, no primeiro caso, na hipótese de sua não realização final. Admitir o contrário valeria por despojar-se o instituto das vantagens que determinaram a sua concepção e adoção, como a redução, a um só tempo, da máquina fiscal e da evasão fiscal a dimensões mínimas, propiciando, portanto, maior comodidade, economia, eficiência e celeridade às atividades de tributação e arrecadação. Ação conhecida apenas em parte e, nessa parte, julgada improcedente (ADI 1.851/AL, Rel. Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, j. 08.05.2002, DJ 15.05.2002). O acórdão do STF não distinguiu o fato gerador presumido, que serviu de base para tributação antecipada e que deixou de se concretizar no mundo fenomênico, do fato gerador da operação subsequente, isto é, venda efetivamente feita a consumidor final, com preço menor do que aquele que embasou a tributação antecipada. É óbvio que o fato gerador ocorreu na venda a consumidor final, nunca na hipotética imaginação do legislador. O fato gerador ocorrido com a venda efetiva da mercadoria ao consumidor final não corresponde àquele fato gerador presumido que ensejou a tributação por substituição tributária, porque a base de cálculo é diferente. E sabemos que a base de cálculo é um dos elementos integrantes do fato gerador, sem a qual não se cogita de fato gerador da obrigação tributária. Dois valores distintos de ICMS pressupõem dois fatos geradores: um presumido que serviu de base para tributação antecipada, mas que acabou não ocorrendo concretamente, e outro que aconteceu efetivamente no mundo da realidade, porém em extensão menor do que aquele presumido. Se essa decisão não for revertida, amanhã o fisco poderá promover a tributação antecipada do ICMS com base no plano de produção para o exercício seguinte e deixar de restituir o tributado a mais, sob a alegação de que a produção existiu, embora em menor escala do que o projetado. O equívoco que vínhamos apontando desde o início do primeiro julgamento realizado pela Corte Suprema nos idos de 2000 ganhou eco no julgamento do Recurso Extraordinário 593849-RG/MG sob a relatoria do Min. Edson Fachin, que substituiu o Ministro Ricardo Lewandowski, onde se reconheceu a existência de repercussão geral sobre o tema constitucional debatido. Nesse julgamento histórico, houve reversão da tese sustentada no RE 266523/MG e na ADI 1.851/-AL, determinandose a restituição do ICMS pago a maior na operação de substituição tributária. Com isso, conferiu-se exata interpretação ao disposto no § 7.º do art. 150 da CF defendido por nós desde o seu advento. O ulgamento ocorreu no dia 19.10.2016 e ainda pende a publicação do acórdão. A decisão foi tomada por maioria de votos, sete votos dando provimento ao recurso extraordinário (Ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Marco Aurélio, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Luís
Barroso) e três votos contrários (Ministros Gilmar Mendes, Teori Zavascki e Dias Toffoli), ausente o Ministro Celso de Mello. Houve modulação de efeitos para impedir a repetição de indébito, salvo nos Estados de São Paulo e de Pernambuco onde as legislações previam a restituição do imposto pago a maior nas operações de substituição tributária. É o seguinte o teor da decisão, cujo julgamento foi publicado no DJe de 27.10.2016 e pendente de publicação do respectivo acórdão: Decisão: O Tribunal, apreciando o tema 201 da repercussão geral, por maioria e nos termos do voto do Relator, conheceu do recurso extraordinário a que se deu provimento, para reformar o acórdão recorrido e afirmar o direito da parte recorrente em lançar em sua escrita fiscal os créditos de ICMS pagos a maior, nos termos da legislação tributária do Estado de Minas Gerais e respeitado o lapso prescricional de 5 (cinco) anos previsto na Lei Complementar 118/05; na qualidade de prejudicial, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 22, § 10, da Lei 6.763/1975, e 21 do Decreto 43.080/2002, ambos do Estado de Minas Gerais; fixou interpretação conforme à Constituição nas expressões “não se efetive o fato gerador presumido”, no § 11 do art. 22 da Lei estadual, e “fato gerador presumido que não se realizou”, no artigo 22 do Regulamento do ICMS, para que essas sejam entendidas em consonância à tese objetiva deste tema de repercussão geral; e condenou a parte recorrida ao pagamento das despesas processuais, à luz da legislação processual regente ao tempo da interposição do recurso extraordinário, ficando a parte vencida desonerada do pagamento de honorários advocatícios, conforme o enunciado da Súmula 512 do STF e o art. 25 da Lei 12.016/2009, vencidos os Ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que negavam provimento ao recurso extraordinário. Por unanimidade, o Tribunal fixou tese nos seguintes termos: “É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”. Em seguida, o Tribunal modulou os efeitos do julgamento a fim de que o precedente que aqui se elabora deve orientar todos os litígios judiciais pendentes submetidos à sistemática da repercussão geral e os casos futuros oriundos de antecipação do pagamento de fato gerador presumido realizada após a fixação do presente entendimento, tendo em conta o necessário realinhamento das administrações fazendárias dos Estados-membros e do sistema judicial como um todo decidido por essa Corte. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 19.10.2016. Como o texto constitucional alude à “imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”, essa restituição deve ser feita em dinheiro. A palavra
imediata expressa o modo de agir diretamente, imediatamente, sem qualquer intermediação. E a palavra preferencial significa um ato de preferência, de prioridade. A restituição imediata e preferencial não se coaduna com o direito de lançar na escrita fiscal os créditos do ICMS pagos a maior. A operação aritmética de confrontar os créditos com os débitos do mês serve, tão somente, para as operações normais de circulação de mercadoria, assim entendida aquela operação em que há transferência de propriedade ou de posse. Assegurar ao contribuinte substituído apenas o direito de lançar mão do crédito, resultante da diferença entre o que pagou antecipadamente e o que realmente resultou da sua operação de revenda, mediante escrituração em seu livro fiscal, não ensejará a recuperação do desfalque econômico-financeiro sofrido pela tributação antecipada, com a adoção de uma base de cálculo irreal que não se concretizou no mundo da realidade. O contribuinte substituído continuará acumulando, eternamente, o crédito de ICMS, sem a possibilidade de sua compensação, pois nas revendedoras de veículos, por exemplo, a maior parte das operações diz respeito às mercadorias sujeitas ao regime de substituição (veículos), sendo raras as hipóteses de vendas de outras mercadorias não sujeitas ao referido regime especial. A única forma compatível com a determinação constitucional – assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido – consiste na restituição em dinheiro. Diferente a hipótese em que o imposto foi pago a menor, só para argumentar, pois na prática isso não acontece por conta da extrapolação do valor de mercado na operação de substituição tributária, como vimos. Na hipótese de imposto pago a menor na operação de substituição tributária, somente para fins de argumentação, o imposto a pagar em determinado mês, resultante do confronto dos créditos pela entrada, e dos débitos pela saída, será recolhido no prazo legal precedido de comunicação ao fisco por meio de GIA do ICMS apurado, em vez de continuar escriturando como débito para o mês seguinte. Se a restituição deve ser feita imediata e preferencialmente, como prescreve o texto constitucional, não há como submeter o contribuinte-credor a um evento futuro e incerto que, provavelmente, nunca ocorrerá: a superação, em determinado mês, do débito do ICMS decorrente de saídas de mercadorias em relação ao crédito do ICMS resultante de entradas de mercadorias no mesmo período.
§ 1.º Esse parágrafo fixa o momento em que deverá ser pago o imposto na hipótese de responsabilidade tributária relativamente às operações ou prestações antecedentes: (a) na entrada ou recebimento da mercadoria, do bem ou do serviço; (b) na saída subsequente promovida pelo substituto tributário, ainda que isenta ou não tributada essa operação de saída; e (c) quando ocorrer qualquer evento que impossibilite a ocorrência do fato determinante do pagamento do imposto.
§ 2.º Esse parágrafo está em desuso, pois não mais existem os preços tabelados pelo governo. Antigamente existia a famosa Comissão Interministerial de Preços que fixava os preços das mercadorias. Os preços dos automóveis, por exemplo, eram tabelados. Hoje, como base de cálculo dos automóveis para fins de substituição tributária, é adotado o preço de cada montadora de veículos. Por força do mercado de concorrência, nenhuma revendedora consegue vender pelo preço de tabela, fazendo descontos que ensejariam, segundo a lei sob comento, a restituição imediata e preferencial, não fosse a jurisprudência da Corte Suprema.
§ 3.º Conforme dissemos nos comentários ao parágrafo anterior, as montadoras de veículos têm as suas tabelas de preços. Pelo que sabemos, nenhum outro setor industrial mantém tabelas de preços de seus produtos, pelo menos visíveis ao público em geral. Contudo, temos dúvidas da constitucionalidade desse parágrafo, considerando que a base de cálculo está sob reserva de lei complementar. E a lei complementar não pode, a nosso ver, adotar como base de cálculo o valor sugerido por um particular, ainda que se considere uma tributação provisória sujeita a ajuste final que, segundo a jurisprudência do STF, será definitiva, como verificamos anteriormente.
§ 4.º A determinação desse parágrafo não vem sendo cumprida pelos legisladores ordinários dos Estados, que vêm prescrevendo adição de 50% do valor conferido pelo fabricante a título de margem de lucro do revendedor, com o fito de aumentar consideravelmente o valor da arrecadação antecipada do ICMS. As antigas pautas de valores que o fisco estabelecia para fins de apreensão das mercadorias em trânsito também eram fixadas de forma arbitrária, não guardando proporção com os preços vigentes no mercado. Atualmente, essas pautas não mais existem porque todas elas foram consideradas inconstitucionais.
§ 5.º Esse parágrafo limita-se a explicitar a metodologia de cálculo do imposto a ser observada na hipótese do inciso II, isto é, na operação de substituição tributária por ocasião da saída subsequente promovida pelo substituinte, aplicável mesmo nas hipóteses de isenção e de não incidência uridicamente qualificada. Em outras palavras, o substituto tributário deverá recolher o ICMS relativo à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota pertinente às operações ou
prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo, além do valor do imposto devido pela operação ou prestação do próprio substituto tributário.
§ 6.º Esse § 6.º oferece uma alternativa à aplicação do inciso II do caput . Poderá a legislação ordinária de cada Estado prescrever que a base de cálculo em relação às operações ou prestações subsequentes será o preço a consumidor final, normalmente praticado em condições de livre concorrência. A apuração desse preço a consumidor final deverá ser feita de conformidade com as regras previstas no § 4.º que, entre outras coisas, manda considerar os preços levantados ainda que por amostragens ou por meio de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores da atividade econômica para, a final, adotar a média ponderada dos preços coletados. Como já o dissemos, o legislador sempre fixou esses preços de forma arbitrária a fim de favorecer o fisco. Art. 9.º A adoção do regime de substituição tributária em operações interestaduais dependerá de acordo específico celebrado pelos Estados interessados. § 1.º A responsabilidade a que se refere o artigo 6.º poderá ser atribuída. I – ao contribuinte que realizar operação interestadual com petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, em relação às operações subsequentes; II – às empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica nas operações internas e interestaduais, na condição de contribuinte ou de substituto tributário, pelo pagamento do imposto, desde a produção ou importação até a última operação, sendo seu cálculo efetuado sobre o preço praticado na operação final, assegurado seu recolhimento ao Estado onde deva ocorrer essa operação. § 2.º Nas operações interestaduais com as mercadorias de que tratam os incisos I e II do parágrafo anterior, que tenham como destinatário consumidor final, o imposto incidente na operação será devido ao Estado onde estiver localizado o adquirente e será pago pelo remetente.
Esse artigo traça as regras básicas para o emprego da substituição tributária pelos Estados interessados. O caput impõe como condição de validade da substituição tributária a prévia existência de um convênio firmado entre os Estados. Nos termos do § 1.º, a substituição tributária somente poder ser feita: (a) em relação à operação interestadual com petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, em relação às operações subsequentes; (b) relativamente às empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica nas operações internas e interestaduais, na condição de contribuinte ou de substituto tributário, pelo pagamento do imposto, desde a produção ou importação até a última operação. Portanto, é inconstitucional a generalização do regime de substituição tributária prevista no Convênio ICMS 93/2015, alterado pelo Convênio ICMS 152/2015, relativamente a toda e qualquer operação interestadual feita com consumidor final. O § 2.º prescreve que nas operações interestaduais com
esses produtos destinados a consumidor final o imposto caberá ao Estado de destino cumprindo o comando contido no inciso I do § 4.º do art. 155 da Constituição. O primeiro Convênio firmado pelos Estados interessados para viabilizar as substituições tributárias nas operações envolvendo esses produtos foi o de número 3/99, alterado pelos Convênios 27/99, 46/99, 72/99, 83/99/ 21/2000, 45/2000, 52/00, 53/2000, … e 50/2008. A cláusula primeira desse convênio implementa o disposto no inciso III do § 1.º do art. 2.º da LC 87/96, que é uma decorrência do disposto na letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF, bem como do disposto no § 4.º do citado art. 155 da Constituição. Para melhor clareza, transcrevemos adiante esses dispositivos constitucionais e legais, bem como a cláusula primeira desse convênio. Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] X – não incidirá: […] b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica. […] § 4.º Na hipótese do inciso XII, h,9 observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001) I – nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo. (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) Por sua vez, obedecendo ao comando constitucional, prescreve o art. 2.º da Lei Complementar 87/96: Art. 2.º O imposto incide sobre: […] § 1.º O imposto incide também: […] III – sobre a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica,
quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais, interestaduais, cabendo o imposto imposto ao Estado Es tado onde estiver locali l ocalizado zado o adquirente. adquirente. A Constituição prescreveu a não incidência do imposto na saída desses produtos para favorecer o Estado de destino, onde ocorre o seu consumo. E a LC 87/96 promoveu a tributação desses produtos produtos procedentes de outros outros Estados na entrada entrada no território de determinado determinado Estado. E por questões de praticidade no recolhimento do imposto, a LC 87/96 faculta à legislação ordinária de cada Estado a substituição tributária, de sorte que o remetente dos produtos referidos promova o recolhimento do ICMS a favor do Estado destinatário, na forma dos arts. 6.º e 9.º que pressupõem a existência de um convênio. Somente os produtos mencionados no convênio é que comportam a substituição tributária, quando não destinados à industrialização ou à comercialização, isto é, quando destinados ao consum consumidor final. final. É o que prescreve a cláusu cl áusula la prim pr imeira eira do citado Convênio Convênio 3/99: 3/ 99: Cláusula Primeira. Ficam os Estados e o Distrito Federal, quando destinatários, autorizados a atribuir aos remetentes de combustíveis e lubrificantes, derivados ou não de petróleo, situado em outra outra Unidade da Federação, a condição de contribuint contribuintes es ou de sujeitos passivos por substituição, relativamente ao ICMS incidente sobre as operações com esses produtos, a partir da operação que os remetentes estiverem realizando, até a última, assegurando o seu recolhimento à unidade federada onde estiver localizado o destinatário. § 1.º O disposto nesta cláusula também se aplica: […] III – na entrada de combustíveis e lubrificantes derivados de petróleo, quando não destinados à industriali industrialização zação ou à comerci comercialização alização pelo pel o destinatário. O Convênio 3/99 foi substituído pelo de número 110/2007, cuja cláusula primeira com as alterações subsequentes tem a seguinte redação: Cláusula Primeira. Ficam os Estados e o Distrito Federal, quando destinatários, autorizados a atribuir ao remetente de combustíveis e lubrificantes, derivados ou não de petróleo, a seguir seguir relacionados, relac ionados, com a respectiva respec tiva classificação class ificação na Nomenclatu Nomenclatura ra Comu Comum do Mercosul – NCM –, situado em outra unidade da Federação, a condição de sujeito passivo passi vo por substitu substituição ição tributária, tributária, relativamente relativamente ao ICMS ICMS incidente incidente sobre as operações com esses produtos, a partir da operação que o remetente estiver realizando, até a última, assegurando assegurando o seu recolhim recol himent entoo à un unidade idade federada onde estiver localizado local izado o destin des tinatário: atário: I – álcool etílico não desnaturado, com um teor alcoólico em volume igual ou superior a 80% vol. (álcool etílico anidro combustível e álcool etílico hidratado combustível),
2207.10.00; Nova redação dada ao inciso II da cláusula cláusula primeira pelo Con Conv. v. ICMS ICMS 68/12, efeitos a partir de 27.06.12. II – gasolinas, 2710.12.5; Redação origin ori ginal, al, efeitos até 26.06.12. II – gasolinas, 2710.11.5; III – querosenes, 2710.19.1; IV – óleos combustíveis, 2710.19.2; V – óleos lubrifican l ubrificantes, tes, 2710.19.3; Nova redação dada ao inciso VI da cláusula cláusula primeira pelo Con Conv. v. ICMS ICMS 68/12, efeitos a partir de 27.06.12. VI – outros óleos de petróleo ou de minerais betuminosos (exceto óleos brutos) e preparação prepar ação não especificadas especi ficadas nem compreendidas compreendidas nou noutras tras posições, posições , que contenh contenham am,, com c omoo constituintes básicos, 70% ou mais, em peso, de óleos de petróleo ou de minerais betum betuminosos, exceto exceto os que que contenh contenham am biodiesel biodie sel e exceto os resíduos de óleos, 2710.19.9; Redação origin ori ginal, al, efeitos até 26.06.12. VI – óleos de petróleo ou de minerais minerais betu b etum minosos (exceto óleos brutos) brutos) e preparações prepara ções não especificadas nem compreendidas em outras posições, contendo, como constituintes básicos, básico s, 70% ou mais, mais, em peso, de óleos de petróleo ou de minerais betum betuminosos, exceto exceto os desperdícios, 2710.19.9; 2710.19.9; Nova redação dada ao inciso VII da cláusula cláusula primeira pelo Con Conv. v. ICMS ICMS 68/12, efeitos a partir de 27.06.12. VII – resíduos res íduos de óleos, óleo s, 2710.9; Redação origin ori ginal, al, efeitos até 26.06.12. VII – desperdícios de óleos, 2710.9; VIII – gás de petróleo e outros hidrocarbonetos gasosos, 2711; Nova redação dada ao inciso IX do caput da da cláusula primeira pelo Conv. ICMS 41/09, efeitos a partir de 01.08.09. IX – coque de petróleo e outros resíduos de óleo de petróleo ou de minerais betuminosos, 2713; Redação origin ori ginal, al, efeitos até 31.07.09. IX – coque de petróleo, betume de petróleo e outros resíduos dos óleos de petróleo ou de minerais betuminosos, 2713; Nova redação dada ao inciso X da cláusula primeira pelo Con Convv. ICMS ICMS 68/12, efeitos a partir de 27.06.12.
X – biodiesel e suas misturas, que não contenham ou que contenham menos de 70%, em peso, de óleos óle os de petróleo ou de óleos minerais minerais betuminosos, betuminosos, 3826.00.00; Redação origin ori ginal, al, efeitos até 31.07.09. X – derivados de ácidos graxos (gordos) industriais; preparações contendo álcoois graxos (gordos) ou ácidos carboxílicos ou derivados destes produtos (biodiesel), 3824.90.29; Acrescido o inciso XI à cláusula primeira pelo Conv. ICMS 146/07, efeitos a partir de 18.12.07. XI – preparações lubrificantes, exceto as contendo, como constituintes de base, 70% ou mais, em peso, de óleos óle os de petróleo ou de minerais betum betuminosos, 3403. § 1.º O disposto nesta cláusula também se aplica: […] III – em relação ao diferencial de alíquotas, aos produtos relacionados nos incisos do caput e nos incisos I e II do § 1.º, sujeitos à tributação, quando destinados ao uso ou consumo e o adquirente for contribuinte do imposto; IV – na entrada no território da unidade federada destinatária de combustíveis e lubrificantes derivados de petróleo, quando não destinados à sua industrialização ou à sua comercialização pelo destinatário. Os textos constitucionais, legais e convencionais são de uma clareza lapidar, de sorte que não deveria estar gerando tantas demandas judiciais não fosse a gula fiscal de várias unidades da Federação brasileira que distorcem o sentido etimológico da palavra para exigir o pagamento do ICMS pelo regime de substituição tributária sempre que os produtos mencionados na Constituição, na LC 87/96 e no Convênio 110/2007 não forem eles próprios objetos de industrialização. Por meio de artifício legislativo alguns Estados estão alargando o campo de incidência tributária claramente definido pela LC 87/96, de aplicação cogente em todo o território nacional, mediante descabida interpretação dada à expressão “quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais”. Destinados à industrialização significa aqueles produtos consumidos no processo de industrialização (material secundário), ou integrados no novo produto resultante resultante da industriali industrialização zação (produt (pr odutoo int i nterm ermediár ediário). io). A moderna moderna doutrina, doutrina, desde de sde Aliomar Aliomar Baleeiro, Baleeir o, denomina de insumos tanto o produto consumido no processo de industrialização quanto aquele que passou a integrar integrar o novo novo produto. produto. Sobre a matéria matéria assim ass im se manif manifesta esta o festejado festejado autor: […] é uma algaravia de origem espanhola, inexistente em português, empregada por alguns economistas para traduzir a expressão inglesa “input”, isto é, o conjunto dos fatores produtivos, produtivos, como como matérias-prim atérias-pr imas, as, energia, energia, trabalho, amortização amortização do capital etc., empregados pelo empresário para produzir o “output” ou o produto final. […]. Insumos são os ingredientes da produção, mas há quem limite a palavra aos “produtos intermediários”
que, não sendo matérias-primas, são empregados ou se consomem no processo de produção.10 Em ambas as hipóteses o Estado destinatário cobrará o ICMS incidente sobre o preço do produto produto industriali industrializado zado onde evidentement evidentementee estão embut embutidos idos os preços das matérias-primas atérias- primas e dos insumos adquiridos. Somente quando destinados ao consumidor final é que não haverá oportunidade para o Estado destinatário destinatário tributar, tributar, por ausência ausência de circu circ ulação do produto produto em seu s eu território, razão pela qual cabe ao rem r emeten etente te na na condição de substitut substitutoo tributário tributário recolher r ecolher o imposto imposto a favor do Estado destinatário por ocasião da saída de seu estabelecimento. Onde está a dúvida? Por óbvio, quando se tratar de remessa de mercadoria, o que deve ser comercializado no Estado de destino é a mesma mercadoria remetida. Não faria sentido algum valer-se da não incidência do imposto pela venda de um sapato, por exemplo, a pretexto que recebeu de contribuinte situado em outro Estado uma mesa. Há de ser revendida a mesma mercadoria. Contudo, tratando-se de remessa para a industrialização, não faz sentido exigir que o próprio produto recebido de outro Estado seja industrializado. Não é lógico adquirir um lubrificante para produzir outro lubrificante, ou adquirir energia elétrica de outro Estado para produzir energia elétrica, caso isso fosse possível. No entanto, por incrível que pareça, é exatamente o que estão exigindo alguns Estados. É o que dispõe, por exemplo, a Lei 6.763/75 que rege o ICMS do Estado de Minas Gerais: Art. 5.º O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS – tem como fato gerador as operações relativas à circulação de mercadorias e às prestações de serviços servi ços de transporte transporte interestadual interestadual e interm intermun unicipa icipall e de comun comunicação, icação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. § 1.º O imposto imposto incide sobre: sob re: […] 4. a entrada, em território mineiro, decorrente de operação interestadual, de petróleo, de lubrificantes e combustível líquido ou gasoso dele derivados e de energia elétrica, quando não destinados destinados à comercia comercialização lização ou à industriali industrialização zação do próprio própri o produto. Inseriu-se no item 4 do § 1.º do art. 5.º a expressão “do próprio produto”, o que restringe o alcance e o conteúdo da norma da LC 87/96 e do Convênio ICMS 110/2007 que pairam acima da legislação local. E o que é pior, o Tribunal de Justiça local vem dando guarida à legislação local em claro confronto com a legislação nacional e o Convênio 110/87 que regem a substituição tributária na hipótese de remessa de petróleo e seus derivados e energia elétrica. A jurisprudência de nossos tribunais, ainda que para efeitos de crédito do ICMS, reconhece que no processo de industrialização são empregados os produtos intermediários ou secundários
consumidos no processo industrial ou agregado ao novo produto, como se verificam das ementas a seguir: Tributário. ICMS. Aproveitamento de crédito. Utilização material de consumo no processo produtivo produtivo (óleo diesel para transporte transporte interno interno do ferro-gusa). ferro-gusa). Decreto-lei 406/68, Convênio 66/88 e Lei Complementar 87/96. Taxa Selic. Fundamentação deficiente. Súmula 284/STF. 1. Considera-se deficiente a fundamentação do recurso especial que indica como violado dispositivo de lei federal que não serve de sustentação à tese defendida. Prejudicada a tese sobre a legalidade da aplicação da taxa taxa Selic. 2. Na vigência do Decreto-lei 406/68 e do Convênio 66/88, a aquisição de produtos ou mercadorias que, apesar de integrarem o processo de industrialização, nele não eram completamente consumidos nem integravam o produto final, não gerava direito ao creditamento do ICMS. Previsão expressa do não creditamento (inciso III do art. 31 do Convênio Con vênio 66/88). 66/88) . 3. Entretanto, a LC 87/96 (Lei Kandir) veio a reconhecer o direito ao crédito de ICMS relativo à aquisição de bens destinados ao ativo imobilizado, material de uso e consumo, bem como como ao recebim recebi mento ento de serviço servi ço de transporte. Jurispr Jurisprudên udência cia pacificada paci ficada nesta nesta Corte. 4. Reconhecimento, no caso concreto, da legalidade do aproveitamento de crédito do ICMS sobre aquisição de óleo diesel consumido no processo produtivo a partir de 1.º de janeiro de 1998, de acordo acor do com o art. 33 da LC LC 87/96 (em sua redação original). 5. Recurso especial da Fazenda não conhecido e provido em parte o recurso especial da Usiminas (RE 850632/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 02.03.2007, 02.03.2007, p. 235). No mesm mesmoo sentido sentido já decidiu de cidiu o Egrégio Egrégio Tribun Tribunal al de Justiça do Estado de Minas Minas Gerais: Tributário. Embargos à execução fiscal. Cda. Nulidade. Inexistência cerceamento de defesa. Inocorrência. ICMS. Creditamento. Convênio n.º 66/88. Lei Estadual n.º 6.763/75. RICMS/91. IN SLT n.º 01/86. Bens de uso e consumo. Ativo fixo. Insumos. Produtos intermediários. Enquadramento. Direito de crédito. 1. Não é nula a CDA substituída nos termos do § 8.º do art. 2.º da LEF, contendo os elementos suficientes para a defesa do contribuinte. 2. Não há falar em cerceamento de defesa quando o magistrado não aprecia a perícia períc ia contida nos nos autos, autos, desde que o faça segundo segundo o livre convenciment convencimentoo motivado. motivado. 3. De acordo com o Convênio n.º 66/88, a Lei n.º 6.763/75 e o RICMS/91, só geram direito de crédito de ICMS os bens adquiridos que são consumidos no processo produtivo, mas não os bens de uso e consumo e destinados ao ativo permanente do estabelecimento. 4. Havendo prova de que parte dos bens enquadrados como de uso e consumo pela Fazenda
Pública são, na realidade, insumos ou produtos intermediários de consumo imediato ou integral, deve ser assegurado o direito de crédito ao contribuinte. 5. Segundo jurisprudência do Supremo Supremo Tribunal ribunal Federal, Federal , não cabe atualização atualização monetária onetária de créditos crédi tos escriturais. 6. Preliminares rejeitadas e recurso parcialmente provido (Processo 1.0027.99.013112-3/001, Rel. Des. Edgard Penna Amorin, DJ 20.09.2007). 20.09.2007). Entretanto, o mesmo tribunal mineiro para efeitos de substituição tributária decidiu que não basta a remessa do produto para a industrialização, quer para ser consumido no processo de industriali industrializado, zado, quer quer para par a se agregar agregar ao novo produto, produto, devendo o próprio produto produto ser industriali industrializado, zado, conforme ementa a seguir: Tributário. Ação anulatória. Presunção de certeza e liquidez. Demonstração. Prova. Ausência. Decisão mantida. Sabe-se que o substituto tributário é eleito para recolher, além do ICMS da operação própria, própri a, o ICMS ICMS denominado denominado “ST – substitu substituição ição tributária” tributária”,, qu quee é recolhido antecipadamente, por imposição legal. A norma a respeito do tema, que autoriza, agora na seara constitucional, o procedimento da substituição tributária é aquela contida no § 7.º, do artigo 150, da Constituição da República, que dispõe que “a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não não se realize real ize o fato fato gerador gerador presum pr esumido”. ido”. Tal regramento, por sua literalidade, afasta qualquer dúvida acerca da constitucionalidade do instituto, sobretudo por encontrar amparo em observância sistemática dos princípios constitucionais, que buscam, ainda que de forma mediata, uma melhor implementação da máquina fiscal, visando a impedir práticas que possam frustrar o alcance dos objetivos constitucionais traçados pela Carta Magna. Se a própria mercadoria não é submetida ao processo de industrialização não há que se afastar a exigência tributária, sob o argumento de que a Lei Estadual teria culminado em excesso de restrição não prevista na Lei complementar (Apelação Cível 1.0024.12.235223-0/001, 1.0024.12.235223-0/ 001, Rel. Des. Geraldo Geral do August Augusto, o, DJ 21.10.2013). 21.10.2013). Para que paire nenhuma dúvida, transcreve-se outro trecho do v. Acórdão, em que se exige a industrialização do próprio produto adquirido: Com efeito, os produtos derivados de petróleo a que se referem os autos não foram eles próprios, própri os, destinados à industriali industrialização, zação, o que que é requisito para que a exação fosse fosse afastada.
A jurisprudência mineira, calcada na legislação tributária do Estado de Minas Gerais, afasta-se do figurino figurino constitucion constitucional al e da lei le i de regência regência da d a matéria matéria e contrari contrariaa a jurisprudência jurisprudência do STJ firmado em caso de operação interestadual com energia elétrica, produto igualmente submetido ao regime de substituição tributária, conforme ementa a seguir: Embargos de declaração no recurso especial. Pretensão de efeitos infringentes. Incidência do princípio da fungibilidade recursal. Recebimento como agravo regimental. Precedentes do STJ. Tributário. ICMS. Energia elétrica. Operação interestadual de fornecimento. Não incidência do imposto quando a energia é destinada ao processo de industrialização (LC 87/96, arts. 2.º, 2.º , § 1.º, III, III, e 3.º, 3.º , III). III). Circunstân Circunstância cia evidenciada nos autos autos por meio de prova pro va pericial. peric ial. Decisão Deci são recorrida recor rida fundada fundada na anális análisee de dispositivos dis positivos in i nfraconstitu fraconstitucionais. cionais. Agravo Agravo regiment regimental al desprovido. desprovi do. 1. Aplicado o princípio da fungibilidade recursal, para receber os Embargos de Declaração como Agravo Regimental, nos termos da jurisprudência desta Corte, tendo em vista a pretensão de efeitos infringentes. Precedentes: EDcl no AREsp 175.781/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 22.08.2012; EDcl no AREsp 101.112/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 24.08.2012; EDcl no AREsp 102.413/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 20.08.2012. 2. A jurisprudência desta Corte fixou a tese de que é possível a apuração de crédito presumido presumido de ICMS ICMS quando quando a energia energia elétrica for utilizada em atividade primordialment primordialmentee industrial, considerando-a, assim, insumo. Precedentes: AgRg no Ag 1.156.362/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 24.08.2010; AgRg no Ag 1.182.149/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 26.03.2010; EREsp 899.485/RS, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.09.2008. 3. No caso, trata-se de operação interestadual de fornecimento de energia elétrica a sociedade empresária que desenvolve atividade de indústria petroquímica. Não se discute, portanto, portanto, a possibi po ssibilidade lidade de creditam cre ditament entoo do ICMS, mas, mas, sim si m, a não incidência do referido tributo, em atenção à regra originalmente insculpida no art. 155, § 2.º, X, b, da CRFB. A ideia subjacente à possibilidade de creditamento, todavia, pode ser estendida aos casos de não incidência, tanto que o próprio legislador infraconstitucional previu no art. 2.º, III, da LC 87/96 que referido imposto não incidirá sobre a entrada de energia elétrica no território do Estado destinatário quando esta for destinada à comercialização ou à industrialização e seja decorrente de operação interestadual, circunstância reforçada pelo art. 3.º, III, do mesmo diploma legal. 4. Portanto, na esteira dos precedentes desta Corte e considerando, sobretudo, a disciplina legal insculpida nos arts. 2.º., § 1.º, III, e 3.º., III, da LC 87/96, tem-se que não haverá a incidência do ICMS no fornecimento interestadual de energia elétrica a adquirente que a
emprega em processo de industrialização, tal como no caso dos autos, conforme demonstrado por meio de prova pericial. 5. Agravo regimental do Estado do Rio Grande do Sul desprovido (EDcl no REsp 1322072/RS, Rel. Min. Min. Napoleão Nu Nunes nes Maia Filh Fil ho, j. 04.09.2012, DJe 14.09.2012). Outrossim, não há como confundir produto remetido para consumo final do destinatário, com o produto produto remetido remetido para o fim de ser empregado empregado no processo process o de industriali industrialização zação viabilizan viabil izando do a atividade-fim da empresa adquirente desse produto (insumo). A ementa do acórdão do STJ a seguir transcrita bem distingue as duas situações: Tributário. Recurso especial. Ação declaratória. ICMS. Creditamento. Telas, mantas e feltros empregados na fabricação do papel. Produtos consumidos no processo produtivo. Não sujeiç sujeição ão à limitação tem temporal poral prevista pr evista no art. art. 33, I, da LC LC 87/96. 1. Discute-se neste recurso especial se o creditamento de ICMS relativo às aquisições de telas, mantas e feltros, empregados na fabricação de papel, está provisoriamente impedido pela lim l imitação itação temporal temporal prevista pr evista no art. art. 33, I, do LC LC 87/96. 2. Tratando-se de uma exceção de ordem temporal que condiciona o exercício do direito de creditament creditamentoo assegu as segurado rado pelo caput do do art. 20 da LC 87/96, a regra prevista no art. 33, I, dessa mesma lei complementar deve ser interpretada restritivamente, sob pena de, mediante eventual e indevido entendimento mais ampliativo, tornar sem efeito as importantes modificações normativas realizadas pela Lei Kandir. Assim, conforme a literalidade desse dispositivo legal, apenas as entradas referentes ao uso e consumo do estabelecim estabeleci mento, ento, ou seja, do local que dá suporte à atividade-fim atividade- fim da empresa (art. (ar t. 11, 11, § 3.º, da LC 87/96), têm o direito do respectivo creditamento protraído, não sendo possível estender essa restrição às aquisições de mercadorias ou produtos a serem consumidos no processo process o produtivo. produtivo. 3. De acordo com o contexto fático-probatório delineado pelo Tribunal estadual, as telas, mantas e feltros são adquiridos pela recorrente para serem integralmente consumidos no processo process o de industriali industrialização zação do papel, viabilizan viabil izando, do, assim assi m, a sua atividade-fim. Nesse contexto, verifica-se que tais materiais não se enquadram como de uso ou de consumo do estabelecimento, mas como produtos intermediários imprescindíveis ao processo de fabricação e, por isso, o creditamento correspondente a essas entradas não está sujeito à postergação de que que trata o art. 33, I,I, da LC LC 87/96. 4. Recurso especial provido (REsp 1366437/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 10.10.2003). Lamentavelmente, outros Estados da Federação seguiram o exemplo de Minas Gerais, alargando
o campo de incidência do ICMS pelo regime da substituição tributária, por meio de um artifício legislativo consistente em substituir a expressão “remetidos à industrialização” por “remetidos para a industrialização do próprio produto”. As decisões proferidas pelos órgãos da Administração estão sempre vinculadas à legislação local. E as decisões de tribunais locais também tendem a prestigiar a legislação estadual, restando a solução da pendência ao Superior Tribunal de Justiça e, em última instância, ao Supremo Tribunal Federal porque a matéria envolve aspecto constitucional. Art. 10. É assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do imposto pago por força da substituição tributária, correspondente ao fato gerador presumido que não se realizar. § 1.º Formulado o pedido de restituição e não havendo deliberação no prazo de noventa dias, o contribuinte substituído poderá se creditar, em sua escrita fiscal, do valor objeto do pedido, devidamente atualizado segundo os mesmos critérios aplicáveis ao tributo. § 2.º Na hipótese do parágrafo anterior, sobrevindo decisão contrária irrecorrível, o contribuinte substituído, no prazo de quinze dias da respectiva notificação, procederá ao estorno dos créditos lançados, também devidamente atualizados, com o pagamento dos acréscimos legais cabíveis.
A substituição tributária tem origem no diferimento do imposto, isto é, adiamento da época para o pagamento do imposto, embora com efeito inverso. No diferimento há protelação da cobrança do imposto por ocasião da ocorrência do fato gerador subsequente. Nem sempre implica alteração do sujeito passivo, como acontece na substituição tributária. Por exemplo, no diferimento do imposto devido pelo importador no desembaraço aduaneiro, para o momento da revenda do produto importado, o contribuinte continua sendo o mesmo. Todavia, a principal diferença reside no fato de que a substituição tributária, quando operada para frente, implica resultado oposto ao do diferimento, isto é, há uma antecipação da cobrança do ICMS por conta de eventual fato gerador que poderá ocorrer no futuro. E isso é bastante problemático, porque sem a ocorrência concreta do fato gerador da obrigação tributária não existirá a base de cálculo do imposto que deverá ser certa e determinada, cuja fixação está submetida ao princípio da reserva legal. Entretanto, a gula do fisco em arrecadar antecipadamente, porque os prazos de recolhimentos do imposto já haviam sido encurtados ao máximo, conduziu ao seguinte pensamento: se eu posso adiar o pagamento do imposto, posso também antecipar o seu recolhimento. Assim nasceu a polêmica substituição tributária para frente que, para evitar contestações, foi constitucionalizada pela Emenda 3/99 que introduziu o § 7.º ao art. 150 da CF nos seguintes termos: A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
A situação topológica desse § 7.º foi infeliz, pois foi inserido exatamente na seção II do capítulo I do título VI que cuida Das limitações do poder de tributar . Esse § 7.º contraria o princípio segundo o qual a cobrança do tributo depende sempre da ocorrência concreta do fato gerador, sendo certo que não se trata de princípio protegido em nível de cláusula pétrea. No entanto, o § 1.º do artigo sob comento convolou a restituição imediata e preferencial a que alude o texto constitucional em 90 dias. De fato, esse parágrafo prescreve que, postulado o pedido de restituição, a Fazenda dispõe do prazo de 90 dias para deliberar, sob pena de o contribuinte substituído creditar em sua escrita fiscal o valor pleiteado com a atualização na forma da lei. Ora, isso não se harmoniza com a determinação constitucional de devolução imediata e preferencial. Restituir em 90 dias não se coaduna com a ideia de imediata restituição. O § 2.º dispõe que, sobrevindo a decisão em contrário da Administração Tributária após 90 dias, o contribuinte substituído terá o prazo de 15 dias, a contar da notificação, para proceder ao estorno dos créditos lançados, também devidamente atualizados, com o pagamento dos acréscimos legais cabíveis, ou seja, dos juros moratórios cobrados retroativamente. Contudo, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como vimos anteriormente, operada a substituição tributária, que é definitiva, não caberá restituição em tempo algum se o fato gerador ocorrer em extensão menor na operação subsequente a cargo do contribuinte substituído. Interpretando literalmente a expressão “fato gerador presumido”, confundiu com a base de cálculo presumida. Uma coisa é o elemento objetivo, nuclear ou material do fato gerador, outra coisa diversa é o elemento quantitativo do fato gerador da obrigação tributária. Porque tributa-se adiantadamente, isto é, antes da ocorrência do fato gerador para efeito de cálculo do imposto adota-se uma base de cálculo presumida. No caso de revenda de veículos, essa base de cálculo presumida é o valor de tabela do fabricante. Se na revenda for alcançado um preço menor do que o valor de tabela do fabricante, o qual serviu de base para tributação antecipada, por óbvio impõe-se a restituição da diferença. O que é definitivo é a substituição tributária, isto é, o contribuinte substituído é o sujeito passivo da obrigação tributária desde a origem por expressa determinação da lei. Isso nada tem a ver com a restituição da diferença verificada no final da operação subsequente. O que não é definitivo é a base de cálculo presumida. A tese consagrada pela Corte Suprema segundo a qual se a diferença for a favor do fisco não se cobra e, se for a favor do contribuinte substituído, não se restitui por definitiva a substituição tributária acaba transformando o fato gerador presumido em fato gerador ictício. Enquanto o presumido comporta prova em contrário, o fictício reveste-se do caráter de definitividade por opção do legislador. Como vimos, não é o que aconteceu com a inserção do § 7.º no art. 150 da CF que permite, como não poderia deixar de ser, um ajuste no final de cada operação subsequente em que houve a substituição tributária para frente. Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
I – tratando-se de mercadoria ou bem: a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador; b) onde se encontre, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhado de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária; c) o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha transitado; d) importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física; e) importado do exterior, o do domicílio do adquirente, quando não estabelecido; f) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria ou bem importados do exterior e apreendidos ou abandonados; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) g) o do Estado onde estiver localizado o adquirente, inclusive consumidor final, nas operações interestaduais com energia elétrica e petróleo, lubrificantes e combustíveis dele derivados, quando não destinados à industrialização ou à comercialização; h) o do Estado de onde o ouro tenha sido extraído, quando não considerado como ativo financeiro ou instrumento cambial; i) o de desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes, crustáceos e moluscos; II – tratando-se de prestação de serviço de transporte: a) onde tenha início a prestação; b) onde se encontre o transportador, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhada de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária; c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese do inciso XIII do art. 12 e para os efeitos do § 3.º do art. 13; III – tratando-se de prestação onerosa de serviço de comunicação: a) o da prestação do serviço de radiodifusão sonora e de som e imagem, assim entendido o da geração, emissão, transmissão e retransmissão, repetição, ampliação e recepção; b) o do estabelecimento da concessionária ou da permissionária que forneça ficha, cartão, ou assemelhados com que o serviço é pago; c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese e para os efeitos do inciso XIII do art. 12; c-1) o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando prestado por meio de satélite; (Alínea incluída pela LC n.º 102, de 11.7.2000.) d) onde seja cobrado o serviço, nos demais casos; IV – tratando-se de serviços prestados ou iniciados no exterior, o do estabelecimento ou do domicílio do destinatário. § 1.º O disposto na alínea c do inciso I não se aplica às mercadorias recebidas em regime de depósito de contribuinte de Estado que não o do depositário. § 2.º Para os efeitos da alínea h do inciso I, o ouro, quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial, deve ter sua origem identificada. § 3.º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte: I – na impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação, encontrada a mercadoria ou constatada a prestação; II – é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular; III – considera-se também estabelecimento autônomo o veículo usado no comércio ambulante e na captura de pescado; IV – respondem pelo crédito tributário todos os estabelecimentos do mesmo titular. § 4.º (Vetado.) § 5.º Quando a mercadoria for remetida para armazém-geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte, no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento do depositante, salvo se para retornar ao estabelecimento remetente. § 6.º Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, tratando-se de serviços não medidos, que envolvam localidades
situadas em diferentes unidades da Federação e cujo preço seja cobrado por períodos definidos, o imposto devido será recolhido em partes iguais para as unidades da Federação onde estiverem localizados o prestador e o tomador. (Parágrafo incluído pela LC n.º 102, de 11.7.2000.)
Caput O conceito de empresa não se confunde com o de estabelecimento. A empresa pode ser conceituada sob dois enfoques: o jurídico e o econômico. Juridicamente, a empresa é uma atividade organizada economicamente que se constitui em um fato social, independentemente de sua função mercantil ou não. Do ponto de vista econômico, a empresa enfatiza os atos de comércio. A conceituação econômica de empresa situa-se no campo do exercício de uma atividade. É a ação do empreendedor de exercitar uma atividade econômica que dará nascimento a uma empresa. O estabelecimento comercial outra coisa não é senão o instrumento de atividade do empresário composto de bens corpóreos e incorpóreos. O Código Civil em seu art. 1.142 assim o conceitua: Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para o exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. Fácil verificar que a sociedade empresária ou simplesmente empresa é que tem a personalidade urídica para praticar os atos e celebrar negócios. Uma empresa pode ter diferentes estabelecimentos como a matriz, a filial, a sucursal, a agência, o escritório de representação etc. O estabelecimento matriz pode, também, exercer a atividade econômica ou pode limitar-se às atividades administrativas, constituindo-se em sede da empresa onde se concentram as unidades de direção, gestão, planejamento e assessoramento. É o estabelecimento matriz que elabora a política de desenvolvimento empresarial, direcionando as atividades empresariais para os diversos estabelecimentos da empresa. Os vários estabelecimentos que formam uma unidade homogênea em torno de uma mesma empresa não se confundem com pessoas jurídicas distintas, apesar da obrigatoriedade de inscrição no cadastro fiscal para fins meramente tributários. Observe-se, no entanto, que a inscrição da filial no CNPJ é derivada do CNPJ da matriz, distinguindo-se apenas pelo número do dígito identificador. Nas esferas estaduais e municipais, também, cada estabelecimento do mesmo titular deve ter inscrição própria no cadastro de contribuintes respondendo por suas obrigações tributárias. Para fins tributários, cada estabelecimento da mesma empresa é considerado autônomo, assim reputado o local onde habitualmente se desenvolve a sua atividade comercial ou de prestação de serviço. Em geral, pressupõe existência de uma infraestrutura material e de pessoal, mesmo naqueles
estabelecimentos do tipo móvel que se deslocam de um lugar para outro, periodicamente, como aqueles onde se promovem espetáculos circenses. A definição do local da operação ou da prestação é importante para definir o local da cobrança do imposto, o aspecto espacial do fato gerador da obrigação tributária, que indica o sujeito ativo do tributo que decorre do princípio da territorialidade das normas jurídicas. Como regra, o ente político em cujo território ocorre o fato gerador é o titular do tributo dele decorrente, salvo as hipóteses excepcionais previstas no art. 102 do CTN: convênios celebrados entre os entes políticos interessados, ou normas específicas da lei complementar, conferindo eficácia extraterritorial às normas das legislações tributárias estaduais e municipais nos casos indicados. O inciso I do art. 11 sob comento aponta nove hipóteses previstas nas alíneas a a i como os locais onde se consideram ocorridos os fatos geradores em relação às operações com mercadorias ou bens. Algumas dessas alíneas merecem rápidos comentários; outras não, bastando simples leitura do texto. A alínea c cuida da hipótese de mercadoria importada que fica em um armazém alfandegado. A sua transferência para o comprador se dá mediante endosso no respectivo warrant , isto é, a mercadoria segue direto do armazém alfandegado para o estabelecimento do adquirente. No exame da alínea d é preciso distinguir o estabelecimento onde ocorre a entrada física da mercadoria importada do exterior, que é o responsável pelo pagamento do imposto, com o desembaraço aduaneiro que segundo a jurisprudência expressa o aspecto temporal do fato gerador, isto é, o imposto a ser recolhido deve observar a legislação tributária vigente no momento do desembaraço aduaneiro. A letra g refere-se às operações interestaduais de mercadorias e produtos aí mencionados que por expressa determinação constitucional saem sem incidência do imposto para favorecer a tributação pelo Estado de destino onde ocorre o consumo. Nesses casos, o imposto é cobrado na entrada da mercadoria ou do produto no Estado destinatário, salvo se destinado à industrialização ou à comercialização, quando ocorrerá a tributação interna pela alíquota cheia, isto é, aquela vigente em cada Estado. O inciso II cuida da definição do local da prestação dos serviços de transporte. Como verificamos, a Lei Complementar 87/96 não possui densidade jurídica suficiente para viabilizar a aplicação de alíquotas interestaduais como do princípio da não cumulatividade do ICMS. A letra a prescreve que se considera o local da prestação do serviço de transporte aquele onde tenha iniciado a prestação. Por causa do princípio da territorialidade das normas, tratando-se de serviço prestado ou iniciado no exterior, o inciso IV responsabiliza pelo pagamento do imposto o estabelecimento ou o domicílio do destinatário. Ora, em relação ao serviço prestado no exterior, a lei brasileira não poderá alcançá-los, a menos que haja um tratado ou convenção internacional a respeito. E mais, se o serviço tiver início em São Paulo com destino em Salvador, qual a alíquota a ser aplicada no
momento da aquisição do bilhete de passagem? A jurisprudência, até hoje, não deu a solução para todos os casos, a não ser para as hipóteses de transportes aéreos de passageiros onde foi proclamada a inconstitucionalidade da cobrança de imposto nas operações internacionais e interestaduais. De fato, o passageiro não tem estabelecimento de destino a menos que venha a falecer durante a viagem. O inciso III define o local da prestação dos serviços de comunicação não oferecendo as hipóteses aí mencionadas maiores dificuldades. No serviço de comunicação, não há distinção de competência impositiva conforme se trate de comunicação local ou interestadual ou internacional. Nesse último caso, o contribuinte é o estabelecimento destinatário do serviço, conforme letra c. Tratando-se de comunicação via satélite, o contribuinte é o estabelecimento do tomador ou o domicílio do tomador do serviço (inciso c-1, acrescido pela LC 102/2000).
§ 1.º Esse parágrafo ressalva a aplicação do sistema de transferência de mercadoria ou produto previsto na letra c do inciso I, sempre que se tratar de mercadorias recebidas para depósito de contribuinte do Estado que não seja o do depositário.
§ 2.º Como se sabe, o ouro quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial sujeita-se exclusivamente à incidência do IOF (§ 5.º do art. 153 da CF). Quando sujeito à incidência do ICMS, deve ter sua origem identificada, pois o imposto cabe ao Estado de onde foi extraído o ouro.
§ 3.º Esse parágrafo define para efeitos tributários o que seja estabelecimento, coincidindo com a conceituação dada no início dos comentários do caput . Não apenas o local onde as pessoas físicas ou jurídicas exercem as suas atividades em caráter permanente ou temporário é considerado um estabelecimento, como também qualquer local onde forem armazenadas as mercadorias. Seus incisos, de I a IV, versam sobre as responsabilidades dos estabelecimentos contendo normas aparentemente conflitantes do ponto de vista lógico. Se cada estabelecimento do mesmo titular é autônomo, como prescreve o inciso II, não faz sentido o inciso IV proclamar a responsabilidade solidária de todos os estabelecimentos do mesmo titular. Na verdade, o sujeito passivo é sempre a empresa, uma pessoa urídica de direito privado, e não os estabelecimentos que não têm personalidade jurídica autônoma, representando meros locais onde a empresa exerce suas atividades em caráter permanente ou temporário, compreendendo nesse conceito o veículo utilizado no comércio ambulante.
§ 4.º (Vetado.) § 5.º Esse parágrafo traça regra específica para a hipótese de o contribuinte remeter sua mercadoria para depósito fechado de sua propriedade, quando a saída posterior dessa mercadoria é considerada como se tivesse ocorrido no estabelecimento do depositante, salvo quando for para retornar ao estabelecimento do remetente.
§ 6.º Esse parágrafo estabelece regras para evitar conflitos de competência impositiva em relação aos serviços de comunicação não medidos, envolvendo diferentes localidades situadas em vários Estados, cujo peço seja cobrado por períodos determinados. Nesse caso, o ICMS devido será recolhido em partes iguais para as unidades da Federação onde estiverem localizados o prestador e o tomador. Esse parágrafo cumpre a missão prevista no art. 146, I, da CF. Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento: I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular; II – do fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias por qualquer estabelecimento; III – da transmissão a terceiro de mercadoria depositada em armazém-geral ou em depósito fechado, no Estado do transmitente; IV – da transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente; V – do início da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, de qualquer natureza; VI – do ato final do transporte iniciado no exterior; VII – das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza; VIII – do fornecimento de mercadoria com prestação de serviços: a) não compreendidos na competência tributária dos Municípios; b) compreendidos na competência tributária dos Municípios e com indicação expressa de incidência do imposto de competência estadual, como definido na lei complementar aplicável; IX – do desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do exterior; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) X – do recebimento, pelo destinatário, de serviço prestado no exterior; XI – da aquisição em licitação pública de mercadorias ou bens importados do exterior e apreendidos ou abandonados; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) XII – da entrada no território do Estado de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização; XIII – da utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação subsequente.
§ 1.º Na hipótese do inciso VII, quando o serviço for prestado mediante pagamento em ficha, cartão ou assemelhados, considera-se ocorrido o fato gerador do imposto quando do fornecimento desses instrumentos ao usuário. § 2.º Na hipótese do inciso IX, após o desembaraço aduaneiro, a entrega, pelo depositário, de mercadoria ou bem importados do exterior deverá ser autorizada pelo órgão responsável pelo seu desembaraço, que somente se fará mediante a exibição do comprovante de pagamento do imposto incidente no ato do despacho aduaneiro, salvo disposição em contrário. § 3.º Na hipótese de entrega de mercadoria ou bem importados do exterior antes do desembaraço aduaneiro, considera-se ocorrido o fato gerador neste momento, devendo a autoridade responsável, salvo disposição em contrário, exigir a comprovação do pagamento do imposto. (Incluído pela LC 114, de 16.12.2002.)
Caput Esse artigo cuida de definir o aspecto temporal do fato gerador da obrigação tributária, isto é, o momento em que se considera ocorrido o fato gerador, que é de suma importância por causa do princípio tempus regit actum.
Inciso I O disposto no inciso I deve ser lido com restrição, pois sabemos que a saída da mercadoria de um estabelecimento para outro do mesmo titular não enseja circulação jurídica. Em outras palavras, nesse caso não ocorre o fato gerador do ICMS. Apenas a circulação jurídica, e não a física, implica ocorrência efetiva do fato gerador fazendo nascer a obrigação tributária. Nesse sentido, a Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça.11
Inciso II Depois de acirrada discussão doutrinária e jurisprudencial, pacificou-se a tese da incidência do ICMS no fornecimento de alimentos, bebidas e outros produtos em bares e restaurantes.
Inciso III Como vimos, a transferência de mercadoria depositada em armazéns se faz mediante endosso no warrant , momento em que se tem por ocorrido o fato gerador independentemente de a mercadoria transitar pelo estabelecimento do transmitente.
Inciso IV É a mesma situação contemplada no inciso anterior.
Incisos V e VI Há dificuldade de aplicar a alíquota interestadual no caso do inciso V porque o bilhete de passagem sequer tem espaço para destacar o imposto devido. No caso do inciso VI tem-se por ocorrido o fato gerador no final do transporte iniciado no exterior por causa do princípio da territorialidade das normas jurídicas.
Inciso VII Nenhuma dificuldade. O momento exato da ocorrência do fato gerador é o da materialização das situações aí descritas.
Inciso VIII Como se sabe, há incidência do ICMS no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista de serviços (art. 155, § 2.º, inciso IX, b, da CF). Nesse caso, a base de cálculo do imposto compreenderá o valor da mercadoria e o da prestação do serviço. É o caso, por exemplo, de venda de aparelho de ar-condicionado com a obrigação de promover a sua instalação no local indicado pelo adquirente. O serviço, tributado pelo ISS, é o de instalação de aparelhos, máquinas e equipamentos prestado a usuário final com o material por ele fornecido (item 14.06 da lista de serviços anexa à LC 116/2003). Outrossim, no tocante a determinados serviços, é a própria lei de regência nacional do ISS que ressalva a tributação pelo Estado do material empregado na prestação de serviços especificados na lista de serviços. São os casos, por exemplo, dos serviços de reparação, conservação e reforma de edifícios (item 5.05); de lubrificação, limpeza, lustração, revisão, de conservação de maquinários e veículos (item 14.01); e de recondicionamento de motores (item 14.03). Em todas essas hipóteses as mercadorias ou peças utilizadas na prestação de serviços ficam sujeitas à incidência do ICMS, vale dizer, seus valores são deduzidos da base de cálculo do ISS. Daí a previsão das letras a e b desse inciso VIII sob comento.
Inciso IX O momento da ocorrência do fato gerador do ICMS em relação à mercadoria importada do exterior coincide com o do imposto de importação, que nos termos do art. 23 do Decreto-lei 37, de 18.11.1966, é o da data do registro da declaração de importação na repartição aduaneira, sem o que não será possível o desembaraço aduaneiro da mercadoria importada de que trata o inciso sob comento. A Súmula 577 do STF prescrevia que, “na importação de mercadorias do Exterior, o fato gerador do Imposto de Circulação de Mercadorias ocorre no momento de sua entrada no
estabelecimento do importador”. Contudo, após o advento da EC 33/2001, que introduziu a alínea a ao inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF, o Supremo Tribunal Federal afastou a incidência da referida Súmula nos julgamento pelo Plenário da Corte dos Recursos Extraordinários 192.711 e 193.817 para proclamar que o fato gerador do ICMS ocorre no momento da entrada no País da mercadoria importada do exterior, assim entendido o momento de seu desembaraço aduaneiro.
Inciso X Esse inciso legal não pode ser interpretado literalmente, pois, se o serviço foi prestado no exterior do país, trata-se de fato irrelevante perante a legislação brasileira, cujas normas não podem alcançar fatos ocorridos fora de seu território, a menos que haja tratado ou convenção internacional em contrário. Como o campo de incidência do ICMS sobre os serviços restringe-se aos de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que iniciados no exterior, só se pode entender que estes são considerados efetivamente prestados no momento em que o tomador, necessariamente localizado em nosso território, obtiver a fruição desses serviços.
Inciso XI Normalmente os bens apreendidos ou abandonados são objetos de venda em leilão obedecendo as normas da licitação pública regida pela Lei 8.666, de 21.06.1993. O fato gerador considera-se ocorrido no local onde se realiza a licitação para adquirir a propriedade da mercadoria, ou dos bens apreendidos ou abandonados.
Inciso XII Como se sabe, na forma da letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF, não incide o imposto na saída para outro Estado de produtos referidos no inciso sob comento. Para os que entendem que se trata de uma imunidade objetiva, a sua tributação na entrada seria inconstitucional. Entretanto, já verificamos que a Corte Suprema fixou o entendimento de que se trata de uma norma de não incidência propriamente dita para beneficiar o Estado consumidor. Por isso, esses produtos sofrem tributação na sua entrada no território do Estado destinatário, salvo se os produtos forem destinados à comercialização ou à industrialização. Nas duas últimas hipóteses, o Estado destinatário cobrará o imposto pela sua alíquota cheia, por ocasião da revenda do produto ou da venda do produto industrializado. Exatamente porque houve entrada sem incidência do imposto, o Estado destinatário recolherá o ICMS pela aplicação de sua alíquota interna sem qualquer dedução de crédito.
Inciso XIII Esse inciso legal é de difícil entendimento, pois, uma vez que o Estado só pode tributar os serviços de transportes interestaduais ou intermunicipais e de comunicação, fica bem difícil vislumbrar uma hipótese de prestação de serviço que “não esteja vinculada a operação ou prestação subsequente”. Serviço é um bem imaterial, não sendo passível de circulação em etapas ulteriores, como acontece com mercadoria que pode ser objeto de várias revendas. Se um passageiro embarca em um ônibus, partindo de São Paulo com destino a Salvador, na Bahia, difícil dizer que o aludido passageiro utilizou-se do serviço de transporte em São Paulo ou em Salvador, sendo certo que o serviço tem-se por prestado quando transportado são e salvo para o local de destino. Aliás, a Lei Complementar 87/96 peca pela falta de densidade jurídica suficiente para viabilizar a tributação de serviços interestaduais de transporte. Na prática, aplica-se a alíquota interna vigente no Estado de origem qualquer que seja o destino final do passageiro. Torna-se problemática a aplicação do disposto no inciso VII do § 2.º do art. 155 da CF: VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual. Ora, o passageiro, necessariamente uma pessoa física, tem domicílio ou residência, nunca localização, que é própria de um estabelecimento de uma empresa. Descabe a cogitação de consumidor final localizado em outro Estado.
§ 1.º A norma visa situar o momento da prestação onerosa do serviço de comunicação, quando cobrado por meio de ficha, cartão ou assemelhados, para a época em que esses documentos são fornecidos ao usuário. Fixa-se apenas o aspecto temporal do fato gerador. O seu aspecto nuclear, objetivo ou material independe do fornecimento desses documentos, nem da efetiva percepção do preço do serviço prestado.
§ 2.º Como o momento da ocorrência do fato gerador do ICMS, tratando-se de mercadoria importada do exterior, a norma sob comento faculta aos Estados a cobrança do imposto no ato do desembaraço aduaneiro. Nada impede de a legislação de cada Estado conceder um prazo determinado para
recolhimento do imposto a contar do desembaraço aduaneiro. O prazo de recolhimento de tributos em geral situa-se no âmbito da política tributária de cada Estado.
§ 3.º Esse parágrafo acrescido pela LC 114/2002 procura possibilitar que os Estados regularizem os efeitos de uma situação irregular. De fato, proceder à entrega de uma mercadoria importada do exterior, antes do desembaraço aduaneiro, configura uma operação ilegal que se assemelha a um descaminho, isto é, uma importação sem a cobertura cambial. Nesse caso, diz a norma sob análise que se considera ocorrido o fato gerador no momento dessa entrega antecipada, determinando que a autoridade responsável exija a prova do pagamento do ICMS, salvo disposição da lei em sentido contrário. Como no inciso anterior, o pagamento concomitante do imposto e da entrega da mercadoria importada depende da legislação de cada Estado. Art. 13. A base de cálculo do imposto é: I – na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do art. 12, o valor da operação; II – na hipótese do inciso II do art. 12, o valor da operação, compreendendo mercadoria e serviço; III – na prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, o preço do serviço; IV – no fornecimento de que trata o inciso VIII do art. 12; a) o valor da operação, na hipótese da alínea a; b) o preço corrente da mercadoria fornecida ou empregada, na hipótese da alínea b; V – na hipótese do inciso IX do art. 12, a soma das seguintes parcelas: a) o valor da mercadoria ou bem constante dos documentos de importação, observado o disposto no art. 14; b) imposto de importação; c) imposto sobre produtos industrializados; d) imposto sobre operações de câmbio; e) quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras; (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) VI – na hipótese do inciso X do art. 12, o valor da prestação do serviço, acrescido, se for o caso, de todos os encargos relacionados com a sua utilização; VII – no caso do inciso XI do art. 12, o valor da operação acrescido do valor dos impostos de importação e sobre produtos industrializados e de todas as despesas cobradas ou debitadas ao adquirente; VIII – na hipótese do inciso XII do art. 12, o valor da operação de que decorrer a entrada; IX – na hipótese do inciso XIII do art. 12, o valor da prestação no Estado de origem. § 1.º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: (Redação dada pela LC 114, de 16.12.2002.) I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle; II – o valor correspondente a: a) seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; b) frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado. § 2.º Não integra a base de cálculo do imposto o montante do Imposto sobre Produtos Industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configurar fato gerador de ambos os impostos.
§ 3.º No caso do inciso IX, o imposto a pagar será o valor resultante da aplicação do percentual equivalente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sobre o valor ali previsto. § 4.º Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo do imposto é: I – o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria; II – o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão de obra e acondicionamento; III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, o seu preço corrente no mercado atacadista do estabelecimento remetente. § 5.º Nas operações e prestações interestaduais entre estabelecimentos de contribuintes diferentes, caso haja reajuste do valor depois da remessa ou da prestação, a diferença fica sujeita ao imposto no estabelecimento do remetente ou do prestador.
Caput A base de cálculo é uma ordem de grandeza do aspecto quantitativo do fato gerador sobre a qual incide determinada alíquota para calcular o montante do tributo devido. Ela está sob reserva de lei complementar em relação aos impostos previstos na Constituição (art. 146, III, a, da CF). Esse artigo prevê nove hipóteses de apuração da base de cálculo do imposto. A maioria delas não oferece dificuldades na interpretação, bastando simples leitura dos textos. Comentaremos alguns dos incisos em que reina controvérsia doutrinária ou jurisprudencial. Os incisos I a IV não oferecem quaisquer dificuldades de entendimento.
Inciso V Determina que se incluam no valor da mercadoria ou do bem importado os valores de todos os impostos nominados nas letras a a d , assim como os valores de […] quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras, conforme prescreve a letra e. A questão parece simples, mas não o é. Na inclusão dos valores dos tributos mencionados na letra e preciso que se examine a base de cálculo para apuração do valor desses tributos. Na apuração do valor da COFINS, por exemplo, o STF determina o expurgo do valor do ICMS da base de cálculo daquela contribuição social com o que se alterará o valor da COFINS a ser incluída na base de cálculo do produto importado para fins de pagamento do ICMS. Dentro da mesma linha de raciocínio o valor do ISS deve igualmente sofrer expurgo para apuração da base de cálculo da contribuição social do PIS/COFINS. Outrossim, em se tratando do PIS/COFINS-importação, o STF não permite a inclusão do valor dessas contribuições na sua própria base de cálculo por implicar afronta ao art. 149, § 2.º, III, a,
da CF12 (RE 559937, Rel. Min. Ellen Gracie, Rel. p/ Acórdão Min. Dias Toffoli, j. 20.03.2013, reconhecida a Repercussão Geral, DJe 17.10.2013).
Inciso VI Conforme afirmamos anteriormente, os serviços inteiramente prestados no exterior não podem ser tributados pela legislação brasileira, sendo necessário que o tomador localizado no exterior do País venha usufruir em nosso território dos serviços lá executados. Na área do ISS existem n situações em que o tomador vem usufruir no Brasil dos serviços executados no exterior. Entretanto, na área do ICMS, restrita à tributação dos serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicação, é difícil, senão impossível, imaginar uma hipótese em que tais serviços sejam executados no exterior do País para o tomador ingressar no nosso território para usufruir dos serviços prestados. No caso de comunicação, necessariamente o tomador deve estar localizado aqui no momento da prestação. E, tratando-se de transporte, o tomador terá iniciado a fruição no exterior para terminar no Brasil, descabendo falar em serviço prestado no exterior.
Inciso VII Interessante notar que no caso de bens procedentes do exterior apreendidos ou abandonados a base de cálculo é menor do que nas situações de importação com cobertura cambial. E aqui é oportuno relembrar que a incidência do tributo independe da licitude ou ilicitude do fato tributado. Muitos autores de renome, inclusive, fazendo interpretação gramatical do disposto no art. 3.º do CTN, sustentam que a tributação do ato ilícito descaracteriza a sua natureza tributária, porque tributo não pode corresponder à sanção do ato ilícito. Ora, nenhuma lei quando define o fato gerador da obrigação tributária faz menção à natureza lícita ou ilícita do fato tributado. Quando o art. 43 do CTN define o fato gerador do imposto de renda como um acréscimo patrimonial, pouco importa se esse acréscimo foi obtido de forma lícita ou ilícita. Do contrário, os honorários percebidos por alguém no exercício ilegal da profissão não poderiam ser tributados, nem a renda auferida por um peculatário.
Inciso VIII – Nenhuma dificuldade há na sua interpretação. Inciso IX Remetemos o leitor aos comentários que fizemos ao inciso XIII do art. 12.
§ 1.º Esse parágrafo exacerba a carga tributária ao determinar a expansão da base de cálculo, inclusive, na hipótese do inciso V que cuida da base de cálculo de bens ou produtos importados, conforme retrocomentados. O aspecto mais relevante neste dispositivo é o que diz respeito à inclusão do imposto na sua base de cálculo, isto é, o ICMS incide sobre si próprio. É o chamado cálculo por dentro que a Suprema Corte entendeu ser constitucional (RE 212.309/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 14.02.2003). O STJ também entende que o ICMS incide sobre si próprio tanto no regime norma de tributação como no regime de tributação por substituição tributária (REsp 1.454.184). A EC 33/2001 incluiu a letra i no inciso XII do § 2.º do art. 155 da CF para prescrever que cabe à lei complementar “fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço”. O advérbio “também” deixa claro que nas operações internas o cálculo do imposto por dentro já estava implícito na Constituição. Entretanto, Eduardo Marcial Ferreira Jardim critica com veemência esse § 1.º do art. 13. Segundo esse renomado tributarista, […] a base de cálculo do ICMS é integrada pelo próprio imposto, donde resta evidenciado que o legislador subconstitucional ultrapassou as fronteiras de sua competência, máxime porque a referida grandeza que representa o valor tributável não poderia expressar um valor superior ao da coisa, do fato ou da conduta suscetível de incidência, pois falece de poderes para tanto, obviamente. A observação é aplicável a qualquer gravame, na medida em que a base de cálculo a ser adotada pelo legislador poderá ser de zero até o limite representado pelo objeto da tributação, nunca acima desse paradigma, asserto, aliás, de clareza solar.13
§ 2.º Exclui expressamente o valor do IPI da base de cálculo do ICMS sempre que a operação realizada configurar fato gerador de ambos os impostos. Isso quer dizer que a regra geral é a inclusão do valor do tributo na sua própria base de cálculo, o que leva à conclusão de que o próprio IPI tem o seu valor incluído na sua base de cálculo. Esse § 2.º não é, pois, uma via de mão dupla.
§ 3.º Remetemos o leitor aos comentários do inciso III do art. 12.
§ 4.º Esse parágrafo traça regras para apuração da base de cálculo na remessa de mercadoria de um estabelecimento situado em um Estado para outro estabelecimento do mesmo titular localizado em outro Estado. A atual conceituação adotada pela STF, que exige a circulação jurídica que envolve operação de compra e venda ou mudança de titularidade, não vejo como possa distinguir operação interna da operação interestadual. Se o deslocamento de um Estado para outro de determinada mercadoria estivesse representando uma etapa de movimentação em direção ao consumo, poder-se-ia utilizar do antigo entendimento do STF que considerava, nessa hipótese, ocorrido o fato gerador do antigo ICM. Por isso, o STJ mantém a Súmula 166 editada anteriormente ao advento da LC 87/96 e que assim prescreve: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”. Comunga do mesmo entendimento a mais Alta Corte do País: O simples deslocamento de coisas de um estabelecimento para outro, sem transferência de propriedade, não gera direito à cobrança de ICM. O emprego da expressão “operações”, bem como a designação do imposto, no que consagra o vocabulário “mercadoria”, são conducentes à premissa de que deve haver o envolvimento de ato mercantil e este não ocorre quando o produtor simplesmente movimenta frangos (AI 131.941-1, Rel. Min. Marco Aurélio, un., DJ 19.04.1991, p. 4583). Esse parágrafo é, pois, inconstitucional.
§ 5.º Esse parágrafo prescreve o óbvio. O reajuste do preço, depois de remetida a mercadoria, pouco importa se se trata de operação interna ou interestadual, logicamente sujeita-se à emissão de nota fiscal suplementar com o consequente recolhimento da diferença do ICMS. Art. 14. O preço de importação expresso em moeda estrangeira será convertido em moeda nacional pela mesma taxa de câmbio utilizada no cálculo do imposto de importação, sem qualquer acréscimo ou devolução posterior se houver variação da taxa de câmbio até o pagamento efetivo do preço. Parágrafo único. O valor fixado pela autoridade aduaneira para base de cálculo do imposto de importação, nos termos da lei aplicável, substituirá o preço declarado.
Caput
Uniformiza a taxa de câmbio na conversão em moeda nacional de preço de mercadoria importada fixada em moeda estrangeira, valendo essa taxa tanto para efeito de pagamento do imposto de importação como para pagamento do ICMS. Aliás, como vimos, na base de cálculo do ICMS inclui-se o valor do imposto de importação, entre outros valores. A parte final do dispositivo está em demasia. Quem conhece a teoria geral do fato gerador sabe muito bem que o aspecto temporal do fato gerador define a legislação aplicável de acordo com o provérbio tempus regit actum, de sorte que a taxa de câmbio aplicada é irreversível.
Parágrafo único Esse dispositivo deve ser lido com intensa restrição sob pena de privilegiar o ato arbitrário da autoridade aduaneira que deve observar o disposto no parágrafo único do art. 142 do CTN, ou seja, a natureza vinculatória do ato de lançamento. Tratando-se de operação entre empresas coligadas, a autoridade aduaneira, ao fixar o valor do produto importado, deverá observar, necessariamente, as normas que regem o transfer pricing . Art. 15. Na falta do valor a que se referem os incisos I e VIII do art. 13, a base de cálculo do imposto é: I – o preço corrente da mercadoria, ou de seu similar, no mercado atacadista do local da operação ou, na sua falta, no mercado atacadista regional, caso o remetente seja produtor, extrator ou gerador, inclusive de energia; II – o preço FOB estabelecimento industrial à vista, caso o remetente seja industrial; III – o preço FOB estabelecimento comercial à vista, na venda a outros comerciantes ou industriais, caso o remetente seja comerciante. § 1.º Para aplicação dos incisos II e III do caput , adotar-se-á sucessivamente: I – o preço efetivamente cobrado pelo estabelecimento remetente na operação mais recente; II – caso o remetente não tenha efetuado venda de mercadoria, o preço corrente da mercadoria ou de seu similar no mercado atacadista do local da operação ou, na falta deste, no mercado atacadista regional. § 2.º Na hipótese do inciso III do caput , se o estabelecimento remetente não efetue vendas a outros comerciantes ou industriais ou, em qualquer caso, se não houver mercadoria similar, a base de cálculo será equivalente a setenta e cinco por cento do preço de venda corrente no varejo.
Caput O dispositivo fixa regras para estipulação do valor da base de cálculo do imposto para os casos em que não houver valor certo estabelecido nas hipóteses dos incisos I a VII do art. 13. Nessas hipóteses, a base de cálculo do ICMS será o previsto em um dos três incisos seguintes, conforme o remetente da mercadoria seja produtor/extrator/gerador de energia, industrial ou comerciante: I – o preço corrente da mercadoria ou seu similar, no mercado atacadista do local da operação, ou na hipótese de sua falta, no mercado atacadista regional, sempre que o remetente for produtor, extrator ou gerador de energia;
II – o preço FOB industrial à vista, caso o remetente seja industrial; III – o preço FOB estabelecimento comercial à vista, na venda a outros comerciantes ou industriais, caso o remetente seja comerciante.
§ 1.º Para aplicação dos dispostos nos incisos I e II retro, esse parágrafo determina a adoção, sucessivamente, do preço efetivamente cobrado na operação mais recente e do preço corrente no mercado atacadista do local da operação ou do mercado atacadista regional, sempre que o remetente não tenha praticado venda de mercadoria recentemente.
§ 2.º Para aplicação do inciso III retro, esse parágrafo manda apurar a base de cálculo do imposto equivalente a setenta e cinco por cento do preço de venda corrente no varejo, na hipótese de o remetente da mercadoria não ter feito operações de vendas a outros comerciantes ou industriais, ou, em qualquer caso, se não houver mercadoria similar. Art. 16. Nas prestações sem preço determinado, a base de cálculo do imposto é o valor corrente do serviço, no local da prestação.
O dispositivo regula a base de cálculo dos serviços prestados de competência impositiva do Estado-membro, quais sejam serviços de transportes intermunicipal e interestadual, de comunicação e serviços não especificados na lista de serviços que acompanham o fornecimento de mercadoria. Em tais casos, se não houver um preço determinado, a base de cálculo do ICMS será sempre o valor corrente do serviço, no local da prestação. Art. 17. Quando o valor do frete, cobrado por estabelecimento pertencente ao mesmo titular da mercadoria ou por outro estabelecimento de empresa que com aquele mantenha relação de interdependência, exceder os níveis normais de preços em vigor, no mercado local, para serviço semelhante, constantes de tabelas elaboradas pelos órgãos competentes, o valor excedente será havido como parte do preço da mercadoria. Parágrafo único. Considerar-se-ão interdependentes duas empresas quando: I – uma delas, por si, seus sócios ou acionistas, e respectivos cônjuges ou filhos menores, for titular de mais de cinquenta por cento do capital da outra; II – uma mesma pessoa fizer parte de ambas, na qualidade de diretor, ou sócio com funções de gerência, ainda que exercidas sob outra denominação; III – uma delas locar ou transferir a outra, a qualquer título, veículo destinado ao transporte de mercadorias.
Caput O dispositivo regula caso específico de frete cobrado por estabelecimento pertencente ao mesmo titular da mercadoria ou por outro estabelecimento do mesmo grupo econômico. Nessas hipóteses, sempre que o valor do frete ultrapassar os níveis normais de preços em vigor, no mercado local, para serviço semelhante, constante de tabelas elaboradas por órgãos competentes, o valor excedente será considerado parte do preço da mercadoria.
Parágrafo único Esse parágrafo único define a interdependência de empresas para fins específicos de apuração do valor do frete. E o faz de forma mais ou menos igual à conceituação genérica do que sejam empresas do mesmo grupo econômico. São três as hipóteses caracterizadoras da interdependência entre as duas empresas: I – quando uma das empresas por si, seus sócios ou acionistas, e respectivos cônjuges ou filhos menores, for titular de mais de cinquenta por cento do capital da outra. Partiu-se do princípio de que cônjuges (viragos) e filhos menores figuram apenas formalmente como sócios; II – quando uma mesma pessoa fizer parte de ambas, na qualidade de diretor, ou sócio com funções de gerência, ainda que exercidas sob outra denominação. Aqui a interdependência caracteriza-se pela unidade de direção, de administração de ambas as empresas; III – quando uma delas locar ou transferir a outra, a qualquer título, veículo destinado ao transporte de mercadorias. A utilização do mesmo veículo, a qualquer título, por ambas as empresas para o transporte de mercadorias, é sinal indicativo da interdependência, isto é, trata-se de empresas do mesmo grupo econômico. Art. 18. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de mercadorias, bens, serviços ou direitos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.
O arbitramento, na hipótese, não poderá ser feito à discrição da autoridade administrativa competente. Tanto o procedimento do arbitramento como as hipóteses de arbitramento estão jungidos ao que dispuser a legislação tributária, como se observa da parte final do dispositivo sob comento: […] sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou
judicial. O procedimento do arbitramento há de assegurar o exercício do contraditório e ampla defesa, que é um princípio constitucional previsto no inciso LV do art. 5.º da CF e protegido em nível da cláusula pétrea. Idêntico dispositivo contém o art. 148 do CTN que na interpretação do STJ o arbitramento é mera técnica a ser aplicada subsidiariamente no lançamento de ofício e não de forma generalizada: O arbitramento fiscal (art. 148, CTN), de forma casuística e mediante processo regular, é condicionado à omissão ou infidelidade do contribuinte (Resp 24.083/SP, Rel. Min. Cesar Rocha, DJU 24.05.1993). Outrossim, descabe o arbitramento somente pelo fato de o valor ou o preço apresentado pelo sujeito passivo não corresponder àquele unilateralmente fixado em pauta fiscal, que só deve ser utilizado como elemento auxiliar do fisco na correta apuração da base de cálculo do imposto. Sobre a questão o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 431 nos seguintes termos: É ilegal a cobrança do ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal. O Supremo Tribunal Federal também tem repelido o uso de pautas de valores arbitrariamente adotadas pelo fisco contra prova documental idônea do contribuinte: Recursos Extraordinários 77544/SP e 72400/RN, RTJ 59/915. Art. 19. O imposto é não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.
O dispositivo sob comento tem sua matriz no inciso I do § 2.º, do art. 155 da CF. Tanto a doutrina como a jurisprudência à quase unanimidade considera a não cumulatividade do ICMS como um princípio tributário, e não mera técnica de tributação em virtude da existência da hipótese de incidência monofásica. No nosso entender, mesmo na hipótese de diferimento do imposto para o momento da saída da mercadoria com destino ao consumidor final (incidência monofásica), ainda assim estaremos diante de um imposto não cumulativo à medida que ele incidiu uma única vez. O certo é que por expressa disposição constitucional esse princípio da não cumulatividade cede ante as hipóteses de isenção e de não incidência juridicamente qualificada, conforme se verifica do inciso II do mencionado § 2.º. Observamos anteriormente que a isenção concedida próximo ao final do ciclo de comercialização da mercadoria acarreta aumento da carga tributária causando efeito inverso do
instituto da isenção, em razão da anulação dos créditos relativos às operações anteriores e impossibilidade de compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes. Por fim, relembre-se que o crédito a ser compensado é de natureza meramente fiscal e que a expressão “montante cobrado nas operações anteriores” não significa imposto efetivamente pago, mas aquele que nos termos da legislação incide sobre a operação ou prestação. Para realizar a compensação bastará a escrituração no livro próprio do montante do imposto destacado na nota fiscal por ocasião da entrada da mercadoria no estabelecimento do contribuinte, mesmo porque o contribuinte não tem como saber se o vendedor recolheu ou não o imposto destacado pela forma prevista na legislação tributária competente. Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação. § 1.º Não dão direito a crédito as entradas de mercadorias ou utilização de serviços resultantes de operações ou prestações isentas ou não tributadas, ou que se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento. § 2.º Salvo prova em contrário, presumem-se alheios à atividade do estabelecimento os veículos de transporte pessoal. § 3.º É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita: I – para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior; II – para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subsequente não forem tributadas ou estiverem isentas do imposto, exceto as destinadas ao exterior. § 4.º Deliberação dos Estados, na forma do art. 28, poderá dispor que não se aplique, no todo ou em parte, a vedação prevista no parágrafo anterior. § 5.º Para efeito do disposto no caput deste artigo, relativamente aos créditos decorrentes de entrada de mercadorias no estabelecimento destinadas ao ativo permanente, deverá ser observado: (Redação dada pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) I – a apropriação será feita à razão de um quarenta e oito avos por mês, devendo a primeira fração ser apropriada no mês em que ocorrer a entrada no estabelecimento; (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) II – em cada período de apuração do imposto, não será admitido o creditamento de que trata o inciso I, em relação à proporção das operações de saídas ou prestações isentas ou não tributadas sobre o total das operações de saídas ou prestações efetuadas no mesmo período; (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) III – para aplicação do disposto nos incisos I e II deste parágrafo, o montante do crédito a ser apropriado será obtido multiplicando-se o valor total do respectivo crédito pelo fator igual a 1/48 (um quarenta e oito avos) da relação entre o valor das operações de saídas e prestações tributadas e o total das operações de saídas e prestações do período, equiparandose às tributadas, para fins deste inciso, as saídas e prestações com destino ao exterior ou as saídas de papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos; (Redação dada pela LC n.º 120, de 2005.) IV – o quociente de um quarenta e oito avos será proporcionalmente aumentado ou diminuído, pro rata die, caso o período de apuração seja superior ou inferior a um mês; (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.7.2000.) V – na hipótese de alienação dos bens do ativo permanente, antes de decorrido o prazo de quatro anos contado da data de sua aquisição, não será admitido, a partir da data da alienação, o creditamento de que trata este parágrafo em relação à fração que corresponderia ao restante do quadriênio; (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) VI – serão objeto de outro lançamento, além do lançamento em conjunto com os demais créditos, para efeito da compensação prevista neste artigo e no art. 19, em livro próprio ou de outra forma que a legislação determinar, para aplicação do disposto nos incisos I a V deste parágrafo; (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.7.2000.)
VII – ao final do quadragésimo oitavo mês contado da data da entrada do bem no estabelecimento, o saldo remanescente do crédito será cancelado. (Inciso incluído pela LC n.º 102, de 11.7.2000.) § 6.º Operações tributadas, posteriores a saídas de que trata o § 3.º, dão ao estabelecimento que as praticar direito a creditar-se do imposto cobrado nas operações anteriores às isentas ou não tributadas sempre que a saída isenta ou não tributada seja relativa a: I – produtos agropecuários; II – quando autorizado em lei estadual, outras mercadorias.
Caput O caput assegura o direito a crédito nas duas hipóteses mencionadas: na hipótese de entrada física ou simbólica da mercadoria no estabelecimento, porque a mercadoria pode ser transferida a terceiro, por exemplo, por meio de simples endosso no warrant .; a outra hipótese de aproveitamento do crédito diz respeito ao imposto incidente sobre a mercadoria adquirida para uso ou consumo do estabelecimento ou para integrar o seu ativo fixo. Por se tratar de crédito de natureza meramente financeira, e não de natureza física, o que é relevante juridicamente é que tenha havido incidência do imposto sobre a mercadoria adquirida. E a entrada da mercadoria para compor o ativo permanente do estabelecimento do contribuinte passou a ser tributada desde a Emenda Passos Porto (EC 23/83). É o quanto basta para assegurar o crédito do imposto. Entretanto, a regra do caput foi flexibilizada pelo art. 33 na redação dada pela EC 138/2010, como veremos mais adiante.
§ 1.º Esse parágrafo veda o direito de crédito nas hipóteses de isenção e de não incidência uridicamente qualificada, como determina o texto constitucional. No entanto, em sua parte final proíbe o crédito quando “se refiram a mercadorias ou serviços alheios à atividade do estabelecimento”. Essa parte final do dispositivo deve ser interpretada com intensa restrição: somente quando as mercadorias ou serviços são completamente alheios à atividade do estabelecimento, isto é, adquiridas ou prestados no interesse individual do titular da empresa é que não ensejam o direito de crédito. É o caso, por exemplo, de uso indevido do dinheiro da empresa pelo seu titular para comprar presentes a seus filhos. Entretanto, se se tratar de mercadoria consumida pelo estabelecimento do contribuinte, ainda que alheio à atividade da empresa, o imposto sobre ela incidente ensejará o direito de crédito. É o caso, por exemplo, de uma empresa do ramo de venda varejista de tecidos que adquire materiais de limpeza ou lubrificantes para promover, respectivamente, a higienização do estabelecimento comercial e a lubrificação de dobradiças de portas e janelas do mesmo estabelecimento comercial.
§ 2.º Esse parágrafo estabelece uma presunção iuris tantum de que o veículo utilizado para transporte pessoal configura um bem alheio à atividade da empresa, a afastar o direito de crédito do imposto. É comum o empresário valer-se de veículo destinado a uso comercial para fazer locomoções de natureza individual, o que, por si só, não descaracteriza a sua destinação empresarial. A existência de motorista profissional no quadro de empregados da empresa revela indícios de que se trata de veículo de uso empresarial, isto é, empregado no exercício da atividade econômica. A preponderância do uso empresarial também é motivo para afastar a presunção de que cuida o parágrafo sob comento.
§ 3.º Esse parágrafo veda o direito de crédito em duas hipóteses: I – para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, sempre que a saída do produto industrializado estiver isenta do imposto, salvo se se tratar de saída para o exterior. Por expressa disposição constitucional, quando a saída for isenta, impõe-se o estorno do crédito das operações anteriores. Diferente a hipótese de imunidade na exportação de produtos para o exterior, quando o crédito fica assegurado nos termos da letra a do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF; II – esse inciso cuida de regulamentação do disposto no inciso II do § 2.º do art. 155 da CF, que deixa a critério da legislação infraconstitucional o aproveitamento ou não do crédito na hipótese de saída isenta ou de não incidência. À primeira vista, pode parecer que o preceito constitucional está se referindo à legislação ordinária de cada Estado por inserir a matéria no campo de política tributária. Contudo, o exame do art. 146, III, b, da CF revela que a matéria concernente ao crédito está sob reserva de lei complementar para dar uniformidade de tratamento jurídico em todo o território nacional.
§ 4.º Esse parágrafo ressalva a vedação do parágrafo anterior à deliberação em contrário dos Estados. O art. 28 aí referido foi vetado, mas aplica-se diretamente o disposto na letra g do inciso II do § 2.º do art. 155 da CF, isto é, convênio firmado pelos Estados com a intermediação do Confaz. Assim procedendo, ficará resguardada para todas as unidades integrantes da Federação Brasileira a uniformidade de tratamento jurídico no tocante à manutenção de crédito do imposto.
§ 5.º
Esse parágrafo enumera os requisitos necessários para o aproveitamento do crédito decorrente de mercadorias entradas no estabelecimento para integrar o ativo fixo. O inciso I condiciona o aproveitamento do crédito ao parcelamento em 48 avos prescrevendo a apropriação da primeira fração no mês em que ocorrer a entrada da mercadoria no estabelecimento… O saldo remanescente ao final do quadragésimo oitavo mês deverá ser cancelado nos termos do inciso VII. Essas restrições ao direito de crédito foram introduzidas por sucessivas Leis Complementares 102/2000, 114/2002, 120/2005. No nosso entender, são inconstitucionais esses condicionamentos, pois desde a Emenda Passos Porto a entrada de mercadoria para integrar o ativo fixo passou a ser tributada pelo ICMS, devendo incidir a regra geral da compensação do imposto devido com o montante dobrado nas operações anteriores. Já verificamos que o crédito a ser compensado é de natureza financeira, não estando vinculado a esta ou aquela mercadoria. Contudo, o Plenário do STF, por maioria de votos apreciando a questão da anterioridade, em sede de medida cautelar emprestou interpretação conforme à Constituição, sem redução de texto, no sentido de afastar a eficácia do art. 7.º da Lei Complementar 102/2000, no tocante à inserção do § 5.º do art. 20 da LC 87/96 sob comento, e às inovações introduzidas no art. 33, II e IV, da citada lei complementar (ADI 2325/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 06.10.2006). Em outras palavras, a Corte Suprema limitou-se a dizer que as alterações introduzidas na LC 87/96 só surtirão efeitos a partir de 1.º.01.2001. Decorridos mais de dez anos dessa decisão liminar, ainda não se tem o ulgamento definitivo do mérito. A nosso ver, o § 5.º sob comento seria constitucional, se o ICMS decorrente de entrada da mercadoria no estabelecimento para compor o ativo permanente pudesse ser parcelado em 48 avos mediante pagamento mensal de cada fração, considerando-se cancelado eventual débito do imposto remanescente ao cabo de 48 meses.
§ 6.º Esse parágrafo visa atenuar os efeitos danosos da isenção concedida de permeio quando se impõe a anulação de créditos relativos às operações anteriores (letra b do inciso II do § 2.º do art. 155 da CF). O crédito relativo às operações anteriores às isentas ou às não tributadas poderá ser feito sempre que as saídas isentas ou não tributadas forem concernentes a produtos agropecuários (inciso I), ou, tratando-se de outras mercadorias, quando houver autorização em lei estadual (inciso II). O inciso I representa um casuísmo e o inciso II foge à regra do § 3.º, em que a vedação de crédito está regulada em nível da lei complementar, vinculando a ação do legislador de cada Estado, a fim de preservar a uniformidade de critério jurídico na preservação ou a anulação de crédito do ICMS, um imposto de nítida vocação nacional. Normas da espécie tornam complexa a legislação tributária, burocratizando a atividade dos agentes econômicos no cumprimento de suas obrigações tributárias.
Art. Art. 21. O sujeito passivo passivo deverá deverá efetu efetuar ar o estorno do do imposto de que que se tiver creditad creditado o sempre que o serviço serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento: I – for objeto de saída ou prestação de serviço não tributada ou isenta, sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada da mercadoria ou da utilização do serviço; II – for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto; III III – vier a ser utilizada em fim alheio à atividade atividade do estabelecimento; estabelecim ento; IV – vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se. § 1.º (Revogad (R evogado o pela LC 102/2000.) § 2.º Não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior ou de operações com o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos. (Redação dada pela LC n.º 120, de 2005.) § 3.º O não creditamento ou o estorno a que se referem o § 3.º do art. 20 e o caput deste deste artigo, não impedem a utilização dos mesmos mesm os créditos em operações posteriores, posteriores, sujeitas sujeitas ao imposto, com a mesma mesm a mercadoria. mercadoria. §§ 4.º a 8.º (Revogados pela LC 102/2000.)
Caput Regula Regula as qu q uatro hipóteses em que que o crédito crédi to deverá ser estornado: I – sempre que houver saída ou prestação isenta ou não tributada e não for previsível esta circunstância no momento da entrada da mercadoria ou utilização do serviço; II – quando a mercadoria for integrada ou consumida no processo de industrialização, quando a saída do produt pr odutoo indu i ndustriali strializado zado não for tributada tributada ou estiver isent i sentaa do imposto; imposto; III III – no caso de a mercadoria ercador ia entrada entrada ser utili utilizada zada em atividade atividade estranha estranha ao estabelecim estabeleci mento; ento; IV – quando a mercadoria vier a perecer, deteriorar-se ou extraviar-se.
§ 1.º Revogado pela LC n.º 102/2000 § 2.º Esse parágrafo determina a manutenção de créditos decorrentes de mercadorias ou prestações destinados ao exterior em cumprimento ao disposto na letra a do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF. Igualmente, manda preservar o crédito quando se trata de operações com o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos protegidos pela imunidade da letra d do do inciso VI do art. 150 da CF. Como se sabe, a imunidade difere da isenção porque a primeira tem sede constitucional atuando no campo definição de competência tributária, ao passo que a segunda tem sede na legislação infraconstitucional atuando no campo do exercício da competência tributária.
§ 3.º Esse parágrafo atenua os efeitos danosos do § 3.º do art. 20, possibilitando a utilização dos mesmos créditos em operações posteriores, com a mesma mercadoria. Para efeito de apropriação de crédito, o legislador infraconstitucional promoveu a vinculação do crédito à mesma mercadoria que ensejou a tributação, afastando-se da natureza financeira do crédito, adotada como regra geral, tornando a legislação tributária cada vez mais confusa. Em outras palavras, o ICMS decorrente da entrada de sapatos, por exemplo, não pode ser compensado com o ICMS devido pela saída de vestuários, mantida a periodicidade de apuração do imposto a recolher mediante o confronto dos créditos gerados pelas entradas de mercadorias em determinado período, e dos débitos decorrentes de saídas de mercadorias no mesmo período. No caso sob comento, a apuração do imposto a recolher não se faz por meio de imposto sobre imposto, mas base sobre base, o que dificulta a operacionalização, operaci onalização, gerando gerando inseg i nseguran urança ça jurídica.
§§ 4.º a 8.º Revogados pela LC 102/2000. Art. Art. 22. 22. (Vetad (Vetado.) o.) Art. Art. 23. O direito direito de crédito, crédito, para efeito efeito de compensação com débito débito do imposto, reconhecido reconhecido ao estabelecimento estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação e, se for o caso, à escrituração nos prazos e condições estabelecidos na legislação. Parágrafo único. O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento.
Caput O dispositivo submete o direito de crédito para efeito de compensação com o débito do ICMS à idoneidade da documentação fiscal, bem como à escrituração nos prazos e condições estabelecidos na legislação. Duas questões são relevantes na interpretação desse texto legal. A primeira diz respeito ao abuso legislativo em definir o que seja nota fiscal inidônea para vedar o direito de crédito. Certamente, o legislador pode agir discricionariamente nessa hipótese, mas nunca de sorte a afrontar o princípio da razoabilidade que se coloca como um limite à ação do próprio legislador. Quem promove promove atos de comércio comércio com contribuint contribuintee com inscrição cadastral suspensa suspensa ou inabilitada não pode se creditar do imposto, imposto, desde que a suspensão suspensão ou inabilitação tenh tenha sido publicada, e não decididas no âmbito interno da administração sem conhecimento de terceiros. A outra observação é a de que é lícito ao contribuinte apropriar-se de crédito do ICMS decorrente de nota fiscal posteriormente posteriormente considerada consider ada inidônea inidônea pelo fisco, sempre sempre que comprovada a veracidade veraci dade da operação
de compra e venda. Com a circulação jurídica perfaz-se o fato gerador da obrigação tributária, tornando o imposto devido. Eventual declaração de inidoneidade da nota fiscal, salvo na hipótese de má-fé, não pode prejudicar o direito de crédito. É o que prescreve a Súmula 509 do Superior Tribunal de Justiça. 14
Parágrafo único O direito de utilização do crédito sujeita-se ao mesmo prazo decadencial para o lançamento tributário. O termo inicial da contagem desse prazo quinquenal é a data da emissão do documento. Art. Art. 24. A legislação legislação tributária tributária estadual estadual disporá sobre s obre o período período de apuração apuração do imposto. As obrigações obrigações consideram-se consideram-se vencidas na data em que termina o período de apuração e são liquidadas por compensação ou mediante pagamento em dinheiro como disposto neste artigo: I – as obrigações consideram-se liquidadas por compensação até o montante dos créditos escriturados no mesmo período mais o saldo credor de período ou períodos anteriores, se for o caso; II – se o montante dos débitos do período superar o dos créditos, a diferença será liquidada dentro do prazo fixado pelo Estado; III – se o montante dos créditos superar os dos débitos, a diferença será transportada para o período seguinte.
A periodicidade de apuração do ICMS ficou a cargo da legislação de cada Estado, porém observados os dispostos nos incisos I a III, a fim de manter a uniformidade nacional: I – as obrigações consideram-se liquidadas por compensação até o montante dos créditos escriturados no mesmo período mais o saldo credor de período ou períodos anteriores, se for o caso; II – se o montante dos débitos do período for superior o dos créditos, a diferença será liquidada dentro do prazo fixado pelo Estado. No começo, a maioria dos Estados adotava o dia 30 do mês seguinte ao da apuração que se dava no último dia do mês; depois, o prazo de recolhimento do imposto foi diminuindo cada vez mais, até evoluir para a técnica de recolhimento por antecipação, por meio meio da figura figura da substituição substituição tributária para frente; frente; III – se o montante dos créditos superar os dos débitos, a diferença será transportada para o período períod o seguint seguinte. e. Du Durant rantee longo longo tempo tempo de vigência vigência do antigo antigo ICM, e até mesmo esmo no atual regime regime do ICMS, havia o problema de crédito ad aeternum, isto é, sem possibilidade de sua compensação porque o estabelecimen estabel ecimento to soment somentee operava oper ava no mercado mercado de exportação para o exterior, exterior, onde impera a imunidade de impostos, ou operava muito pouco no mercado interno, causando o acúmulo de créditos. Várias soluções legislativas foram implementadas pelas legislações estaduais. A transferência do crédito ao fornecedor da mercadoria por conta do preço da mercadoria; a restituição em dinheiro do crédito acumulado. Atualmente, a remessa de mercadoria para estabelecimento exportador é isenta do imposto ou não é tributada.
Art. Art. 25. Para efeito efeito de aplicação aplicação do disposto no art. 24, os débitos débitos e créditos créditos devem devem ser apurados apurados em cada estabelecimento, compensando-se os saldos credores e devedores entre os estabelecimentos do mesmo sujeito passivo localizados no Estado. (Redação (R edação dada pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) 11.07.2000.) § 1.º Saldos credores acumulados a partir da data de publicação desta Lei Complementar por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o inciso II do art. 3.º e seu parágrafo único podem ser, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento: I – imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; II – havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito. § 2.º Lei estadual poderá, nos demais casos de saldos credores acumulados a partir da vigência desta Lei Complementar, permitir que: I – sejam imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; II – sejam transferidos, nas condições que definir, a outros contribuintes do mesmo Estado.
Caput Os estabelecimentos, embora pertencentes a um mesmo titular, para efeitos fiscais são considerados autônomos, devendo cada qual manter a sua escrita fiscal para efeito de apuração periódica periód ica do imposto a ser recolhido.
§ 1.º A norma do caput sofre sofre flexibilização quando se trata de operações interestaduais com energia elétrica e petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos de derivados, quando destinados à industrialização ou à comercialização, hipótese em que não há incidência do imposto na saída (inciso III do art. 3.º da lei sob comento e letra b do inciso X do § 2.º do art. 155 da CF). Nessas hipóteses, os saldos credores credore s acumu acumulados podem ser se r imput imputados ados pelo sujeito passivo a qualquer um de seu estabelecimento situado no Estado na proporção das saídas que representem o total das saídas efetuadas pelo estabelecimento (inciso I). Havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros outros contribuint contribuintes es localizados local izados no mesmo esmo Estado, mediante a emissão emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito (inciso II).
§ 2.º Esse parágrafo deixa a critério da legislação de cada Estado o aproveitamento de saldos de créditos crédi tos acumulados acumulados na generali generalidade dade dos casos, observados os segu se guint intes es parâm pa râmetros: etros: I – sejam imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; II – sejam transferidos, nas condições que definir, a outros contribuintes do mesmo Estado.
Art. 26. Em substituição ao regime de apuração mencionado nos arts. 24 e 25, a lei estadual poderá estabelecer: I – que o cotejo entre créditos e débitos se faça por mercadoria ou serviço dentro de determinado período; II – que o cotejo entre créditos e débitos se faça por mercadoria ou serviço em cada operação; III – que, em função do porte ou da atividade do estabelecimento, o imposto seja pago em parcelas periódicas e calculado por estimativa, para um determinado período, assegurado ao sujeito passivo o direito de impugná-la e instaurar processo contraditório. § 1.º Na hipótese do inciso III, ao fim do período, será feito o ajuste com base na escrituração regular do contribuinte, que pagará a diferença apurada, se positiva; caso contrário, a diferença será compensada com o pagamento referente ao período ou períodos imediatamente seguintes. § 2.º A inclusão de estabelecimento no regime de que trata o inciso III não dispensa o sujeito passivo do cumprimento de obrigações acessórias.
Caput Esse dispositivo faculta à legislação estadual estabelecer outro regime de apuração do imposto mencionado nos arts. 24 e 25 retroanalisados. Examinemos as alternativas que cada Estado poderá adotar: I – que o cotejo entre créditos e débitos se faça por mercadoria ou serviço dentro de determinado período. É o regime que leva em conta o crédito físico que se contrapõe ao crédito financeiro do imposto; II – que o cotejo entre créditos e débitos se faça por mercadoria ou serviço em cada operação. Já verificamos que esse regime é impositivo para todos os Estados na hipótese do § 3.º do art. 21; III – que, em função do porte ou da atividade do estabelecimento, o imposto seja pago em parcelas periódicas e calculado por estimativa para um determinado período, assegurado ao sujeito passivo o direito de impugná-la e instaurar o processo contraditório. O grande mal desse regime de pagamento por estimativa é que as parcelas mensais são estabelecidas em valores bem superiores aos da realidade de cada contribuinte, sendo sumariamente indeferidas as impugnações do contribuinte. Outro mal consiste na impossibilidade de compensação do saldo credor apurado no final de cada exercício. O contribuinte é obrigado a pleitear, na maioria das legislações estaduais, a restituição do saldo credor e a continuar pagando no exercício seguinte as parcelas mensais em valores superestimados pelo fisco.
§ 1.º A regra desse § 1.º concilia os interesses das partes da relação tributária. Na esfera da lei de regência nacional do ISS não há regra semelhante. Por isso, algumas municipalidades, como a de São Paulo, partiram para soluções que atentam contra o princípio da razoabilidade. Havendo diferença para menos no final do período, o contribuinte saldá-la. No entanto, se houver diferença para mais, o
contribuinte deverá continuando pagando normalmente o valor estimado para o período seguinte, requerendo a restituição o recolhimento a maior do período anterior, em vez de permitir a compensação até onde for compensável.
§ 2.º O regime de estimativa não dispensa o cumprimento das obrigações acessórias que incluem o dever de emitir e escriturar as notas fiscais. Esse regime foi aventado pelo legislador no interesse do fisco que tinha dificuldade de acesso a determinados locais para os atos fiscalizatórios, notadamente os locais insalubres, como as oficinas mecânicas, as funilarias, os postos de gasolina etc., normalmente desprovidos de escritórios. Hoje, com os avanços tecnológicos no campo da informática, que possibilita a fiscalização a distância por meios eletrônicos, esse regime de estimativa perdeu a sua importância prática. Arts. 27 a 30. (Vetados.) Art. 31. Nos exercícios financeiros de 2003 a 2006, a União entregará mensalmente recursos aos Estados e seus Municípios, obedecidos os montantes, os critérios, os prazos e as demais condições fixadas no Anexo desta Lei Complementar. (Redação dada pela LC n.º 115, de 26.12.2002.) § 1.º Do montante de recursos que couber a cada Estado, a União entregará, diretamente: (Redação dada pela LC n.º 115, de 26.12.2002.) I – setenta e cinco por cento ao próprio Estado; e II – vinte e cinco por cento aos respectivos Municípios, de acordo com os critérios previstos no parágrafo único do art. 158 da Constituição Federal. § 2.º Para atender ao disposto no caput, os recursos do Tesouro Nacional serão provenientes: (Redação dada pela LC n.º 115, de 26.12.2002.) I – da emissão de títulos de sua responsabilidade, ficando autorizada, desde já, a inclusão nas leis orçamentárias anuais de estimativa de receita decorrente dessas emissões, bem como de dotação até os montantes anuais previstos no Anexo, não se aplicando neste caso, desde que atendidas as condições e os limites globais fixados pelo Senado Federal, quaisquer restrições ao acréscimo que acarretará no endividamento da União; II – de outras fontes de recursos. § 3.º A entrega dos recursos a cada unidade federada, na forma e condições detalhadas no Anexo, especialmente no seu item 3, será satisfeita, primeiro, para efeito de pagamento ou compensação da dívida da respectiva unidade, inclusive de sua administração indireta, vencida e não paga junto à União, bem como para o ressarcimento à União de despesas decorrentes de eventuais garantias honradas de operações de crédito externas. O saldo remanescente, se houver, será creditado em moeda corrente. (Redação dada pela LC n.º 115, de 26.12.2002.) § 4.º A entrega dos recursos a cada unidade federada, na forma e condições detalhadas no Anexo, subordina-se à existência de disponibilidades orçamentárias consignadas a essa finalidade na respectiva Lei Orçamentária Anual da União, inclusive eventuais créditos adicionais. (Redação dada pela LC n.º 115, de 26.12.2002.) § 5.º Para efeito da apuração de que trata o art. 4.º da Lei Complementar n.º 65, de 15 de abril de 1991, será considerado o valor das respectivas exportações de produtos industrializados, inclusive de semielaborados, não submetidas à incidência do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, em 31 de julho de 1996. (Redação dada pela LC n.º 102, de 11.07.2000.)
Caput e parágrafos Trata-se de dispositivos de efeito concreto para reger a entrega mensal de recursos financeiros da União aos Estados e Municípios nos exercícios de 2003 a 2006. Os critérios aí previstos foram substituídos pela Lei Complementar 62, de 28.12.1989, que estabeleceu normas sobre o cálculo, a entrega e o controle das liberações dos recursos do Fundo de Participação. Contudo, as Ações Diretas de Inconstitucionalidade 875, 2.727, 3.243 e 1.987 (apensados) declararam inconstitucionais os coeficientes previstos na LC 62/89, permitindo-se, entretanto, sua utilização até o exercício de 2012, quando, então, o Congresso Nacional deverá aprovar novos coeficientes com base no censo de 1990. Em consequência, sobreveio a Lei Complementar 143, de 17.07.2013, que alterou a redação do art. 2.º da Lei Complementar 62/89 e estabeleceu novos coeficientes individuais de participação dos Estados e do Distrito Federal a serem aplicados até dezembro de 2015 e outros coeficientes a serem aplicados a partir de 2016. Essa LC 143/2013 revogou os dispositivos do CTN que regulavam a matéria (arts. 86 a 89 e 93 a 95), promoveu a alteração da redação do art. 92 do CTN e deu nova redação ao art. 102 da Lei 8.443/92 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União) para se adequarem à nova disciplina implantada por essa lei complementar. Art. 32. A partir da data de publicação desta Lei Complementar: I – o imposto não incidirá sobre operações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semielaborados, bem como sobre prestações de serviços para o exterior; II – darão direito de crédito, que não será objeto de estorno, as mercadorias entradas no estabelecimento para integração ou consumo em processo de produção de mercadorias industrializadas, inclusive semielaboradas, destinadas ao exterior; III – entra em vigor o disposto no Anexo integrante desta Lei Complementar.
O inciso I regulamenta o disposto no art. 155, § 2.º, inciso X, letra a, da CF. Em sua redação original, essa alínea a assim prescrevia: “sobre operações que destinem ao exterior produtos industrializados, excluídos os semielaborados definidos em lei complementar”. A EC 42, de 19.12.2003, alterou a redação original da alínea a retrorreferida, deixando de fazer referência à exclusão dos semielaborados definidos em lei complementar, colocando um ponto final nas inúmeras discussões judiciais envolvendo o reconhecimento da imunidade. Com isso, fica prejudicada a aplicação da Lei Complementar 65, de 15.04.1991, que define os produtos semielaborados que poderão ser tributados por ocasião da exportação para o exterior. O inciso II assegura a manutenção do crédito do imposto nas hipóteses de entrada de mercadorias no estabelecimento para integrar ou sere consumidos no processo de industrialização. A razão é óbvia: por ocasião da saída do novo produto (industrializado), haverá incidência do imposto sobre o valor do material secundário que ficou agregado ao produto industrializado, e, no caso de terem sido consumidas as mercadorias no processo de industrialização (insumos), o seu valor
igualmente integrará o preço do novo produto. O Anexo referido no inciso III acha-se revogado. A Lei Complementar 115, de 26.12.2000, estabeleceu novas normas para a União promover a entrega de recursos financeiros aos Estados, Distrito Federal e Municípios. Art. 33. Na aplicação do art. 20 observar-se-á o seguinte: I – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1.º de janeiro de 2020; (Redação dada pela LC n.º 138, de 2010.) II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento: (Redação dada pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica; (Incluída pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) b) quando consumida no processo de industrialização; (Incluída pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e (Incluída pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) d) a partir de 1.º de janeiro de 2020 nas demais hipóteses; (Redação dada pela LC n.º 138, de 2010.) III – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, nele entradas a partir da data da entrada desta Lei Complementar em vigor; IV – somente dará direito a crédito o recebimento de serviços de comunicação utilizados pelo estabelecimento: (Incluído pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) a) ao qual tenham sido prestados na execução de serviços da mesma natureza; (Incluída pela LC n.º 102, de 11.07.2000.) b) quando sua utilização resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção desta sobre as saídas ou prestações totais; e (Incluída pela LC n.º 102, de 11.7.2000.) c) a partir de 1.º de janeiro de 2020 nas demais hipóteses. (Redação dada pela LC n.º 138, de 2010.)
Esse dispositivo estabelece novas restrições ao direito de crédito, além daquelas constantes do art. 20. Já se incorporou na rotina do legislador brasileiro a produção de normas nebulosas e dúbias que exigem um exercício mental muito intenso para compreender os respectivos alcances e conteúdos em virtude da dispersão proposital de matérias que deveriam ser tratadas no mesmo dispositivo. Esse artigo sob comento parece ter sido enxertado depois que o art. 20 exauriu o elenco de restrições ao princípio constitucional da não cumulatividade, indo muito além do permissivo constitucional. Quando o intérprete consegue detectar as proibições legislativas ao direito de crédito, surgem novas normas esparsas, às vezes, em outro diploma legal, estatuindo diferentes restrições supervenientes. Todas essas restrições estabelecidas de forma arbitrária pelo legislador infraconstitucional estão em confronto aberto com o princípio da não cumulatividade inserto no inciso I do § 2.º do art. 155 da CF. O inciso I fixa o direito de crédito a partir do ano 2020, assim como a letra d do inciso II e a letra c do inciso IV. O inciso III fixa, por sua vez, o direito de crédito de mercadorias destinadas ao ativo fixo, a partir do advento da Lei Complementar sob comento. A arbitrariedade legislativa, que destoa do princípio da razoabilidade, um limite imposto à ação do próprio legislador, exsurge com lapidar clareza pela só leitura desses textos. O princípio da não cumulatividade do imposto não pode ficar a critério do legislador ordinário para sua implementação. O imposto é não cumulativo por
expressa determinação constitucional. É razoável o legislador complementar facultar ao legislador estadual outra modalidade de incidência não cumulativa, como aquela prevista no art. 26, mas não pode fixar uma data futura para possibilitar a compensação do montante do imposto cobrado nas operações anteriores, o que equivale à fixação de um prazo certo para que o imposto assuma a característica de não cumulativo. Como assinala, com acerto, José Eduardo Soares de Mello, compete à lei complementar […] estabelecer um procedimento que tenha por escopo operacionalizar a sistemática da “não cumulatividade”, jamais torpedeá-lo ou limitar, restringir e cercear os direitos públicos subjetivos (constitucionais), erigidos como um autêntico estatuto do contribuinte.15 Art. 34. (Vetado.) Art. 35. As referências feitas aos Estados nesta Lei Complementar entendem-se feitas também ao Distrito Federal.
Limita-se a esclarecer que o Distrito Federal deve obedecer as mesmas normas estabelecidas para os Estados. Art. 36. Esta Lei Complementar entra em vigor no primeiro dia do segundo mês seguinte ao da sua publicação, observado o disposto nos arts. 32 e 33 e no Anexo integrante desta Lei Complementar.
A Lei Complementar sob comento entrou em vigor em 1.º.11.1996. Como antes mencionado, o Anexo integrante dessa lei complementar acha-se substituído por aquele introduzido pela Lei Complementar 115, de 26.12.2000.
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Recursos Extraordinários 92.927, 95.954, 101.346, 102.482, 102.608 e 2102.948. 2 RE 206.069, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 1.º.09.2005. 3 Recursos Extraordinários 185.789 e 203.075. 4 Recursos Extraordinários 87.049, 86.026, 71.307, 101.441 e 134.071. 5 Cf. nosso Direito financeiro e tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 424. 6 HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. Código Tributário Nacional comentado . 2. ed. São Paulo: Rideel, 2016. 7 MELO, José Eduardo Soares de. ISS : aspectos teóricos e práticos. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 105. 8 HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. ISS : doutrina e prática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 69-70. 9 “XII – cabe à lei complementar: ... h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)” 10 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 214. 11 Súmula 166 do STJ: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento
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do mesmo contribuinte”. “§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: [...] III – poderão ter alíquotas: a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro;” JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário de direito tributário . São Paulo: Noeses, 2011. p. 185. Súmula 509 do STJ: “É lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda”. MELO, José Eduardo Soares de. O ICMS e a LC 87/96 . Obra coletiva coordenada por Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 1996. p. 80.
4 OS REGIMES DE DIFERIMENTO E DE SUSPENSÃO DO ICMS Diferimento e suspensão do ICMS configuram dois regimes distintos, como adiante examinados.
4.1
DIFERIMENTO DO IMPOSTO
Diferimento vem de diferir que na linguagem registrada pelos dicionaristas significa adiar, delongar, dilatar, procrastinar. Pode, também, ter o sentido de discordar, divergir, diferenciar etc. Em tese, pode significar ato ou efeito de adiar, como também ato ou efeito de discordar. O Direito Tributário emprega essa terminologia no primeiro sentido. Dessa forma, o diferimento do ICMS significa o adiamento do prazo de recolhimento do imposto. Ele tem origem no Ato Complementar 31, de 28.12.1966, editado com base na legislação excepcional, em decorrência da alteração do sistema de cobrança da parcela do ICM pertencente aos Municípios, preconizada no Projeto de Constituição de 1967, na época, já aprovada pelo Congresso Nacional. O Presidente da República visou, pois, nesse aspecto, antecipar para 1.º.01.1967 os efeitos da nova Constituição, que acabou sendo promulgada em 24.01.1967. Prescrevia o art. 4.º do citado Ato Complementar: Art. 4.º No caso de diferimento ou antecipação de incidência do imposto que importe no seu recolhimento em Município diferente daquele em que ocorrer o fato gerador, a legislação estadual estabelecerá as normas necessárias ao resguardo dos créditos correspondentes aos Municípios de origem ou destino, conforme o caso. Verifica-se do texto transcrito que o diferimento do imposto não pode ser entendido como transferência do momento da ocorrência do fato gerador do tributo para etapa ou etapas posteriores.
O diferimento apenas transfere para momento ulterior a obrigação de recolher o imposto, ou transfere para futuro o lançamento do imposto (constituição definitiva do crédito tributário). Entretanto, pressupõe a existência da obrigação tributária pela ocorrência do fato gerador, ou seja, pela subsunção do fato concreto à hipótese legal prevista. O diferimento não se confunde, outrossim, com a moratória, que é a dilação de prazo concedida ao contribuinte para pagamento de crédito tributário definitivamente constituída pelo lançamento ou cujo lançamento já tenha sido iniciado (art. 154 do CTN), não havendo mutação do sujeito passivo da obrigação tributária. No diferimento há a mudança do sujeito passivo da obrigação tributária, por força de lei. Pelo diferimento, a lei estabelece a exclusão de responsabilidade do contribuinte (sujeito passivo natural) pelo pagamento do crédito tributário, atribuindo-a ao terceiro, vinculado ao fato gerador da obrigação tributária (art. 128 do CTN) a obrigação de efetuar o pagamento desse crédito tributário. Surge assim a figura do responsável tributário que, sem revestir a figura do contribuinte, sua responsabilidade decorre de expressa determinação legal. É um instituto jurídico que atua apenas no âmbito interno de determinado Estado. Não tem aplicação nas operações interestaduais. É comum a legislação tributária estadual prever várias hipóteses de diferimento do lançamento do ICMS, quer para facilitar a operacionalização da sistemática de cobrança, quer por questões de economia de custos, quer ainda por razões várias. Entre as hipóteses mais comuns de diferimento podemos citar as seguintes: a) o lançamento do imposto incidente na saída de mercadoria do produtor rural com destino a cooperativa de que faça parte, ficando diferido para o momento em que ocorrer a subsequente saída da mercadoria do estabelecimento da cooperativa; b) saída de produtos primários do estabelecimento produtor com destino às indústrias, ficando o imposto diferido para o momento da saída do produto industrializado; c) o lançamento do imposto incidente sobre as sucessivas saídas de café cru, em coco ou em grão, ficando diferido para o momento em que ocorrer: I – sua saída para outro Estado; II – sua saída para o exterior; III – sua saída para órgão ou entidade do Governo Federal; IV – a saída dos produtos resultantes de sua industrialização, inclusive de torração. Todas essas hipóteses representam o diferimento para trás em que o imposto é pago depois de ocorrido o fato gerador. Essa deveria ser a regra geral, sem exceção. No entanto, existe outra
modalidade de diferimento que é para frente, isto é, implica recolhimento antecipado do imposto que seria devido na operação subsequente. O recolhimento do imposto é antecipado para momento anterior ao da ocorrência do fato gerador. Por isso, esse diferimento é acoimado de inconstitucional pela maioria esmagadora dos estudiosos. É fruto da gula fiscal que não tem limite. Não havendo mais espaço para encurtar o prazo de recolhimento do imposto, engendrou-se a figura do recolhimento antecipado no pressuposto de que toda mercadoria que sai da fonte produtora percorre um longo ciclo que acaba no consumidor final. Dessa forma, implantou-se a substituição tributária para frente pela qual determinado contribuinte que realiza uma operação de circulação de mercadoria recolhe não só o tributo inerente a sua operação, mas recolhe por antecipação todos os impostos incidentes nas prováveis operações subsequentes, adotando-se como base de cálculo um valor presumível, na prática, sempre acima do valor de mercado, e que irá integrar o futuro fato gerador, que se concretizará à medida que forem realizadas concretamente as operações subsequentes de circulação urídica. A partir do advento da EC 3/93, essa modalidade de diferimento, para evitar contestações, ganhou sede constitucional representado pelo § 7.º acrescido ao art. 150 da CF, nos seguintes termos: A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável tributário pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido. Na verdade, trata-se de apuração e recolhimento antecipado do imposto, com fundamento na base de cálculo pelo valor presumido, que não se confunde com o fato gerador presumido que, evidentemente, ocorrerá futuramente, a não ser que a mercadoria transacionada sob esse regime venha evaporar-se por um passe de mágica. Toda mercadoria acaba encerrando sua etapa de circulação com a destinação ao consumidor final. É a regra geral. Isso é lógico e elementar. O legislador constituinte referiu-se ao fato gerador presumido, porque o elemento quantitativo (alíquota e base de cálculo) integra o fato gerador da obrigação tributária, como norma jurídica de tributação, com os demais elementos: subjetivo, espacial e temporal, além, obviamente, do seu aspecto material, objetivo ou nuclear (descrição legislativa abstrata e genérica). Sem a conjugação dos elementos material, quantitativo e temporal não será possível determinar o quantum exato do imposto devido. O aspecto espacial também influi nessa quantificação do imposto, porque nem todos os Estados adotam a mesma alíquota. O acerto ou o desacerto da tributação antecipada, portanto, só será revelado por ocasião da revenda da mercadoria ao consumidor final, quando será feita a restituição imediata e preferencial do imposto que tiver sido recolhido a maior. É o que prescreve o § 7.º retrorreferido, que contribuiu para diminuir os doutrinadores contrários a essa substituição tributária para frente que afronta a teoria geral do fato gerador que, poder-se-ia dizer, atribui responsabilidade
ao nascituro. Entretanto, a jurisprudência está caminhando exatamente em sentido contrário, sustentando a tese fazendária no sentido de que fato gerador presumido se tem por ocorrido sempre que houver operação de compra e venda posterior, ainda que com preço menor do que aquele que serviu da base para a tributação antecipada, hipótese em que não cabe a cogitação de restituição. E claro que o fato gerador ocorre a cada circulação jurídica, mas o quantum do imposto a pagar depende do preço considerado em cada operação de circulação de mercadoria, que é a base de cálculo do imposto. Onde há dois preços existem com certeza duas operações de compra e venda, da mesma forma que onde há emprego de duas bases de cálculo para apuração do imposto existe sem dúvida a ocorrência de dois fatos geradores distintos: um real e outro que serviu de base para pagamento antecipado do imposto para oportuno ajuste fiscal. Daí por que não procede a tese de que não cabe a restituição do imposto porque a substituição tributária é definitiva. A interpretação literal do texto constitucional que se refere a fato gerador presumido, com total desconsideração da sua base de cálculo, sem a qual o imposto deixa de ter existência jurídica, conduziu o aplicador ao equívoco de permitir que a fazenda se aproprie definitivamente do imposto pago a maior por ocasião da antecipação da ocorrência do fato gerador. Ora, o que torna a norma do § 7.º compatível com a Constituição é exatamente a ressalva da restituição da quantia paga, imediata e preferencialmente, caso não se realize o fato gerador com a base de cálculo presumida. Restituição “imediata” significa sem permeio e “preferencial” restituição do que foi pago a mais no mesmo momento em que se apura essa circunstância, não sendo possível cogitar-se de providências administrativas ou judiciais que mais se assemelham aos pedidos de restituição de indébito tributário. Por isso, o prazo de 90 dias fixado pela LC 87/96 (§ 1.º do art. 10) é absolutamente inconstitucional. Piores ainda os julgados que perfilham a tese de que não há que falar em restituição ou pagamento complementar da diferença, porque o instituto da substituição tributária é definitiva, incidindo em uma declaração acaciana. A lei que promove o diferimento para frente, mediante substituição tributária, é sempre definitiva, jamais provisória. Não há nem pode haver a figura da substituição provisória. O contribuinte substituinte substitui definitivamente o contribuinte substituído. Esse fato absolutamente nada tem a ver com a restituição do imposto pago a maior. Uma vez concretizado no mundo fenomênico aquele fato gerador presumido (imposto calculado antecipadamente com base em provável valor de revenda) e consta que essa base de cálculo havia extrapolado o valor de mercado adotado nessa operação de venda ao consumidor, impõe-se a restituição imediata da diferença, cobrada a maior. Aliás, a restituição imediata e preferencial de que cuida o texto constitucional deriva exatamente da definitividade da substituição tributária. Se provisória fosse essa substituição, não caberia a cogitação de restituição enquanto ela não se firmar definitivamente. Não existe nem pode existir pagamento de tributo em montante mais ou menos definido, sem que haja previsão de um momento para sua apuração definitiva, quando se fará
o ajuste para menos ou para mais, restituindo o que foi pago a mais e recolhendo o que foi pago a menos, como ocorre no pagamento de imposto por estimativa. O mesmo acontece na legislação do imposto de renda que reserva para o final de cada exercício a operação de ajuste fiscal, com o fim de efetuar o pagamento do imposto faltante, ou receber de volta o que foi pago em excesso, em respeito ao princípio constitucional da legalidade tributária: o que foi pago aquém da determinação legal deve ser complementado, e o que foi pago além da prescrição legal deve ser restituído. Por fim, importante lembrar que a Constituição refere-se a fato gerador presumido, e não a fato gerador fictício. Fato gerador presumido considerado em seus múltiplos aspectos comporta prova em contrário, diferente do fato gerador fictício que se situa no mundo do imaginário, descabendo a cogitação de prova em sentido contrário. A manutenção da jurisprudência dominante servirá de estímulo aos legisladores ordinários para estabelecer a base de cálculo propositalmente acima do valor de mercado, a fim de apropriar-se de um valor indevido, descaracterizando o ICMS estruturado na Constituição.
4.2
SUSPENSÃO DO IMPOSTO
A suspensão do imposto de que trataremos neste tópico não se confunde com a suspensão da exigibilidade do crédito tributário prevista nas seis hipóteses taxativamente enumeradas no art. 151 do CTN, tais como a concessão de moratória, o depósito do montante integral do tributo, as reclamações, impugnações ou recursos administrativos, a concessão de liminar em mandado de segurança ou de tutela antecipada em procedimentos ordinários etc. A suspensão do imposto de que iremos cuidar consiste no condicionamento da incidência do imposto a um evento futuro definido na legislação tributária. É a não incidência do imposto por ocasião da saída da mercadoria, cujo pagamento fica condicionado à ocorrência de um evento futuro previsto na legislação de cada ente político tributante. Ao contrário do diferimento, a suspensão não implica alteração do sujeito passivo do imposto. A suspensão é uma categoria jurídica que consiste em permitir que o contribuinte, sujeito passivo natural, postergue o pagamento do imposto para uma etapa posterior do ciclo de movimentação da mercadoria sem, contudo, transferir a terceiro (responsável tributário) o ônus do recolhimento do imposto. Por isso, na suspensão é sempre o mesmo contribuinte que procedeu à saída com suspensão quem terá que recolher o imposto em época assinalada pela legislação de cada Estado. Normalmente, as legislações estaduais costumam prever a suspensão do imposto para as seguintes hipóteses: (a) de saída de mercadoria, para dentro do Estado, remetida para demonstração, inclusive para consumidor ou usuário final, postergando-se o pagamento do imposto por ocasião da efetiva transferência de propriedade. Não havendo destinação a consumidor final, a mercadoria
deverá retornar à origem, também com suspensão do imposto, dentro do prazo previsto na legislação de cada Estado; (b) de remessa do estabelecimento fabricante, de produtos determinados com destino a hospitais para utilização em cirurgias, ficando o imposto suspenso para ser pago apenas por ocasião da cirurgia; (c) o lançamento de imposto incidente no desembaraço aduaneiro de mercadoria ou produtos destinados à manutenção e ao reparo de aeronave pertencente à empresa autorizada a operar no transporte comercial internacional e utilizados nessa atividade para estocagem no Regime Aduaneiro Especial de Depósito Alfandegado (DAF), que fica suspenso pelo período definido na legislação de cada Estado; (d) outra hipótese de suspensão diz respeito à remessa de mercadoria para industrialização por encomenda. Normalmente, o lançamento do imposto incidente na saída fica suspenso, a fim de ser recolhido no momento posterior ao retorno do produto industrializado ao estabelecimento de origem, mas apenas quando o autor da encomenda promover a subsequente saída desse novo produto. É que o simples retorno do produto industrializado não configura etapa de circulação jurídica, o que acontece tão somente por ocasião de sua venda, implicando a transferência de propriedade. No caso de remessa de mercadoria para fins de industrialização por encomenda é possível a suspensão do imposto em operações interestaduais por força do Convênio AE-15/74, tornado permanente pelo Convênio ICMS 151/94 subscrito pelo Estado de São Paulo e alguns outros Estados. A suspensão do imposto, nessa hipótese, abrange não apenas a saída promovida pelo industrializador em retorno ao estabelecimento do autor da encomenda, como também a saída que, antes do retorno dos produtos ao estabelecimento autor da encomenda, por ordem deste, for promovida pelo estabelecimento industrializador com destino a outro estabelecimento industrializador. Na hipótese de inexistir, no Estado em que é procedida a industrialização por encomenda, previsão legal de suspensão do imposto no retorno, o estabelecimento industrializador deverá recolher o imposto acrescido do valor da industrialização. A legislação do Estado de São Paulo prevê o regime de suspensão do ICMS na remessa de mercadorias para industrialização sob encomenda, tanto no âmbito interno como no interestadual.
5 A TRIBUTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TRANSPORTES INTERMUNICIPAIS E INTERESTADUAIS À primeira vista, esse tema não oferece maiores dificuldades, mas, no fundo, ele suscita dúvidas e incertezas. Antes de mais nada, é preciso ter em mente o caráter mercantil do imposto, o que coloca a salvo da tributação o transporte de carga própria, como decidiu reiteradamente o STF à época em que o imposto sobre o serviço de transporte era da competência da União. Não há razão para alterar aquele entendimento consagrado pelo Supremo Tribunal Federal motivado pelo fato de que a competência impositiva foi deslocada para o âmbito dos Estados. Imperioso lembrar, também, que são tributáveis pelo ICMS apenas os serviços de transporte interestadual e intermunicipal, ainda que esses serviços tenham se iniciado no exterior. Contudo, há que reconhecer que os serviços de transportes interestaduais e intermunicipais não mereceram uma regulamentação específica pela Lei Complementar 87/96, de sorte a possibilitar a aplicação das alíquotas interestaduais e a aplicação do princípio da não cumulatividade que pressupõe destaque do ICMS a ser compensado nas operações subsequentes. O legislador complementar não atentou para o fato de que a Constituição de 1988 ampliou o campo de incidência do antigo ICM que passou a abarcar, também, a prestação de serviços expressamente referidos no texto constitucional, dando origem ao atual ICMS. A Lei Complementar 87/96 traçou as normas gerais do ICMS, mas não assegurou o caráter não cumulativo do imposto cobrado em decorrência da prestação de serviços de transporte interestadual de passageiros, violando o mandamento constitucional contido no art. 155, § 2.º, I, da CF. Apesar de a referida lei tratar em seu art. 19 da não cumulatividade do imposto, também em relação à prestação de serviços de transporte interestadual, e o seu art. 20 referir-se ao direito de crédito do imposto pelo recebimento de serviços de transporte interestadual, nada adiantou quanto à forma de obtenção do resultado não cumulativo. No tocante ao transporte interestadual e intermunicipal de passageiros,
essa lei revela-se incompleta. Realmente, a referida Lei Complementar 87/96 disciplinou a tributação dos serviços de transporte de cargas e passageiros de modo uniforme, adotando o mesmo critério pertinente à circulação de mercadoria, não atentando para a especificidade dos serviços, impossibilitando a implementação do mecanismo de compensação do imposto pago na etapa anterior, em relação aos serviços de transporte interestadual de passageiros tomados por consumidor que seja contribuinte do imposto, deixando de cumprir o comando do art. 146, III, “a”, da CF. De fato, a Lei Complementar 87/96 é completamente omissa na regulamentação do mecanismo de compensação do imposto, para assegurar o resultado não cumulativo na prestação do serviço de transporte interestadual de passageiros, bem como a maneira pela qual se utiliza de alíquotas interestaduais, conforme o destino do passageiro. Se o adquirente de passagem for pessoa jurídica contribuinte do ICMS, como ela poderá creditar-se do imposto para compensação posterior, se o bilhete é sempre emitido “ao portador”, ou seja, sem a identificação do tomador do serviço? Não é por outra razão que o Plenário do Supremo Tribunal Federal na ADI 1600-8, de que foi relator o Excelentíssimo Senhor Ministro Sydney Sanches, declarou, em 26.11.2001, a inconstitucionalidade da exigibilidade do ICMS no transporte aéreo de passageiros conforme ementa a seguir: Constitucional. Tributário. Lei Complementar 87/96. ICMS e sua instituição. Arts. 150, II; 155, § 2.º, VII, “a”, e inciso VIII, CF. Conceitos de passageiro e de destinatário do serviço. Fato gerador. Ocorrência. Alíquotas para operações interestaduais e para as operações internas. Inaplicabilidade da fórmula constitucional de partição da receita do ICMS entre os Estados. Omissão quanto a elementos necessários à instituição do ICMS sobre navegação aérea. Operações de tráfego aéreo internacional. Transporte aéreo internacional de cargas. Tributação das empresas nacionais. Quanto às empresas estrangeiras, valem os acordos internacionais. Reciprocidade. Viagens nacional ou internacional. Diferença de tratamento. Ausência de normas de solução de conflitos de competência entre as unidades federadas. Âmbito de aplicação do art. 151, CF é o das relações das entidades federadas entre si. Não tem por objeto a união quando esta se apresenta na ordem externa. Não incidência sobre a prestação de serviços de transporte aéreo, de passageiros – intermunicipal, interestadual e internacional. Inconstitucionalidade da exigência do ICMS na prestação de serviços de transporte aéreo internacional de cargas pelas empresas aéreas nacionais, enquanto persistirem os convênios de isenção de empresas estrangeiras. Ação julgada, parcialmente procedente (ADI 1600, Rel. Min. Sydney Sanches, Relator p/ acórdão Min. Nelson Jobim, j. 26.11.2001, DJ 20.06.2003).
Como muito bem assinalou o Excelentíssimo Senhor Ministro Nelson Jobim: O bilhete é emitido – sempre – em nome da pessoa transportada. É ela, evidentemente, uma pessoa física . Pessoa jurídica não é transportável. Mesmo quando o bilhete é adquirido por uma pessoa jurídica, ele será – sempre – emitido em nome de uma pessoa física – o passageiro. Primeira inconsistência E aqui está o primeiro problema. A regra nuclear do ICMS é a não cumulatividade. No caso, o bilhete é emitido em nome do passageiro. Pergunto: Como a pessoa jurídica, adquirente do bilhete para o passageiro, poderá se creditar do valor do imposto para abatimento futuro? Não há resposta na lei. Ainda nesse julgamento, muito bem asseverou o Excelentíssimo Senhor Ministro Celso de Mello: Com efeito, e como bem demonstrou, em substancioso voto, o eminente Ministro Nelson Jobim, as estruturas e as regras que compõem o diploma legislativo em questão, bem assim o sistema instituído em nosso País, em tema de transporte aéreo de passageiros e de transporte aéreo internacional de cargas, frustram a aplicabilidade do postulado constitucional da não cumulatividade do ICMS – ante a ausência de qualquer mecanismo de creditamento ou de compensação do valor desse imposto – tornam inviável, notadamente em função das peculiaridades que caracterizam o serviço de transporte aéreo de passageiros, a própria incidência da alíquota pertinente a esse tributo, considerada a impossibilidade de qualificar-se, aquele em cujo nome é extraído o bilhete de passagem, como consumidor final, ou não, e como contribuinte, ou não, do ICMS… A declaração de inconstitucionalidade deu-se por duplo fundamento: por não permitir a aplicação do princípio da não cumulatividade nem a possibilitar a aplicação de alíquotas interestaduais, visto que o bilhete não comporta destaque do ICMS e o seu valor é cobrado na origem pela aplicação da alíquota interna. É o que restou decidido na ADI 1.600 retrorreferida, oportunidade em que o Ministro adiantou que a mesma tese é aplicável em relação ao transporte rodoviário intermunicipal e interestadual. Contudo, em relação ao transporte rodoviário de passageiros intermunicipais e interestaduais, a
mesma Alta Corte do País julgou improcedente a ADI 2.669 impetrada pela Confederação Nacional do Transporte, conforme se verifica da lacônica ementa a seguir transcrita: ICMS. Transporte terrestre. Lei Complementar n.º 87/96. Constitucionalidade. Mostra-se harmônica com a Constituição Federal a incidência do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte terrestre (ADI 2669, Rel. Min. Nelson Jobim, Relator p/ acórdão Min. Marco Aurélio, DJe 06.08.2014). O Ministro Relator Nelson Jobim, em percuciente voto, demonstrou a identidade de fundamentação com a ADI 1.600 pertinente ao serviço de transporte aéreo internacional e interestadual, no que foi acompanhado pelos Ministros Sepúlveda Pertence e Ricardo Lewandowski. Abriu divergência o Ministro Marco Aurélio julgando improcedente a ação, seguido pelos demais Ministros sem maiores discussões, resultando em 4 votos pela procedência da ação direta inconstitucional e 5 votos pela improcedência da ação. Muito embora tenham afirmado que o transporte rodoviário é diferente do transporte aéreo, não há dúvida que estamos diante de decisões conflitantes que se devem à mudança na composição do Supremo Tribunal Federal. Sustentamos a falta de densidade jurídica da Lei Complementar 87/96 para possibilitar a tributação pelo ICMS, tanto do transporte aéreo intermunicipal e interestadual como do transporte rodoviário intermunicipal e interestadual. Realmente, em relação ao serviço de transporte de passageiros, não há lugar para aplicação da alíquota interestadual “nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado”. De fato, passageiros não podem ser equiparados a bens e serviços destinados a consumidor final. Como assinalamos no nosso livro, […] os Estados vêm aplicando a alíquota interna nos transportes terrestres interestaduais e intermunicipais fazendo vista grossa às alíquotas de 7% a 12% fixadas pelo Senado Federal nos termos do art. 155, § 2.º, IV da CF, e impossibilitando o tomador pessoa jurídica de creditar-se do ICMS cobrado nas operações anteriores, vulnerando o princípio da não cumulatividade previsto no inciso I, do § 2.º, do art. 155 da CF. 1 No nosso entender, essa apertada decisão por 4 x 5 votos merece revisão pelo Plenário da Corte Suprema em sua composição completa.
1
Cf. nosso Direito financeiro e tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 500-501.
6 A GUERRA FISCAL E AS TENTATIVAS LEGISLATIVAS PARA SUA CESSAÇÃO A guerra fiscal está de tal forma arraigada nos hábitos de nossos governantes que dificilmente terá um fim com os mecanismos como aquele previsto no art. 155, XIII, g , da CF, que prevê a celebração do Convênio entre os Estados para concessão de isenções e demais benefícios fiscais. A outorga unilateral de incentivos fiscais regionais, como forma de atrair investimentos em seus Estados, já faz parte da estratégia governamental de desenvolvimento econômico. Cada governante preocupa-se com o seu Estado, pouco importando com os malefícios que venham causar a outros Estados. Zelar pela harmonia dos Estados e combater as desigualdades socioeconômicas das diferentes regiões do País é uma incumbência do poder central (art. 151, I, da CF). Por isso, os governantes estaduais não se importe em aprofundar as diferenças regionais desenvolvendo políticas de concentração de riquezas nos Estados mais desenvolvidos economicamente. Em todo caso, foi editada a Lei Complementar 24, de 07.01.1975, parcialmente recepcionada pela ordem constitucional vigente, para prevenir as guerras fiscais mediante o emprego do ICMS como instrumento de política econômica. Dispõe o seu art. 1.º: Art. 1.º As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei. Parágrafo único. O disposto neste artigo também se aplica: I – à redução da base de cálculo; II – à devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros; III – à concessão de créditos presumidos;
IV – a quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiros-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus. […] O art. 8.º dessa LC 24/75, por sua vez, prescreve: Art. 8.º A inobservância dos dispositivos desta Lei acarretará, cumulativamente: I – A nulidade do ato e a ineficiência do crédito fiscal atribuído ao estabelecimento recebedor da mercadoria; II – A exigibilidade do imposto não pago ou devolvido e a ineficácia da lei ou ato que conceda remissão do débito correspondente. Parágrafo único. Às sanções previstas neste artigo poder-se-ão acrescer a presunção de irregularidade das contas correspondentes ao exercício, a juízo do Tribunal de Contas da União, e a suspensão do pagamento das quotas referentes ao Fundo de Participação, ao Fundo Especial e aos impostos referidos nos itens VIII e IX, do artigo 21 da Constituição Federal. Fundamentado no art. 8.º retrorreferido, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo vinha exigindo o estorno de créditos relativamente às mercadorias procedentes de outros Estados. O Comunicado CAT 36, de 29.07.2004, da Fazenda do Estado chegou a colocar em sua lista negra nada menos que 11 Estados-membros que haviam outorgado unilateralmente os diferentes incentivos fiscais. Proposta a ação direta de inconstitucionalidade contra esse Comunicado, ela não foi conhecida pelo STF sob a alegação de que o “o Comunicado CAT-36/2004, da Coordenadoria da Administração Tributária do Estado de São Paulo, constitui mero ato administrativo despido de normatividade, isto é, não é ato normativo autônomo, geral e abstrato e, portanto, não pode ser submetido à fiscalização abstrata de sua constitucionalidade, conforme a consolidada jurisprudência desta Corte” (ADI 3350 AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 31.10.2008). Estimulado por essa decisão, o órgão fazendário do Estado de São Paulo editou a CAT 14, de 24.03.2009, dispondo sobre ineficácia e nulidade do crédito do imposto decorrente de entrada de mercadoria no território paulista procedente de outro Estado, com os benefícios do incentivo fiscal denominado “ProEmprego”, instituído pelo Estado de Santa Catarina. Aludida CAT determinou o cancelamento de ofício dos créditos excedentes a 3% do valor da operação, com a aplicação de sanções previstas no art. 85 da Lei paulista 6.374/89, prejudicando os contribuintes paulistas que nenhum benefício fiscal auferiram, limitando-se a adquirir mercadorias procedentes de Santa Catarina favorecendo os contribuintes locais. No nosso entender, apenas nas hipóteses de incentivos fiscais representados pela isenção e não
incidência legalmente qualificada podem os créditos do imposto ser anulados e estornados. Demais incentivos fiscais, como redução da base de cálculo, redução de alíquotas etc., apesar de submetidos ao regime de convênios celebrados entre os Estados e equipados à isenção e não incidência, conforme parágrafo único do art. 1.º da LC 24/75, não podem ensejar anulação do crédito do imposto e seu estorno, por ausência de base constitucional. O princípio da não cumulatividade do ICMS só cede ante a isenção e a não incidência expressa do imposto. O que é uma exceção constitucional não pode ser ampliada por meio de lei complementar. É o nosso entendimento. Nesse sentido pronunciouse o STF: Recursos Extraordinários 161.031, 355.422, 240.395, 367.504, 355.422 e 298.941. Em relação ao estorno de ofício pela Fazenda, a matéria está sendo julgada pelo STF no RE 628.075, em que foi reconhecida a existência de repercussão geral, conforme ementa a seguir: Constitucional. Tributário. ICMS. Guerra fiscal. Cumulatividade. Estorno de créditos por iniciativa unilateral de ente federado. Estorno baseado em pretensa concessão de benefício fiscal inválido por outro ente federado. Arts. 1.º, 2.º, 3.º, 102 e 155, § 2.º, I, da Constituição Federal. Art. 8.º da LC 24/1975. Manifestação pela existência de repercussão geral da matéria (RE 628.075/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 1.º.12.2011). O fisco paulista, em vez de adotar medidas unilaterais procedendo à anulação do crédito do imposto, exigindo o recolhimento do imposto na base de 18% e impondo pesadas multas aos contribuintes adquirentes de mercadorias procedentes de Santa Catarina, deveria ajuizar a ação direta de inconstitucionalidade contra o ato concessivo de incentivo fiscal irregularmente concedido por aquele Estado. Por sua vez, o STF deveria deixar de aplicar o art. 12 da lei de regência da matéria, passando a examinar a medida cautelar suspendendo incontinente os efeitos do ato concessivo de benefício fiscal, sem a intermediação do Confaz, tarefa que não demanda maiores exames. Em razão da demora excessiva do STF em pronunciar-se a respeito de incentivos fiscais unilateralmente concedidos pelos entes políticos regionais, a chamada guerra fiscal alastrou-se por seis Estados (Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina, Pernambuco, Goiás e Alagoas). Em todas essas unidades da Federação brasileira foram outorgados benefícios fiscais relativamente a produtos e mercadorias desembaraçados nos portos localizados em seus territórios. É aquilo que ficou conhecido como Guerra dos Portos. Nessas hipóteses, exigir o imposto à alíquota de 18% como se a importação tivesse ocorrido no território paulista, além do estorno do crédito e imposição de multas, configura certamente uma afronta à sistemática de tributação interestadual, bem como ao princípio da não cumulatividade do ICMS, que tem sede constitucional. Nesse sentido é a jurisprudência do STF que repele a tese da compensação de inconstitucionalidades, como se verifica da ementa a seguir: ICMS: “guerra fiscal”: concessão unilateral de desoneração do tributo por um Estado federado, enquanto vigorem benefícios similares concedidos por outros: liminar deferida.
1. A orientação do Tribunal é particularmente severa na repressão à guerra fiscal entre as unidades federadas, mediante a prodigalização de isenções e benefícios fiscais atinentes ao ICMS, com afronta da norma constitucional do art. 155, § 2.º, XII, g – que submete sua concessão à decisão consensual dos Estados, na forma de lei complementar (ADIn 84/MG, 15.02.1996, Galvão, DJ 19.04.1996; ADInMC 128/AL, 23.11.1989, Pertence, RTJ 145/707; ADInMC 902 3.3.94, Marco Aurélio, RTJ 151/444; ADInMC 1.296/PI, 14.06.1995, Celso; ADInMC 1.247/PA, 17.08.1995, Celso, RTJ 168/754; ADInMC 1.179/RJ, 29.02.1996, Marco Aurélio, RTJ 164/881; ADInMC 2.021/SP, 25.08.1999, Corrêa; ADIn 1.587, 19.10.2000, Gallotti, Informativo 207, DJ 15.08.1997; ADInMC 1.999, 30.06.1999, Gallotti, DJ 31.03.2000; ADInMC 2.352, 19.12.2000, Pertence, DJ 09.03.2001). 2. As normas constitucionais, que impõem disciplina nacional ao ICMS, são preceitos contra os quais não se pode opor a autonomia do Estado, na medida em que são explícitas limitações. 3. O propósito de retaliar preceito de outro Estado, inquinado da mesma balda, não valida a retaliação: inconstitucionalidades não se compensam. 4. Concorrência do periculum in mora para a suspensão do ato normativo estadual que – posto inspirada na razoável preocupação de reagir contra o Convênio ICMS 58/99, que privilegia a importação de equipamentos de pesquisa e lavra de petróleo e gás natural contra os produtos nacionais similares – acaba por agravar os prejuízos igualmente acarretados à economia e às finanças dos demais Estados-membros que sediam empresas do ramo, às quais, por força da vedação constitucional, não hajam deferido benefícios unilaterais (ADI 2377-MC/MG, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 07.11.2003, p. 00081). Em 1.º.06.2011, a Corte Suprema julgou quatorze ações diretas de inconstitucionalidade declarando a inconstitucionalidade de diversos incentivos fiscais concedidos à margem do art. 155, § 2.º, XII, g , da CF sem, contudo, fazer a modulação de efeitos. Os contribuintes de boa-fé, prejudicados pelos efeitos dessas decisões, com certeza irão bater às portas do Judiciário, pois estarão arcando com as consequências de um ato irregular pelo qual não foram responsáveis. Para prevenir a repetição de incentivos fiscais irregulares, o STF esboçou o teor da súmula vinculante considerando inconstitucionais os incentivos fiscais sem a intermediação do Confaz. Houve solicitação do Senado Federal no sentido de o STF sustar a edição da referida súmula vinculante porque estaria em andamento o projeto legislativo para solucionar o problema decorrente das ações diretas de inconstitucionalidade julgadas sem fixação de efeitos prospectivos. De fato, estava em tramitação o PLC 238/2013 que autorizava os Estados firmar convênios, com a intermediação do Confaz, convalidando os incentivos fiscais considerados inconstitucionais pela Corte Suprema mediante a concordância de 3/5 das unidades federadas e 1/3 das unidades federadas integrantes de cada uma das cinco regiões do País. A proposta legislativa, todavia, não vingou. Por isso, o Confaz arvorou-se em legislador complementar, e na reunião de Brasília, do dia 29.04.2004,
firmou o Convênio 70/2014 concedendo diretamente a anistia e a remissão dos créditos tributários decorrentes de incentivos fiscais outorgados de forma inconstitucional. Patente a inconstitucionalidade desse Convênio, a exemplo do Protocolo 21/2011, que repartia o ICMS entre os Estados distribuidores e destinatários de mercadorias nas operações interestaduais por meio de comércio eletrônico. O citado Protocolo foi considerado inconstitucional pelo Plenário da Corte Suprema no julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4628 e 4713. Na realidade, a concessão de incentivo fiscal por meio do ICMS, um imposto de vocação nacional pelos efeitos financeiros que provocam em âmbito nacional, está implicitamente vedada pelo art. 151 da CF. Entretanto, a guerra fiscal está de tal forma incorporada na cultura dos governantes estaduais que dificilmente terá um fim. A edição de súmula vinculante nos termos anunciados pelo STF teria o condão de dispensar o moroso processo de julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade, fulminando incontinente os incentivos fiscais sem base na Constituição. Uma forma de acabar de vez com esses incentivos fiscais viciados seria proibir, por meio de uma emenda, a concessão de qualquer tipo de incentivo fiscal em relação ao ICMS. A alternativa que apresentamos ao Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e encaminhada ao Congresso Nacional consiste na penalização do governante, mediante introdução na Lei 8.429, de 02.06.1992, da figura do ato de improbidade administrativa, com a respectiva sanção, como adiante transcrito. A Lei n.º 8.429, de 02 de junho de 1992, passa a vigorar acrescida: (a) da Seção II-A e do art. 10-A: Seção II-A – Dos Atos de Improbidade Administrativa Decorrentes de Concessão ou Aplicação Indevida de Isenções, Incentivos e Benefícios Fiscais Art. 10-A. Constitui ato de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão no sentido de conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõe a Lei Complementar que regula o disposto na alínea g , do inciso II, do § 2.º, do art. 155 da Constituição. (b) do inciso IV ao art. 12: Art. 12. […] IV – na hipótese do art. 10-A, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos e multa civil de até três vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido. Para evitar qualquer dúvida quanto à caracterização da infração é de todo conveniente que a conduta do agente público decorrente da aprovação do presente projeto legislativo seja devidamente tipificada, a exemplo do que ocorre com o PLC 386/2012 do Senado Federal, que altera a Lei
Complementar 116/2003 que, entre outras coisas, visa prevenir a guerra fiscal entre os Municípios. Outrossim, para o novo tipo infracional estipula-se a penalidade específica do inciso IV do art. 12. Com a providência legislativa retroapontada é possível colocar um ponto final nessa guerra fiscal que vem acontecendo desde o ICM, hoje, ICMS.
7 EXAME DE TEMAS CONTROVERTIDOS São inúmeros os casos polêmicos e controvertidos em matéria de ICMS que vêm desafiando a inteligência dos doutrinadores e dos julgadores, decorrentes da complexidade do nosso sistema tributário nacional, em que convivem legislações das três esferas políticas. A lei de regência nacional do ICMS não é suficiente para aclarar diversos aspectos duvidosos em relação à legislação desse imposto, sendo certo que, como vimos, ela própria padece de dúvidas e questionamentos diversos. Não temos a pretensão de exaurir a matéria neste capítulo, mas procuraremos abordar quatro desses aspectos controvertidos que têm causado maior quantidade de litígios de natureza tributária quanto ao ICMS.
7.1
FATOS GERADORES CONFRONTANTES
O fato gerador da obrigação tributária é aquela situação genérica e abstratamente descrita na norma jurídica que, uma vez concretizado no mundo fenomênico, provoca a sua incidência, infalivelmente fazendo surgir a obrigação tributária. Os fatos do mundo da realidade capazes de suportar uma imposição tributária, conhecidos como fatos signos presuntivos de riqueza, são utilizados pelos legisladores tributários das três esferas políticas como veículos de incidência tributária. Quando são idênticos ou coincidentes esses fatos signos presuntivos de riqueza, veiculados pelas legislações tributárias de dois entes políticos, teremos a chamada bitributação urídica, isto é, duas entidades políticas tributando sob o mesmo fato gerador. Decorre do princípio da privatividade do imposto cabente a cada esfera política que não pode haver bitributação jurídica, salvo expressa previsão constitucional em contrário, como no caso de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel que era tributado tanto pelo IVV como pelo ICMS pela Constituição de 1988. A Emenda Constitucional 3, de 17.03.1993, veio suprimir o IV
pertencente aos municípios, passando aqueles produtos a ser tributados apenas pelo ICMS. Outras vezes, esses fatos geradores situam-se em uma zona cinzenta em que há uma dificuldade de definir a competência tributária. São os fatos geradores confrontantes. Muitas vezes surgem dúvidas se em uma determinada situação há incidência do ISS, do ICM ou do IPI. No tocante à saída de produto industrializado do estabelecimento industrializador, sabemos que há incidência tanto do ICMS como do IPI por força do expresso dispositivo constitucional do inciso XI do § 2.º do art. 155 da CF, que determina a exclusão da base de cálculo do ICMS do montante do IPI, quando a operação envolver ocorrência de fato gerador de ambos os impostos. Em relação ao ISS/ICMS, em princípio, a Constituição faz nítida separação entre a incidência de um e de outro imposto. A prestação de serviços ficou situada na esfera de competência impositiva dos Municípios desde que definidos em lei complementar, com exclusão expressa dos serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicação, inseridos na competência tributária dos Estados (arts. 156, III, e 155, II, da CF, respectivamente). Além disso, dispôs a alínea b do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF que incidirá o ICMS “sobre o valor total da operação quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios”. A dúvida, nesse caso, resolve-se pela consulta à lista de serviços especificados anexa à Lei Complementar 116/2003. Diversos itens dessa lista ressalvam a incidência do ICMS em relação a materiais, motores ou equipamentos fornecidos na prestação de serviços, como no caso de peças ou motores empregados no serviço de conserto de veículos. Entretanto, na prática não é simples assim. As dúvidas ora surgem por causa das confusões conceituais, ora por não distinguirem a atividade-fim da atividade-meio. É comum afirmar que o ISS grava o serviço previsto na lista de serviços quando, na verdade, o seu fato gerador é a prestação efetiva do serviço remunerado, sendo o serviço mero objeto do imposto. A confusão do objeto de imposto com o fato gerador desse imposto leva alguns autores a afirmar que o imposto incide sobre o serviço prestado ou consumido, para justificar a tributação pelo ISS do serviço prestado no exterior do País. De fato, afirmam Gabriel Lacerda Troianelli e Juliana Gueiros: A autorização constitucional é, assim ampla, e não tem o objetivo de alcançar apenas a prestação do serviço (fornecimento de trabalho, a “locação” da força de trabalho), mas ela visa a onerar os serviços, prestados ou consumidos . Foi com fundamento na autorização constitucional estabelecida no inciso III do art. 156 que a Lei Complementar 116/03 estabeleceu uma nova modalidade de incidência sobre os serviços (e não uma nova incidência), que é o efetivo consumo do serviço. Até o advento dessa Lei Complementar, o ISS era um tributo incidente sobre a prestação dos serviços. 1
Outras vezes, dúvidas surgem por não distinguir a atividade principal, objeto de tributação, da atividade secundária sem a qual a primeira não poderia ser executada. Em outras palavras, não se faz a necessária distinção entre a atividade-fim e a atividade-meio. No passado, antes da pacificação da matéria pela jurisprudência, era comum o fisco de São Paulo autuar as operadoras dos serviços de comunicação na modalidade de radiochamadas, ou pager de comunicação, em que o prestador de serviços vendia ou locava o aparelho receptor ao tomador de serviço, com a incumbência de efetuar, quando necessário, o conserto desses aparelhos. Ora, a manutenção ou o conserto do aparelho receptor são meras atividades-meio. São atividades auxiliares e acessórias, necessárias à prestação de serviço de telecomunicações na modalidade radiochamada. Evidente, pois, que no caso a competência tributária é privativa do Estado por força do disposto no inciso II do art. 155 da CF. A fronteira entre a tributação pelo ICMS e a tributação pelo IPI, também nem sempre é clara. Não basta afirmar que qualquer modificação de um bem móvel de qualquer natureza alterando as suas características ou a sua utilidade, ou, ainda, aperfeiçoando-o para o consumo final, caracteriza a operação de industrialização, pois atualmente o conceito de industrialização envolve produção de bem em grande escala. Exige-se a produção em série ou de forma padronizada pela transformação de matérias-primas. Se o bem ou produto que sofreu modificação e, portanto, enquadrável no conceito de industrialização previsto no parágrafo único do art. 46 do CTN não for objeto de atos de mercancia, não poderá ser considerado um produto industrializado para fins de incidência do IPI. É o que acontece com cartões de visita, com os softwares específicos de uso de determinadas empresas, que diferem de CDs virgens vendidos em prateleiras. Para distinguir os fatos geradores do ISS dos fatos geradores do ICMS e do IPI a doutrina costuma invocar a natureza específica das obrigações que ensejam a tributação por este ou aquele imposto. Já escrevemos sobre a matéria diferenciando as obrigações de fazer e a de dar para a caracterização do fato gerador de um e de outro imposto, nos seguintes termos: a) O ISS só pode incidir sobre prestação de serviço, assim entendida o produto de esforço humano que se apresenta sob forma de bem imaterial, ou, no caso de implicar utilização de material preserve a sua natureza no sentido de expressar uma obrigação de fazer, isto é, ter como objeto da prestação, a própria atividade; b) O ICMS incide sobre circulação de bens corpóreos ou incorpóreos, mas que expressa uma obrigação de dar, cujo objeto da prestação é uma coisa ou direito, algo já existente; c) O IPI, apesar de a industrialização envolver um “fazer,” só pode ter por fundamento uma obrigação de dar, porque, por expressa definição, é um imposto que incide sobre venda, importação ou arrematação de produto industrializado.2
No âmbito do fato gerador confrontante, a maioria dos conflitos ocorre entre o ISS e ICMS e ISS e IPI. Por isso, é oportuno deixar expressa a ideia de que o ISS é imposto de natureza mercantil que incide sobre circulação de bem imaterial, definida na lista de serviços anexa à Lei Complementar 116/2003, promovida pela pessoa física ou jurídica, sob regime de autonomia, expressando sempre uma obrigação de fazer como atividade principal. Como o fato gerador do ISS pressupõe efetiva fruição, pelo tomador do serviço prestado, envolve a obrigação de dar, como atividade secundária. Exemplo: um jurista cumprindo o contrato de prestação de serviço jurídico para emissão de parecer em determinado caso concreto, se ele terminar a redação do parecer, subscrevê-lo mantendo-o sobre a sua mesa de trabalho, embora concluído o serviço, isto é, tenha verificado o resultado do serviço, o fato gerador não terá ocorrido. Somente com a entrega do parecer ao tomador é que ocorrerá o respectivo fato gerador do ISS, porque só com a fruição do serviço contratado é que irá surtir o efeito do trabalho executado. No entanto, doutrina e jurisprudência têm confundido, com relativa frequência, o resultado do serviço executado, com o efeito do serviço prestado. Por isso, o STJ determina a tributação pelo ISS do serviço exportado para o exterior sempre que o resultado verificar-se no território brasileiro. Ora, para caracterizar exportação de serviço, o prestador há de estar localizado em nosso território, onde ele executa o serviço contratado, pois, se for executado lá fora, de exportação não se tratará, mas de prestação de serviço no exterior, sujeitando-se às normas de tributação do país onde o serviço foi prestado. As maiores dúvidas e perplexidades ocorrem com as chamadas industrializações por encomenda. Diante da importância e relevância do tema, abordaremos essa questão nos itens subsequentes.
7.2
REGIME JURÍDICO-TRIBUTÁRIO DO PRODUTO INDUSTRIALIZADO POR ENCOMENDA
Examinaremos neste tópico duas das questões controvertidas: o regime jurídico de tributação das embalagens personalizadas e o dos elevadores personalizados.
7.2.1
Embalagens personalizadas
Essa questão estava já pacificada na jurisprudência dos nossos tribunais firmando a tese da tributação pelo ISS até que sobreveio a ação direta de inconstitucionalidade adiante mencionada (ADI 4389), proposta por fabricantes de embalagens, provocando uma reviravolta na jurisprudência. De fato, em torno da composição de serviços gráficos personalizados para impressão de cartões
de visita, de calendários e outros materiais individualizados, a jurisprudência de nossos tribunais caminhou em direção à tributação apenas pelo ISS, causando reflexos em outros tipos de industrialização por encomenda. Isso porque a confecção desses materiais envolve execução de trabalho gráfico previsto no item 13.05 da lista anexa à Lei Complementar 116/2003: 13.05 – Composição gráfica, inclusive confecção de impressos gráficos, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia e fotolitografia, exceto se destinados a posterior operação de comercialização ou industrialização, ainda que incorporados, de qualquer forma, a outra mercadoria que deva ser objeto de posterior circulação, tais como bulas, rótulos, etiquetas, caixas, cartuchos, embalagens e manuais técnicos e de instrução, quando ficarão sujeitos ao ICMS. (Redação dada pela Lei Complementar n.º 157, de 2016.) Nem a Constituição nem a lei definem o que sejam serviços de composição gráfica previstos no item 13.05 da lista de serviços. As palavras “mercadoria” e “serviço” também não encontram definição constitucional ou legal, porque não é função do legislador formular definições, tarefa da doutrina e da jurisprudência. Conforme assinalamos no nosso livro, o que é tributado por esse item 13.05, que consta da lista de serviços tributáveis, não é a impressão de livros, jornais, revistas ou periódicos, ou de quaisquer outros textos ou desenhos, mas tão somente aqueles serviços ligados à composição de textos e a processos utilizados para sua impressão. Composição gráfica envolve atividade consistente na escolha adequada de tipos gráficos; na disposição de letras e linhas; na separação de períodos ou frases; nas pontuações etc. Pode ser executada manual ou mecanicamente. 3 Outrossim, se a prestação de serviço de composição gráfica corresponder à mera atividademeio para alcançar um fim, ou seja, a confecção de um produto industrializado, aquela prestação não poderá ser tributada pelo ISS. No caso, o valor da mão de obra integrará o custo do produto industrializado, que é tributado pelo ICMS e IPI. Isso acontece, por exemplo, na composição gráfica para produção de embalagem comum, destinada à venda no atacado e no varejo. São as sacolas de papel, de plástico, fornecidas gratuitamente em supermercados para transportar as compras; sacas para acondicionamento de produtos primários; caixas de papelão para mudanças; caixas de isopor etc. O mesmo acontece com a produção de papéis multicoloridos para embrulhar presentes e guardanapos utilizados em bares e restaurantes. Todas essas embalagens ou bens são produzidos em escala industrial , ou seja, em massa, e de forma padronizada, porque usados pelos consumidores em geral que os adquirem nas lojas e supermercados ou estabelecimentos de outra natureza. Contudo, o serviço de composição gráfica personalizada, que é executado sob encomenda, resulta em uma embalagem que se apresenta como única do gênero, configurando uma atividade-fim. Nesse caso, estamos diante da contratação de um serviço (obrigação de fazer), e não de contratação
de uma compra e venda (obrigação de dar). O estabelecimento produtor executa as embalagens de conformidade com as especificações do encomendante e na exata quantidade solicitada. Para que assim ocorra é preciso que o estabelecimento produtor proceda a uma composição gráfica específica, peculiar, ímpar, que a torna imprestável para produção de embalagens comuns e em massa. Não se produz para o mercado em geral, mas apenas e tão somente para o encomendante, mesmo porque não há mercado para a embalagem personalizada. Para o fabricante, a embalagem personalizada não passa de um bem, de uma utilidade entregue ao encomendante em cumprimento de uma obrigação de fazer. O preço cobrado pelo fabricante refere-se à prestação de serviço de composição gráfica específica. E nesse preço encontra-se embutido o valor da matéria-prima empregada, bem como o valor dos insumos utilizados na fabricação. O Supremo Tribunal Federal já havia pacificado a sua jurisprudência nesse sentido, conforme ementa a seguir: Serviços de composição gráfica (feitura e impressão de notas fiscais, fichas, talões, cartões etc.). – Erro do contribuinte ao declarar-se devedor de imposto não devido, ou a presunção de que se estaria enriquecendo ilicitamente em face de terceiro que não a fazenda pública, não dá a esta o direito de exigir tributo a que não faz jus. Qualificação jurídica de fatos certos. – Os serviços acima referidos não estão sujeitos ao ICM, mas, apenas, ao ISS. Precedentes de ambas as turmas do STF. Recurso extraordinário conhecido e provido (RE 92.927, Rel. Min. Moreira Alves, republ. DJ 13.11.1980). No mesmo sentido os Recursos Extraordinários 92.927, 95.954, 101.346, 102.482, 102.608 e 102.948. No STJ existe a Súmula 156 com o seguinte teor: A prestação de serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita, apenas, ao ISS. No âmbito do TJSP decidiu-se, também, pela incidência apenas do ISS na produção de embalagem de papelão personalizada, conforme a seguinte ementa: Execução fiscal. ICMS. Serviços de composição gráfica sob encomenda. Confecção de embalagens de papelão personalizadas, sob encomenda de clientes determinados. Atividade sujeita ao ISS, e não ao ICMS. Irrelevância de as embalagens incorporarem-se a
produtos que, por sua vez, serão comercializados. Recurso oficial e voluntário da Fazenda Pública improvidos” (Ap. Civ. 934.013.5/3, Rel. Des. Aroldo Viotti, j. 10.08.2009). Todavia, com a propositura da ADI 4389 pela Associação Brasileira de Embalagem, houve novo entendimento ou flexibilização do entendimento anterior. Interessante notar que a inicial da ação direta de inconstitucionalidade não pede expressamente a sujeição ao ICMS na produção de embalagem personalizada por encomenda, como era de esperar, mas genericamente que julgue, […] conforme os arts. 155, II, e 156, II, da CF, a interpretação do conjunto normativo composto pelo art. 1.º, caput , e § 2.º, da LC n.º 116/03, c.c. o subitem 13.05 da lista a ela anexa, que conclua pela incidência exclusiva do ICMS sobre a fabricação e circulação de embalagens. Parece-nos óbvio que a produção e a circulação de embalagem comum sujeitam-se apenas ao ICMS, porque ela é objeto de venda no mercado atacadista ou varejista. Outra coisa bem diversa é a embalagem personalizada, que serve apenas para o uso do encomendante, circunstância omitida na inicial da ação direta de inconstitucionalidade. Atualmente, a maioria dos supermercados está vendendo, ainda que de forma facultativa, as embalagens personalizadas aos consumidores finais, o que encerra, na prática, a discussão quanto ao imposto incidente: ICMS ou ISS. Na mesma linha veio dispor o item 13.05 da Lista de Serviços com a nova redação conferida pela LC 157/2016. Examinando o pedido inaugural, o STF deferiu a medida cautelar, por unanimidade, fixando o entendimento de que incide apenas o ICMS na “industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria”, de conformidade com a ementa a seguir: Constitucional. Tributário. Conflito entre imposto sobre serviços de qualquer natureza e imposto sobre operação de circulação de mercadorias e de serviços de comunicação e de transporte intermunicipal e interestadual. Produção de embalagens sob encomenda para posterior industrialização (serviços gráficos). Ação direta de inconstitucionalidade ajuizada para dar interpretação conforme o art. 1.º, caput e § 2.º, da Lei Complementar 116/2003 e o subitem 13.05 da lista de serviços anexa. Fixação da Incidência do ICMS e não do ISS. Medida cautelar deferida. Até o julgamento final e com eficácia apenas para o futuro (ex nunc), concede-se medida cautelar para interpretar o art. 1.º, caput e § 2.º, da Lei Complementar 116/2003 e o subitem 13.05 da lista de serviços anexa, para reconhecer que o ISS não incide sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização
ou de circulação de mercadoria. Presentes os requisitos constitucionais e legais, incidirá o ICMS (ADI 4389, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 098, public. 25.05.2011). O certo é que a embalagem personalizada não configura, por si só, uma mercadoria, porque ela não é objeto de venda, mas serve simplesmente para embalar o produto vendido. Logo, para gerar crédito do ICMS decorrente do princípio da não cumulatividade aquela embalagem deverá ser considerada insumo. O que é insumo? Pode-se dizer que é um bem ou serviço utilizado na produção de outro bem ou serviço. Esse bem pode tanto ser consumido no processo de industrialização como se integrar ao novo produto. Daí a dificuldade de considerar a embalagem personalizada insumo, pois ela não integra a produção de mercadorias que as embala, muito menos é consumida no processo de industrialização. Seria então um insumo no processo de circulação de mercadoria? O conceito de insumo sempre esteve ligado à atividade produtiva (industrial ou agrícola). No entanto, como bem observado pelo Ministro Joaquim Barbosa, relator da ADI 4389, […] a evolução social, técnica e científica tende a tornar obsoletos conceitos há muito tidos como absolutos, […] o que provoca um verdadeiro desafio ao legislador e ao Judiciário, na medida em que exigem novos paradigmas para calibrar a carga tributária de acordo com a expressão econômica das atividades, sem serem dissipadas ou exasperadas por puros formalismos. Assim, não deve nos espantar cogitar-se de insumos no processo de circulação de mercadorias. Se a embalagem for necessária para fazer circular uma mercadoria, ela será um insumo. Não se pode colocar no mercado, por exemplo, um sabão em pó sem a respectiva embalagem, nem comercializar remédios sem embalagens até mesmo para efeito de segurança do produto e exigência da Anvisa. Nessas hipóteses, não importa se a embalagem ostenta ou não a marca da empresa encomendante. O importante é que essa embalagem integra o processo de circulação de mercadoria. O encomendante, no caso, celebrou com o estabelecimento produtor um contrato que tem por objetivo a obrigação de dar, e não um contrato que tem por escopo a obrigação de fazer (serviço gráfico personalizado). Tanto assim é que a quantidade de embalagens, nesse caso, será sempre considerável, havendo uma verdadeira produção em escala industrial. Só que essa tese não pode, a nosso ver, ser generalizada para excluir sempre a incidência do ISS, da mesma forma que a composição gráfica personalizada não pode ser generalizada para excluir a incidência do ICMS/IPI em todas as situações. Na produção de embalagens personalizadas para embalar produtos vendidos por supermercados, por exemplo, sacolas, não há que falar em insumo no processo de circulação de mercadorias. Essas
embalagens não são mercadorias, porque não destinadas à venda e, também, não são insumos, porque os produtos vendidos podem prescindir dessas embalagens. Elas não têm um preço ao consumidor, tanto é que o preço de produto adquirido no supermercado é rigorosamente igual, com ou sem fornecimento de embalagem. Aliás, até recentemente, em São Paulo, muitos dos supermercados não mais estavam fornecendo as embalagens personalizadas. Cada interessado era obrigado a providenciar os meios mais cômodos de transportar as mercadorias adquiridas. Contudo, a maioria dos supermercados, para fugir da tributação do ISS, está cobrando um valor simbólico pelo fornecimento das embalagens personalizadas, com o intuito de caracterizar venda de mercadorias. É importante a distinção entre a utilização do produto industrializado para uso próprio (calendários, folhinhas, cartões de visita etc.) e o produto industrializado para embalar produtos que não podem ser comercializados sem embalagem. Nesse último caso, o consumidor final não é o encomendante, mas o adquirente do produto embalado. Como se vê, as construções teórico-doutrinárias e jurisprudenciais, para se fixarem na tese da incidência exclusiva do ICMS na produção de embalagens personalizadas por encomenda, não devem ser aplicadas indistintamente, devendo ser analisadas em cada caso concreto. Esse parece ser o entendimento consagrado pela Corte Suprema em sede de medida cautelar, por decisão unânime do Plenário. A superveniência da LC 157/2016 que alterou a redação do item 13.05 da Lista de Serviços anexa à LC 116/2003 deixa clara a incidência do ICMS sobre o fornecimento de embalagens personalizadas. É oportuno esclarecer que os debates sobre o assunto hão de centrar sobre “serviço de composição gráfica” versus “serviço de composição gráfica personalizada”, e não sobre “embalagem comum” e “embalagem personalizada”. A embalagem em si, personalizada ou não, é um bem material, portanto não pode ser serviço, mas isso nada tem a ver com a discussão sobre a definição do imposto incidente ante os fatos geradores confrontantes. Outrossim, o uso que o encomendante fará da embalagem personalizada, acondicionando seus produtos (mercadorias) destinados ao consumidor, nenhuma relevância jurídica tem na definição do imposto a ser pago pelo produtor da embalagem feita por encomenda. No caso, esse produtor prestou serviço de composição gráfica personalizada, indispensável à produção de embalagem que se mostra como única no gênero. O custo da embalagem, assim como os demais, inclusive a margem de lucro, integrarão a base de cálculo do ICMS. Nada impede, também, de o encomendante dar destinação isolada às embalagens personalizadas promovendo suas vendas para outros fins, desde que haja mercado. Esclareça-se, por oportuno, que, se a empresa que promove a venda de produtos no mercado tiver um setor industrial para fabricar as suas embalagens personalizadas não haverá incidência do ISS, porque o que é tributado pelo ISS é a prestação de serviço remunerado, dado o seu caráter
mercantil. Somente o estabelecimento industrial que fornece embalagens personalizadas por encomenda de terceiro presta serviços de composição gráfica específica que se constitui em atividade-fim, e como tal sujeita-se ao pagamento apenas do ISS.
7.2.2
Elevadores personalizados
Para saber se os elevadores fabricados sob encomenda se sujeitam à incidência do ICMS ou à incidência do ISS é preciso examinar as particularidades de cada caso concreto, à luz da ordem urídica global. A Constituição Federal, com o objetivo de evitar tais conflitos, optou pela outorga rígida de competências tributárias, de forma que as bases econômicas sobre as quais recaem os impostos fossem atribuídas de modo privativo a cada ente político. No tocante ao imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e comunicação (ICMS) e ao imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS), a Constituição Federal fez que fossem excludentes um do outro. O fato gerador da obrigação tributária ou enseja a incidência do ICMS ou a do ISS, restando proibida a incidência simultânea dos dois impostos. Dispõem os arts. 155 e 156 da CF: Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: […] II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações se iniciem no exterior. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: […] III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) Logo, as operações relativas à circulação de mercadorias e de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação foram expressamente destinadas à competência impositiva dos Estados, a título de ICMS. Assim sendo, a prestação de serviços ficou com a sua competência dividida entre os Estados (transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação) e os Municípios (demais serviços, listados em lei complementar).
A Constituição Federal cuidou, ainda, das chamadas operações mistas, dispondo sobre a incidência do ICMS sobre o valor total da operação, quando as mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios: Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito federal instituir imposto sobre: […] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] IX – incidirá também: […] b) sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios. Portanto, remeteu a regulamentação da matéria às leis complementares, dada a reserva constante do seu art. 146, I e III, conforme segue: Art. 146. Cabe à lei complementar: I – dispor sobre conflitos de competência, matéria tributária, entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; […] III – estabelecer normais gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; […] Nesse diapasão, a Lei Complementar 87/96, em seu art. 2.º, IV, dispõe que o ICMS incide sobre o fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios: Art. 2.º O imposto incide sobre: […] IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios.
A Lei Complementar 116/2003, que dispõe a respeito do imposto sobre serviços de qualquer natureza, por sua vez, estabeleceu em seu art. 1.º como fato gerador a prestação de serviços constantes da sua lista anexa , e no § 2.º dispõe que, “ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias”. Esse dispositivo legal guarda perfeita harmonia com o disposto no já transcrito art. 155, § 2.º, IX, “b”, da CF. E essa Lei Complementar de 116/2003, ao dispor em seu art. 7.º sobre a base de cálculo do ISS, disciplinou expressamente o que pode ser objeto de tributação pelo ISS excluindo-se da sua base de cálculo o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços , nos seguintes termos: Art. 7.º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. […] § 2.º Não se incluem na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza: I – o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar. […] Obediente à lei complementar, de aplicação nacional, o Decreto 45.490/2000 (Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo), em seu art. 37, § 1.º, “5”, também, ao dispor sobre a base de cálculo do ICMS, determinou que deve compor a base de cálculo do imposto a importância cobrada a título de montagem e instalação com máquina, aparelho, equipamento e outro produto de qualquer natureza. Artigo 37. Ressalvados os casos expressamente previstos, a base de cálculo do imposto nas hipóteses do artigo 2.º é (Lei 6.374/89, art. 24, na redação da Lei 10.619/2000, art. 1.º, XIII): […] § 1.º Incluem-se na base de cálculo: […] 5 – a importância cobrada a título de montagem e instalação, nas operações com máquina, aparelho, equipamento, conjunto industrial e outro produto, de qualquer natureza, quando o estabelecimento remetente ou outro do mesmo titular tenha assumido contratualmente a obrigação de entregá-lo montado para uso, observado o disposto no artigo 126.4 Note-se que existe um conjunto normativo disciplinando a competência para a tributação das operações de circulação de mercadorias, das prestações de serviços e das operações mistas, que não
se confundem com a tributação mista . Como visto, nas operações mistas, de regra, ou o imposto é devido ao Município (ISS), ou ele é devido ao Estado (ICMS). Entretanto, a Lei Complementar 116/2003 em alguns casos de operações mistas adotou, excepcionalmente, o regime de tributação mista, isto é, cobrança pelas duas entidades políticas, como mais adiante se verá. Adentrando no exame do tema deste subitem, para saber qual o regime jurídico-tributário a ser aplicado na venda de elevadores personalizados, fabricados sob encomenda do adquirente, é preciso fazer uma análise detida da legislação e das normas ligadas diretamente com a atividade econômica do fabricante dos elevadores, bem como, e especialmente, a análise do contrato firmado entre o fabricante dos elevadores e o encomendante. Tivemos a oportunidade de examinar um caso concreto em que a empresa fabricante havia firmado um contrato de compra e venda de elevadores fabricados sob encomenda do comprador (incorporador imobiliário), especificando o modelo a ser adquirido, bem como contendo as condições de sua instalação. Enfim, o contrato consignava a obrigatoriedade da entrega dos produtos prontos para uso com a respectiva garantia, constando expressamente a obrigação de executar os serviços de instalação desses elevadores em determinado prédio em construção. Para tanto, o encomendante havia fornecido as plantas relacionadas à construção civil, de modo a conhecer as características básicas do edifício e a identificar o tipo adequado de elevador que tenha as características compatíveis com a edificação e as necessidades de uso. No caso, os elevadores comercializados e instalados pela fabricante foram produzidos de acordo com as especificações do dono da obra, mas as suas instalações e preparações para uso não podem ser confundidas com uma etapa da obra desenvolvida pela construtora, o que envolveria uma prestação de serviço específico de um empreiteiro. A instalação e montagem desses elevadores a cargo da fabricante constituem mera atividade secundária da fabricante e têm relevância jurídica apenas para a composição da base de cálculo do imposto estadual. A instalação dos elevadores configuraria uma etapa na execução da obra de construção se, depois de entregues pela fabricante, o incorporador contratasse uma empresa especializada na instalação de elevadores nos prédios em construção. Tanto é assim que a Lei Complementar 116/2003 cuidou de separar o que pode ser, ou não, objeto de tributação pelo ISS (art. 1.º, § 2.º c.c o art. 7.º, § 2.º, I). Com o mesmo propósito, de forma a coadunar com a inteligência do mencionado dispositivo de aplicação nacional, sem invadir a competência dos Municípios, o Estado de São Paulo, mediante a edição do Decreto 45.490/2000 (RICMS), também cuidou expressamente de definir o que o pode ser, ou não, objeto de incidência do imposto estadual, separando qual tipo de serviço será de competência municipal (art. 37, § 1.º, “5”).
No caso que estamos considerando, a aquisição de elevadores sob encomenda do incorporador representa uma simples operação de compra e venda de mercadoria com prestação de serviço não especificado na lista de serviços anexa à Lei Complementar 116/2003. À medida que é o fabricanteinstalador quem fornece os elevadores, não teria aplicação o item 14.06 da lista nacional de serviços que assim prescreve: Instalação e montagem de aparelhos, máquinas e equipamentos, inclusive montagem industrial, prestados ao usuário final, exclusivamente com material por ele fornecido. Essa operação de fornecimento de elevador personalizado, com prestação de serviço não especificado na lista, sujeita-se única e exclusivamente ao ICMS, ao teor do art. 155, § 2.º, IX, “b”, da CF, do art. 2.º, IV da LC 87/96, do art. 7.º, § 2.º, da LC 116/2003 e do art. 37, § 1.º, item 5, do Decreto 45.490/2000. O valor da mão de obra é incluído na base de cálculo do ICMS. A Lei Complementar, quando prescreve a dupla tributação nas operações mistas, o faz de forma expressa e às claras, separando a matéria tributária de uma entidade política e a de outra entidade política. São os casos, por exemplo, dos serviços previstos nos itens 7.02, 7.05, 14.01, 14.03 etc. Dispõem referidos itens: 7.02 – Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos ( exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS) . 7.05 – Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). 14.01 – Lubrificação, limpeza, lustração, revisão, carga e recarga, conserto, restauração, blindagem, manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores, elevadores ou de qualquer objeto (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao ICMS). 14.03 – Recondicionamento de motores (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao ICMS). Em todas as demais hipóteses em que não há expressa ressalva, os serviços especificados na lista ficam na competência impositiva municipal, ainda que envolvendo fornecimento de
mercadorias, isto é, o valor do material integra o preço do serviço prestado. Imperioso concluir que a aquisição dos elevadores personalizados pelo incorporador imobiliário, com as respectivas instalações pela própria fabricante no edifício em construção, configura típica operação de circulação de mercadorias, que envolve a realização de serviços não especificados na competência impositiva municipal (inciso IV do art. 2.º da Lei Complementar 87/96). Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça conforme ementa a seguir: Tributário. ICMS. ISS. Venda e instalação de aparelhos de refrigeração. CTN, art. 123. Dec.-lei 406/68 (arts. 2.º, I, e 8.º. Lista de serviços (item 48). Dec.-lei 834/69. 1. A venda de produto fabricado por outra empresa industrial, seguida de montagem ou instalação pela vendedora (a mesma que monta, vende e instala), sem o fornecimento de material diverso, comprovadamente contínuas ou simultâneas, certo que o adquirente usuário não forneceu material algum (“exclusivamente” – item 48 – lista de serviços – Dec.-lei 834/69), evidenciada a preponderância daquela atividade econômica (venda), constitui fato imponível sujeito a incidência do ICMS e não do ISS. 2. Recurso provido (REsp 6219/MG, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 23.05.1994). No mesmo sentido, oportuna a transcrição da decisão do Superior Tribunal de Justiça no REsp 208.589/MG, de relatoria do Ministro Demócrito Reinaldo, in verbis: Cuida-se, na hipótese, de embargos à execução opostos por empresa ao Executivo Fiscal que lhe promoveu a Fazenda Estadual, objetivando a cobrança de ICM devido sobre a parcela referente à instalação de vidros vendidos pela embargante (prestação de serviços). O acórdão recorrido decidiu que, “Não obstante seja forçoso reconhecer a conflitância da matéria em voga, dado à tênue linha divisória entre o campo de incidência do imposto estadual e o municipal, restou em que o critério recomendado deva ser a predominância da atividade exercida pelo contribuinte, o que, na espécie, por induvidoso, assoma como sendo o serviço de instalação e não a venda de mercadorias”. Contra este decisório se insurge a Fazenda Estadual, na via do recurso especial. Alega, em seu prol, que o fornecimento de mercadorias com prestação de serviço, não especificados na lista, fica sujeito ao fato imponível sujeito à incidência do ICMS e não do ISS. Parece-me, com a razão, a recorrente. Com efeito, devo esclarecer, desde logo, que a empresa recorrida tem, como ramo de negócios, a venda de vidros em geral e, comumente, sua colocação, além de outros serviços, tais como: retirar, aparelhar, rebaixar portas, blindex e vitrines, regulagem,
remoção e recolocação de vidros e matérias correlatos. Consoante se observa da própria afirmação recorrida, o seu negócio essencial é a venda de mercadorias (vidros em geral), sendo esta a sua atividade econômica predominante, prestando como consequência, os serviços de colocação, acepilhamento e montagem dos vidros, atividade, induvidosamente, secundária. De conseguinte, na interpretação do art. 8.º e seus parágrafos do Dec.-lei 406/68, deve-se atender o escólio do STF, ao assentar: “Ao redigir o § 1.º do art. 8.º do Dec.-lei 406/68 teve o seu autor, o capricho de salientar que é tributável pelo ISS o serviço que, incluído na lista, seja prestado com o fornecimento de mercadorias, e que, ao redigir o § 2.º do mesmo artigo, ele teve o cuidado visível de tributar pelo ICM o fornecimento de mercadorias com a prestação de serviços não especificados na lista (o § 2.º foi de novo redigido pelo Dec.-lei 834/69). A comparação dessas duas normas permite se vislumbre que o legislador fixou, pra o assunto, o critério da utilidade preponderante: no § 1.º, o serviço prepondera sobre a mercadoria e incide o ISS, no § 2.º, a mercadoria prepondera sobre o serviço e incide o ICM”. A Suprema Corte, no julgamento do RE 96.660-9, enfatizou que se incluem na referida lista anexa ao Dec.-lei 406/68 apenas aqueles serviços que aderem, de forma profunda e permanente, ao prédio onde são instalados, de forma que a venda de boxes e divisórias estão excluídas da aludida lista dos serviços que padecem da incidência do ISSQN. In casu, é de se aplicar, na espécie, o art. 8.º, § 2.º, do Dec.-lei 406/68, uma vez que há fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista, sendo o caso de incidência do ICM. Com efeito, o fato de não terem sido as mercadorias produzidas no mesmo local de trabalho e não tendo elas a aderência permanente ao imóvel onde são instalados, sujeitam-se à incidência do ICMS. É que o item 19 da referida listagem anexa ao Dec.-lei 406/68, ao referir-se aos serviços auxiliares ou complementares, os vincula à construção civil, ou seja, à obra construída, com aderência permanente à entidade principal, o que não ocorre com os boxes e as divisórias. A venda de mercadorias produzidas pela apelante com obrigação de entregá-las aos compradores, no local onde são instaladas, constitui operação sujeito ao ICM. De fato, a recorrida produz a mercadoria (vidros em geral) em seu próprio estabelecimento. Vende-as aos interessados. Transporta-as ao local indicado e, ali, realiza a prestação de serviço: colocação de vidros, boxes, divisórias etc. É, pois, evidente, que a atividade principal, aí, é a venda de mercadorias, atividade econômica prevalecente. A colocação dos vidros constitui mera complementação. É atividade secundária. Esta não se pode sobrepor àquela. O fornecimento de mercadorias é feito com prestação de serviços, de forma a incidir, no caso, o § 2.º do art. 8.º do Dec.-lei 406/68. Demais disso, a colocação de vidros, com a formação de boxes ou divisórias, não está
contemplada na listagem anexa ao Dec.-lei 406/68. Não se trata, pois, de prestação de serviço autônomo, constitutiva da incidência do ISS. A autonomia ou preponderância dessa atividade exigiria que a empresa fosse, apenas, uma prestadora de serviços de colocação de vidros, com a formação de boxes ou divisórias, todavia, utilizando mercadorias (vidros) fornecidas por terceiro. No caso, ao contrário, a atividade-fim é a venda de mercadorias (vidros) e a sua colocação constitui a atividade-meio. O imposto devido é o ICMS ( DJ 30.08.1999). Nota-se que, apesar de o Decreto-lei 406/68 ter sido parcialmente revogado pela Lei Complementar 116/2003, o comando constante do § 2.º do art. 1.º dessa Lei Complementar 116/2003 representa exatamente o conteúdo do antigo § 1.º do art. 8.º do mencionado Decreto-lei 406/68. Observe-se que a lista anexa à Lei Complementar 116/2003, da mesma forma, dispõe em determinados itens o mesmo conteúdo preconizado pelo Decreto-lei 406/68, determinando expressamente exclusão da base de cálculo do ISS das mercadorias fornecidas com a prestação de serviços. Logo, a revogação dos dispositivos mencionados pela Lei Complementar 116/2003 em nada alterou a interpretação que deve ser feita pelo Judiciário, com o objetivo de separar o que está sujeito à incidência do imposto estadual (ICMS) e o que está sujeito à incidência do imposto municipal (ISS). Ademais, verifica-se, na prática, que uma empresa fabricante, quando opta por recolher ISS pela instalação e montagem do produto por ela fabricado, acaba sendo autuada pelo fisco estadual em razão do não recolhimento do ICMS, conforme jurisprudência pacífica do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo. Vejamos: Prestação de serviços de instalação, montagem e outros decorrente de um mesmo contrato de fornecimento de mercadorias, sujeita-se à incidência do ICMS e não do ISS, por ser a venda a atividade preponderante (Processo DRT 06 4026134-7 2013,publicação 1.º.07.2014). ICMS. Falta de pagamento do imposto pela não inclusão do valor cobrado a título de instalação e montagem em sua base de cálculo (Processo DRT 14 677718 2011, j. 05.12.2013). ICMS. Falta de pagamento do ICMS referente a operações tributadas como se fossem tributadas pelo ISS. Violação ao artigo 37, § 1.º, item 5, do RICMS. O montante dos serviços de instalação e montagem, quando relativos a mercadorias produzidas pelo fornecedor fora do local da prestação de serviços, deve ser incluído na base de cálculo do
imposto. Recurso conhecido e improvido (Processo DRTC III 115014 2009, publicação 14.08.2010). Falta de pagamento do ICMS, no período de março de 2001 a dezembro de 2003, por escrituração de documentos fiscais modelo 1, referentes a operações tributadas, como não tributadas, lançadas a título de serviço e garantia complementar. A lista de serviços anexa à LC 57/87 e, a partir de 2003, à LC 116/03 é taxativa, não contemplando exceções. Não estando nelas descritos os chamados “serviços pós-venda”, da autuada, não se há falar em incidência do ISS. No caso destes autos os aparelhos, máquinas e equipamentos são vendidos (fornecidos, na linguagem da lei) pelo contribuinte autuado aos seus clientes, consumidores finais, não restando atendida a condição para o enquadramento do serviço prestado pelo contribuinte no item 21 (vetado) da antiga lista de serviços, nem nos itens 14.01 ou 14.02 da atual lista de serviços. É lícito concluir que no preço pago pelos consumidores finais pelas mercadorias já está incluído o direito à montagem e instalação, valor este que deve fazer parte da base de cálculo do ICMS (Processo DRTC-I 202126 2006, j. 23.05.2009). Esses acórdãos proferidos pelo Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), órgão colegiado de segunda instância administrativa do Estado de São Paulo, harmonizam-se com a melhor doutrina e urisprudência de nossos tribunais acerca da aplicação da legislação tributária competente (a do ICMS ou a do ISS) à luz do ordenamento jurídico global.
7.3
VALOR ADICIONADO DO ICMS
A Constituição Federal, além de contemplar os entes políticos com impostos privativos, previu o mecanismo de repartição de receitas tributárias e de participação no produto de arrecadação de impostos da União, como são os casos do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) formados por recursos provenientes de 49% do produto de arrecadação do imposto de renda e do imposto sobre produtos industrializados (art. 159, I, da CF). Entre os impostos de receitas partilhadas figura o ICMS em que, por expressa disposição do art. 158, IV, da CF, pertence aos Municípios 25% do produto de sua arrecadação. Como assinalamos no nosso livro, a participação no produto de impostos de receita partilhada significa que o […] imposto ao ser criado, já pertence a mais de uma pessoa política, nos exatos limites constitucionais fixados. Nunca pertence integralmente ao titular da competência impositiva
que institui, fiscaliza e arrecada o imposto, devendo devolver o quantum respectivo às entidades participantes, porque a elas pertence por expressa determinação constitucional. 5 Realmente prescreve o parágrafo único do art. 158 da CF: Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: I – três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II – até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal. A definição do que seja valor adicionado (VAF) está nos §§ 1.º e 2.º do art. 3.º da Lei Complementar 63/90, que deu cumprimento ao disposto no art. 161, I, da CF. Os três quartos, no mínimo, daqueles 25% do produto da arrecadação estão vinculados às disposições da Lei Complementar referida. Apenas em relação a até ¼ que o legislador estadual tem a faculdade de estabelecer critério próprio de participação dos municípios situados em seu território. Logo, o Município faz jus a 75% no mínimo do ICMS arrecadado, na proporção do valor adicionado nas operações e prestações realizadas em seu território, conforme prescrição da lei complementar, e até 25% de acordo com o dispuser a lei estadual. A Lei do Estado de São Paulo 3.201/81, com a redação dada pela Lei 8.510/93, está de conformidade com a LC 63/90, ao prescrever que os índices de participação dos Municípios sejam apurados 76% com base no valor adicionado em cada município, e 24% segundo critérios aí previstos. Entretanto, a Lei 9.332/95 introduziu alterações no critério retromencionado, extravasando os limites fixados na LC 63/90. Essa alteração procedida pela Lei 9.332/95 foi considerada inconstitucional pelo STF conforme ementa a seguir: Constitucional. Financeiro. Partilha do produto arrecadado com a incidência do imposto sobre circulação de mercadorias e serviços – ICMS. Fundo de participação dos municípios. Operações de geração de energia elétrica. Usina. Norma estadual que dispõe sobre o cálculo do valor agregado (Lei 9.332/1995, do Estado de São Paulo). Violação dos arts. 158, IV, e parágrafo único, I, e 161, I, da Constituição de 1988. Viola a reserva de lei complementar federal, prevista no art. 161, I, da Constituição, norma estadual que dispõe sobre o cálculo do valor agregado, para fins de partilha da arrecadação do ICMS, nos termos do art. 158, IV, e parágrafo único, I, da Carta Magna. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida e julgada procedente (ADI 1423, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 16.05.2007, DJe-032).
Entretanto, a grande discussão que se trava no âmbito da jurisprudência resume-se à questão de saber a qual município pertence o valor adicional do ICMS (VAF) previsto no art. 158, IV, parágrafo único, da Constituição. O Convênio 66/88, que regia essa matéria de forma transitória, de conformidade com o disposto no § 8.º do art. 34 do ADCT, não mais pode ser invocado como vêm fazendo alguns julgados dos tribunais, porque com o advento da Lei Complementar 63/90 desapareceu a situação de transitoriedade, passando a questão ser incluída sob reserva de lei complementar, nos exatos termos do art. 161, I, da CF. A maioria das disputas municipais circunscreve-se em torno do ICMS gerado nas operações com energia elétrica. O Convênio 66/88, aplicável até o advento da LC 63/90, continha dispositivos obscuros e ambíguos que permitiam interpretações literais insustentáveis de aceitação em face do ordenamento urídico global. Com base nesse convênio, vários julgados deferiram o VAF ao município do local onde estão fisicamente instaladas as usinas hidroelétricas, ou do município em cujo território estão localizadas as barragens, com total desconsideração do fato gerador do ICMS em seus diversos aspectos. Parece ter havido uma confusão entre geração de energia a ser comercializada com o fato gerador da obrigação tributária. O local da situação da usina e o local da represa, notadamente, são relevantes apenas para a destinação da compensação financeira referida no § 1.º do art. 20 da CF, batizada de royalties do petróleo, ao que tudo indica, por ser a exploração do petróleo a que maior expressão econômica apresenta entre as explorações de recursos naturais que ensejam o pagamento da compensação financeira (exploração de recursos hídricos, exploração de recursos minerais e exploração de petróleo, xisto betuminoso e gás natural). No pagamento da compensação financeira, que tem natureza indenizatória, é relevante identificar o município afetado pela exploração, notadamente pela invasão de seu território pelas águas represadas que trazem inúmeros problemas para o município. No entanto, no pagamento do VAF interessa apenas e tão somente analisar a questão à luz da teoria geral do fato gerador da obrigação tributária, para identificar os sujeitos ativo e passivo do imposto mediante a conjugação dos elementos material, subjetivo e espacial do fato gerador. O imposto é sempre devido no local da ocorrência do fato gerador. Por isso, é importante atentar para o domicílio fiscal do contribuinte que, segundo o art. 127 do CTN, é onde a pessoa natural tem sua residência habitual, e, tratando-se de pessoa jurídica, o lugar de sua sede. Logo, não interessa saber onde estão situadas as usinas geradoras de energia elétrica, nem onde se situam os reservatórios de água, mas apenas o local onde se acha estabelecido o contribuinte. Daí o equívoco dos julgados que se posicionam num e noutro sentido retrocitados.
Se a sede do contribuinte estiver no local das usinas hidroelétricas, será beneficiário do VAF o município em cujo território estiverem as instalações das usinas. Se o contribuinte se localizar no município onde estão os reservatórios de água, a este município caberá o valor adicionado do ICMS. Se o contribuinte do ICMS estiver localizado em seu terceiro município, onde não haja instalação das usinas, nem reservatórios de águas, a este terceiro município caberá o VAF. É que o VAF só pode existir se presente o ICMS. E este só vem ao mundo depois de surgida a obrigação tributária respectiva (art. 139 do CTN). E essa obrigação tributária só nasce com a ocorrência do fato gerador (art. 116 do CTN), isto é, subsunção do fato concreto à hipótese legal abstrata e genérica. Somente a conduta do agente (contribuinte) faz surgir a obrigação tributária, a exemplo do crime, cuja existência depende da conduta praticada pelo agente, não bastando a simples definição de crime na lei penal. Como a obrigação tributária é uma relação jurídica, ela não pode prescindir de seus elementos constitutivos, exatamente como acontece na obrigação de direito civil. Julgados que elegem o local da usina hidroelétrica, ou o local da represa como elemento identificador do município competente para receber o VAF, na verdade, reconhece a existência de relação jurídica entre o ente político tributante (Estado) e a usina ou represa que não são sujeitos de direito, mas meros objetos de direito. Ainda que a usina tenha transferido a energia elétrica gerada para o estabelecimento comercial do mesmo proprietário da usina, essa transferência não deflagra a ocorrência do fato gerador do ICMS, por ausência de circulação jurídica. É o que prescreve a Súmula 166 do STJ: Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte. A usina, por si só, nem estabelecimento em sentido jurídico é. Quem pratica o ato tipificado na lei tributária é a pessoa jurídica ou física, proprietária da usina hidroelétrica , regularmente inscrita no CNPJ e no Cadastro Estadual de Contribuintes. Só ela é capaz de concretizar o fato gerador mediante operação de venda da energia produzida. Somente ela pode integrar o elemento subjetivo assivo do fato gerador , na condição de contribuinte ou responsável tributário. Portanto, é suficiente localizar no espaço o estabelecimento que promove a operação relativa à circulação de mercadorias e serviços para saber onde ocorreu o fato gerador e, por conseguinte, definir o município beneficiário dos ¾ do VAF a que alude o inciso I do parágrafo único do art. 158 da CF. O local do estabelecimento vendedor de energia é eleito pelo contribuinte (dona da Usina) consoante a regra do art. 127 do CTN. E nada impede de o contribuinte eleger o seu domicílio tributário no município em que não situa, nem as instalações da Usina, nem as represas d’água. Não cabe ao fisco alterar esse endereço, a menos que o local eleito esteja dificultando ou
impossibilitando a fiscalização e arrecadação do tributo. É o que prescreve o § 2.º do art. 127 do CTN: Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal: I – quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, o centro habitual de sua atividade; II – quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento; III – quanto às pessoas jurídicas de direito público, qualquer de suas repartições no território da entidade tributante. § 1.º Quando não couber a aplicação das regras fixadas em qualquer dos incisos deste artigo, considerar-se-á como domicílio tributário do contribuinte ou responsável o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação. § 2.º A autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, aplicando-se então a regra do parágrafo anterior. Como se verifica do texto legal transcrito, os critérios previstos na lei só têm aplicação na hipótese de ausência do domicílio fiscal eleito pelo contribuinte. Uma vez eleito o domicílio pelo contribuinte, a autoridade administrativa fiscal competente só poderá recusá-lo ou alterá-lo nas hipóteses do § 2.º. Outrossim, não cabe ao aplicador da lei questionar o critério de justiça do legislador que deu essa flexibilidade ao contribuinte de promover a arrecadação do imposto neste ou naquele município. O aspecto espacial do fato gerador da obrigação tributária aponta onde ocorreu o fato gerador e, consequentemente, define o sujeito ativo dessa obrigação tributária por força o princípio da territorialidade, que só pode ser afastado nas hipóteses do art. 102 do CTN. Em outras palavras, a identificação do aspecto espacial do fato gerador conduz à fixação do aspecto subjetivo ativo do fato gerador sobre um dos 27 Estados componentes da Federação, no caso do ICMS. Em recente julgado, a Primeira Seção do STJ, em grau de embargos de divergência no recurso especial, e por maioria de votos, afastou as duas teses em conflito e adotou uma terceira: prevalência do local do consumo da energia elétrica. Para maior clareza transcreve-se a ementa do v. acórdão: Embargos de divergência em recurso especial. Dissídio configurado. ICMS. Repartição.
VAF. Regra constitucional. Critério. Energia elétrica. Elemento temporal e espacial da obrigação tributária. Consumo. Limites do processo. Eleição de terceira tese no julgamento de embargos de divergência. Precedentes. 1. Os arestos embargado e paradigmas decidiram que o Valor Adicionado Fiscal, para efeito de repartição da receita do ICMS, deve ser computado ao município onde se concretiza a hipótese de incidência tributária. Divergiram, todavia, quanto à definição dos elementos espacial e temporal da obrigação tributária do ICMS incidente sobre energia elétrica: (a) o aresto embargado adotou o critério da produção e, por isso, atribuiu o VAF ao Município de Ubarana, onde localizados os geradores da usina hidrelétrica; e (b) os paradigmas acolheram o critério da distribuição e, consequentemente, destinaram o VAF ao Município de Promissão, onde situada a subestação elevadora, a partir de onde é distribuída a energia elétrica produzida na municipalidade vizinha. Dissídio configurado. Embargos de divergência admitidos. 2. O critério eleito pelo art. 158, parágrafo único, inciso I, da CF/88 para definir a quem pertence o valor adicionado fiscal relativo a uma operação ou prestação sujeita, em tese, à incidência do ICMS é, unicamente, espacial, ou seja, local onde se concretiza o fato gerador do imposto. 3. Conforme posição doutrinária e jurisprudencial uniforme, o consumo é o elemento temporal da obrigação tributária do ICMS incidente sobre energia elétrica, sendo o aspecto espacial, por dedução lógica, o local onde consumida a energia. 4. A produção e a distribuição de energia elétrica, portanto, não configuram, isoladamente, fato gerador do ICMS, que somente se aperfeiçoa com o consumo da energia gerada e transmitida. 5. Como o critério de rateio do ICMS leva em conta o valor adicionado fiscal que ocorre no território de cada município e não há incidência tributária pela geração da energia ou por sua distribuição, consequentemente, não se justifica a participação do município produtor ou distribuidor na partilha do ICMS incidente sobre as operações com energia elétrica, que somente contemplará os municípios consumidores. 6. Conhecidos os embargos de divergência, incumbe ao órgão julgador aplicar o direito à espécie, mesmo que, para isso, seja necessária a adoção de uma terceira tese, diversa das que foram acolhidas nos arestos embargado e paradigma. Precedentes da Corte Especial e de todas as Seções do STJ. 7. Atualmente, só o Município de Promissão, onde situada a Subestação elevadora, tem direito de adicionar ao seu índice de participação as operações vinculadas à Usina de mesmo nome. A ação judicial objetiva compelir o Estado de São Paulo a computar essas operações, em sua totalidade, a favor do Município de Ubarana, onde se acham localizados
os geradores da Usina. 8. As conclusões adotadas conduzem à procedência, em parte, da pretensão autoral, devendo a Fazenda Pública ré acrescer ao índice de participação do Município autor as operações da Usina de Promissão proporcionalmente ao consumo de energia elétrica verificado em seu respectivo território. 9. Embargos de divergência acolhidos em parte para julgar procedente, também em parte, a pretensão do autor, ora embargado. (Embargos de Divergência em REsp 811.712, Rel. Min. Hamilton Cavalhido, relator para acórdão Min. Castro Meira, DJe 06.03.2013). Como se verifica, o v. acórdão afirmou corretamente que o critério eleito pela Constituição para definir a quem pertence o valor adicionado do ICMS é unicamente o espacial, isto é, o local onde se concretiza o fato gerador do imposto. Nem poderia ser de outra forma. Entretanto, prossegue o acórdão que o “consumo é o elemento temporal da obrigação tributária do ICMS” (Item 3), para fixar a tese de que o VAF deve ser deferido ao Município onde ocorrer o consumo da energia. E aqui reside o grande equívoco. O consumo nada tem a ver com o fato gerador do ICMS. Uma vez ocorrido o fato gerador por venda da mercadoria, por exemplo, o imposto é devido independentemente de ter havido o consumo de mercadoria, ou do local do consumo. Cinco são os elementos do fato gerador da obrigação tributária: (a) elemento material ou objetivo ou, ainda, nuclear (descrição legislativa da hipótese em que é devido o tributo); (b) elemento subjetivo (ativo = Fazenda Pública e passivo = contribuinte ou responsável); (c) elemento quantitativo (base de cálculo e alíquota); (d) elemento espacial (onde ocorre o fato gerador); e (e) elemento temporal (quando ocorre o fato gerador). Faltando um desses cinco elementos não existirá obrigação tributária que outra coisa não é senão uma relação jurídica que não se diferencia da obrigação do direito comum a não ser pelo seu objeto (exclusivamente tributo) e pela sua origem (exclusivamente com base na lei). O consumo, por não fazer parte integrante do fato gerador, é indiferente para o fim de deflagrar o nascimento da obrigação tributária. O local do consumo só é relevante nas operações interestaduais de petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica (art. 155, § 2.º, X, b, da CF), quando o ICMS será devido integralmente no Estado destinatário, onde se dá o consumo, hipótese em que caberá a esse Estado destinatário proceder à distribuição do VAF. Consoante decidiu o STF, a tributação no destino foi estabelecido para beneficiar o Estado consumidor, e não o consumidor final, razão da exceção constitucional expressa. Fora de dúvida, pois, que o consumo não representa o aspecto temporal do fato gerador. O elemento temporal do fato gerador da obrigação tributária é o momento definido na lei tributária competente, que precisa quando se tem por ocorrido o fato gerador, para definir a legislação
aplicável segundo o princípio tempus regit actum. Dessa forma, o aspecto temporal do imposto de importação, por exemplo, é a data do registro da importação na repartição aduaneira (art. 23, caput , do Decreto-lei 37/66), sendo que o aspecto material do fato gerador desse imposto é a entrada de produtos estrangeiros no território nacional, conforme prescreve o art. 19 do CTN. Esse aspecto temporal é de suma importância para definir a legislação aplicável a cada caso concreto, pois a alíquota desse imposto pode variar de um dia para outro por força da delegação contida no § 1.º do art. 153 da CF. O elemento espacial do fato gerador diz respeito ao local da ocorrência do fato gerador. Tem conexão direta com o elemento subjetivo ativo do fato gerador, à medida que define o ente político competente para tributar o ICMS dentre os 27 Estados que compõem a Federação. Enquanto não se fizer um estudo sistemático dos cinco aspectos que compõem o fato gerador da obrigação tributária, geralmente estudado apenas pelo seu aspecto material ou objetivo, as imprecisões doutrinárias e jurisprudenciais continuarão. Diríamos, sem exagero, que o estudo do Direito Tributário resume-se praticamente ao estudo aprofundado da teoria geral do fato gerador da obrigação tributária. E isso requer, também, o conhecimento acerca do domicílio do contribuinte, matéria regulada pelo CTN. Transcrevamos as ementas de acórdãos do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que adotam a tese da ocorrência do fato gerador do ICMS no local em que é realizada a operação de venda de energia elétrica: ICMS. Energia elétrica. Município que mantém em seu território a geração de energia elétrica. Pretensão à participação na partilha do ICMS. Inadmissibilidade. Administração, saída e venda de energia elétrica em outro município. Fato gerador configurado em território deste último. Sentença de improcedência mantida. Reexame e recurso desprovidos. Se a energia elétrica, embora produzida em um município, tem a sua venda e saída realizada em outro, onde está a administração da usina elétrica, somente este último tem direito ao ICMS, em razão do ato de mercancia constituir-se no fato gerador do imposto (Ap. Civ. 47.419-5/4/SP, Rel. Des. Luis Ganzerla, j. 28.03.2000). ICMS. Álcool carburante. Município que mantém em seu território estabelecimentos de produção de álcool carburante. Pretensão à participação na partilha do ICMS. Inadmissibilidade. Distribuição do álcool carburante em outros municípios. Fato gerador configurado em territórios destes últimos. Sentença de improcedência mantida. Reexame e recurso desprovidos. Se o álcool carburante, embora produzido em um município, tem a sua distribuição realizada em outros, somente estes últimos têm direito ao ICMS, em razão do ato de mercancia constituir-se no fato gerador do imposto (Ap. Civ. 57.264-5/4/SP, Rel.
Des. Luis Ganzerla, j. 15.08.2000). Elucidativo, também, o v. acórdão proferido nos Embargos Infringentes 123.633-1/3-02, de que foi relator o então Desembargador Cezar Peluzo, que posteriormente integrou o STF. Vale a pena destacar trecho de seu brilhante voto, em que demonstra a indissociabilidade do fato gerador com a pessoa do contribuinte, pessoa física ou jurídica, vale dizer, a necessária consideração do domicílio fiscal do sujeito passivo que dirime o conflito de competência tributária, porque o domicílio tem sempre base territorial: Cuida-se, portanto, de critério baseado na discriminação de operações tributáveis, segundo o território em que se realizem. E, para apurar tal relação física entre cada operação e o território, tem-se de recorrer ao domicílio do cedente, entendido como o sujeito que promove a operação tributável, porque esse é, para os efeitos legais, o local da operação . Escusaria advertir que o recurso normativo ao domicílio, enquanto residência habitual das pessoas físicas e centro principal das atividades das jurídicas, resulta da necessidade de simplificação das tarefas de administração tributária. Noutras palavras, toma a lei em consideração esse dado objetivo, que permite identificar, com prontidão e clareza, um dos elementos fundamentais da exigibilidade do imposto. De modo que não há, ao propósito, nenhuma alternativa hermenêutica, porque é expressa a lei na delimitação do domicílio fiscal, como se tira do art. 127 da Lei federal n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966 , onde se consagra o princípio da facultatividade, cuja exceção, aberta ao juízo discricionário da autoridade administrativa, depende não de motivos arbitrários, senão de causas preestabelecidas (par. 2.º) inaplicáveis ao caso. Donde, se o domicílio fiscal da COSIPA, em consonância com a própria situação geográfica de sua unidade produtora, setenta e cinco por cento de suas instalações ocupam o respectivo território, está no Município de Cubatão, não pode ser outro, para aquele efeito constitucional, o território e realização das operações tributáveis de circulação de mercadorias, das quais seja cedente, ainda que atos, relevantes no suporte fático da exigibilidade do imposto, possam ocorrer no Município de Santos. Tais atos, como já se notou, carecem de reflexos legais no tema da participação no produto da arrecadação do imposto (g.n). Esse v. acórdão foi integralmente mantido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do RE 196.243-7 em sede de agravo regimental conforme ementa a seguir: Agravo regimental a que se nega provimento, eis que o extraordinário interposto contra o acórdão do Superior Tribunal de Justiça ataca decisão que cingiu-se a examinar
dispositivos legais; quanto ao interposto na origem, está preso à revisão dos fatos, insuscetível de análise nesta sede (RE 196243 AgR/SP, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 04.08.2000). A jurisprudência da Corte paulista está afinada com o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal que consagrou definitivamente a tese de que por “operações relativas à circulação de mercadorias” entende-se a circulação jurídica traduzida pelo negócio jurídico que opere a transferência efetiva de titularidade. Senão vejamos: Agravos regimentais no recurso extraordinário. Tributário. Repartição do ICMS. Valor adicionado fiscal – VAF. Municípios de base extrativa. Reexame de fatos e provas. Deslocamento de mercadorias. Estabelecimentos do mesmo titular. 1. O acórdão recorrido não se distanciou da jurisprudência do STF ao afirmar que, ocorrendo o fato gerador do tributo – ICMS – no território do Município de Ouro Preto, local de saída final dos produtos beneficiados, não existe motivo para a participação dos municípios de base extrativa na receita proveniente da arrecadação do ICMS com base no valor adicionado fiscal – VAF, vez que não houve agregação de valor às mercadorias nos referidos municípios. 2. Reexame de fatos e provas. Incidência da Súmula n. 279 do STF. Impossibilidade em recurso extraordinário. 3. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que o simples deslocamento da mercadoria de um estabelecimento para outro da mesma empresa, sem a transferência de propriedade, não caracteriza a hipótese de incidência do ICMS. Precedente. Agravos regimentais a que se nega provimento (RE 422051 AgR/MG, Rel. Min. Eros Grau, DJe-116 24.06.2010). Constitucional e tributário. Agravo regimental em recurso extraordinário. Deslocamento de mercadorias. Estabelecimentos do mesmo titular. Não incidência de ICMS. 1. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que o simples deslocamento da mercadoria de um estabelecimento para outro da mesma empresa, sem a transferência de propriedade, não caracteriza a hipótese de incidência do ICMS. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido (RE 267.599 AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe-232 10.12.2009). Tributário. Agravo regimental em agravo de instrumento. Saída física de bens de um estabelecimento para outro de mesma titularidade. Não incidência do ICMS. Precedentes da corte. Agravo improvido. I – A jurisprudência da Corte é no sentido de que o mero deslocamento físico de bens entre estabelecimentos, sem que haja transferência efetiva de titularidade, não caracteriza operação de circulação de mercadorias sujeita à incidência do
ICMS. II – Recurso protelatório. Aplicação de multa. III – Agravo regimental improvido (AI 693714 AgR/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe-157 20.08.2009). Entretanto, essa questão continuará suscitando dúvidas e incertezas diante da oscilação da urisprudência do STJ que parece estar construindo um novo preceito legislativo que promova a distribuição justa do VAF. São conhecidas as velhas disputas do VAF entre os Municípios de Andradina e de Pereira Barreto em função da energia elétrica produzida pela Usina Hidroelétrica de Três Irmãos, de propriedade da Companhia Energética de São Paulo (CESP) situada nas divisas dos dois Municípios. A Usina está localizada dentro do território do Município de Andradina, ao passo que a maior parte das águas represadas está no Município de Pereira Barreto, bem como o domicílio fiscal da CESP. O Município de Andradina vem pleiteando há décadas à Secretaria da Fazenda do Estado, até agora sem sucesso, a destinação dos 3/4 do VAF. No início de 2010 a Municipalidade de Andradina impetrou Mandado de Segurança 004013426.2010.8.26.0000 (990.10.040134-3) contra ato do senhor Secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, que negou o pedido formulado pelo Município de Andradina no sentido de lhe serem deferidos os 3/4 do VAF do ICMS, porque em seu território estão localizadas as instalações eradoras de energia elétrica. Ante o parecer desfavorável do órgão ministerial, porque o domicílio da CESP encontra-se no território do Município de Pereira Barreto, o senhor Prefeito de Andradina agiu politicamente, a fim de forçar os órgãos da Secretaria da Fazenda do Estado a transferir o domicílio fiscal da CESP para o Município de Andradina. O estabelecimento da CESP foi notificado a fazer essa transferência. Foi então que o Município de Pereira Barreto impetrou mandado de segurança contra o Secretário da Fazenda a fim de afastar o ato ilegal e abusivo que favorecia o Município de Andradina, alterando o domicílio do contribuinte no curso da lide. Embora não concedida a medida liminar pleiteada, o fisco paulista não levou adiante a transferência de ofício, manifestamente incabível no caso, tendo em vista o art. 127 e seu § 2.º do CTN. Em primeira instância, ambos os mandamus foram julgados improcedentes por conta das intermináveis confusões trazidas aos autos, entre as quais a noção de “prédio operacional” responsável pela geração de energia elétrica. No mandado impetrado por Pereira Barreto não se discutiu o mérito, isto é, não se ventilou a quem caberia o VAF, mas, tão somente, a ilegalidade e nulidade da pretendida alteração de ofício do domicílio fiscal da CESP, proprietária da Usina Três Irmãos, em face do que dispõe o § 2.º do art. 127 do CTN. Os autos encontram-se no Tribunal de Justiça aguardando julgamento. Somente uma providência legislativa poderá pôr cobro a essa interminável discussão em torno da disputa do VAF. Um dos projetos legislativos em discussão no Congresso Nacional, em casos de Usinas situadas nas divisas de dois Municípios, prevê a distribuição igualitária do VAF.
7.4
INCIDÊNCIA DO ICMS NO LEASING POR OCASIÃO DA OPÇÃO DE COMPRA
Um dos temas que maior controvérsia suscita na seara do direito tributário é o leasing . Na área do ISS as discussões judiciais havidas ao longo do tempo são incontáveis. Vão desde a não incidência do imposto, a simulação da tese em sentido contrário, até o aceso debate em torno do local de pagamento do ISS, que está longe de encontrar uma posição de conformidade com o estabelecido pela lei de regência nacional desse imposto. No tocante ao ICMS, a operação de leasing internacional também suscitou inúmeras discussões jurisprudenciais. Houve reação legislativa à posição firmada pela Corte Suprema, mas que acabou sendo afinal superada pelo STF após um momento de vacilação. Contudo, ainda resta uma questão não resolvida pela Corte Maior, como veremos ao final. Quanto à incidência ou não do ICMS no leasing internacional a discussão teve início com base no disposto no art. 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/96, lei de regência nacional do ICMS, vazado nos seguintes termos: Art. 3.º O imposto não incide sobre: […] VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário. À luz desse dispositivo, a jurisprudência do STF fixou o entendimento de que não incide o imposto na importação de equipamento objeto de contrato de arrendamento mercantil, consignando que o fato gerador do ICMS somente ocorrerá quando o bem arrendado incorporar-se ao patrimônio de arrendatário, caracterizando, nessa hipótese, a circulação mercantil. Outrossim, o STF firmou posição acerca da não incidência do ICMS na importação de veículo por pessoa física para uso próprio (RE 203.075). Posteriormente, foi editada a Súmula 660 do STF com a seguinte redação: Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. A exemplo do que aconteceu com a Emenda Passos Porto que enterrou nada menos que três teses consolidadas pelo STF, o legislador constituinte derivado reagiu ao entendimento da Corte Suprema, alterando por meio da EC 33/2001 a redação da letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF para os seguintes termos:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir imposto sobre: […] II – Operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 3, de 1993.) […] IX – incidirá também: a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço. (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 33, de 2001.) Essa emenda ampliou o campo de incidência do ICMS nas importações, não mais limitadas a mercadorias, pelo que qualquer pessoa física ou jurídica que promova a importação de bens passa a ser contribuinte do ICMS, independentemente de haver ato de mercancia ou não, bastando a simples entrada de um bem a qualquer título. Essa reação afrontosa do legislador constituinte derivado que, na realidade, infringe o princípio da separação dos poderes gerou uma enorme discussão jurisprudencial, com reflexo na área de serviços especificados na lista nacional de serviços, que estão fora do campo de incidência do ICMS. O imposto estadual só pode incidir sobre a prestação do serviço de comunicação e dos serviços de transportes interestadual e intermunicipal ainda que iniciados no exterior. Assim, surgiu no STF a tese de que o inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96 só tem aplicação no âmbito do leasing interno (RE 206.069). Transcrevemos, para maior clareza, trecho do voto da Ministra Relatora Ellen Gracie, condutor da decisão majoritária: O exame desse dispositivo revela que, nessa circunstância, a imposição de ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. A Constituição Federal elegeu o elemento fático “entrada de mercadoria importada” como caracterizador da circulação jurídica da mercadoria ou do bem, e dispensa indagações acerca dos contornos do negócio jurídico realizado no exterior. Veja-se que, a par de incidir sobre “operações relativas a circulação de mercadorias”, fez o constituinte de 1988 constar do texto constitucional a expressa ressalva da incidência
sobre a “entrada” do bem “importado”. Interpretar o disposto na letra a do inciso IX do § 2.º de forma isolada, sem conexão com o caput do art. 155, inciso II, da CF, conduz à bitributação jurídica, pois a entrada do bem importado configura fato gerador do imposto de importação (art. 19 do CTN) conforme sustentado pelo STJ no REsp 622283. E mais, o leasing nacional ou internacional, pouco importa, só se sujeita à incidência do ISS, pois a Constituição vigente não ressalvou a bitributação jurídica nesse particular, a exemplo do que havia feito originalmente em relação à venda a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel, que estava inserido tanto na competência tributária do Estado (ICMS) como na competência tributária do município (IVV). Hoje, não há mais possibilidade de qualquer bitributação urídica. O leasing internacional sujeita-se apenas ao ISS nos termos do art. 1.º, § 1.º, da Lei Complementar 116/2003 e item 15.09 da lista anexa c.c o art. 156, III, da CF. No nosso entender, o legislador constituinte derivado, ao promulgar a EC 33/2001, não instituiu nem pretendeu instituir a bitributação jurídica (ICMS/II, ou ICMS/ISS). Visou, tão somente, esvaziar a tese da não incidência do ICMS na importação de bens. Entretanto, mesmo após a reversão da tese da tributação do leasing internacional pelo ICMS, o que se deu no julgamento do RE 461.968, DJe 23.08.2007, a discussão em torno da nova redação conferida à letra ado inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF continuou sustentando que a imposição do ICMS prescinde da verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. Em outras palavras, a circulação jurídica, assim entendida como operação que implique transferência de propriedade, é irrelevante para fins de tributação do ICMS com base na nova redação conferida pela EC 33/2001. Para bem diferenciar antes e depois da emenda, o STF editou a Súmula 660 nos seguintes termos: “[…] não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto”. De fato, nada impede de o legislador constituinte derivado criar um quarto imposto estadual com o nome de ICMS, porém diferente daquele previsto no inciso II do art. 155 da CF, ou com outro nome qualquer, por exemplo, “ICMS incidente sobre bens importados do exterior”, na esteira do que ocorreu com PIS/Pasep-importação e Cofins-importação. O que o legislador constituinte derivado não pode é lançar a confusão sustentando que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF não expressa circulação de mercadorias. Ora, dizer que o ICMS referido no inciso II do art. 155 da CF (circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação ainda que a operações e as prestações se iniciem no exterior) incide também na entrada de bem ou mercadorias
importados do exterior qualquer que seja a sua finalidade, é o mesmo que afirmar que aquele ICMS não se caracteriza pela circulação jurídica, transformando-o em um autêntico imposto sobre transporte ou de deslocamento físico da mercadoria. Se se tratar de ICMS referido no inciso II do art. 155, não se pode desconsiderar o aspecto da circulação jurídica a exigir transferência de propriedade, o que não acontece com o leasing internacional que, como já o dissemos, caracteriza o fato gerador do ISS, e não do ICMS, ainda que haja a previsão de opção de compra, que é elemento estrutural do leasing financeiro. No julgamento do RE 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, em que foi reconhecida a existência de repercussão geral da matéria constitucional debatida, o STF encerrou definitivamente a controvérsia decidindo, por maioria de votos, vencidos o Ministro Relator e o Ministro Teori Zavaski, que não há incidência do ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, nos termos da ementa a seguir: Recurso extraordinário. Constitucional e tributário. ICMS. Entrada de mercadoria importada do exterior. Art. 155, II, CF/88. Operação de arrendamento mercantil internacional. Não incidência. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 1. O ICMS tem fundamento no artigo 155, II, da CF/88, e incide sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. 2. A alínea “a” do inciso IX do § 2.º do art. 155 da Constituição Federal, na redação da EC 33/2001, faz incidir o ICMS na entrada de bem ou mercadoria importados do exterior, somente se de fato houver circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio (compra e venda). 3. Precedente: RE 461968, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 30.05.2007, DJe 23.08.2007, onde restou assentado que o imposto não é sobre a entrada de bem ou mercadoria importada, senão sobre essas entradas desde que elas sejam atinentes a operações relativas à circulação desses mesmos bens ou mercadorias. Supremo Tribunal Federal. 4. Deveras, não incide o ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional, salvo na hipótese de antecipação da opção de compra, quando configurada a transferência da titularidade do bem. Consectariamente, se não houver aquisição de mercadoria, mas mera posse decorrente do arrendamento, não se pode cogitar de circulação econômica. 5. In casu, nos termos do acórdão recorrido, o contrato de arrendamento mercantil internacional trata de bem suscetível de devolução, sem opção de compra. 6. Os conceitos de direito privado não podem ser desnaturados pelo direito tributário, na forma do art. 110 do CTN, à luz da interpretação conjunta do art. 146, III, combinado com o art. 155, inciso II e § 2.º, IX, “a”, da CF/88. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento (RE 540.829/SP-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 16.06.2015).
À primeira vista, parece impressionante a tese sustentada pelo eminente Ministro Relator Gilmar Mendes, segundo o qual: O ICMS não pode ser visto, atualmente, como um imposto incidente apenas sobre operações mercantis e alguns serviços, mas também como um imposto que incide sobre importações. Poder-se-ia ter-lhe conferido nova denominação, mas o Constituinte Derivado optou por manter a tradicional nomenclatura. Em tese, está correto o eminente Ministro. Certamente, nada impede de o Poder Reformador prever a instituição de um quarto imposto para os Estados, pois o princípio da não bitributação urídica é um princípio implícito que decorre da discriminação constitucional de impostos. Isso aconteceu em relação ao PIS/Pasep-importação e à Cofins-importação em que a EC 42/2003 acrescentou o inciso IV ao art. 195 da CF, prevendo a contribuição social “do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equipar”. Com fundamento nesse inciso IV do art. 195 da CF, a União instituiu o PIS/Pasep-importação e a Cofins-importação pela MP 164, de 29.01.2004, convolada na Lei 10.865/2004 com pequenas alterações. Nos termos do 3.º dessa Lei, essas contribuições não incidem sobre a totalidade da receita bruta do contribuinte, como ao PIS/Pasep e Cofins tradicionais, mas apenas sobre a “entrada de bens estrangeiros no território nacional ou o pagamento, o crédito, a entrega, o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no exterior como contraprestação do serviço prestado”. Uma coisa é a faculdade de o Constituinte Derivado alargar o rol de impostos conferidos privativamente a cada entidade política, que não se confunde com o exercício da competência tributária residual atribuída apenas à União, com as limitações predeterminadas (art. 154 da CF), e outra coisa bem diversa é o Constituinte Derivado conferir competência tributária privativa para o Estado instituir determinado imposto, no caso, o ICMS, com as características previstas no inciso II do art. 155 e ao mesmo tempo pelo seu § 2.º descaracterizar o ICMS previsto no caput , fazendo incidir o aludido imposto sobre mera entrada de bens ou mercadoria sem que haja “operação relativa à circulação de mercadorias”, que na interpretação do STF implica operação de compra e venda, ou seja, circulação jurídica. Alterando o elemento nuclear ou material do fato gerador do ICMS – circulação jurídica –, esse imposto deixará de ser aquele referido no inciso II do art. 155 da CF, pouco importando a denominação mantida. ICMS sem circulação jurídica não é aquele ICMS previsto no caput do art. 155 da CF. Como imposto novo que fica sendo, não poderá prescindir de lei ordinária que o institua, definindo o respectivo fato gerador como “a entrada de bens ou mercadorias importadas do exterior
por pessoa física ou jurídica”. E não poderá incluir a operação de arrendamento mercantil procedente do exterior, sob pena de invadir a esfera de competência do Município. Por tudo isso, entendemos que o STF deu a única interpretação possível ao disposto na letra a do inciso IX do § 2.º do art. 155 da CF, exigindo a circulação jurídica do bem ou mercadoria importada do exterior como condição da incidência do ICMS previsto no caput do art. 155 da CF. Confiante nessa tese, em 27.05.2004, ajuizamos a favor de um cliente, contra a Fazenda do Estado de São Paulo, ação declaratória de inexigibilidade de crédito tributário pago pelo regime de parcelamento, cumulada com a ação de repetição (Proc. 583.53.2004.016797-2) que foi julgada procedente, reconhecendo a nulidade do pedido de parcelamento e ordenando a restituição do ICMS pago. Entretanto, o TJSP reformou essa escorreita decisão monocrática, julgando a ação improcedente, por maioria de votos, mantida a decisão em grau de embargos infringentes. Interposto o recurso especial perante o STJ, o recurso foi provido restabelecendo-se na íntegra a decisão de primeira instância (REsp 1.34895/SP). A Fazenda do Estado ingressou com o recurso extraordinário contra a decisão proferida pelo STJ. Entretanto, o STJ sobrestou o andamento do recurso extraordinário, tendo em vista que o STF reconheceu a existência de repercussão geral no RE 540.829/SP. No julgamento final, o Colendo STF, contra votos dos Ministros Gilmar Mendes e Teori Zavascki, acolheu a tese de não incidência do imposto no leasing internacional, porque mera entrada de bem importado do exterior sem que haja circulação jurídica não caracteriza o ICMS previsto no inciso II do art. 155 da CF. Como se verifica, a reação do Poder Reformador contra a soberana decisão da Corte Suprema causou dúvidas e incertezas e atravancou por mais de dez anos a prestação jurisdicional do Estado. Em matéria de ICMS relacionado com o leasing , resta ainda uma questão não resolvida pela urisprudência. Trata-se de interpretar corretamente a parte final do inciso VIII do art. 3.º da Lei Complementar 87/96, que submete à tributação do ICMS o bem arrendado, por ocasião do exercício da opção de compra pelo arrendatário. O leasing financeiro de que estamos falando, por expressa disposição legal (Lei 6.099/74 com as alterações de Lei 7.132/83 e Resolução 2.309/96 do Banco Central), pressupõe a existência de tríplice opção conferida ao arrendatário: a) devolver o bem arrendado ao arrendador no final do prazo contratual; b) prorrogar o contrato de arrendamento ao final do prazo pactuado; c) exercer a opção de compra ao final do prazo contratual. Se faltar a cláusula de opção de compra pelo valor residual garantido, não se tratará de leasing financeiro.
Logo, exercida a opção de compra, que faz parte integrante e indissociável do leasing financeiro, ensejador da incidência do ISS, não poderá haver incidência do ICMS à sombra do obscuro inciso VIII do art. 3.º da Lei Complementar 87/96, que invadiu a competência impositiva municipal, estendendo o campo da incidência do ICMS para além dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Ademais, quando o arrendatário exercer a opção de compra, necessariamente no final do prazo de arrendamento mercantil, não mais haverá mercadoria a ser vendida. E também não existirá a base de cálculo do ICMS porque o valor residual já fora pago de forma parcelada com as prestações mensais a cargo do arrendatário. Nesse particular, releva observar que a Súmula 263 do STJ foi cancelada posteriormente pela Corte Especial, que passou a entender que o valor residual pode ser pago no decorrer do contrato de leasing , sem que implique operação de compra e venda a descaracterizar o leasing , uma vez que a Resolução 2.309/96 do Banco Central permite tal faculdade. Faltando base de cálculo, um dos elementos do fato gerador da obrigação tributária, o imposto, não poderá existir, tanto quanto o imposto sem sujeito ativo ou passivo. Como assevera José Eduardo Soares de Melo, […] considerando que a LC 116/03 reiterou a incidência do ISS sobre o leasing (item 15.09), sem nenhuma ressalva de incidência do ICMS, pode-se entender que restaria prejudicado o preceito da LC 87/96 (art. 3.º, VIII), que dispusera sobre a tributação estadual.6 Consoante escrevemos, […] a opção de compra é elemento estrutural do contrato de leasing . Por isso, descabe a cogitação de tributação pelo ICMS quando houver o exercício da faculdade pelo arrendatário de comprar o bem arrendado. A Constituição não previu a bitributação jurídica que somente existiu em relação às “vendas a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel” (art. 156, IV, da CF). Mas o inciso IV da CF veio a ser revogado pela EC 3/1993, de sorte que atualmente só incide o ICMS sobre as vendas de combustíveis líquidos e gasosos. 7 Nesse sentido, decidiu o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme ementa a seguir transcrita: ICMS. Importação de aeronave. Contrato de arrendamento mercantil ( leasing ). Não caracteriza o fato imponível do ICMS. I – Os bens importados em decorrência do leasing não se destinam ao consumo, nem ao
ativo fixo do importador, porque continuam integrando o patrimônio do arrendante. II – Em que pese a circunstância de o artigo 3.º, inciso VIII, da Lei Complementar 87, de 1996, prescrever que, ao fazer a opção de compra, o arrendatário estaria sujeito à incidência do ICMS, tal mandamento contraria a sistemática do leasing , pois, ao ser exercida a opção de compra, não há mais mercadoria e, como se isto não bastasse, não ocorre nenhuma operação mercantil, mas tão somente, uma operação de financiamento (TJSP, AC 57.384-5/SP, Rel. Des. Guerrieri Rezende, 7.ª Câmara de Direito Público, j. 05.04.1999, JTJ v. 218, Lex, p. 74-78, jul. 1999). A cobrança do ICMS sobre o leasing por ocasião do exercício da opção de compra pelo arrendatário, com base na segunda parte do inciso VIII do art. 3.º da LC 87/96, é inconstitucional, quer por invadir a esfera de competência impositiva do Município, quer por implicar exigência de imposto sem a necessária base de cálculo.
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TROIANELLI, Gabriel Lacerda; GUEIROS, Juliana. O ISS e exportação e importação de serviços. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães (Coord.). ISS : LC n.º 116/2003. Curitiba: Juruá, 2004. p. 202. HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. ISS : doutrina e prática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 66. Cf. nosso ISS : doutrina e prática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 201. Regulamentos do ICMS de outros Estados também contêm dispositivos semelhantes. Cf. HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 57. MELO, José Eduardo Soares de. ISS : aspectos teóricos e práticos. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 105. Cf. HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. Código Tributário Nacional comentado . 2. ed. São Paulo: Rideel, 2016. p. 418.
8 SÚMULAS PERTINENTES AO ICMS 8.1
Súmulas vinculantes do STF Súmula 32 – O ICMS não incide sobre alienação de salvados de sinistro pelas seguradoras.
Súmula 48 – Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço.
8.2
Súmulas do STF
Súmula 536 – São objetivamente imunes ao imposto sobre circulação de mercadorias os “produtos industrializados”, em geral, destinados à exportação, além de outros, com a mesma destinação, cuja isenção a lei determinar. Súmula 569 – É inconstitucional a discriminação de alíquotas do Imposto de Circulação de Mercadorias nas operações interestaduais, em razão de o destinatário ser, ou não, contribuinte. Súmula 571 – O comprador de café ao IBC, ainda que sem expedição de nota fiscal, habilita-se, quando da comercialização do produto, ao crédito do ICM que incidiu sobre a operação anterior. Súmula 572 – No cálculo do Imposto de Circulação de Mercadorias devido na saída de mercadorias para o exterior, não se incluem fretes pagos a terceiros, seguros e despesas de embarque. Súmula 573 – Não constitui fato gerador do Imposto de Circulação de Mercadorias a saída física de máquinas, utensílios e implementos a título de comodato. Súmula 574 – Sem lei estadual que a estabeleça, é ilegítima a cobrança do Imposto de Circulação de Mercadorias sobre o fornecimento de alimentação e bebidas em restaurante ou estabelecimento similar.
Súmula 575 – À mercadoria importada de país signatário do GATT, ou membro da ALALC, estende-se à isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias concedida a similar nacional. Súmula 576 – É lícita a cobrança do Imposto de Circulação de Mercadorias sobre produtos importados sob o regime da alíquota “zero”. Súmula 577 – Na importação de mercadorias do exterior, o fato gerador do Imposto de Circulação de Mercadorias ocorre no momento de sua entrada no estabelecimento do importador. Súmula 578 – Não podem os Estados, a título de ressarcimento de despesas, reduzir a parcela de 20% do produto da arrecadação do Imposto de Circulação de Mercadorias, atribuídas aos Municípios pelo art. 23, § 8.º, da Constituição Federal. Obs. Referência feita à Constituição Federal de 1967.
Súmula 579 – A cal virgem e a hidratada estão sujeitas ao Imposto de Circulação de Mercadorias. Súmula 615 – O princípio constitucional da anualidade (§ 29 do art. 153 da CF) não se aplica à revogação de isenção do Imposto de Circulação de Mercadorias. Súmula 660 – Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto. Súmula 661 – Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro. Súmula 662 – É legítima a incidência do ICMS na comercialização de exemplares de obras cinematográficas, gravados em fitas de videocassete.
8.3
Súmulas do STJ
Súmula 20 – A mercadoria importada de país signatário do GATT é isenta do ICMS quando contemplado com esse favor o similar nacional. Súmula 49 – Na exportação de café em grão, não se inclui na base de cálculo do ICM a quota de contribuição, a que se refere o art. 2.º do Decreto-lei n.º 2.295, de 21.11.1986. Súmula 71 – O bacalhau importado de país signatário do GATT é isento do Imposto de Circulação de Mercadorias. Súmula 80 – A taxa de melhoramento dos portos não se inclui na base de cálculo do ICM. Súmula 87 – A isenção do ICMS relativa a rações balanceadas para animais abrange o concentrado e o suplemento. Súmula 94 – A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do Finsocial.
Súmula 95 – A redução da alíquota do imposto sobre produtos industrializados ou do imposto de importação não implica redução do ICMS. Súmula 129 – O exportador adquire o direito de transferência de crédito do ICMS quando realiza a exportação do produto e não ao estocar a matéria-prima. Súmula 135 – O ICMS não incide na gravação e distribuição de filmes e videoteipes. Súmula 155 – O ICMS incide na importação de aeronave, por pessoa física, para uso próprio. Súmula 163 – O fornecimento de mercadorias com a simultânea prestação de serviços em bares, restaurantes e estabelecimentos similares constitui fato gerador do ICMS a incidir sobre o valor total da operação. Súmula 166 – Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte. Súmula 198 – Na importação de veículo por pessoa física, destinado a uso próprio, incide o ICMS. Súmula 237 – Nas operações com cartão de crédito, os encargos relativos ao financiamento não são considerados no cálculo do ICMS. Súmula 350 – O ICMS não incide sobre o serviço de habilitação de telefone celular. Súmula 391 – O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada. Súmula 431 – É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal. Súmula 432 – As empresas de construção civil não estão obrigadas a pagar ICMS sobre mercadorias adquiridas como insumos em operações interestaduais. Súmula 433 – O produto semielaborado, para fins de incidência de ICMS, é aquele que preenche cumulativamente os três requisitos do art. 1.º da Lei Complementar n.º 65/1991. Súmula 457 – Os descontos incondicionais nas operações mercantis não se incluem na base de cálculo do ICMS. Súmula 509 – É lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda.
REFERÊNCIAS BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. BORGES, José Souto Maior. Isenções tributárias. 2. ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980. BRITO, Edvaldo. O ICMS e a LC 87/96 . Obra coletiva. Coordenação de Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 1996. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS . 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. CARVALHO DE MENDONÇA J. X. de. Tratado de direito comercial brasileiro. v. V, Livro III, § 24. COSTA, Alcides Jorge. Algumas ideias sobre uma reforma do sistema tributário brasileiro. In: NOGUEIRA, Ruy Barbosa (Coord.). Direito tributário atual . São Paulo: Resenha Tributária, 1987/1988. v. 7/8. HARADA, Kiyoshi; HARADA, Marcelo Kiyoshi. Código Tributário Nacional comentado . 2. ed. São Paulo: Rideel, 2016. ______. Direito financeiro e tributário . 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016. ______. Direito municipal . São Paulo: Atlas, 2001. ______. ICM : direito a crédito na isenção e no diferimento. São Paulo: Resenha Tributária, 1979. ______. ISS : doutrina e prática. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2016. JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário de direito tributário. São Paulo: Noeses, 2011. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário . 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. MELO, José Eduardo Soares de. ISS : aspectos teóricos e práticos. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005. ______. O ICMS e a LC 87/96 . Obra coletiva coordenada por Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 1996. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Da interpretação e da aplicação das leis tributárias . 2. ed. São Paulo: RT. ______. Direito tributário comparado. São Paulo: Saraiva. NUNES, Pedro. Dicionário de tecnologia jurídica . 5. ed. São Paulo: Freitas Bastos, 1961. PIMENTEL, Alexandre Freire. Direito cibernético: um enfoque teórico e lógico-aplicativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967 . São Paulo: RT, t. II.