O GOLPE NA EDUCAÇÃO
LUIZ ANTONIO CUNHA E MOACYR DE GOÉS
O GOLPE NA EDUCAÇÃO BRASIL OS ANOS DE AUTORITARISMO ANÁLISE - BALANÇO - PERSPECTIVAS
LUIZ ANTONIO CUNHA E MOACYR DE GOÉS
SÉTIMA EDIÇÃO EDITORA JORGE ZAHAR EDITOR. RIO DE JANEIRO 1991
O GOLPE NA EDUCAÇÃO BRASIL OS ANOS DE AUTORITARISMO ANÁLISE - BALANÇO - PERSPECTIVAS
LUIZ ANTONIO CUNHA E MOACYR DE GOÉS
SÉTIMA EDIÇÃO EDITORA JORGE ZAHAR EDITOR. RIO DE JANEIRO 1991
POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA I. Por Dentro do Contexto Nos anos 60 a crise brasileira é econômica, é social e é política. Desde o Movimento de 1930 resposta tupiniquim à crise de 1929 do capitalismo internacional - que o Brasil procurava saídas face à ruptura da República agro-exportadora, à crescente urbanização e à influência dos militares que desejavam construir as próprias armas (ver os discursos do ditador do Estado Novo). 0 primeiro patam patamar ar do novo novo modelo modelo foi constr construíd uídoo por Vargas, Vargas, com Volta Volta Redond Redonda, a, negoci negociand andoo com os americanos americanos o apoio do Brasil aos Aliados na Segunda Segunda Guerra Guerra Mundial. Direcionou-s Direcionou-see o país para a industrialização. Na reordenação que se processou, após a crise do Estado liberaloligárquico, a sociedade política (o Estado) Estado) incorporou incorporou setores setores da classe classe dominante com interesses interesses voltadas voltadas para o setor industrial industrial e, a partir partir daí, procurou conciliar capital e trabalho. trabalho. Instalou-se, Instalou-se, posteriorme posteriormente, nte, o chamado chamado "modelo "modelo de substituição das importações" que possibilitou a emergência do setor industrial como hegemônico nos anos 60. Já no final dos anos 50 este processo parecia estar em vias de conclusão e o seu desdobramento implicaria abrir um mais amplo mercado interno. Este foi o desafio ao governo João Goulart e ao seu programa de "Reformas de Base". A situação, todavia, não era tão fácil e esquemática: O Brasil era e é um país terceiro-mundista, dependente. Aqui se confrontavam interesses econômicos das mais diversas ordens: - o latifúndio, impenetrável às mudanças sociais; - os grupos ligados à internacionalização do capital que buscavam o poder político, indispensável à segurança de sua reprodução; - a chamada "burguesia nacional" que preferia aliar-se ao capital internacional a fazer concessões à força de trabalho, apesar dos ideólogos do , ISEB Instituto Superior de Estudos Brasileiros) teorizarem a aliança de classes.
02 Esta luta de foice no escuro se processava numa sociedade: - em que o movimento operário era vulnerável, pela sua dependência de Estado interventor de sindicatos; - em que o campo estava no início da organização de seus trabalhadores em Ligas Camponesas e sindicatos rurais; - em que as camadas médias eram atravessadas pela "indústria do anticomunismo - em que a Aliança para o Progresso constituía-se na grande ideóloga e financiava "ilhas de sanidade" hostis ao
contra a Revolução Cubana
governo reformista de Jango;
- em que os intelectuais orgânicos da classe dominante atuavam no
Congresso Nacional,
formavam opinião pública através dos meios de comunicação de massas, da escola, de parte das Igrejas, de organizações
tipo IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais) e IBAD (Instituto
Brasileiro de Ação Democrática), instrumentalizando conceitos ideológicos de "civilização ocidental e cristã", corrompendo com o dinheiro
da embaixada americana (eleições de 1962) com o objetivo
político de conservação das estruturas, contra as reformas ou qualquer mudança, escamoteando a discussão da luta de classes. Nesta conjuntura, ó confronto "abertura de mercado interno" versus "exportar é a solução" foi decidido pela força em 1964. O segmento industrial, financiado pelo chamado "capital associado", cresce-não com a demanda externa, e o Brasil rumou em direção a Belindia, isto é, a construção de uma Bélgica (a-minoria rica e industrializada) em cima de uma Índia (a massa de despossuídos e miseráveis), como já se disse tantas vezes. Na sociedade civil, o discurso_ político progressista dos anos 60 remeteu, freqüentemente, às figurações de "povo e antì-povo" e de ações e anti-nação fluindo para a denúncia do latifúndio e do imperialismo. Não percebeu, todavia, com maior clareza, que a sociedade é que a crise social existente era também interna e apropriação/expropriação do trabalho a
dividida em classes,
que só com uma análise de
questão poderia ser discutida. Assim, apesar da relativa
liberdade assegurada pelo populoso aos movimentos sociais, a discussão da luta de restrita aos setores marxistas e não alcançou o palanque continuou latente e latejasse, sem
classes ficou
político dos comícios. A crise social
um canal efetivo de comunicação com as massas.
03 Na sociedade civil no Nordeste, este discurso remeteu, também, à preocupação com as tendências para a consolidação do capitalismo monopolista e à modernização da produção industrial do Centro-Sul e seu avanço sobre o mercado nordestino. A criação da Sudene em 1958 foi precedida de urna discussão, que se prolongou pelo período, na qual o perfil do novo órgão e seus objetivos foram questionados. A discussão da colonização brasileira pelas forças do capital internacional foi decodificada para questionar a possível colonização do Nordeste pelas forças econômicas do CentroSul: o chamado "imperialismo .interno". Apesar de tudo, a Sudene deflagrou grandes esperanças para a região. Diante de uma situação que se tomava cada vez mais complexa, a : aliança PSD-PTB, voto rural e voto urbano, não resistiu aos interesses divergentes entre cidade e campo, entre grupos nacionalistas e outros ligados ao capital externo.A crise, política se revela, principalmente, pelo esgotamento do modelo populista (1930-1964). Com a ruptura da República agroexportadora; em 1930, o Brasil conheceria a experiência latino-americana populista, tão como a Argentina de Perón, o México de Cárdenas, o Peru da APRA (Aliança Popular Revolucionária Americana), etc. No Brasil o populoso foi "revolucionário" em 1930; "bonapartista" em 1937; nacionalista e antimperialista de 1950 a J 954 ; desenvolvimentista no final dos anos 50; moralista em 1961 ; nacionalista e sindicalista até a sua queda em 1964. O populoso esgotou-se pelo avanço das camadas urbanas e dos setores ligados ao campo que escaparam do controle dos grupos dirigentes. Nesta situação excepcional deu-se uma crise orgânica na classe dirigente, que se sentiu ameaçada na sociedade civil e na própria estrutura econômica, visualizando riscos para a acumulação de capital.. Assim, quando se armou o confronto - como desdobrar o modelo de substituição das incorporações no bojo de uma crise social? o populoso já não teve coelhos para tirar de sua cartola mágica. Sem condições políticas para se transformar no popular, o populoso em 1964, deixou a cena para o novo estado tecnocrata-civil-militar. Os novos tempos serão comandadas pela internacionalização do capital, que se aprofundará, e dirigidos pela tradicional classe dominante, agora com mais uma proposta de modernização. Face às novas condições, o novo Estado definiu-se pela coerção para manter a dominação, no sentido, gramsciano do termo.Na crise de 1964, onde estavam os educadores? Que faziam? Qual a visão de mundo de suas vanguardas? Qual o papel do Estado na educação nacional? E o povo? 04
II. JK-Jânio-Jango: Caminhos e Descaminhos da Educação Nacional
A crise faz crescer. Ou, em outras palavras, a contradição move a História. Apesar de um forte conservadorismo e do medo das mudanças (que tem sido a tônica em educação), alguns educadores começaram a perceber que os problemas de sua sala de aula não se resolveriam, apenas, dentro dela. Era preciso espiar o que se passava no campo social como um todo e voltar à sala de aula com a visão da realidade do processo que estava sendo vivido. Nos anos 20 e 30, Pascoal Leme fora pioneiro desta prática. Esta preocupação, todavia, ficou soterra a pela repressão do Estado novo (1937-1945). Com a crise dos anos 50-60, maior número de educadores começou a botar a cabeça para fora da sala de aula para olhar e estudar o mundo.
O "TRÂNSITO" É possível que um marco dessa nova postura tenha sido Paulo Freire,
quando relatou o tema
"Educação dos adultos e as populações marginais: o problema dos mocambos", vinculando analfabetismo e pauperismo (Seminário Regional de Pernambuco, preparatório ao II Congresso Nacional de Educação de Adultos). Neste Congresso (Rio, 1958), o defendeu a educação com o homem, denunciando ainda: a substituição da aula educação
educador nordestino
a então vigente educação para o homem. E
expositiva pela discussão, a utilização de modernas técnicas de
de grupos com a ajuda de recursos áudio-visuais,etc.
Demonstrou preocupação com metodologias e, principalmente, com o lugar (social, político, educacional, de autoridade) a ser assumido por educador e educandos. Com a defesa da tese "Educação e atualidade brasileira" (Recife, 1959) Paulo Freire voltou ao tema e discutiu o seu carismático conceito de "transito" nós anos 60 o povo viveria o "trânsito" de uma sociedade fechada para uma sociedade que se abria, e o cidadão ultrapassaria uma consciência mágica/intransitiva para uma consciência transitiva critica.
05 O II Congresso, onde se discutiram 210 teses, foi um momento de esperanças, mesmo que os seus andaimes estivessem fincados num chão de fracassos e de destroços de experiências passadas : a da Alfalit (Agência Alfabetizadora Confessional), a Cruzada Nacional de Educação (1932), a Bandeira Paulista de Alfabetização (1933), a Cruzada de Educação de Adultos (1947), o Serviço de Educação de Adultos (1947), o I Congresso Nacional de Educação de Adultos (1947), o Sistema Radioeducativo Nacional - Sirena (1957), a Campanha de Educação de Adultos e Adolescentes (1947-1954), a Campanha de Educaç3o Rural (1952-1959), a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (1958). 0 final do governo JK foi marcado pela discussão sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) no Congresso Nacional, nos órgãos educacionais, sindicais, estudantis, na imprensa e nos comícios da campanha eleitoral de 1960. Jânio Quadros governou sete meses e assinou um convênio com a Igreja Católica criando o MEB - Movimento de Educação de Base (decreto 50370, de 21 de março de 1961). A história é conhecida: a renúncia de Jânio, a tentativa de golpe dos ministros militares, a conciliação do parlamentarismo "para evitar o derramamento de sangue" e a posse de Jango. 0 governo parlamentarista também teve o seu programa de educação (outubro de 1961). 0 programa do premier Tancredo Neves foi identificado por Robert Dannemann como tendo os seguintes objetivos, a serem alcançados em cinco anos: a expansão e o aprimoramento da rede escolar comum; a recuperação dos analfabetos e insuficientemente alfabetizados para a Nação; a extensão dos benefícios da cultura a todos os brasileiros; o incentivo à criação artística, intelectual e científica. Pretendia o governo, em termos de ensino primário, atingir os objetivos estabelecidos em Ponta del Leste e, se possível, antecipar-se a eles. Tais objetivos, fixados na Conferência da OEA (Organização dos Estados Americanos) realizada naquela cidade, eram: a eliminação do analfabetismo, a escolarização mínima de seis anos para todas as crianças em idade escolar, etc.
06 Em 1962, quando a crise institucional se aprofundou, o parlamentarismo, nos seus exteriores, ainda assumiu duas medidas de ordem educacional: a Mobilização Nacional contra o Analfabetismo (decreto 51470, de maio) e o Programa de Emergência para o Ensino Primário e Médio (decreto 51552, de setembro). No primeiro decreto falou-se, expressamente, de um entrosamento de propósitos de alfabetização e educação de base com o problema do desenvolvimento social e econômico. 0 decreto, todavia, não passou de uma carta de intenções. Para o Ministro Darcy Ribeiro o Programa de Emergência redescobria o município como "núcleo operativo em que se processa a ação educacional".São os tempos de descentralização da LDB, e ao MEC cumpre o repasse dos recursos para sua aplicação nos Estados.
A LEI DE DIRETRIZES E BASES A mais longa discussão da questão da educação em nível nacional que já ocorreu neste país foi o debate sobre a Lei de Diretrizes e Bases. Começou em 1948, quando já se discutia o Projeto Mariani; incendiou-se a que o com o Sübstutivo Lacerda; não se concluiu a polêmica com a promulgação da lei 4.024 em dezembro de 1961. O debate assumiu um papel questionador até 1964, quando ocorreu, com o golpe de Estado,
o verdadeiro "cala a boca" nacional.
A grande confrontação, na discussão da LDB, estabeleceu-se entre os privatistas do ensino e os educadores que defendiam a escola públicam gratuita e laica. Os privatistas combateram o Projeto Mariani, e fizeram do Substitutivo Lacerda a sua bandeira. Nesta trincheira ficaram os católicos sob a liderança da AEC (Associação de Educação Católica),que deflagrou a Campanha de Defesa da Liberdade de Ensino em oposição à Campanha de Defesa da Escola Pública. A AEC mobilizou os colégios católicos, os Círculos Operários, a opinião pública conservadora e pressionou o Congresso Nacional. Esta militância católica começou a "rachar" na JEC (juventude Estudantil Católica) e JUC (Juventude Universitária Católica) face à posição do movimento estudantil em favor da escola pública. A Campanha de Defesa Escola Pública retomou o pensamento liberal norte-americano e europeu do final do século XIX ao qual se somaram marxistas), mobilizou a opinião pública progressista, o movimento estudantil, e obteve o apoio operário (I e II Convenções Operárias em Defesa da Escola Pública, Sindicato dos Metalúrgicos, São Paulo, 1961). Nos anos 50-60, a defesa da escola pública, no contexto da discussão da LDB, deu continuidade ao pensamento de educadores como Anísio Teixeira; Pascoal Leme e outros e se converteu em estuário do rio cujos tributários foram: a criação da Associação Brasileira de Educação (1924), a IV Conferência Nacional de Educação (1931), o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), o I Congresso Brasileiro de Escritores (1945), o IX Congresso Brasileiro de Educação (1945), a Universidade do Povo e os Comitês Democráticos, criados no então Distrito Federal pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro) quarto de seu período de vida legal (1945-1947)
07 A LDB terminou sendo uma conciliação dos projetos Mariani e Lacerda. Assim o ensino no Brasil é direito tanto do poder público quanto da iniciativa privada (art. 2°). A gratuidade do ensino, conquista constitucional fica sem explicitaçâo. Abre-se a porta para o Estado financiar a escola privada (art. 9S). Do Projeto Mariani, permanece a proposta de equiparação dos cursos de nível médio dentro de uma articulação flexível. Anísio Teixeira, no seu incurável otimismo, disse que a LDB é uma meia vitória. mas uma vitória.. Finalmente, Bárbara Freitas fala do caráter "tardio" da LDB,. em face das novas tendências da "internacionalização do mercado", do caráter de seletividade que ela consagra, da proclamação vazia da educação como direito e dever de todos, omitindo uma "realidade social em ' que a desigualdade está profundamente arraigada". E nos diz que a LDB traduz no seu texto a estratégia típica da classe dominante que ao mesmo tempo que institucionaliza a desigualdade social, ao nível da ideologia, postula a sua inexistência; [assim, o sistema educacional além de contribuir para reproduzir a estrutura de classes e as relações de trabalho, também reproduz essa ideologia da igualdade. A LDB consagrou a descentralização, reservando ao governo federal a fixação de metas e a ação supletiva, financeira e técnica. Enquanto a União se debatia em sua crise institucional de parlamentarismo versus presidencialismo, os fatos importantes em educação se deslocavam da área do governo federal para emergirem em âmbitos regionais e/ou institucionais. A teoria do II Congresso Nacional de Educação de Adultos buscava a sua práxis nos movimentos de cultura popular. No ocaso a República presidencialista de Jango, iniciada em 1963 por força do plebiscito, apesar do clima de conspiração, ainda teve tempo de propor à nação:
08 a) O Plano Nacional de Educação (PNE), oriundo do Conselho Federal de Educação; b) 0 Plano Trienal de Celso Furtado, que encampou o PNE; c) A Comissão de Cultura Popular, criada junto ao gabinete do ministro, com atribuição de implantar o Sistema Paulo Freire, em Brasília (junho); d) O Plano Nacional de Alfabetização-PNA (decreto 5346S, de janeiro de 1964) que oficializou, a nível nacional, o Sistema Paulo Freire; este, chegou a operacionalizar-se em Brasília, projeto-piloto nordeste (Sergipe) e projeto-piloto sul (Baixada Fluminense, Rio). O PNA foi extinto em abril de 1964, 14 dias após o golpe de Estado (decreto 53886).
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III. Os Movimentos de Cultura/Educação Popular Quem não se lembra da universidade brasileira dos anos 50-60? A "torre de marfim". A mansão dos eleitos onde pontificava o catedrático vitalício, voto soberano numa congregação formada quase exclusivamente de catedráticos vitalícios. A jovem docência recrutada por cooperação do catedrático para ser seu instrutor ou assistente. O vínculo da cooperação criava os laços pessoais de fidelidade. A renovação era barrada à porta dessa universidade, mesmo que o movimento estudantil protestasse em greve por participação de 1/3 nas decisões. Quem fala para o próprio umbigo está condenado ao isolamento. Pior: a não perceber o que se passa ao redor. Assim aconteceu com essa universidade. Não percebeu a formação de um movimento popular crescente e que, em algumas regiões, ameaçava ser hegemônico. Vitorioso em algumas eleições locais e urbanas, o movimento popular abriu espaço para o pensamento renovador em educação e absorveu alguns intelectuais com experiência de lutas políticas das classes subordinadas. Estes vão se transformar em intelectuais orgânicos de uma política voltada para a cultura popular. Onde o movimento popular venceu pelo voto (Recife e Natal) ou em instituições que estavam atentas às mudanças sociais (Igreja Católica e União Nacional dos Estudantes - UNE), ocorreram oportunidades de práticas de cultura popular que conflitaram com a educação conservadora, encastelada na cátedra universitária vitalícia. Assim foi no Recife (Movimento de Cultura Popular - MCP), em Natal (Campanha De Pé No Chão Também Se Aprende A Ler); no âmbito da Igreja Católica (Movimento de Educação de Base - MEB); na UNE (Centro Popular de Cultura - CPC). Estes foram os movimentos que emergiram em 1960-1961 e, pelo estudo de suas propostas e práticas, é possível acompanhar um tempo de alvorada - curta alvorada.
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MOVIMENTO DE CULTURA POPULAR O MCP estruturou-se como uma sociedade civil, no âmbito da administração do Prefeito Miguel Arraes, no Recife, Pernambuco, em maio de 1960, com sede no Sítio da Trindade, o antigo Arraial do Bom Jesus das lutas holandesas. sDe acordo com o art. 1° de seus Estatutos, eram seus objetivos: a) promover e incentivar, com a ajuda de particulares e poderes públicos, a educação de crianças e adultos; b) atender ao objetivo fundamental fundamental da educação que é o de desenvolver plenamente plenamente todas as virtualidade do ser humano, através da educação integral de base comunitária, que assegure, também, de acordo com a Constituição, o ensino ensino religioso facultativo; c) proporcionar a elevação do nível cultural do povo, perpassando-o pata a vida e para o trabalho; d) colaborar para a melhoria do nível material do povo, através da educação especializada; e) formar quadros destinados a interpretar, sistematizar e transmitir os múltiplos aspectos da cultura popular. O MCP organizou-se em três departamentos: o de Formação da Cultura (DFC) o de Documentação e Informação (DDI) e o da Difusão da Cultura (DDC). Destes, o que parece ter tido um crescimento maior foi o Departamento da Formação da Cultura, integrado por dez divisões: Pesquisa (Diretor: Paulo Freire); Ensino (AnitaPaes Barreto);Artes Plásticas e Artesanato (Abelardo da Hora); Música, Dança e Canto (Mário Càncio) Cinema, Rádio Televisão e Imprensa (...); Teatro (Luiz Mendonça); Cultura Brasileira (...); Bem-Estar Coletivo (Geraldo Vieira); Saúde (Arnaldo Marques); Esportes (Reinaldo Pessoa). O principal ideólogo do MCP foi Germano Coelho, um intelectual bastante marcado pela influência do pensamento francês: Boimondeau, Peuple et Culture, Lebret; Dumazedier, Mounier, Freinet, Maritain, etc. Na 32 Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC (1980), o professor Paulo Rosas, criador das Praças de Cultura do MCP, relatou as realizações da organização até setembro de 1962: 201 escolas, com 626 turmas; 646 alunos;rede de escolas radio-fonicas; um centro de artes plásticas e artesanato; 452 professores e 174 monitores ministrando o ensino correspondente a 19 grau, supletivo, supletivo, educação educação de base e edacação edacação artística; artística; uma escola para motoristasmotoristas- mecânicos; mecânicos; cinco praças de cultura (estas praças levavam ao povo local: biblioteca, teatro, cinema, teleclube, música, orientação pedagógica, jogos infantis, educação física); Centro de Cultura Dona Olegarinha; círculos de cultura; galeria de arte; conjunto teatral, etc. A visão de mundo do MCP não era a da produção de bens culturais para Posterior doação ao povo. Pelo contrário, a participação do povo no processo de elaboração da cultura foi fundamental para os pernambucanos.
11 Por isso, em 1963, o MCP recomendou uma estratégia que privilegiasse atividades que se caracterizassem: a) pela oferta de assessoramento a esforços criadores de cultura desenvolvidos pelos núcleos de cultura das próprias organizações populares; b) pela aplicação das várias modalidades de incentivos ao surgimento, ao crescimento e à multiplicação de tais fontes produtoras de cultura popular; c) pela criação de mecanismos de estímulo e de coordenação capazes de criar interdependências e ajudas mútuas entre as diversas organizações nos seus diversos níveis de existência social, facilitando desse modo que as deficiências deficiências de umas sejam completadas pelas potencialidade potencialidadess de outras è permitindo permitindo,, em última análise, que as mais atrasadas encontrem condições favoráveis pata ascender ao nível das mais adiantadas. É um erro grosseiro interpretar os tempos do populoso como todo mundo calçando do mesmo modelo popu populis lista. ta. No tecido tecido do populo populoso so emergi emergiram ram alguma algumass propos propostas tas marcad marcadame amente nte popula populares res e de pensamento coletivo construído em termos sérios; Não propostas paternalistas e eleitoreiras. Basta uma reflexão maior sobre esta última letra c, por exemplo. Seu alcance é o de um caminhar coletivo, solidário, de todos, sem cultos a personalidades políticas. Sem caudilhismos. Democrático. - Mas, por que MCP? O melhor é dar a palavra ao próprio MCP que abriu o seu Plano de Ação para 1963 com o seguinte seguinte diagnóstico: diagnóstico: Um movimento movimento de cultura cultura popular só surge quando quando o balanço das relações de poder começa a ser favorável aos setores populares da comunidade e desfavorável aos seus setores de elite . Esta nova situação caracteriza, de modo genérico, o quadro atua a vida brasileira. No caso particular particular de Pernambuco, Pernambuco, primeirament primeiramentee em Recife, logo depois depois em todo o Estado, Estado, aquele aquele assenso democrático assumiu proporções inéditas, daí resultando um elemento qualitativamente novo na configuração do movimento de cultura popular. Em Recife, e a seguir em Pernambuco, as forças pop popul ular ares es e demo democr crát ática icass logr lograr aram am se faze fazerr repr repres esen enta tarr nos nos post postos os-c -cha have ve do gove govern rnoo e da administração. A ocorrência dessa conquista, alcançada através do esforço organizado das massas populares, criou novas condições que se traduzem na possibilidade de movimento de cultura popular ser financiado por recursos públicos e ser apoiado pelos poderes públicos. Tal fato é praticamente inexistente no resto do país, onde, via de regra, os movimentos de cultura popular encontram, como condições adversas a sua existência e ao seu funcionamento, a hostilidade do poder público e a ausência de dotações orçamentárias para fins de cultura popular.
12 O movimento popular gera o movimento de cultura popular. O movimento popular, ao atingir determinada etapa de seu processo de desenvolvimento, experimenta a necessidade de liquidar certos entraves de ordem cultural que se apresentam como barreiras características daquela etapa obstaculizando a passagem para a etapa seguinte. A superação de tais dificuldades se apresenta assim como condição para o prosseguimento do processo. O movimento popular não gera um movimento cultural qualquer. Gera, precisamente um movimento de cultura popular . Os interesses culturais do movimento popular portanto, tem caráter especifico exprimem a necessidade e uma produção cultural a um só tempo voltada para as massas e destinada-a elevar ó nível de consciência social das forças que integram, ou podem vir a integrar o movimento popular. A demanda por uma consciência popular-adequada ao real e possuída do projeto de transformá-lo é característica do movimento popular porque esse se assenta nas três seguintes pressuposições: a) só o povo pode resolver os problemas populares b) tais problemas sé apresentam como tuna totalidade de efeitos que não pode ser corrigida senão pela supressão de suas causas radicadas nas estruturas sociais vigentes; c) o instrumento que efetua a transformação projetada é a luta política guiada por idéias que representam adequadamente a realidade objetiva Nas palavras do MCP percebe-se a forte congruência política/ cultura popular. O segmento político; aqui identificado como um assenso democrático de proporções inéditas em Pernambuco, é conseqüência das vitórias eleitorais da Frente do Recife, competentemente costuradas por Pelópidas Silveira, Miguel Arraes e outras lideranças populares. A Frente do Recife, congregando as forças progressistas e alguns segmentos liberais e conservadores modernos, permitiu um programa de democratização do poder decisório em Pernambuco, a principal "Casa-Grande" do Nordeste oligárquico. E, na medida em que se criava um canal efetivo de comunicações-decisões massa/poder político, foi possível a prática de uma política de cultura popular/educação alternativa à fechada universidade e, de um modo geral, à escola elitista, formal, tradicional. Assim, a educação popular vai se concretizar num instrumento em favor
da transformação social, pois o seu
compromisso remete às forças-políticas que se apóiam, no movimento popular. Por isso diz o documento do mcp que o movimento popular gera o movimento de cultura popular.
13 Há um esforço de síntese, de caminhar juntos, movimento popular/movimento de cultura popular. Nos limites deste trabalho seria impossível relacionar todas as experiências e todos os instrumentos de trabalho criados pelo MCP, mas também seria impossível deixar de mencionar a edição de uma cartilha (Livro de leitura) produzida por Norma Porto Carreiro Coelho e Josina Maria Lopes Godoy com o objetivo de alfabetizar adultos, respeitando o seu universo cultural e, também, que é no âmbito do MCP que vai ocorrer a primeira gestação do Sistema Paulo Freire (janeiro de 1962).
O SISTEMA PAULO FREIRE O Centro de Cultura Dona Olegarinha é, para a esquerda cristã, um dos "santuários" mais caros ("santuário" na concepção da Guerra do Vietnam). Ali nasceu o Método Paulo Freire, uma das armas mais utilizadas pelos jovens católicos radicais" (Kadt) dos anos 60. O Centro Dona Olegarinha, do MCP, fundado no Poço da Panela (outro local histórico do Recife, onde, no século XIX, funcionou um dos núcleos de luta pela Abolição), organizou-se em colaboração com a paróquia de Casa Forte, que lhe cedeu uma casa para sua instalação. Na proposta de criação do Centro, encaminhada ao MCP, afirmou Paulo Freire: O Centro de Cultura é uma unidade educativa enfeixando um conjunto de motivos que agregam grupos, que os levam a atividades de objetivos semelhantes. Estas atividades variadas, resposta a variações de núcleos diferentes de motivação, se acham porém, entrelaçadas e sistematizadas, possibilitando assim um trabalho organicamente educativo. A televisão, a leitura, a costura e o arranjo de casa, o recreio e a educação dos filhos são motivos geradores de atividades, a congregar grupos, a se alongarem em clubes, que compõem o "Centro de Cultura". Assim haverá tantos clubes no Centro de Cultura quantos sejam os núcleos motivadores de atividades específicas. (...) Os Clubes dentro do Centro são dimensões próprias do Centro. Em janeiro de 1962 foi feita a primeira tentativa de alfabetização de adultos (quatro homens e uma mulher), empregando um método eclético e com ajuda de meios visuais - uma proposta de Paulo Freire. "Em dois meses, com aproximadamente trinta horas, um dos alunos estava lendo trechos relativamente difíceis (...). Em março formou-se nova turma, para repetir a experiência, obtendo-se resultados semelhantes" - como informa, em dissertação para o Curso de Serviço Social de Pernambuco, Zaira Ary, coordenadora do Centro de Cultura Dona Olegarinha até novembro de 1962.
14 É importante visualizar no Sistema Paulo Freire (evolução do Método): a História, a Antropologia Cultural e a Metodologia. Em termos de História, já antecipamos, no capítulo anterior, a sua visão, que é a da ocorrência de um trânsito do povo brasileiro, nos anos 60. Nesse processo econômico, emergiria o fenômeno que Mannhein chama de "democratização fundamental", que implica uma crescente e irreversível ativação do povo no seu próprio processo histórico, abrindo leques de participação interdependentes de ordem econômico-social-político-cultural. O povo deixa de ser objeto para ser sujeito. Naturalmente, passava por esta postura uma forte influência de Álvaro Vieira Pinto, do desenvolvimento nacionalista, do ISEB, do pensamento da época, enfim. Em termos "de Antropologia Cultural, é o próprio Freire que afirma: Pareceu-nos (...) que o caminho seria levarmos ao analfabeto, através de seduções, o conceito antropológico de cultura. A distinção entre os dois mundos: o mundo da natureza e o da cultura. O papel ativo do homem em sua e com a sua realidade. O sentido de mediação que tem a natureza passa as relações e comunicações dos homens. A cultura como acrescentamento que o homem faz ao mundo que ele não fez.
A Metodologia do Sistema Paulo Freire implica o cumprimento das conhecidas etapas que devem ser executadas na seguinte ordem: levantamento do universo vocabular do grupo que se vai alfabetizar; seleção neste universo dos vocábulos geradores, sob um duplo critério da riqueza fonêmica e o da pluralidade do engajamento na realidade local, regional, nacional; criação de situações existenciais típicas do grupo que se vai alfabetizar; criação de fichas-roteiros, que auxiliam os coordenadores de debates no trabalho; feitura de fichas com a decomposição das famílias fonémicas correspondentes aos vocábulos geradores. No clima das Reformas de Base do Governo de Jango, o Sistema Paulo Freire foi um verdadeiro achado. Através dele seria possível - era a ,previsão - acrescentar cinco milhões de eleitores ao corpo eleitoral em 1965 e assim desequilibrar o poder da oligarquia em favor do movimento popular. De janeiro de 1962 (Dona Olegarinha) até final de 1963 e início de 1964, a proposta Paulo Freire de alfabetização em 30 horas saiu dos limites de uma quase anônima experiência com cinco analfabetos para ser adotada nacional e oficialmente como proposta do governo federal.
15 0 seu grande teste ocorreu em Angicos, no interior do Rio Grande do Norte, quando o presidente da República, acompanhado do governador do Estado, presenciou a sua aula de encerramento, em 2 de abril de 1963 e afirmou: “Hoje, minhas senhoras e meus senhores, nestas classes, aprende a população pobre e analfabeta de Angicos as primeiras letras (...), mas, acima de todo, alunos e alunas, jovens e adultos, todos estarão capacitados para ler também a grande Cartilha da República: a Constituição de nossa Pátria, que lhes fez cidadãos e que tem o dever de lhes proporcionar este mínimo de alfabetização”.
Quebrando o protocolo falou, então, um dos alunos alfabetizados, o Sr. Antônio Ferreira que, entre outras coisas, afirmou: Naquele tempo anterior veio o presidente Getúlio Vargas matar a "fome da barriga" - que é uma doença fácil de ,curar. Agora, na época atual, veio 0 nosso presidente João Goulart matar a precisão da cabeça que o pessoal todo tem necessidade de aprende. Temos muita necessidade das coisas que nós não sabia e que hoje estamos sabendo. Em outra hora nós era massa, e hoje já não somos massa, estamos sendo povo.
Essa distinção entre massa e povo havia sido incorporada ao discurso da esquerda cristã dos anos 60 como sua marca registrada..: “A Campanha De Pé No Chão Também Se Aprende A Ler” Em ordem cronológica o segundo movimento de cultura popular a emergir foi a Campanha De Pé No Chão Também Se Aprende A Ler. desenvolvida diretamente pela Secretaria Municipal de Natal (Rio Grande do Norte) na administração do prefeito Djalma Maranhão: fevereiro de 1961. Aqui também a congruência movimento popular educação popular é indissolúvel. De Pé No Chão foi fruto dos compromissos eleitorais do candidato Djalma Maranhão, quando concorreu à Prefeitura de Natal em 1960. Então, as forças progressistas, nacionalistas, de esquerda, estruturaram a campanha de seu candidato em organizações suprapartidárias chamadas "Comitês Nacionalistas" ou "Comitês Populares" ou "de Rua", face a uma conjuntura política confusa, dividida em 13 legendas partidárias. A exemplo da Frente do Recife, em Natal formou-se um arco político muito amplo: de conservadores modernos aos jovens custos radicais e aos comunistas.
16 Durante a campanha foram organizados 160 comitês, numa população de 16G mil habitantes. Nesses comitês eram discutidas as questões sob uma ótica municipal estadual/nacional/internacional, objetivando o fortalecimento do movimento popular. Além da mobilização política os problemas mais urgentes dos bairros e as reivindicações mais veementes da população. Após convenções de bairros os comitês promoveram a Convenção Municipal, e esta, ao consolidar as listas das reivindicações das bases, encontrou a "escola para todos" e a "erradicação do analfabetismo" como a prioridade de número um. Ali estava escrita, então, a plataforma do candidato e o programa do futuro prefeito. Djalma Maranhão foi vitorioso nas urnas com 66% dos votos. A administração de Djalma Maranhão, que se iniciou em novembro de 1960, começou repetindo a experiência educacional de sua gestão anterior (1956-1959), instalando o que se chamava na época de "escolinhas", isto é, a utilização de salas disponíveis, adequadas ao funcionamento de uma classe de aula. Os custos assumidos pela prefeitura se restringiam ao pagamento de um pro-labore a um monitor, instalações de carteiras escolares, distribuição de material didático e merenda. As demais despesas eram custeadas pela comunidade: igrejas de todos os credos, sindicatos, cinemas, teatros, cooperativas, albergues noturnos; clubes de futebol, de folclore, etc. Apesar do grande esforço desenvolvido (em meados de 1963 estavam em funcionamento 271 "escolinhas"), era impossível dirigir a ação educativa para os bolsões de analfabetismo e miséria que se localizavam na periferia da cidade, pois a abertura dessas classes se fazia de forma aleatória, de acordo com as possibilidades da comunidade e não da vontade do poder público. Em janeiro de 1961, o Secretário Municipal de Educação, Moacyr de Góes, se reuniu com o Comitê Nacionalista do l3airro das Rocas e recolocou a questão: o povo e o prefeito querem erradicar o analfabetismo; mas, como construir escolas se não há dinheiro? Após 'mais de duas horas de discussão com 40 ou 50 homens e mulheres, veio uma sugestão do grupo: - "Se não tem dinheiro para fazer uma escola de alvenaria, faça uma escola de palha, mas faça a escola"! A partir daí, a discussão se direcionou em detalhar a sugestão, votar aprovar a proposta, que foi, posteriormente, encampada pelo prefeito. Em 23 de fevereiro de 1961, Djalma Maranhão, pessoalmente, recrutava os alunos para as aulas que se iniciavam. no conjunto de classes cobertas de palha de coqueiro sobre chão de barro batido que veio a ser chamado de Acampamento Escolar das Rocas.
17 Um acampamento escolar era integrado de vários galpões de 30 m x 8m. Cada um era dividido em quatro partes (classes) através de pranchas de madeira, utilizadas como quadro-de-giz e quadro-mural.. Em 1961 construíram-se dois acampamentos, nos bairros de Rocas e Carrasco. Em 1962, o número cresceu para nove: Quintas, Conceição, Granja, Nova Descoberta, Aparecida e Igapó: Com os dois anteriores, cobriam-se os limites da cidade. 0 funcionamento se fazia em três turnos. Resolvido o problema do espaço físico para o funcionamento das
classes de alfabetização e
primeiras séries primárias (pelo menos em termos de emergência), De Pé No Chão se desdobrou em uma série de projetos que sinalizaram etapas, as quais, em síntese, foram as seguintes: a) Ensino Mutuo. Em face da reação de alguns adultos a comparecer à (ainda não surgira o Método Paulo Freire e leitura para adultos),
escola para a alfabetização
De Pé No Chão ainda não editara o seu Livro de
os secundarias alfabetizavam esses adultos nas próprias residências destes,
em pequenos grupos. b) Praças de Cultura. Urbanização de uma área em torno de um parque
infantil, quadra de
esportes e posto de empréstimo de livros (biblioteca). Em 1962 funcionavam 10 destas "praças", experiência aprendida no MCP. c) Centro de Formação de Professores. Etapa preparatória à superação da fase de emergência. Funcionamento em três níveis: Cursos de Emergência, treinando monitores para a campanha em três meses; Ginásio Normal, em quatro anos; Colégio Pedagógico, em mais três anos com Escola de Demonstração. Prédio construído em alvenaria e devidamente instalado em moldes acadêmicos. d) Campanha De Pé No Chão Também Se Aprende Cima Profissão. Em 1963, funcionavam cerca de 10 cursos de iniciação profissional, como extensão da primeira campanha. e)Interiorizarão da Campanha. Convênios de assessoramento técnico-pedagógico com sete prefeituras do interior do Rio Grande do Norte em 1963. Previsão para 1964:40 convênios.f) Aplicação do Método Paulo Freire. Funcionamento de cinco círculos de cultura, com dez classes. g)Escola Brasileira Construída com Dinheiro Brasileiro, Primeira ajuda financeira do governo federal (Ministro Paulo de Tarso), que possibilitou a construção de pequenas salas de aula de alvenaria, partindo de estruturas metálicas pré-fabricadas. Estas classes acrescentavam-se aosacampamentos, que continuavam funcionando. 0 seu nome revela o conflito ideológico do governo da prefeitura com o governo do Estado, que ampliava a sua rede escolar com financiamento norte-americano da Aliança para o Progresso.
18 Em termos estatísticos, De Pé No Chão registrou os seguintes dados quantitativos: Discentes: 1961: 2.000 alunos em março e 8.000 alunos em dezembro; 1962: I 5.000 alunos , 1963: 17.000 alunos só em Natal (não há dados do interior). Docentes qualificados: 1961 : 243 monitores; 1962: 410 monitores e 26 orientadores¡ supervisores. 1963: 500 monitores e 32 orientadores/ supervisores. Índices de aprovação: 1961 : 60% 1962: 74% 1963: 85% 0 custo-aluno médio anual de Pé No Chão era de menos de dois dólares. Ao longo de seu processo, De Pé No Chão enfrentou três desafios básicos, aos quais respondeu com soluções que estavam ao seu alcance de movimento pobre que se desdobrava, com as próprias forças, no meio de uma sociedade terceiro-mundista, consequentemente, pobre: a~ 0 espaço físico; b ) A qualificação de seu pessoal docente ; c) A criação de seu próprio material didático. A primeira resposta, como já foi visto, ocorreu com a solução do acampamento, proposta pelo movimento popular. A qualificação docente foi uma questão mais difícil. Em Natal só havia uma Escola Normal, fundada 50 anos atrás. A universidade estava em processo de implantação. A solução foi a criação de cursos de emergência para qualificar docentes leigos, através de formação intensiva.
19 A criatividade se manifestou no esquema de acompanhamento do desempenho profissional desses docentes: 20 monitores trabalhavam sob a orientação/supervisão de um docente diplomado por Escola Normal ou Faculdade de Filosofia. Aliou-se, então, o pensamento acadêmico à prática popular, isto é, somou-se a técnica dos docentes diplomados à criatividade dos monitores, estes verdadeiros "doutores" em superar dificuldades sociais pela própria vivência, sabendo "dar o pulo do gato" e "tirar leite de pedra". . 0 conhecimento passou a ser construído como resultante de duas vertentes, a acadêmica e a popular, e cada nascente oferecia uma contribuição valiosa para o processo de educação. A criação do material didático foi o terceiro grande desafio. No início, De Pé No Chão distribuía, criticamente, as cartilhas tradicionais. Assim, crianças que não tinham em casa feijão nem arroz alfabetizavam-se na escola com a silabação de "ovos de páscoa". Evidentemente este conteúdo não tinha nada a ver com a proposta. Então, no final de 1962 e início de 1963,DE Pé No Chão passou a produzir o seu próprio material didático, através da metodologia conhecida como "unidades de trabalho". Semanalmente a orientadora/supervisora reunia-se com os seus vinte monitores. Mas, essa reunião não seria mais apenas de revisão e correção do trabalho docente dos monitores. Sua pauta ganhava mais um item : coletar e discutir sugestões para os conteúdos que deveriam ser ministrados. Quinzenalmente as orientadoras supervisoras reuniam-se com a direç3o e a equipe técnica do Centro de Formação de Professores. Em um dia de trabalho, as sugestões dos monitores eram estudadas, compatibilizadas; definia-se uma direção de aprendizagem e esta "matéria-prima" transformava-se nos conteúdos propedêuticos definidos em níveis de alfabetização, 1ª, 2ª, 3ª séries primárias, os quais, mimeografados, voltavam às salas de aula dos monitores. Na esteira do tempo, De Pé No Chão deixou, possivelmente, algumas heranças, em função de seus processos de rupturas: a) Ruptura com o pensamento colonizador, na tentativa de pensar por si próprio; b) Ruptura do círculo pauperismo-analfabetismo-pauperismo; c) Ruptura com o autoritarismo oligárquico no processo de decisões; d)
Ruptura com a hierarquia acadêmica, ao gerar seus próprios quadros docentes e) Ruptura com a "ditadura" do prédio escolar (não confundir escola com prédio escolar); f) Ruptura com a teoria e a prática da classe dominante de que ela éa
única depositária da cultura e doadora de conteúdos e formas de
educação; isto é, demonstrou a capacidade das classes subordinadas para
propor e executar uma política e uma prática de educação.
20 Na primeira parte dos anos 60, em função da crise sócio-político-ecònômica e dá busca de soluções alternativas, houve uma geral expectativa em relação ao novo. Assim, os movimentos de cultura popular
foram permeados também por uma forte
influência de dois importantes acontecimentos de ordem internacional : a revolução cubana e o Concilio Vaticano II. No Brasil, no clima das Reformas de Base os comunistas trouxeram o PCB para uma semi-clandestinidade e os católicos concluíram um caminho de lutas da JUC de contestação ao capitalismo, criando a Ação Popular - AP, que optou pelo socialismo. Em l96l , a nova diretoria da UNE foi eleita, integrando
em "frente única"
cristãos e marxistas. De Pé No Chão criou um espaço
para a prática dessa
proposta: lado a lado, sem perda de suas identidades
ideológicas,
comunistas e cristãos de esquerda, junto a liberais e conservadores modernos, construíam uma política de cultura popular, expressão educacional do movimento popular no Rio Grande do Norte. Isto é visível no documento que De Pé No Chão apresentou ao Nacional de Alfabetização e Cultura Popular (Recife, 1963), que deve ter sido o seu limite ideológico, permeado AP e do PCB e que terminava com a legenda de José
I Encontro documento esse
pelas influências da Marli, o herói
histórico do mais antigo processo de libertação de Cuba: Há (. . .) um entrelaçamento dialético entre cultura popular e libertação nacional - socialismo e luta anti-imperialista. Por conseguinte, embora pareça em princípio paradoxal, a cultura popular tem papel de instrumento de revolução econômico-social, mas, em última instância, a afirmação e vitória dessa revolução é que irá possibilitar o surgimento das mais autênticas criações populares, livres das alienações que se processam no plano político e econômico. Fica claro, portanto, o mais profundo sentido dialético da , revolução popular que não é um fim, porém um meio de conseguir a libertação total do povo, fazendo-o construtor do seu destino. "NENHUM POVO DONO DO SEU Destino SE ANTES NÃO DONO DE SUA CULTURA".
21 Movimento de Educação de Base Em 21 de março de 1961, o governo federal (Jânio Quadros) institucionalizou os entendimentos com a Igreja Católica (decreto 50370), e criou-se o MEB, em ordem cronológica a terceira organização de cultura popular do período. O principal veículo utilizado pelo MEB foi o rádio fruto de experiências acumuladas pela Igreja, principalmente no SAR (Serviço de Assistência Rural) no Rio Grande do Norte. A área inicial de atuação do MEB foi a do subdesenvolvimento brasileiro Norte, Nordeste e Centro-Oeste -, expandindo-se posteriormente para outras regiões (decreto 52267/63). 0 MEB estruturou-se através de um conselho diretor nacional, comissão executiva nacional, equipe estadual e equipes locais. O seu êxito maior foi registrado quando as equipes locais assumiram papéis mais decisórios no processo e a intervenção dos leigos no seio da hierarquia manifestou-se através de iniciativas mais adequadas às realidades onde atuavam. Assim, o I Encontro de Coordenadores (dezembro, 1962) tomou como base "a idéia de que a educação deveria ser considerada como comunicação a serviço da transformação do mundo" e que o MEB seria um movimento "engajado com o povo neste trabalho de mudança social, comprometido com este povo e nunca com qualquer tipo de estrutura social ou qualquer instituição que pretenda substituir o povo". Para o MEB, a conscientização era intrínseca à própria educação,ela ajudava alguém a tomar consciência do que são os outros (comunicação entre sujeitos) e do que é o mundo (coisa intencionada), como informa José Pereira Peixoto. A tendência católica radical produziu alguns documentos importantes no período, dos quais destacaram-se o texto Algumas diretrizes de um ideal histórico cristão para o povo brasileiro (congresso comemorativo dos dez anos da 1UC) e o Documento Básico da Ação Popular. O MEB foi o único movimento de educação e de cultura popular que sobreviveu ao golpe de Estado de 1964, por força do convênio com a União que fixara as datas-base de 1961 /65 o recuo da hierarquia da Igreja face novas condições
políticas, em 1966, o MEB "perdeu as suas características de Movimento de Educação Popular e tornou-se uma forma tardia de Educação Fundamental", como analisa Carlos Rodrigues Brandão. A estatística de 1964 é indicativa da perda do impulso já registrado: em dezembro restam 4.554 das 6.218 escolas radiofônicas atuantes em março do mesmo ano... Que o MEB fale por eles mesmo num dos seus momentos mais altos (1963), através do documento Cultura popular: notas para estudo elaborado pela sua Equipe Nacional, resgatado e publicado por Osmar Fávero:
22 No Brasil, há reconhecimento da situação por parte dos grupos culturalmente marginalizados. Não há, no entanto, plena consciência de todas as implicações dessa marginalizarão, no plano da pessoa humana. Há; por outro lado, grupos de pessoas - operários sindicalizados, camponeses politicamente organizados, estudantes, militantes políticos - para os quais o desnível se tornou consciente, obrigando-os a optar por uma ação transformadora dos padrões culturais, políticos, econômicos e sociais que o determinam. Dessa ação, resulta um conflito ideológico, já que os grupos dominantes (social, econômica, política e culturalmente) a ela opuseram seus interesses. Daí resulta que qualquer atitude frente à cultura popular, é necessariamente situada no conflito ideológico . Cultura popular no Brasil não é um fenômeno neutro, indiferente; ao contrário, nasce do conflito e nele desemboca necessariamente. Centro Popular de Cultura 0 Arena era o porta-voz das massas populares num teatro de cento e cinqüenta lugares. Esta irônica e sofrida constatação da realidade, diagnosticada por Oduvaldo Viana Filho - o Vianinha - foi o ponto de partida para a criação do Centro Popular de Cultura, órgão cultural da UNE, com regimento interno próprio e autonomia administrativa e financeira, cronologicamente o quarto grande movimento de cultura popular dos anos 60. Agora, o teatro não tinha apenas 150 lugares: a platéia era todo 0 território nacional, ocupado pela UNE volante. O sonho de Vianinha ocupava um maior espaço: É preciso produzir conscientização em massa, em escala industrial. Só assim é possível fazer frente ao poder econômico que produz alienação em massa. Nos primeiros momentos do CPC, ao lado de Vaninha, estavam
Leon Hirzman e Carlos Estevam Martins, que foi o seu primeiro diretor, seguindo-se Carlos Diegues e Ferreira Gullar. O referencial teórico do CPC está explicitado em dois textos básicos para a compreensão do período e da proposta: A questão da cultura popular, de Carlos Estevam, e A cultura posta em questão, de Ferreira Gullar. 0 primeiro afirma que é necessário distinguir a arte do povo da arte popular e, ambas, da arte praticada pelo CPC a que ele chama de , "arte popular revolucionária ".
23 O CPC alcançou uma produção variada em teatro (montagem de cerca de vinte peças), cinema (um filme e um documentário), música (além de shows, a gravação de dois discos), literatura (vinte e seis títulos editados na coleção Cadernos do Povo, além de outras publicações), cursos de extensão, etc. 0 teatro de rua, de "caixotinho", foi o forte do CPC; mas o filme Cinco vezes favela e o disco O povo canta alcançaram, também, grande repercussão. A partir de setembro de 1963 (I Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular), o CPC reviu a sua diretriz política e começou a abrir maior espaço para trabalhos mais permanentes e sistemáticos junto às classes subordinadas, a partir da alfabetização. O projeto, mais ambicioso do CPC terá sido, possivelmente, a construção do seu próprio teatro no prédio da UNE, situado na'Praia do Flamengo, no Rio, que foi inaugurado no dia 30 de março de 1964. No dia seguinte, este teatro foi incendiado pelos lacerdinhas, no clima de "caça às bruxas" gerado pelo golpe de Estado. Revisitando o Manifesto do CPC (março, 1962), no texto A questão da cultura popular encontra-se uma visão de mundo jovem e otimista: Pela investigação, pela análise e o devassamento do mundo objetivo, nossa arte está em condições de transformar a consciência de nosso público e de fazer nascer no espírito do povo uma evidência radicalmente nova: a compreensão concreta do processo pelo qual a exterioridade se descoisifica, a naturalidade das coisas se dissolve e se transmuda. (...) A arte popular revolucionária aí encontra o seu eixo mestre: a transmissão do conceito de inversão da práxis, o conceito do movimento dialético segundo o qual o homem aparece como o próprio autor das condições históricas de sua existência. (...) Nenhuma arte poderia se propor finalidade mais alta que esta de se alinhar lado a lado com as forças que atuam no sentido da passagem do reino da necessidade para o reino da liberdade. Completando a moldura ,
Os quatro movimentos pioneiros de educação e cultura popular dos anos 60 e mais o Sistema Paulo Freire fazem parte de uma História na qual o país buscava caminhos alternativos às propostas tradicionais e conservadoras. Todos foram filhos da crise sócio-político-econômicá dos anos 50-60`e terminaram por ser peças da estratégia política maior: as propostas de reformas de Base que sepultaram o parlamentarismo e reintroduziram Jango no presidencialismo. Todos caminharam na mesma direção.
24
Todos receberam recursos públicos, mas o modo e os objetivos de sua aplicação foram diferenciados. O MCP, cuja meta era assegurar educação gratuita para todos, por ser uma sociedade civil, constituiu-se numa rede paralela a do ensino público então existente. O MEB teve e tem os seus objetivos confessionais e catequéticós, mesmo que às vezes não estejam explicitados. 0 CPC tentou organizar-se como empresa prestadora de serviços, mas teve de depender da União, pelo menos para dois de seus projetos principais: a construção do teatro no prédio da UNE e a campanha de alfabetização (1963). único movimento que aplicou recursos públicos dentro da rede de escolas públicas foi a Campanha de Pé no chão também se aprende a ler. por isso em natal, a defesa da escola pública não foi somente um discurso : a prática ocorreu na Secretaria Municipal de Educação com a implantação e implementação de uma rede escolar que assegurou matrícula para todos numa política de ensino gratuito e laico. Por outro lado, o único movimento que penetrou eficientemente na área rural foi o MEB. Finalmente, para completar a moldura histórica do período, registre-se o impulso de proliferação dos movimentos de cultura popular no Brasil : se em 1960-1961 surgiram as quatro organizações já referidas, no I Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular, realizado em setembro de 1963 no Recife, estiveram presente 77 movimentos, dos quais desenvolviam atividades de alfabetização de adultos. Ó plenário de 158 delegados, 69 observadores e 22 convidados promoveu o intercâmbio de experiências e estudou a viabilidade de se criar uma coordenação nacional dessas organizações. 0 primeiro objetivo foi alcançado; o segundo, todavia, frustrou-se, apesar de uma segunda tentativa ter sido feita, quando da realização do Seminário Nacional de Cultura Popular (janeiro de 1964, Rio).
25 IV. 1964 - Os Acordos MEC-USAID: Em Direção aos "Anos de Chumbo" A tomada do poder no Brasil em 1964 não foi um simples golpe latinoamericano nem mais um pronunciamento, e sim uma articulação política de profundas raízes internas e externas, vinculada a interesses econômicos sólidos e com respaldas sociais expressivos. Não foi coisa de amadores. Tanto é assim que, passados os primeiros momentos de perplexidade, o novo Estado emergiu do figurino do IPES com objetivos programados, metas estabelecidas e, naturalmente, com os homens que se apossaram do poder. Como resultado da força, o Estado que se reorganizava optou pela coerção (no sentido usado por Gramsci) como caminho para difundir a sua concepção de mundo. A chamada "limpeza de área" - na linguagem dos eMs (Inquérito Policial Militar) - foi dirigida contra os setores Enais progressistas que, no governo anterior, tentaram alcançar a hegemonia em Sintonia com as classes populares subordinadas, no bojo das campanhas das reformas de base Os intelectuais comprometidos com a revolução, com o reformismo, ou mesmo com o liberalismo já não serviam, não eram confiáveis. No campo da educação houve um corte profundo, pois, aos olhos do novo sistema, a educação com só poderia ser "subversão". Como fazer o controle do sistema educacional, através de técnicas que facilitassem a divulgação da nova ideologia condizente com os interesses do capitalismo? Novos mecanismos foram desencadeados: a repressão se abateu sobre os intelectuais comprometidos com as reformas, e o Estado foi buscar meios de criar novos quadros. Não precisou procurar muito. A mão estava a sua fonte de poder: a Aliança para o Progresso. A USAID, agência confiável, desincumbiu-se da missão. Assumiu esta, assim, a tarefa da reordenação da educação nacional, sigilosamente, nas gestões de três ministros de Educação (Suplicy de
Lacerda, Raymundo Moniz de Aragão e Tarso Dutra) até que, ameaçado de processo de crime de responsabilidade pelo deputado Márcio Moreira Alves, o sr. Tarso Dutra prestou informações ao Congresso Nacional e o véu do segredo começou a ser dissipado.
26 1964 é o oposto de 1958, mas, a bem da verdade, diga-se que a interferência norte-americana nas coisas da educação nacional, camuflada de assistência técnica já vinha de longe e não era um fenômeno exclusivamente brasileiro Esses interesses se manifestam desde a Guerra Fria e cresceram no final dos governos Dutra e JK : Todavia, foi no governo Castelo Branco que a desnacionalização do campo educacional tomou formas nunca vistas. Os Acordos MEC-USAID cobriram todo o espectro da educação nacional , isto é, o ensino primário, médio e superior a articulação entre os diversos níveis, o treinamento de professores e a produção e veicularão de livros didáticos. A proposta da USAID não deixava brecha. ó mesmo a reação estudantil, o amadurecimento do professorado e a denúncia de políticos nacionalistas com acesso à opinião pública evitaram a total demissão brasileira no processo decisório da educação nacional. Melhor do que falar é demonstrar. Daí a transcrição da lista das ementas dos acordos MEC-USAID e suas respectivas datas, compilada por Otaíza de Oliveira Romanelli: a) 26 de junho de 1964: Acordo MEC-USAID para Aperfeiçoamento do Ensino Primário; b) 31 de março de 1965: Acordo MECContap (Conselho de Cooperação Técnica da Aliança para o Progresso)-USAID para melhoria do ensino médio; c) 29 de dezembro, de 1965 : Acordo MECUSAID para dar continuidade e suplementar com recursos e pessoal o primeiro acordo para o ensino primário; d) S de maio de 1966: Acordo do Ministério da AgriculturaContap-USAID, para treinamento de técnicos ruxais; e) 24 de junho de 1966: Acordo MEC-Contap-USAID, de assessoria para a expansão e aperfeiçoamento do quadro de professores de ensino médio e proposta de reformulação das faculdades de Filosofia do Brasil; f) 30 de junho de 1966: Acordo MEC-USAID, de assessoria para a modernização da administração universitária; g) 30 de dezembro de 1966: Acordo MEC-INEP CONtaP-USAID. SOB a forma de termo aditivo dos acordos para aperfeiçoamento do ensino primária com a secundária e a superior"; h) 30 de dezembro de 1966: Acordo MEC-Sudene-ContapUSAID,ypaia criação do Centro de Treinamento Educacional de Pernambuco; i) 6 de janeiro de 1967: Acordo MEC-SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros)USAID, de cooperação para publicações técnicas, científicas e educacionais (por, esse acordo, seriam colocados, no prazo de três anos, a contar de 1967, 51
milhões de livros nas escolas; ao MEC e ao SNEL
27 caberiam apenas responsabilidades de execução, mas aos técnicos da USAID todo o controle, desde os detalhes técnicos de fabricação do livro até os detalhes de maior importância como: elaboração, ilustração, editoração e distribuição de livros, além da orientação das editoras brasileiras no processo de compra de, direitos autorais de editores não-brasileiros, vale dizer, norte-americanos); j) Acordo MEC-USAá de reformulação do primeiro acordo de assessoria a modernização das universidades, então substituído pôr assessoria do planejamento do ensino superior, vigente até 30 de junho de 1969; k) 2? de novembro de Ï9b7: Acordo MEC-Contap-Usaid de cooperação para a continuidade do primeiro acordo relativo à orientação vocacional e treinamento de técnicos rurais; 1) 1 7 de janeiro de 1968: Acordo MEC-USAID para dar continuidade e complementar o primeiro acordo para desenvolvimento do ensino médio. 0s acordos MEC-USAID encerraram essa fase dos movimentos de ' educação e cultura popular, dos quais outras formas surgiram no final dos anos 60 e seguem vigorosas até hoje, como por exemplo as CEBs (Comunidades Eclesìais de Base). Aqueles movimentos tiveram os seus equívocos e debilidade, próprios e uma época de fortes tendências culturalistas e de otimismo pedagógico além das limitações do nacionalismo que privilegiava a luta âmbito da sociedade. Mesmo assim tiveram a capacidade de se transformar, impulsiona os por uma prática junto as classes subordinadas. Assim, a crítica feita por José Willington Germano a um desses movimentos, parece falar a todos eles quando afirma: De um movimento que, de início, pretendia, simplesmente oferecer educação para todos, De Pé No Chão Também Se Aprender A Ler avança conceptualmente e passa a encarar a educação e a cultura como instrumentos de libertação. Não se tratava, pois, de um projeto que tivesse em vista integrar os marginalizados à sociedade, fornecendo aos indivíduos escolarizados a possibilidade de ascensão social. Tratava-se, isto sim, de transformar essa mesma sociedade, e a educação e a cultura exerceriam um papel preponderante
nesse processo. Os movimentos de educação e cultura popular foram destruídos e os seus educadores e aliados cassados, presos e exilados. Para eles, como para as lidera as dos trabalhadores, começa o caminho em direção aos anos de chumbo expressão que é título do belo filme de Margaréthe Von Trotta. Terminam os tempos da "Voz Ativa" e começa a girar a roda viva.
28 O golpe na educação
I. "Educação" pela Repressão No dia seguinte ao da posse do primeiro Presidente da República civil
depois de 20 anos de generais-presidentes, a imprensa
trouxe um balanço sintético da ditadura: 17 atos institucionais, 130 atos complementares (todos contra a Constituição, mesmo a da Junta Militar), 11 decretos secretos e 2.260 decretos-lei. Para não atrapalhar essa fúria legiferante do regime militar, o Congresso Nacional, mesmo mutilado por sucessivas casacões de mandatos de parlamentares, foi posto em recesso
forçado por três vezes. Foram
banidos do território nacional, por razões
políticas, 80 brasileiros.
Cerca de 400 pessoas foram mortas ou se encontram desaparecidas, devido à onda repressiva mais forte de nossa história. Uma dezena de milhar de brasileiros deixaram seu país em virtude perseguiç8es de caráter político-ideológico. medida tomada pelo governo imposto a todos considerados suspeitos
de ameaças e
A repressão foi a primeira
pelo golpe de 1964. Repress3o a tudo e
de práticas ou mesmo idéias
subversivas. A mera acusação de que uma
pessoa, um programa educativo ou
um livro tivesse inspiração "comunista" era suficiente para demissão, suspensão ou apreensão.
Assim, reitores foram demitidos, programas
educacionais e sistemas educativos foram atingidos. Alguns casos dramáticos exemplificarão isso. Anísio Teixeira, que ocupava a reitoria da Universidade de
Brasília, foi sumariamente demitido, logo nos
primeiros dias do golpe.
O Programa Nacional de Alfabetização, que
utilizava o Método Paulo
Freire, que o dirigia, foi liquidado, até
mesmo em termos financeiros.
Milhares de projetores de dia filmes,
importados da Polônia (o local de fabricação trazia a marca do "comunismo") foram vendidos a particulares
a preço de liquidação. O
Movimento de Educação de Base, desenvolvido
pela igreja Católica,
principalmente no Nordeste, foi contido por todos
os lados, tendo seu
material educativo apreendido, monitores perseguiOs integrantes da equipe dirigente da Campanha Aprender A Ler foram presos por seis meses,
dos e verbas cortadas. De Pé .No Chão Também de
no mínimo. Um oficial da
Marinha de Guerra assumiu o "comando" da
29 Secretaria de Educação do Município de Natal, ordenou o abandono dos acampamentos e a incineração dos acervos das bibliotecas. Interventores foram nomeados para a Universidade de Brasília, cada um deles dando sua contribuição pessoal para a descaracterização daquele empreendimento arrojado; a Cruzada ABC, com sede em Recife, dirigida por missionários norte-americanos e funcionando com generosas verbas do governo de seu país, procurava substituir o PNA e o MEB na educação das massas para incorporá-las ao desenvolvimento do capitalismo moderno. Na direção do sistema educacional, os defensores do ensino público e gratuito foram sendo substituídos pela aliança dos que lutavam pela hegemonia da escola particular subsidiada pelo Estado, com os militares empenhados na repressão às atividades por eles julgadas subversivas. Tomando mais uma vez o caso exemplar de Anísio Teixeira, além de ter sido demitido da reitoria da Universidade de Brasília, já em abril de 1964 não teve seu mandato renovado no Conselho Federal de Educação, de onde saiu, em princípios de 1968, com o silêncio cúmplice de seus colegas. Durmeval Trigueiro, outro ativo combatente pelo ensino público e gratuito, foi também retirado daquele conselho, além de ser compulsoriamente aposentado do cargo de professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Enquanto isso, os conselheiros que concordavam com as novas orientações da política educacional tinham seus mandatos sucessivamente renovados. Quebrava-se, assim, a resistência, remanescente no CFE, à colocação dos recursos governamentais a serviço dos interesses de agências internacionais e à submissão da política educacional brasileira aos seus ditames. Professores e estudantes universitários foram expulsos das instituições onde lecionavam ou estudavam. A denúncia de professores às comissões de investigação passou a ser um instrumento a mais de política universitária. A Universidade de São Paulo, das mais antigas, a maior e a mais conceituada das universidades brasileiras, foi palco dessa tenebrosa prática. O reitor Luís Antônio da Gama e Silva, ministro da Justiça e da Educação nos primeiros dias do governo golpista, aproveitou o período de caça às bruxas para demitir professores que lhe faziam oposição e consolidar seu poder na universidade. Mais tarde, como ministro da Justiça do general-presidente Costa e Silva, o professor Gama e Silva notabilizou-se por trazer sempre à
mão o rascunho de um elenco de medidas de endurecimento da repressão política, o que acabou vingando em 13 de dezembro de 1968, com a edição do Ato Institucional número 5.
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Até mesmo a competição propriamente acadêmica passou a ter a mediação da repressão política. Em 1964, Florestan Fernandes, o grande sociólogo da USP, preparava-se para disputar uma cátedra de sociologia naquela universidade. Para isso, tinha uma brilhante tese sobre a integração do negro na sociedade de classes, que veio a receber, posteriormente, importante prêmio internacional. Seu oponente, ao contrário, era uma pessoa cuja bibliografia a história da universidade brasileira não registra. Tinha, entretanto, o cacife de ser amigo do governador golpista Ademar de Barros. Pois bem, por interferência do governador, Florestan Fernandes foi preso às vésperas do concurso, o que deixava sem competidor o obscuro pretendente. Mas, como nos primeiros tempos do período de governo autoritário ainda havia algumas áreas de liberdade, a opinião pública reivindicou a imediata libertação de Florestan Fernandes. Solto a tempo, frustrou-se a conspiração policia-acadêmica, e Florestan Fernandes conquistou a merecida cátedra. Pouco tempo; porém, nela permaneceu, pois a onda repressiva acionada pelo Ato Institucional número 5 aposentou-o , retirando da USP e do meio universitário brasileiro um dos mais férteis de seus cientistas sociais. Beneficiaram-se, com isso, as universidades estrangeiras, que passaram a disputar o privilégio de ter Florestan Fernandes como professor visitante. Mas não foi apenas a alta administração do sistema educacional, os membros dos conselhos universitários e os grandes nomes da ciência que foram atingidos pela sanha repressiva. Funcionários do MEC, das secretarias estaduais e municipais de educação, e simples professores também foram demitidos ou, se mantidos em seus cargos, ameaçados constantemente; na tentativa de se obter, pelo medo, seu consentimento ao novo regime. O famigerado decreto-lei 477, de fevereiro de 1969, representou a expressão mais acabada das ameaças da repressão política e ideológica à universidade brasileira. Essa norma repressiva dizia que cometeria "infração disciplinar" o professor, o aluno ou o funcionário de estabelecimento de ensino público ou privado que se enquadrasse em diversos casos, entre os quais os seguintes: aliciar ou incitar à deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralisação de atividade escolar ou participar nesse movimento; praticar
atos destinados à organização de movimentos subversivos, passeatas, desfiles ou comícios não autorizados ou deles participar; conduzir ou realizar, confeccionar, imprimir, ter em depósito, distribuir material subversivo de qualquer natureza.
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Se o infrator fosse professor ou funcionário, seria demitido ( ou dispensado), e proibido de ser nomeado (ou admitido ou contratado) por qualquer outro estabelecimento de ensino pelo prazo de cinco anos. Se fosse estudante, seria desligado do curso, e proibido de se matricular em qualquer outro estabelecimento de ensino por três anos. A apuração das acusações de infração deveria ser feita por processo sumário, tudo correndo muito rápido, tendo o acusado apenas 48 horas para apresentar sua defesa. O processo seria conduzido por funcionário do estabelecimento de ensino, por iniciativa do dirigente do estabelecimento, da Divisão de Segurança e Informação do MEC ou "de qualquer outra autoridade ou pessoa". O mais incrível é que, embora o dirigente do estabelecimento fosse reconhecido agente da repressão, era, ao mesmo tempo, visado por ela. A simples remessa de auto de prisão em flagrante ou a mera comunicação do recebimento da denúncia criminal, feita por "autoridade competente", obrigava o diretor de colégio ou faculdade e reitor de universidade a instaurar o processo sumário. Se não fizesse isso, e não proferisse decisão em 48 horas depois de recebido o processo, o dirigente ficaria sujeito às penalidades do próprio decreto-lei, perdendo o cargo, sendo expulso do estabelecimento e proibido de lecionar, como um professor "subversivo" comum. Houve universidades que incluíram a maior parte dos dispositivos desse decreto-lei em seus estatutos, não podendo, é claro, impedir que outras contratassem os professores ou matriculassem os estudantes expulsos. A Universidade de Brasília, por exemplo, lançou mão desse expediente repetidas vezes. Em julho de 1976, o reitor capitão-de-mar-e-guerra José Carlos de Azevedo expulsou sete estudantes e suspendeu 12 por 18 meses; em julho de 1977, expulsou 30 e suspendeu 34 por períodos diversos, sem invocar o decreto-lei 477, pois o regimento da universidade era bastante para a aplicação dessas pesadas penas. Impossível é avaliar, com certeza, a eficácia dessa norma repressiva sobre os professores, mesmo sabendo-se que poucos foram expulsos com base nela ou na versão assimilada pelos estatutos de universidades e de faculdades. Seu "bom comportamento", a aceitação amarga da autocensura, foi a face escondida do tenebroso sucesso desse ato arbitrário.
Foi só em 1979, após muitos anos de lutas contra o decreto-lei 477 e as outras medidas repressivas do governo autoritário, que um projeto de lei tratando da representação estudantil foi aprovado pelo Congresso Nacional. Entre outras providências, revogava o decreto-lei 477, no que dizia respeito, também, aos professores e funcionários. Com isso, abriu-se espaço para a mudança dos estatutos e regimentos
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das universidades e faculdades naquilo em que procuravam se valer do draconiano decreto-lei. Mesmo antes de baixado o Ato Institucional n4 5 e seu descendente direto, o decreto-lei 477, todos os professores ou candidatos ao magistério eram considerados suspeitos de subversão, até que mostrassem o contrário. Tinham de provar que sobre eles não recaía culpa de subversão. As universidades passaram a exigir dos candidatos ao magistério, mesmo à precária categoria de colaborador, a apresentação do "atestado de ideologia", emitido pelas delegacias de ordem política e social das secretarias estaduais de segurança pública. As universidades enxertaram nas suas estruturas as assessorias de segurança e informação, ligadas à divisão correspondente do Ministério da Educação e às agências locais do Serviço Nacional de Informação. Com base nos pareceres dessas assessorias, professores tinham negados pedidos de bolsa de estudos e licenças para comparecer a congressos técnicos, professores visitantes eram vetados, e outras arbitrariedades do gênero foram abundantemente cometidas. Ainda não foi feito o balanço quantitativo dessa onda repressiva, de modo a se saber quantos professores e quantos estudantes tiveram seu trabalho ou seus estudos prejudicados pela perseguição política. Em geral, a imprensa dava mais destaque aos efeitos do decreto-lei 477 nas universidades públicas, pois seus atos eram divulgados em boletim, quando não no próprio Diário Oficial. No entanto, universidades e faculdades particulares lançavam mão desse instrumento repressivo para demitir professores que reclamavam de salários atrasados ou da pressão para aprovar certos estudantes e também para expulsar estudantes, como os de um curso de medicina que rejeitavam o "ensino" de anatomia por um professor que se resumia a ler o conhecido e antigo (antiquado?) compêndio de anatomia humana de Testut e Latarjet. No entanto, é possível fazer uma segura avaliação qualitativa. Desespero e a apatia foram os componentes do efeito da repressão nas escolas e nas
universidades. 0 desespero de uns levou ao abandono do magistério e do estudo e até mesmo aos equívocos da luta armada. A apatia de outros resultou no desleixo para com o ensino, no cinismo docente, tendo como contrapartida o desinteresse para com o estudo, expresso pela atitude estudantil de repetir o que o professor espera, mesmo o absurdo e o injusto, desde que a promoção estivesse assegurada. Entre o desespero e a apatia, caminhavam com dificuldade professores e estudantes que buscavam resguardar a dignidade de sua situação,
33 só possível num ambiente de liberdades democráticas. A história mostrou que esses resistentes tinham raz5o, e, progressivamente, os desesperados e os apáticos voltam a reunir-se a eles nas lutas pela democratização do ensino em nosso país.
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II. Educação: Grande Negócio Vitorioso o golpe de 1964, subiram ao poder os defensores do privativo na educação, aqueles que defendiam a desmontagem ou, pelo menos, a desaceleração do crescimento da rede pública de ensino. Em compensação, as verbas públicas destinadas ao ensino deveriam ser transferidas às escolas particulares que, ermitão, se encarregariam da escolarização das crianças e dos jovens. Só a iniciativa particular não tivesse interesse em abrir escolas é que a escola pública seria bem-vinda. Foi sintomática a participação de um dos mais ardilosos conspiradores e mais duros oponentes do presidente João Goulart, o governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, na elaboração de um projeto de lei de diretrizes e bases da educação nacional que nem mesmo procurava dissimular os interesses dos que usavam a escola como meio de acumulação de capital e/ou de influência ideológica. 0 governo golpista, e privatista em matéria de educação, não precisou mudar a lei. Foi só aplicá-la em proveito das escolas particulares. A ocupação dos postos-chave do Ministério da Educarão pelos privatistas foi facilitada pelo trabalho de sapa da propaganda ideológica da trama golpista, que teve sucesso em veicular a associação da imagem dos defensores da prioridade do ensino público (verbas públicas para o ensino público e gratuito) com a imagem, que os militares abominavam, de um regime "socialista", no qual o Estado teria o controle de toda a vida social. Para os militares desinformados, alvo principal da propaganda direitista, os que defendiam a destinação dos recursos públicos para a rede pública de ensino eram as mesmas pessoas que defendiam a desapropriação das terras, o estreitamento das relações comerciais, culturais e políticas com a União Soviética, com a China Popular e com Cuba, o "materialismo ateu" contra as "tradições cristãs" de nosso povo, e outros "pecados" parecidos. 0 Plano Nacional de Educação elaborado pelo Conselho Federal de Educação, em 1962, foi revisto em 1965, pelo mesmo conselho, já reorientado em função do peso dos privatistas no governo golpista.
35 Na revisão, além de deslocar para mais adiante as metas originais - como a de matricar a população de 7 a 11 anos de idade em escolas primárias -, o CFE aumentou os recursos a serem transferidos para o setor privado. A versão de 1962 daquele plano previa que 3% dos recursos do Fundo Nacional do Ensino Primário fossem destinados a bolsas de estudo em escolas particulares; a revisão de 1965 aumentou essa proporção para 5%. Da mesma forma, o Fundo Nacional do Ensino Médio, de 14,5% para 20%, e o Fundo Nacional do Ensino. Superior, de zero para 5%. , O aumento das transferências de verbas públicas para as escolas privadas no ensino médio estava "adoçado" com a inclusão, na mesma rubrica, mas sem definir quantitativos, da "educação de excepcionais". No ensino superior, esse disfarce também existia: a mesma rubrica juntava as bolsas de estudo, as residências de estudantes e as subvenções às universidades e estabelecimentos isolados particulares. Estava declarada a posição do CFE e do governo golpista de apoio à tremenda expansão do ensino superior particular, ao mesmo tempo em que se continha o setor público. A história do salário-educação é um exemplo dramático de como uma boa idéia pode ser distorcida pela corrupção institucionalizada pela ditadura . Sálario-educação foi o nome que teve, no Brasil, a forma de contribuição a presas para com a escolarização de seus empregados e os filhos destes, aliás, utilizada e muitos países. Em 1955, 23 dos 55 países participantes da conferência Internacional de instrução Pública em Genebra, adotavam formas de participação das empresas no financiamento do ensino proporcional ao montante dos investimentos das empresas ou dos salários pagos por elas aos seus empregados. Em termos legais, essa idéia vingou, no Brasil, pela primeira vez, na Constituição de 1934, que obrigava as empresas industriais e a escolas situadas fora dos "centros escoares" a proporcionarem ensino primário gratuito, desde que, tem o mais e 50 empregados houvesse dentre eles e seus filhos, pelo menos dez analfabetos. O golpe de 1937 outorgou outra Constituição, com outras prioridades, e aquele dispositivo foi esquecido. A Constituição de 1946 retomou a idéia, estipulando que as empresas industriais, comerciais e agrícolas onde trabalhassem mais de 100 pessoas ficavam obrigadas a manter ensino primário gratuito para seus empregados e
os filhos destes.
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Várias tentativas foram feitas para regulamentar esse dispositivo constitucional, o que só veio a acontecer com a lei 4.440, de outubro de 1964. Essa lei determinava que, se uma dada empresa oferecesse ensino primário gratuito aos seus empregados a aos filhos destes, estaria de acordo com a Constituição. Mas "considerando que a maioria esmagadora das empresas não teria condições ou mesmo interesse em montar uma escola para esses propósito, a lei estabelecia que as empresas com 1,4 % da folha de pagamento, alíquota aumentada, posteriormente, para 2,5% (fundindo-se as cobranças estaduais e federais). Pelo fato de ser uma contribuição devida pelas empresas, calculada com base nos salários pagos por elas, a denominação passou a ser a de salário educação. Pç Estaria tudo muito bem se não houvesse a previsão da "escada" I pela via privatizante, já na lei 4.440, de 1964. Esta previa que ficariam isentas do salários educação as empresas (com mais de 100 empregados, ' claro) que instituíssem mediante convênio "sistema de bolsas de estudo" com escolas particulares. No texto da lei, havia a ressalva de que o convênio com o "sistema de bolsas" deveria ser julgado satisfatório por ato da administração estadual do ensino, aprovado pelo respectivo conselho Estadual de Educação. Ora, ocorre que foi justamente nessa época que as secretarias e os conselhos estaduais de educação passaram a ser ostensivamente ocupados pelos donos de colégios particulares e seus propostos, que tinham todo o interesse em aprovar convênios que beneficiavam, antes de tudo, as empresas de ensino de sua propriedade ou às quais prestavam seus "serviços". A armação era a seguinte: considerando que as empresas preferiam recorrer o educação do que abrir suas próprias escolas, organizaram-se firmas de agenciamento entre as empresas e as escolas particulares. Uma dada empresa recebia a visita de um agente que a convencia a deixar de recolher a quantia devida do salário educação, transferindo parte dessa quantia a uma escola, a título de bolsa de estudo, em troca de um recibo, emitido pela escola, com o valor total do salário-educação. A diferença ia para o "caixa
2" da empresa ou para o bolso de um de seus dirigentes. Já a escola, "arranjava" uma lista de alunos "beneficiados" por essas bolsas. Em muitos casos, os bolsistas já tinham sido contemplados com outras bolsas e deles sé pedia, freqüentemente, que, ainda assim, pagassem à escola uma certa quantia, a título de "complementação".
37 Segundo dados do próprio Ministério da Educação, esse agenciamento empresa-escola foi responsável pelo desvio de cerca de 40% dos recursos devidos por conta do salário-educação. Em 1983, no Estado do Rio de Janeiro - os dados são ainda do ministério - a econcedidas 150 mil "bolsas-fantasma", representando um roubo de cerca de 4 bilhões de cruzeiros, feito por 210 escolas. A corrida para repartir os despojos do salário-educação fez com que algumas prefeituras resolvessem privatizar sua rede de escolas. JáDas
direções dessas fundações participavam o prefeito e o
secretário de educação, é claro, mas, isso que é o mais importante, participavam também
os grandes industriais e
comerciantes, justamente os proprietários e gerentes das empresas devedoras do salário-educação. Esses prósperos senhores transferiam, então, o dinheiro devido por suas empresas para as fundações educacionais que eles próprios dirigiam!
Foi a forma mais ousada de submeter o ensino público ao controle
do capifundações instituídas pelo poder público, mesmo as de direito poder privado; obrigaram as escolas a manterem escrituração dos recursos recebidos; impediram a cobrança aos alunos de contribuição complementar; encarregaram as secretarias estaduais de educaçcontribuição do salário-educação a empresa que mantiver escola de 19 grau para seus
empregados e os filhos destes ou, então que se
preste a indenizar a escolarização em estabelecimento privado desses beneficiários.
38 Mas o salário-educação não é a única fonte de bolsas de estudo que serve para manter, artificialmente o segmento mais atrasa o setor privado. No Município de Rio de Janeiro, pois outros tipos de balsas de estudo destinadas a estudantes de 14 grau. As bolsas de "obrigatoriedade escolar" são dadas a crianças de sete a 14 anos de idade que não conseguem vaga em escola pública nas proximidades de sua residência. Essas bolsas são distribuídas na periferia do município, justamente onde reside a população mais miserável e onde a rede pública é diminuta. Em seu lugar, proliferam escolas privadas que subsistem às custas das bolsas de estudo, conferidas, tradicionalmente, por intermediação político partidária. As bolsas de "compensação" resultam da transformação em bolsas do imposto sobre serviços e do imposto predial e territorial urbano devidos pelas escolas. Estas comunicam à secretaria de educação o número de bolsas de "compensação" que oferecerão, em lugar de pagar o ISS e o IPTU, e a secretaria indica os alunos que serão beneficiados, conforme critério de carência econômica. Até 1983, as escolas podiam converter todo o imposto devido em bolsas de estudo. Desde 1984, só podem fazer isso com metade do imposto a pagar. Esse sistema de multiplicidade de bolsas tem permitido que, durante anos e anos, muitas escolas somassem as bolsas municipais, recebidas da prefeitura, com as bolsas federais, do salário educação. Num levantamento realizado em I983, pela Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro, cerca de 50% das escolas apresentavam casos de duplicidade de bolsas. E somavam, também, as contribuições mais ou menos espontâneas recebidas dos alunos a título de complementarão. Quando denunciamos esse verdadeiro assalto aos recursos governamentais, estamos preocupados com uma questão muito concreta: a distribuição dos recursos disponíveis para a expansão e a melhoria da qualidade da rede pública de ensino. É tenebrosa a solidariedade existente entre os privatistas na direção dos sistemas de ensino - empenha dos na contenção da escola pública, de modo a abrir espaço para a escola particular - e esse sistema de transferencia de recursos públicos para o setor privado de ensino, sob a forma de bolsas de estudo. 0 resultado é a feição antidemocrática do sistema educacional, onde, ao lado de uma rede pública menor do que deveria e poderia ser, de gualdida insatisfatória,
subsiste um setor de escolas particulares parasitárias mantidas vivas às custas das insuficiências artificiais do setor público.
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Um bom exemplo disso é o Estado do Rio de Janeiro, que disputa há muito com o de Minas Gerais, a primazia em termos do controle privatista sobre o ensino público. 0 Município do Rio de Janeiro é herdeiro da mais ampla rede escolar pública do país, resultado do privilégio de ter sido capital do Império e na República, até 1960. Apesar disso, desrespeito do grande crescimento da população , a rede pública de 1º grau "encolheu" de 1975 a 1980 , diminuindo o efetivo discente em 98 mil alunos, uma perda relativa de 14%. Enquanto isso - ou melhor, por causa disso - a rede particular universalizar o ensino de 14 grau. Situação ainda mais grave ocorreu nos municípios que formam a região metropolitana do Grande Rio, onde estão os tristemente afamados municípios da baixada fluminense: Caxias, Nova Iguaçu, Nilópolis e São João de Meriti. 0 conjunto da região metropolitana decresceu menos, em tempos de número de alunos (2,5%) do que o município da capital, embora o crescimento da população tenha feito as exigências . de escolarização mais graves naquela do que neste. Persiste, assim, na região metropolitana, uma taxa de analfabetismo muito elevada para sua situação geral: 20°ó do milhão e meio de jovens de sete a 14 anos, dos quais 50 mil nunca tiveram, por tempo algum, escolarização regular. De todo modo, esses dados, referentes à situação média do crescimento ou decréscimo numa dada área sócio-geográfica, dissolvem realidades ainda mais terríveis do que a que os números permitem ver. É o caso, por exemplo, da desativação do segundo segmento do ensino de 19 grau (5ª a 8ª série), transferindo-se os alunos para escola particular situada nas proximidades, com suas anuidades pagas pelo poder público mediante bolsas de estudo, evitando-se, com tal providência, a falência do negócio do ensino que enriquece um "benemérito da educação", em troca de apoio político. Escândalo como esse, que não é privilégio, aliás, do Rio de Janeiro, só é ultrapassado no Estado de Minas Gerais, onde os grupos privados, dos mais fortes e organizados do país, conseguiram do governador Francelino Pereira um decreto condicionando a extensão das quatro primeiras séries de escola pública de 19 grau à concordância do representante das entidades
mantenedoras. Cercaram, assim, o ensino de 2º grau como uma reserva de caça para o capital, colocando um freio, com amparo legal, ao crescimento da escola pública.
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Quando a crise econômica levou milhares e milhares de crianças e jovens a se transferirem da escola particular para a escola pública de 1º e 2º graus, encontrou-a com poucas vagas; "encolhida", como no Rio de Janeiro; submetida legalmente, em sua expansão, como em Minas Gerais; ou estagnada, como em todo o país. O ensino profissional não escapou da voragem do capital em multiplicar-se com o álibi de promover a educação. Por iniciativa do general-ministro da Educação Ney Braga, o Congresso Nacional aprovou, em 1975, uma lei (n.º 6.297) que concedia incentivos fiscais às empresas que tivessem projetos de formação profissional. Para fins do imposto de renda, as empresas poderiam deduzir o dobro das despesas com projetos que objetivassem "a preparação imediata para o trabalho de indivíduos, menores ou maiores, através da aprendizagem metódica da qualificação profissional e do aperfeiçoamento e especialização técnica em todos os níveis". Mesmo que o abatimento ficasse limitado a 10% do lucro tributado, passou a valer a pena para as empresas, principalmente as de grande porte, justamente as que usam técnicas do tipo capital-intensivo, comprar formação profissional, nem que fosse exclusivamente para efeito de aumentar seu lucro líquido. Paia responder à nova procura por comprovantes de gastos, surgiram empresas de treinamento profissional ligadas aos grandes grupos econômicos e também as que se dedicavam à mera corretagem de cursos ou, apenas, de recibos. Assim, mais do que a qualificação profissional, o objetivo desse incentivo fiscal é aumentar os lucros das empresas, não só pela retenção de recursos, como também pela possibilidade que abre para o aumento do capital de giro e/ou para especulação financeira com recursos que, de outra forma, seriam pagos como imposto sobre a renda. Não queremos dizer que as empresas não tenham usado pelo menos parte dos recursos comprovados como despesa de efetiva formação profissional. Mas o que acontece é que, quando o treinamento existe de fato, tem contemplado, principalmente, as pessoas que ocupam cargos de comando : gerentes, administradores, supervisores. A maior parte dos trabalhadores, os que estão diretamente ligados à produção, deixa de se beneficiar de projetos de
melhoria de sua qualificação profissional. Em suma, esses incentivos fiscais resultam em um pagamento (pelo não recebimento do imposto devido) de toda a sociedade para as empresas, principalmente as grandes, reforçam a sua estrutura de poder e permitem que elas obtenham ganhos financeiros imediatos.
41 Mas foi no ensino superior que a acumulação de capital no campo do ensino se fez de forma mais intensa e escandalosa. Que grande ou média cidade brasileira não conhece o caso de um colégio particular de 1° ou 2~ graus que começou abrigando um curso superior nos horários e salas disponíveis e viu esse curso crescer e se multiplicar até virar uma grande faculdade, com vários cursos? Ou mesmo uma universidade? Fato semelhante ocorreu com cursivos pré-vestibulares, que, movidos pelos lucros que tiveram, cresceram "para cima , instalando faculdades, e para baixo , abranda cursos regulares de 1° e 2º graus. Existem "organizações educacionais", nascidas de cursivos pré-vestibulares, que já anunciam a integração vertical" de sua
mercadoria: do pré-escolar à faculdade.
Chegarão à pós-graduação?
Na Cidade do Rio de Janeiro encontramos mais de um caso exemplar
da acumusuperiores oferecidos, incorporando os imóveis vizinhos, construindo grandes
prédios, e chegando hoje a ser uma das maiores universidades do país -
a
Universidade Gama Filho. O aumento da procura de ensino superior nos anos 60, ao tempo em que o governo federal fretava o crescimento das universidades públicas (e gratuita
42 Em primeiro lugar, voltaram à carga sobre a questão do pagamento do ensino superior público a "preços de mercado" onde esse pagamento ainda não atingia esses níveis. Retomaram antigos argumentos sobre a justiça dos ricos pagarem a educação dos pobres comoEm segundo lugar, não bastassem os subsídios governamentais ao setor privado, que permitiram a algumas instituições construírem verdadeiros compus universitários, os empresários do ensino inventaram outro mecanismo para sustentar a lucratividade de seus eCulpa do desemprego? Em parte. Da desonestidade de alguns? Talvez. Mas, certamente, todo esse problema não poderá ter solução se o empenho da política educacional não for o abandono da política privatista. Aliás, essa política dos grupos mais conservadores do país não escapou da crítica de um dos mais fiéis aliados do regime autoritário, desde os tempos da conspiração anti-Goulart : a USAID. Em 1976, a USAID se preparava para diminuir muito ou até mesmo para deixar de financiar projetos educacionais no Brasil. Para justificar a mudança, pediu ao General Accounting Office (Escritório de Contadoria Geral) do governo norte-americano um parecer s
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O parecer foi pelo fim da ajuda externa, alegando que o crescimento econômico (era justamente a época do fim do milagre econômico", só que o consultor ainda não sabia. . .) geraria os recursos necessários para fazer frente às grandes necessidades educa O governo brasileiro estaria, para o consultor norte-americano; aumentando a seletividade da escola, pois usava os recursos externos justamente para diminuir os gastos públicos com educação. Além do mais
,
agravando a seletividade, estaria havendo
uma d Da Constituição de 1967, que o regime autoritário fez o Congresso aprovar, foi retirada a vincularão automática de verbas para o ensino,
no plano da União:
podia-se gastar 10%, como 10% como 15% , como 5% . Assim, a orçamento da
participação do MEC no
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no período 1960-1965, desabou para a metade desses níveis nos anos 70, chegando a 4,3% em 1 975. 0 descaso do Estado para com a educação, acentuado pela ditadura, fez com que o Brasil se convertesse num dos países que relativamente menos aplicam nesse setor, Para se ter uma idéia, em 1974 - ano limite do tão badalado "milagre econômico brasileiro" -, o Brasil tinha o 9° lugar do mundo em termos de produto nacional bruto (PNB). No entanto, em termos de despesas públicas com educação, em cifras absolutas, estavO PNB, nesses anos todos, cresceu mais rapidamente do que as despesas públicas com educação. Em 1976, por exemplo, o PNB cresceu 11,6% enquanto a despesa pública com educação aumentou de apenas 1,3%. Voltando a 1 974, ano para o qual temos dados gerais, as despesas públicas com educação representavam, no Brasil, apenas 2,8%, o que deixava o país, em termos relativos, em 779 lugar no mundo. Concluindo: este é um dos países em que, relativamente ao PNB,Os municípios continuavam obrigados a gastar 20°/a Em 1 971 , a lei 5.692 ampliou a obrigação, fazendo incidir aquela proporção também sobre o Fundo de Participação dos Municípios. No entanto, a centralização promovida pelo regime autoritário fazia com quA desobrigação do Estado para com a educação teve no ensino superior diretamente mantido pelo Ministério da Educação seu efeito mais danoso. As verbas mandadas às universidades foram drasticamente cortadas, á ponto de muitas delas terem de paralisar impo
45 Com isso, muito se regozijaram os arautos do privativo, que aproveitaram esse fato para apoiar suas pretensões de aumento dos subsídios para seus empreendimentos. Assim se fecha esse círculo viciado e vicioso de mútuo reforço entre forças solidárias a desobrigação do Estado para com a manutenção do ensino público e gratuito e o subsídio governamental aos empreendimentos privados que buscam, no campo de ensino, a ac Esse subsídio nem sempre é direto, na forma de recursos que saem dos cofres públicos para os das empresas de ensino. Ele aparece até de forma indireta, através dos abatimentos permitidos pelo imposto de renda. E há pelo menos uma instituição que, movida por esses incentivos fiscais e pelo ardor cívico-religioso, pretende ocupar o vácuo deixado pelo Estado em sua desobrigação para com a manutenção do ensino público e gratuito. Não é uma sociedade civil, de carátEm 1984, a Fundação Bradesco gastou 20 bilhões de cruzeiros na manutenção de escolas, situadas em 11 Estados, que recebiam 26 mil alunos. Esses recursos provieram de doações das empresas do grupo capitaneado pelo banco. Como várias dessas escolas ministrEm 1985, a Fundação Bradesco prepara-se para gastar 107 bilhões de cruzeiros em projetos educacionais, metade do que o Estado do Rio de Janeiro gastou em educação no ano de 1984. 0 número de escolas sobe para 29 e o número de alunos para 33 mil. São escolas de 1º grau situadas nas mais diversas regiões: em capitais de Estado e no pantanal matogrossense. Nelas se oferece o ensino que o governo nega ao povo brasileiro e cobra-se a adesão a um autoritário código de conduta que os funcionários do gr
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da ditadura, as escolas da Fundação Bradesco exigem dos alunos adesão a uma moral ultraconservadora, pedindo-lhes que prometam não fumar, não beber, não praticar nenhum ato "contra a moral e os bons costumes". A muito custo, tem havido algumas vitórias parciais contra esse círculo viciado/vicioso e mu o reforço entre a, desobrigação dó Estado para com a manutenção do ensino gratuito e o apoio governamental aos empreendimentos privados. As lutas pela democratização do ensino, especialmente pelo ensino público e gratuito, atingiram o Congresso Nacional, renovado pelas eleições de 1982. Na nova correlação de forças que se formou, foi possível a aprovação, na Câmara dos Deputados como no SeAssim, desde dezembro de 1983, a Constituição determina que o governo federal deve gastar pelo menos l3% e os Estados e municípios pelo menos 25% da receita resultante de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino. Foi uma vitória das forças polítVemos, assim, o quanto tem sido difícil a luta pela democratização do ensino em nosso país: como a solidariedade entre o capital (especialmente o interessado na "mercadoria" educação) e a burocracia civil-militar pôde encontrar meios e modos de diluir as
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III. A Exclusão pela Base Quando os resultados do Censo Demográfico de 1970 foram divulgados, ainda no governo Médici, os dados foram mais eloqüentes do que a frase de efeito do general de plantão: "a economia vai bem, mas o povo vai mal". Ele não disse qual economia estava indo bComo poderia uma parte da economia ir bem, enquanto a outra ia mal? Para os arautos da política econômica da ditadura, ó que havia eram diferenças no ritmo da melhoria geral. Para os críticos, no entanto, uns estavam se beneficiando da miséria dos outros.Mas, os argumentadores do regime autoritário não se fizeram de rogados. Foram buscar "explicações" fora do campo econômico para justificar a exploração das massas. O que os religiosos faziam antes (e alguns ainda teimam em fazer), procurando na maldição dSe a renda está mal distribuída, se os dados mostram que, no período 1960-1 970, os ricos estavam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres, não é porque aqueles são os capitalistas e seus funcionários mais próximos e estes os trabalhadores exp
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massas essa crença no papel milagroso da educação. Para o governo e seus argumentadores, então, a distribuição da renda mais igualitária viria, automaticamente, como resultado da mais ampla distribuição de oportunidades educacionais para todos. Para buscar credibilidade para sua política _"distributivista", os governos autoritários organizaram o Movimento Brasileiro de Alfabetização - Mobral, que, em uma década, deveria reduzir a proporção de analfabetos para menos de 1 0%. Montou toda uma rede E a realidade, como andava? A taxa de escolaridade das crianças de sete a l0 anos, faixa etária que correspondia ao antigo curso primário, baixou de 1970 a 1980: de 66,3% para 65,5%. Isto quer dizer que, em 1980, mais de um terço das crianças que deveriam estar cursando a escola priEsses dados eloqüentes mostram que ás condições de escolarização pioraram justamente na base escolar: na escola primária, englobada Agora num fantasioso ensino de 1° grau, obrigatório em suas oito séries para as crianças e adolescentes, de sete a 14 anos
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O resultado dessa incompetência, ou melhor, dessa política educacional lesiva aos interesses mais fundamentais do povo brasileiro continua a ser uma eficiente máquina produtora de analfabetos. Aos 14 anos de idade, os jovens brasileiros, já deveriam ter oeste panorama desolador é bastante para denunciar o fracasso da política educacional , fracasso ainda a maior se levarmos em conta que durante todos esses anos, os generais e coronéis do Ministério da Educação tiveram meios excepcionais postos a sua dispotaxa de evasão e repetência na 1ª série do ensino de 1º grau, da ordem de 40% como média nacional. Ao invés de: enfrentá-la pela diminuição do número de alunos por sala; do aumento do número de horas de aula por dia e do número de dias de aula por ano; daNão tenha dúvida, leitor, desse paradoxo perverso mesmo tendo aumentado a presença o povo brasileiro na escola, o resultado da escolarização tem sido absolutamente insuficiente e insatisfatório .
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De fato, o número de anos de escolaridade o anula não aumentou entre 1 aquele ano, os dados do Censo mostravam que a escolaridade mediana da população de dez anos e mais era de apenas I ,5 ano. Isso quer dizer que metade da população maior de dez anos nãoPosto o problema de outro ângulo, quando se vê o número de analfabetos de 14 anos de idade reduzir-se tão pouco, só 5% ao longo de toda uma década em que a educação foi alardeada como a panacéia para todos os males do povo brasileiro, só podemos entender Pois bem, até aqui falamos da escola regular de 1° grau. Qual teria sido, entretanto, o desempenho do Mobral, grande esperança política educacional do milagre brasileiro". O Movimento Brasileiro de Alfabetização foi criado em 1967, mas só revisto mesmo em 1970. Sua inspiração provinha das numerosas campanhas e cruzadas que se promoveram para livrar o país da "sujeira" do analfabetismo, como se a falta do conhecimento da lei
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ou precedida por significativas melhorias do padrão de vida das classes populares; ou, então, 2) de campanhas maciças de educação popular durante ou logo após uma revolução, como na União Soviética na China, em. Cuba, no Vietnã e, mais recentemente, na NiDinheiro para o Mobral não faltou, pois a Loteria Esportiva e os incentivos fiscais foram boas fontes de receita. Recursos humanos também, pois milhares e milhares de pessoas ofereceram-se como voluntários para alfabetizar os adultos, mesmo sem remuneraçãQual o resultado de todo esse aparato? O primeiro sinal do fracasso retumbante do Mobral foi dado pelo resultado das eleições legislativas de 1974. Abandonando a opção equivocada do "voto nulo", as oposições ao regime militar apresentaram plataformas e candidatos que conseguiram amplo apoio poAs contas do Censo de 1980 não deram outra. . . Se a taxa de analfabetismo de 1970 era de 33,6% para a população de 15 anos e mais, dez anos depois tinha baixado para 25,4%, ou seja, uma diferença de apenas 8,2%. Para uma barulhenta cravada alfabetizada,
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que esperava uma "taxa residual" de analfabetos em 1980 inferior a 10%, era o fracasso proclamado aos quatro ventos. Ventos que sopravam ainda mais forte quando se via que o número absoluto de analfabetos de 15 anos e mais aumentou, naquele período, de 54Não acredite o leitor nas falsas idéias de que taxas tão elevadas de iletrados são características irremissíveis dos países latino-americanos e subdesenvolvidos. Países como o Haiti, a Guatemala, Honduras, El Salvador, Bolívia e República Dominicana têm tMas não é nada fácil acabar com uma estrutura tão grande como a do Mobral, com suas diretorias e assessorias, suas coordenações estaduais e sua presença em praticamente todos os municípios do país. Assim, ao invés de ser extinta, a instituição passou a prVamos agora apresentar ao leitor um panorama do que se convencionou chamar de "pirâmide escolar" brasileira, embora não utilizemos essa figura geométrica. Os dados apresentados abaixo mostrarão; de modo eloqüente, a discriminação, pela base, das oportunidTính
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periferia dos grandes centros urbanos, como já foi dito e explicado. Dos 22,7 milhões de alunos do 1Q grau, a grande maioria (16,J milhões) está nas quatro primeiras séries, correspondentes ao antigo curso primário, sendo que 4,5 milhões dessas crianças eSe o segundo segmento de ensino de 1° grau já representa um profundo corte na promoção dos alunos, quando comparado com o primeiro segmento, o ensino de 2° grau expressa um corte ainda maior, pois tem apenas 2,8 milhões de estudantes, a metade dos quais fNo ensino superior encontravam-se, em 1980, cerca de 1,5 milhão de estudantes, 75% deles freqüentando faculdades particulares. Nestas faculdades, em geral de baixíssimo nível de ensino e altas anuidades, estudam(?) os alunos que já padeceram as piores conMas, se o ensino superior apresenta, no Brasil, um padrão altamente discriminatório, o ensino de 1º e de 2° graus já procedeu, antes dele, a uma perversa exclusão de milhões de crianças e jovens que ficaram privados da educação sistemática. É a exclusão p
53 IV. A Profissionalização Fracassada A política educacional da ditadura teve no "ensino profissionalizante" uma das suas "realizações" mais ambiciosas. Tratou de multiplicar os ginásios orientados para o trabalho (GOT) e tornar o 2° ciclo do ensino de 2° grau (o antigo colegial) compulsoriamente profissional. Vamos começar pelos ginásios orientados para o trabalho e ver o que eles tinham a ver com o trabalho. Nas duas primeiras séries do antigo ginásio predominavam as disciplinas de caráter geral, ao lado de disciplinas vocacionais, destinadas a sondar aptidões: artes industriais ou técnicas agrícolas, conforme a economia da região onde o ginásio se localizassPois bem, cerca de 600 ginásios desse tipo foram construídos no Brasil, para o que muito contribuíram os assessores norte-americanas e os dólares da USAID. E foram assimilados pela reforma do ensino de 19 e 29 graus de l971 (lei 5.692) como se tivessem siHoje, a maioria desses GOT, já sem esse nome, está com as salas ambiente usadas para outras finalidades, os equipamentos deteriorados ou trancados a sete chaves, "postos a salvo" dos alunos. A própria idéia da sondagem de aptidões e de iniciação para o tr
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da elite ou para a escolarização a qualquer preço das crianças e jovens
que não foram
atendidos pela escola pública, nem mesmo se preocuparam em vestir a máscara da "orientação para o trabalho" no ensino de 1° grau. Fizeram de conta (ou assumiram mesmo)
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de fabricar todo o produto. Não se trata de fabricar fogões a lenha, mas computadores. Ao capital interessa que os trabalhadores não tenham de dominar todo um conjunto complexo de operações, de conhecimento de matérias-primas, de processo de estética etc.Que aptidões o GOT pretendia sondar? Aptidões para o trabalho cada vez mais desqualificado, alienado? Que utilidade tinha iniciar os alunos em trabalhos artesanais se eles iriam inserir-se em linhas de produção que dispensavam qualificações artesanais? Além do mais, não tem sentido a prática de atividades artesanais para sondar as aptidões dos alunos para cursos técnicos a nível de 2° grau. Os técnicos industriais projetam, desenham, administram, controlam custos e qualidade, supervisionais grupos de peA educação para o lar reunia outro conjunto de estereótipos acerca da produção. Só que, agora, tratava-se da produção doméstica, de ensinar as meninas - às vezes os meninos, só que não se levava isso a sério - a preparar alimentos e roupas, a conservar a Que "aptidão para o lar" o GOT esperava ensinar? Que ensino técnico a nível de 2° grau poderia ser recomendado a uma aluna que quisesse prosseguir seus estudos? Seria algum curso "espera-marido"? Ou esse seria em grau superior? Todo esse equívoco pedagógico, misturado aos estereótipos conservadores, assumiu ares de modernidade na política nacional da ditadura
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com as bênçãos do imperialismo enviadas pelos acordos MECUSAID. A profissionalização no ensino de 2° grau, embora situada no mesmo quadro ideológico, teve razões diferentes para sua generalização, como foi feito pela mesma lei 5.692, de l 971 . A idéia de acabar com os cursos clássico e científico, que só preparavam para vestibulares, tornando todo o colégio (o, 2° ciclo do antigo 2° grau) profissionalizante, nasceu da preocupação de conter a procura de vagas nos cursos superiores. A procura de cursos superiores vinha crescendo no Brasil desde os anos 40, impulsionada pela inviabilização dos pequenos negócios ao alcance das camadas médias, correlativamente ao crescimento das burocracias do setor público e do setor privado. A redefinEssa demanda se dirigia às instituições públicas, por serem gratuitas (ou quase), já que os jovens das camadas médias procuravam caminhos para minimizar os custos de seus projetos de ascensão social. Mas o governo instalado pelo golpe de Estado não se disPor outro lado, sabiam não ser politicamente conveniente para o regime elevar ainda mais a visível barreira dos exames vestibulares, pois
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o número de "excedentes" crescia a cada ano, assim como suas reivindicações de aumento do número de vagas nas universidades públicas. As escolas técnicas industriais eram o festejado modelo do novo ensino de 2° grau profissionalizante. Elas não eram muitas, no Brasil , no fundos anos 60. Apenas algumas dezenas, mas gozavam de alto conceito, muitos dos seus exalunos conseguiam bons empregos ou faziam. bons cursos superiores. Só que que o que que dav dava cert certoo com com pou poucas cas esco escola lass, com com algu alguns ns mil ilhhares ares de alun alunoos, e no setor etor industrialContrariando, então, as pessoas que conheciam o mundo da produção (fora dos quartéis e dos gabinetes do Conselho Federal de Educação), o governo enviou ao Congresso um projeto de lei (que veio a resultar na lei 5.692/71 ), tornando universal e compul compulsor soriaC iaCom om isso, isso, os planej planejado adores res educac educacion ionais ais da ditadu ditadura ra imagin imaginava avam m resolv resolver er doi doiss problemas, ao mesmo tempo. Haveria uma imensa carência de técnicos e auxiliares técnic técnicos, os, de tod todas as as especi especialid alidade ades, s, cujos cujos cargos cargos estari estariam am sendo sendo ocupad ocupados os por pessoa pessoass sem formaçãoSó que não era nada disso o que acontecia. Se os planejadores educacionais da ditadura saíssem dos seus gabinetes, iriam ver que os engenheiros estavam ocupando o lugar dos técnicos
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não por causa da falta de técnicos mas porque faltavam empregos para engenheiros, e estes venciam aqueles na competição. E não era por outra razão que grande parte dos que concluíam os cursos técnicos industriais acabavam indo para uma escola de engenhariEles iriam ver, também, que o sistema educacional brasileiro não seria capaz de implantar, mesmo gradualmente, uma transformação desse tipo, por absoluta falta de recursos humanos e materiais. Ademais, veriam não ser possível para as escolas oferecerem haSancionada a lei pelo general-presidente Emílio Médici, com a assinatura de seu ministro da Educação, o coronel Jarbas Passarinho, passou-se à sua sua impl implan anta tação ção,, alard alardea eada da como como a tábu tábuaa de salv salvaçã açãoo da educ educaç ação ão naci nacion onal al:: agor agora, a, sim, sim, a profissionalização dava As escolas particulares, ciosas dos interesses i nteresses imediatos de sua clientela, inventaram a profissionalização do faz-de-conta: já que seus alunos estavam interessados mesmo era no curso superior, fantasiavam de "curso técnico de análises clínicas" o currícul
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ordem. No caso de um caro colégio religioso, que atendia à elite econômica de sua cidade, o curso "técnico" era de mecânica de automóveis, pois os futuros universitários já tinham como certo ganhar um carro do pai se fossem vitoriosos nos exames vestibulaMas, para o CFE, parece que bastava um parecer seu. para mudar o mundo do trabalho. 0 parecer 45/72 relacionou 130 habilitações para técnicos e auxiliares técnicos. Em certos casos, previam-se várias ocupações "típicas" de um mesmo setor. Para a indústriaOs estragos na rede pública foram enormes. . As escolas normais foram desativadas, sendo o curso de formação de professores primários (da 1ª a 4ª série, na nova e prolixa linguagem) transformado em apenas mais uma habilitação do elenco oferecido pelas escolas, para onde iam dos alunos que, por suas A quem interessava a política de profissionalização universal e compulsória no ensino de 2° grau? Aos empresários do ensino certamente não, pois elevava seus custos. Aos estudantes também não, pois, nas condições sociais da sociedade
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brasileira, era encarada como uma perda de tempo. Aos administradores educacionais também não, pois se viam diante da tarefa imensa e impossível de implantar um projeto inviável, mesmo se houvesse dinheiro sobrando, o que não era o caso. Aos técnicos em fato conhecido que as pequenas empresas empregam uma quantidade diminuta de técnicos de nível médio formados em escola - o que não quer dizer que não tenham funcionários desempenhando funções que poderiam ser desempenhadas por aqueles. A esperança dos prMas, só mesmo os coronéis do Ministério da Educação, seus letrados conselheiros e os apressados convertidos a essa pedagogia novidadeira é que não sabiam da tendência das grandes empresas, principalmente as multinacionais .e as estatais, de empregarem o mAs resistências que se desenvolveram contra a política de profissionalização compulsórias ganharam força quando a crise do "milagre econômico" eclodiu em fins de 1973, forçando-a a mudar sua forma de atuação. Previa-se como inevitável uma política econômiPara
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O general-ministro da Educação Ney Braga deu a ordem de "meia volta, volver", por mensagem ao Conselho Federal de Educação, na qual incorporava algumas críticas dos setores mais brandos do próprio Ministério da Educação. 0 CFE, antes um bastião poderoso nAlém da formação de técnicos e auxiliares técnicos, o ensino profissionalizante de 2º grau passava a visar, para a maior parte dos alunos, principalmente a educação geral, com algumas tinturas de informação tecnológica, correspondentes a alguns setores daNa. nova concepção da profissionalização salvadora, a divisão, antes bem definida, entre a parte geral e a parte especial do currículo, ficou borrada pelo reconhecimento de que há disciplinas da parte de educação geral que podem ser consideradas instrumenMas a meia profissionalização não agradou a ninguém, a não ser aos membros do CFE, ansiosos por uma retirada sem reconhecer seus
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próprios erros. As resistências continuaram, assim como a pressão do movimento de professores, dos empresários do ensino, dos estudantes e dos técnicos em educação. Depois de estudos promovidos pelo Ministério da Educação, em associação com universidades, o governo enviou ao Congresso um curto mas incisivo projeto de lei, logo aprovado, alterando profundamente a lei 5.692/71. Em 1982, já não era politicamente possívePela lei 7.044/82, a qualificação para o trabalho, antes visada pela lei 5.692/71 , foi substituída pela preparação para o trabalho, um tempo impreciso que mantém, na letra, a imagem do ensino profissionalizante, mas permite qualquer coisa. A lei da reforRetirada, gradativamente, a profissionalização universal e compulsória, o que foi posto em seu lugar? Nada. A preparação para o trabalho pode se resumir em atividades que difundem uma visão abstrata do trabalho numa sociedade abstrata, com resultados pedaVoltamos ao ponto de partida piores do que estávamos. As escolas públicas de 2~ grau foram desorganizadas, seus currículos transformaram-se num amontoado de disciplinas, onde se misturam as concepções positivistas do CFE com os penduricalhos dos interesseFrac
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conter os candidatos ao ensino superior teve de ser providenciada neste elevação das barreiras dos exames vestibulares. Ao
grau mesmo, pela
mesmo
tempo, procurou-se incentivar os cursos superiores de curta duração, em especial os da área tecnológica (n
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1 V. A Educação Moral, Cívica e Física Os regimes ditatoriais sempre procuraram substituir as instituições livres da sociedade para, na escola, imporem ao povo a educação moral e cívica que servisse para consolidar o seu poder. No Brasil, não foi diferente. A derrubada do Estado Novo, em 1945, e a nova Constituição, promulgada em 1946, aboliram a educação moral e cívica em nome dos princípios liberais que reservaram às famílias, às organizações religiosas, às entidades culturaisMas o golpe de 1964 encontrou vivas as idéias autoritárias do Estado Novo e sobreviventes muitos de seus partidários, formando, é claro, nas fileiras da conspiração antidemocrática. Os setores mais brandos do movimento golpista, os que misturavam a ânsia de soluções autoritárias com algumas pitadas de liberalismo, não eram partidários da reintrodução da disciplina educação moral e cívica nos currículos escolares. Os setores mais extrNeste sentido, o homem forte do governo Castelo Branco, o ministro da guerra, general Costa e Silva, tentou várias vezes que o Conselho Federal de Educação determinasse a inclusão dessa disciplina nos currículos escolares. Sem sucesso. A resistência opost
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onde podemos ver argumentos muito parecidos com os do positivista Teixeira Mendes em seu livreto A incorporação do proletariado na sociedade moderna, escrito em 1889. Dizia o general-ministro Costa e Silva: "A família moderna facilita, de certo modo, a imO papel da nova disciplina seria preencher o `vácuo ideológico" deixado na mente dos jovens, para que não fosse preenchido pelas "insinuações materialistas e esquerdistas". A educação moral e cívica seria a maneira da escola suprir essa deficiência da educação familiar. Mas, ao contrário do que propunham os positivistas fundadores da República, ela não deveria ser mais uma disciplina dos currículos escolares. Ela deveria serMas, no início de 1969, aqueles conselheiros democratas já não eram membros do Conselho Federal de Educação. Anísio Teixeira tinha concluído seu mandato e não fora reconduzido. Durmeval Trigueiro foi aposentado compulsoriamente do serviço público e perdeuBaixado o AI-5 em dezembro de 1968 e deposto o vice-presidente Pedro Aleixo, em setembro do ano seguinte a Junta Militar que ocupou a Presidência da República deixou um decreto-lei (n° 869) resultante de um grupo de trabalho da Associação dos Diplomados d
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deveria, obrigatoriamente, integrar os currículos escolares de todos sistema de ensino do país.
os graus e modalidades do
Essa disciplina,
"apoiando-se nas tradições nacionais", teria por finalidade: a) a defesa do princípio democrático, através da preservação do espírito religioso da dignidade da pessoa humana e do amor à liberdade com responsabilidade, sob a inspiração de Deus; b) a preservação o fortalecimento e a projeção dos valores espirituais e éticos da nacionalidade; c) o fortalecimento da unidade nacional e do sentimento de solidariedade
humana;
d) o culto à Pátria, aos seus símbolos, tradições, instituições, e os grandes vultos de sua história e) o aprimoramento do caráter, com apoio na moral, na dedicação à família
e à comunidade;
f) a compreensão dos direitos e deveres dos brasileiros e o conhecimento da organização sócio político-econômica do País; g) o preparo do cidadão para o exercício das atividades cívicas, com fundamento na moral, no patriotismo e na ação construtiva visando ao bem comum; h) o culto da obediência à lei, da fidelidade ao trabalho e da integração na comunidade.
As oito finalidades da disciplina incorporavam e ampliavam as da prática educativa pensada três anos antes. Seria ministrada do curso primário ao superior, inclusive na pós-graduação. No ensino superior, ela seria mascarada de Estudos de Problemas Brasile
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na nova ditadura, A educação cívica e o trabalho, além de Educação cívica das mulheres, uma consolidação do que havia de mais conservador nos estereótipos machistas (na versão fascista), celebrando o papel da mulher como silenciosa, modesta, oculta, mas iAs finalidades da educação moral e cívica representavam uma sólida fusão do pensamento reacionário, do catolicismo conservador e da doutrina da segurança nacional, conforme era concebida pela Escola Superior de Guerra. Não foi por acaso que a Comissão EspMembro do Conselho Federal de Educação, o arcebispo Luciano já era o mais destacado intelectual da corrente integraste da Igreja Católica, que tem resistido às mudanças produzidas pelo Concílio Vaticano II e seus desdobramentos teológicos e pastorais. ComApesar do parecer do arcebispo-conselheiro proclamar que a educação moral e cívica devesse ser confessional, isto é, não vinculada a nenhuma religião e a nenhuma igreja, a incorporação das doutrinas tradicionais do catolicismo e de seus quadros não era se
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cantado; em tupi-guarani, por professores e alunos do Curso de Educação Moral e Cívica realizado pela Sociedade Educativa e Literária Brasileira, no Rio de Janeiro, em julho de J 970. Esse caráter dissimulador e anestesiado das contradições que dilaceravam nosso país atravessa todo o parecer. Aqui está um exemplo disso: ~ preciso afirmar-se claramente que a pessoa humana está acima do Estado, e que este não teve outra razão de ser nem outra finalidade senão a de por ser a serviço da Pessoa, do Homem, de sua explicitação, de sua realização, de sua fidelidade. A educação mQue pessoa humana estava acima do Estado? Não era, certamente, o camponês, oprimido pelo latifundiário através dos jagunços e da tropa da Polícia Militar; nem o operário da empresa multinacional, submetido pelo arrocho salarial; nem o funcionário público,Como as grandes linhas da Constituição Nacional poderiam inspirar a formação de cidadãos conscientes, solidários, responsáveis e livres? A Constituição em vigor fora profundamente marcada por uma emenda que a Junta Militar impôs ao Congresso, mutilado pel
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dos atos autoritários e suas conseqüências; pela convocação de eleições livres e da futura Assembléia Nacional Constituinte. Ao contrário disso, o parecer do arcebispo Luciano dizia que os cidadãos brasileiros eram chamados a participar do "imenso esforço de desenvolvimento integral que nossa Pátria empreende". Que desenvolvimento?, perguntamos. O dos projetos faraônicos que levaram à geração de uma das maiores dívidas externas do mundo? Ao aumento dos índices de mortalidade infantil devido à deterioração das condições de vida? À substituição das plantações destAlém das diretrizes gerais para a educação moral e cívica (e sua versão mascarada Estudo de Problemas Brasileiros), o parecer apresenta programas detalhados dessa disciplina para o curso primário, o curso médio e o curso superior. No curso primário, o conteúdo do ensino deveria estar centrado na "comunidade", esta categoria mitológica pela qual a direita celebra a coesão social e condena os diferentes e os desviantes - mito do qual a esquerda tem sido, também, prisioneira. No curso médio (ginásio e colégio) o conteúdo da disciplina já era mais explicitamente ideológico: o trabalho como um direito do homem e um dever social (pelo qual cada um dá a contribuição de que é capaz para fazer funcionar o conjunto da sociedade, send
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Nos cursos superiores, o conteúdo da disciplina educação moral e
cívica, travestida em Estudos
de Problemas Brasileiros, deveria contemplar explícita e detalhadamente, as políticas da ditadura para resolver os "problemas sociais; políticos e econômicos":
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Acontecia de tudo, em nome da moral e do civismo. Desde a esperada propaganda acintosa da ditadura, até o cometimento de violências psicológicas contra as crianças, como em um caso, noticiado pela imprensa, de um menino de J 1 anos que saiu chorando da auAlguns professores conseguiam, às custas de artimanhas, contornar os programas oficiais e desenvolver, com os alunos, atividades produtivas de resistência à ideologia oficial, desenvolvendo uma atitude crítica. Infelizmente, seu número foi pequeno, não sóConvergente com essa orientação conservadora da educação moral e cívica, a ditadura enfatizou também a educação física. As duas disciplinas já formavam um par coerentemente conservador no Estado Novo e assim foram retomadas após o golpe de l 964. A idéia-força da ênfase na educação física era a seguinte: o estudante, cansado e enquadrado nas regras de um esporte, não teria disposição para entrar na política. Esta idéia era, aliás, adaptada de outra que os militares desenvolveram para. os recrutas A técnica de controle que os militares estabeleceram fez com que fossem abrindo caminho nas organizações voltadas para a educação física e os desportos, na burocracia do Ministério da Educação - a que essa área está afeta - e fora dela. Em todos esses órgSob os generais Geisel e Ney Braga, as bolsas de estudo deveriam ser concedidas, de preferência, aos alunos de qualquer nível que se sagrassem campeões desportistas. Com isso, visava-se uma seleção às avessas: ao invés do desempenho intelectual e profissiBuscava-se com essa política desportista produzir a "coesão nacional e social" que a ditadura não havia conseguido com o Mobral nem com a propaganda via televisão:
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VI. A Universidade: Modernizada, Amordaçada e Privatizada 0 golpe militar foi fatal para a Universidade de Brasília, a mais importante iniciativa governamental no campo do ensino superior.
Em
abril de 7964, começou o segundo ano letivo da mais jovem universidades, que reunia profes
e mais moderna de nossas
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de Brasília pelo seu pioneirismo, pelo arrojo de suas concepções e pela demonstração de empenho em reunir, no seu corpo docente, o que havia de melhor nos diversos campos do conhecimento, como Maurício Rocha e Silva, na Biologia; Victor Nunes Leal, WaldirA jovem universidade nem bem estava totalinente implantada quando o golpe ceifou cabeças de sua direção e dos seus corpos discente e docente. Mais do que isso, alterou seu plano original, extinguindo unidades inteiras e alterando as remanescentes, como, pNo entanto, a sobrevivência da estrutura inovadora da Universidade de Brasília foi garantida pela reforma da Universidade Federal de Minas Gerais, que, então, se desenvolvia pela liderança do Reitor Aluísio Pimenta. Deposto pelo general Carlos Guedes em aDepois da Universidade Federal de Minas Gerais, a Universidade Estadual de Campinas preservou a estrutura da UnB, por iniciativa de Zeferino Vaz, paradoxalmente um dos reitores-interventores da Universidade de Brasília. Outras também o fizeram, o que mostComo
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das universidades de nosso país. Ela podia mais facilmente evitar os vícios das outras e tirar partido das inovações: Por isso, a modernização inovadora, representada pela Universidade de Brasília nos dois primeiros anos de sua existência, cedeu lugar, por força do golpe, à modernização conservadora, movida pela legislação autoritária, quase toda feita à base de decretosEsses elementos de política educacional procuraram fazer com que todas as universidades federais adaptassem sua estrutura ao figurino da Universidade de Brasília, utilizando, para tanto, um importante motivo: o princípio da `hão duplicação de meios para fA organização de departamentos foi a maneira encontrada para juntar no mesmo `9ugar" da universidade todos os professores, pesquisadores, laboratórios e outros recursos de um mesmo campo do conhecimento. Por exemplo, todos os físicos num `9ugar", todos os
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da mesma disciplina, por mais diferença que houvesse entre seus objetivos, dificuldades e, o pior de tudo, em turmas grandes e heterogêneas. Imagine o leitor como ficava bem mais "barato" colocar na mesma sala , com um só professor, todos os alunos de uma universidade para aprenderem, digamos, estatística descritiva: os de engenharia, os de matemática e os de física juntos com os de psicologia, de serviço social e de pedagogia. Seria uma grande turma, ou melhor, prolongando as angústias do vestibular propriamente dito e acirrando as disputas entres os estudantes. Tudo isso em nome da recuperação das deficiências do ensino de 29 grau e da pretensão de evitar a especialização precoce. . . Para viabilizar a transição dos estudantes pelas disciplinas dos diversos" departamentos da universidade, em busca da integralização dos seus também diversos currículos, os planejadores educacionais do regime autoritário importaram da universidade norte-aOnde o regime de créditos (ou de débitos) foi efetivamente implantado, as turmas se desorganizaram, inviabilizando a antiga solidariedade entre os estudantes, força viva do movimento estudantil. Essa dissolução das turmas se somou à regulamentação do movi
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promovida, logo em novembro de 1964, pela chamada lei Suplicy, nome do primeiro titular do Ministério da Educação no governo do marechal-presidente Castelo Branco (lei 4.464/64). A "lei Suplicy" obrigava os estudantes a votarem para a eleição dos diretórios acadêmicos, mas, em contrapartida, limitava o campo de atuação do movimento estudantil, tornando as entidades presas fáceis da intervenção das direções das faculdades e das rei
A cópia
apressada e a generalização opressora da estrutura da Universidade de Brasília para todas as universidades federais fizeram com que promissoras de organização de faculdades de filosofia, ciências e letras. A FFCL da
abortassem experiências muito
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Mas, a ânsia uniformizadora da política educacional autoritária não parou aí. Em julho de 1968, .em meio ao crescimento dos protestos de amplos setores sociais contra a ditadura (estudantes, profissionais liberais, operários), o governo organizou um grupoA chamada Lei da Reforma Universitária, n9 5.540/68, determinava que todas as instituições de ensino superior se adaptassem ao modelo, criticado acima, já ensaiado no sistema federal. Mesmo as universidades estaduais, como a Universidade de São Paulo, de Não queremos dizer que todas as determinações da Lei da Reforma Universitária derivavam diretamente da política educacional da ditadura. Procuravam incorporar algumas demandas de professores e estudantes que, havia décadas, lutavam pelo aperfeiçoamento doAo invés de propiciar a existência de diversos padrões de organização da carreira docente, a lei 5.540 simplesmente extinguiu o regime de cátedra. De fato, a maioria dos catedráticos talvez fosse, em 1968 P ' professores improvisados, estéreis como pesquisadores, hábeis em escolher como assistentes os candidatos mais dóceis do que questionadores, mais medíocres do que inteligentes. No entanto; houve instituições e áreas acadêmicas nas quais o regime de cátedra) de pesquisa e de prestação de serviços. Foi o caso das faculdades de medicina, para falar numa área acadêmica. Foi o caso, também, da Universidade de São Paulo, para falar numa instituição específica, que teve em seus quadros professores catedráticos da mEm contrapartida, o funcionamento do corpo docente em departamentos, mas de um modo tal que não houvesse uma hierarquia do
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tipo acadêmico (apenas ficando a salarial e a de participação no poder dos órgãos colegiados, quando muito), abriu caminho para o triunfo do individualismo docente, que dificulta ao máximo a formação dos grupos de trabalho, mas induz a emergência dos meroCom o padrão universitário do ensino superior deu-se coisa um pouco diferente. Há muito tempo que olhamos com inveja para nossos vizinhos hispano-americanos que têm a universidade como padrão para o ensino. superior, com faculdades isoladas só em casos excepcionais : e isso desde o século XVI. No Brasil, ao contrário, as universidadPor que aconteceu justamente o contrário? Antes mesmo que a lei da reforma universitária fosse rascunhada, já tinha começado o crescimento do setor privado no ensino superior, que corria ansioso ao encontro da demanda não atendida pelas insuficientes universidades públicas. Como os empresários do
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professores-fantasmas. Assim, a idéia de se fazer da universidade a regra do ensino superior, como na maioria dos países do mundo, foi atropelada pela própria política educacional implícita da ditadura. O resultado de tudo isso foi que o ensino superior brasileiro é, hoje, dos mais heterogêneos que existem. Temos instituições que podem se equiparar, em certos campos de conhecimento, apesar de tudo, às melhores do mundo, e outras que não passam de meras máquinas de venda de diplomas a longo prazo. Infelizmente, estas são muito mais numerosas do que aquelas. Temos universidades - cerca de 70 - e oito centenas de estabelecimentos isolados, nos quais a especialização esconde, na maior parte dos casos, a mais restrita concepção da ciência, da técnica e da cultura. A progressiva redução dos recursos alocados às universidades públicas, nos últimos dez anos, fez com que elas diminuíssem o desenvolvimento da pesquisa científica, tecnológica e artística, atividade pela qual são responsáveis em praticamente 90°1° de tudoNem mesmo a sustentação do potencial de pesquisa, como também, do ensino, tem podido ser feita nas universidades públicas. Premidos por uma política salarial malthusiana, os professores vêem-se obrigados a deixar a universidade ou a estender a jornada de No grave momento em que vivemos, em, meio a uma crise economico-social que castiga nosso povo, grandes contingentes de estudantes estão abandonando os estabelecimentos particulares por não poderem pagar as crescentes mensalidades cobradas pois um ensino q
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são insuficientes para aquelas. Ainda mais, retomam a tese da cobrança
do ensino nas
universidades públicas, a "preços de mercado", de modo a eliminar a "concorrente", fosse a universidade pública uma empresa
como eles próprios definem seus
empreendimenFundação sem fundo, como as instituídas pela ditadura, estarão fadadas ao fracasso acadêmico e administrativo, só lhes restando, para sobreviver, subordinar o ensino, a pesquisa e a prestação de serviços à busca do sucesso empresarial.
81 PARA EVITAR O GOLPE Numerosas e variadas propostas de reformulação do sistema do país têm sido feitas por entidades do magistério, por as associações científicas e por partidos políticos. A análise c tarefa que não cabe neste livro. Vamos focalizar aqui as propostas - mais do que isso; as bandeiras - que têm sintetizado as mudanças de maior alcance educação: as mudanças que abrirão caminho para outras. 1 - A gratuidade do ensino público em todos os níveis fundamental a ser atingido, pois já existem escolas F grau cobrando mensalidades dos seus alunos; sem falar dos cursos das universidades federais e estaduais, às vezes; quanto as faculdades particular2 - A dotação automática de recursos para o ensino como determina a emenda constitucional no 24 (emenda João Calmon mantida na nova Constituição, nos mesmos termos: 13% impostos, da União, e 25%, dos Estados e dos município deve reservar para o ensino, in3 - Os recursos públicos destinados ao ensino devem ser aplicados nas escolas e universidades públicas. Não podemos com subsídio governamental a instituições particulares de ensino por mais que sejam, quando falta tanto para que o B~ sistema público de en
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aspirações dos que há tanto tempo lutam pela democratização da educação em nosso país. 4 -A nova Constituição deverá manter o encargo das empresas com o ensino de 19 grau, só que, ao invés de incidência sobre a folha de pagamento (o salário-educação), impõe-se encontrar uma fórmula que faça essa contribuição incidir sobre o resultado econôm5 - A nova Constituição deverá prever, como a de 1 934 e a de 1946, que o Congresso Nacional aprove uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que substitua a que foi aprovada em 1961 e sucessivamente retalhada pelas leis, decretos-lei, decretos e6 - A nova LDB deverá rever as atribuições e a composição do Conselho Federal e dos Conselhos Estaduais de Educação, de modo a se evitar que continuem a desempenhar funções executivas e cartoriais que não lhes cabem e a evitar, ainda, que continuem a ser 7 - A nova LDB deverá dar especial atenção ao atendimento escolar e para escolar das crianças de zero a seis anos, sem que, entretanto, fique comprometida a prioridade efetiva da política educacional de universalização do ensino de 1 p grau pela expansão 8 -