STRAUSS, Claude-Lévi, Raça e História, História , trad. Inácia Canelas, Editorial Presença, Lisboa, 1973.
Resumo:
A obra Raça e História de Levi-Strauss surge após a 2ª Guerra Mundial, com o apoio da Unesco, cujo objetivo era combater o racismo e anular a ideia entre a superioridade entre as raças. Patrick Wilcken, em The Poet in the Laboratory (Penguin, (Penguin, 2010), define a obra como “ um um verdadeiro panfleto anti-racista e um manifesto relativista”, apresentando as ideias de Strauss ao público em geral. Strauss inicia a sua obra referindo a importância da luta contra o preconceito racista, tendo em conta a contribuição das múltiplas raças para um património comum. O autor refere que ao analisar uma raça, há a tendência para o afastamento da verdade científica, quer seja positiva ou negativa. Apoia-se Apoia-se em Gobineau, “pai das teorias racistas”, para afirmar que a desigualdade das raças humanas terá de ser analisada de maneira qualitativa, uma vez que o problema consistia na análise não só da raça pura mas também da mistura ou “mestiçagem” cada vez mais desenvolvida. Para Strauss, Gobineau terá cometido um erro tremendo não ponderando a análise sociológica e psicológica das várias culturas humanas. O estudo aponta para as diferenças raciais e culturais, porém salientando a existência de aptidões, anatómicas e fisiológicas, distintas que se relacionam com questões geográficas, históricas e sociológicas, desenvolvendo-se então a diversidade. Nesta perspectiva, para o autor, a questão da desigualdade da raça encontra-se intimamente relacionada com a diversidade da cultura, uma vez que afirma que existem mais culturas que raças.
Neste ponto, o autor refere que as culturas divergem e anulam-se, tendo em conta a sua vivência, que se encontra documentada em suportes escritos,
denominados
“monumentos
figurados”
(p.13)
que
permitem
compreender o presente. Segundo o autor, mesmo existindo um “traço comum”, as culturas poderão divergir e tornar-se sociedades distintas, como o exemplo dos Estados Unidos da América, ex-colónia da Inglaterra. Deste modo, a diversidade das culturas não pode ser vista de modo estático, estando em constante evolução, a ideia fulcral ao longo da sua obra. Por isso, é importante pensar que a diversidade advém do contacto com outras culturas e da evolução da sociedade porque se não se relacionassem não teriam perceção da diversidade. A diversidade das culturas é considerada um fenómeno natural, sendo a atitude principal do ser humano afastar e repudiar o que é discrepante. Na tentativa de quebrar os preconceitos existtentes na mente da Humanidade, observa-se a lentidão e expansão limitada do processo, tendo em conta que, quano mais o ser humano se tenta afastar da diversidade cultural, mais se aproxima das suas características. Os sistemas filosóficos e religiosos proclamam a igualdade natural entre todos. No entanto, esta ideia poderá ser enganadora porque negligencia a diversidade em si., como referem as declarações de direitos do Homem. Strauss evidencia que ao considerarmos os esádios ou etapas de evolução de uma sociedade, o fazemos erradamente pois torna-se uma “falso evolucionismo” (p.20). Tendo em conta a teoria darwinista, o autor considera que, neste estudo, a evolução biológica não pode ser utilizada para avaliar a evolução da espécie humana e suas raças. A evolução social é anterior ao biológico e
não pode ser analisada da mesma forma pois não existe uma certeza na observação. Assim, o autor refere que em cada sociedade a mesma pode diferenciar a cultura em três vertentes: a contemporânea (surge no mesmo tempo mas em espaço diferente), a que nasceu no mesmo espaço mas em tempo diferente e a que nasceu em tempo e espaço diferentes. No entanto, apenas se pode considerar a parte de um todo, pois à medida que o tempo passa, menos conhecimento temos das civilizações mais antigas, permitindo só o reconhecimento de alguns aspetos em comum. O autor distingue, ainda, duas histórias – a história progressiva aquisitiva e a história ativa – que permitem analisar a evolução das sociedades humanas. A história progressiva aquisitiva acumula todo o passado para a construção de grandes civilizações. A história ativa à qual falta “o dom sintético” (p.27). O autor apoia-se, então, na Arqueologia, na Pré-história e na Paleontologia para mencionar a evolução progressiva da sociedade, dando como exemplo, a domesticação de algumas espécies para o melhoramento das suas condições de vida. Strauss vai avançando na sua obra para os conceitos de História Estacionária e História Cumulativa. A primeira apoia-se no desenvolvimeno análogo, isto é, “cujo desenvolvimento fosse dotado de significação para nós” ( p.33).
A segunda não apresenta qualquer significação para o ser humano.
Com estes conceitos, Strauss analisa uma socidedade nela mesma e não em confronto com outras sociedades. O autor defende que o ambiente que nos rodeia faz com que nos desloquemos com um sistema de referências que a educação nos impõe desde o nosso nascimento. Não se pode definir culturas progressivas ou
inertes, as que têm maior importância ao nível do desenvolvimento da humanidade, pois todas as culturas são desenvolvidas nos seus aspectos. Algumas são mais desenvolvidas a nível da tecnologia, outras ao nível da agricultura e outras a nível familiar (por exemplo), o que faz com que todas tenham a sua importância embora de maneira diferente. O autor refere também que é impossível emitir juízos verdadeiros sobre outras culturas diferentes da nossa, pois estará sempre aprisionada ao relativismo, embora todas as civilizações reconheçam a superioridade da civilização ocidental. Os países “insuficientemente desenvolvidos” (p.41) reprovam em relação aos outros por não lhes darem meios para poderem ser ocidentalizados. Mas, esse fenómeno está a ocorrer no presente embora não conheçamos ainda o seu resultado. Na ausência de poderem escolher, os povos subjugados tiveram que sucumbir às substituições que lhes eram proporcionadas, pois para as puderem rejeitar teriam que aguardar pela altura em que estariam prontos para combater de igual maneira no mesmo campo a civilização ocidental, não podendo ser combatida por ser “um fenómeno objectivo que só pode ser explicado pelo apelo a causas objectivas” (p.43). Embora a civilização ocidental seja conhecida pela sua “superioridade” também civilizações anteriores o fizeram no passado, não sendo tão reconhecidas pelo seu mérito sendo considerado um acaso os seus feitos. O autor refere que o acaso não pode explicar todas estas “evoluções” pois por trás havia imenso trabalho a ser desenvolvido e nenhum acaso evoluiria sem esforço do homem. O autor menciona ainda na obra que para explicar as diferenças nas civilizações à medida da sua evolução existe a “necessidade de se invocarem conjuntos de causas tão complexas e tão descontínuas que seriam incognoscíveis” (p.49).
Os etnógrafos são muitas vezes limitados a observar as “mudanças subtis que a sua simples presença é suficiente para introduzir no grupo humano” (p,49). A civilização ocidental mostrou-se mais cumulativa do que as outras, pois soube desenvolver o capital neolítico inicial. A humanidade soube, ao longo do tempo dar continuidade a um elevado número de invenções, sínteses técnicas que mudaram a relação que o homem tinha com a natureza que por conseguinte tornou possíveis mais transformações. O autor afirma que devido ao facto de as várias transformações tecnológicas terem aparecido em simultâneo em vários sítios e alturas mostra que não dependeu da inteligência de uma raça ou de uma cultura mas de outros factores gerais, dos quais o homem não tem controlo. A revolução industrial teria sido inevitável em qualquer outro ponto do globo e com essa inevitabilidade cada cultura iria introduzir diferentes contribuições que fariam com que a questão de reclamar a prioridade do conjunto se tornaria “fútil” (p.52). Sendo uma solução para este “problema” a introdução de uma limitação, um rigor de distinção das histórias estacionária e cumulativa. Esta distinção nunca será nítida. “Toda a história é cumulativa, com diferenças de graus.” (p.53) não havendo nenhuma cultura que não o tivesse sido. A distinção dessas culturas depende apenas do cálculo de probabilidades. “A probabilidade relativa de uma combinação complexa em relação a outras combinações do mesmo tipo, mas de complexidade menor.” (p.53). Se a humanidade parecer estacionária ou regressiva não quer dizer que o seja de acordo com outros pontos de vista. “A humanidade não evolui num sentido único” (p.54). As formas de histórias cumulativas foram sempre resultado de combinações, voluntárias ou involuntárias, realizadas por meios como migrações, empréstimos, guerras, etc. daí o ser “absurdo” (p.55) afirmar que há culturas superiores umas às outras. Por estarem sempre coligadas as
culturas é isso que permite edificar séries cumulativas. A humanidade permaneceu estacionária durante nove décimos da sua história pois a história humana é uma combinação que levou tempo a produzir-se, o que poderia ter sido muito cedo ou muito mais tarde. Finalmente, tornou-se cumulativa porque o homem nunca deixou de especular, mas sempre desenvolvendo cada vez mais os seus êxitos. “O que é verdadeiro no que respeita ao tempo não o é menos no que respeita ao espaço, mas deve exprimir-se de um modo diferente.” (p.57) .A história cumulativa não é propriedade de nenhuma cultura e sim, resulta mais da sua conduta do que da sua natureza. Exprime a “maneira de estar em conjunto”. (p.58) Enquanto a história é estacionária os super organismos sociais têm como característica a história cumulativa. As contribuições culturais podem dividir-se em dois pólos opostos. De um lado, temos as aquisições isoladas que têm também um carácter limitado e, do outro, existem as aquisições que oferecem um carácter de sistema. As tentativas de compromisso ou se desorganizam por completo ou fazem um síntese original. Quando mencionamos a civilização mundial estamos a falar de um termo abstracto, “geral” a que atribuímos um valor moral ou lógico, nunca podendo deixar de verificar que o conteúdo da civilização mundial é muito pobre. As culturas contribuem com as suas diferenças e os sentimentos de gratidão e humildade que podem e devem ter para com os outros. Consideramos civilização um “conceito limite” (p.61) a civilização implica a “coexistência de culturas” (p.61) No último capítulo, o autor refere que todo o progresso cultural é função de uma ligação entre as diferentes culturas e consiste em pôr “em comum
das
possibilidades
que
desenvolvimento histórico” (p.62).
cada
cultura
encontra
no
seu
A diferença entre culturas é um factor que ultrapassa a fronteira do tempo, evoluindo em vários campos e a ritmos diferentes umas das outras. A diversidade entre as várias culturas deve contribuir para uma melhor relação entre ambas, sendo favorecida a generosidade e o respeito de umas para com as outras e assim viver em harmonia.