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PRESIDENTE DA REPÚBLICA Luiz Inácio Lula da Silva MINISTRO DA EDUCAÇÃO Fernando Haddad GOVERNADOR DO ESTADO Wellington Dias REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ Luiz de Sousa Santos Júnior SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PIAUÍ Antonio José Medeiros SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DO MEC Carlos Eduardo Bielschowsky DIRETOR DE POLITICAS PUBLICAS PARA EaD Hélio Chaves COORDENADORIA GERAL DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL Celso Costa COORDENADOR GERAL DO CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA A DISTÂNCIA DA UFPI Gildásio Guedes Fernandes SUPERITENDÊNTE DE EDUCAÇÃO SUPERIOR NO ESTADO Eliane Mendonça DIRETOR DO CENTRO DE CIENCIAS DA NATUREZA Helder Nunes da Cunha COORDENADOR DO CURSO NA MODALIDADE EAD Miguel Arcanjo Costa COODENADORA DE MATERIAL DIDÁTICO DO CEAD/UFPI Cleidinalva Maria Barbosa Oliveira
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Este texto é destinado aos estudantes aprendizes que participam do Programa de Educação a Distância da Universidade Aberta do Piauí (UAPI), vinculada ao consórcio formado pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), Universidade Estadual do Piauí (UESPI), Centro Federal de Ensino Tecnológico do Piauí (CEFET-PI), com apoio do Governo do Estado do Piauí, através da Secretaria de Educação. O texto é composto de quatro unidades, contendo itens e subitens, que discorrem sobre a Sociologia Geral e a Sociologia da Educação propriamente dita; Na unidade 1 abordarei o contexto histórico do surgimento da Sociologia como ciência. Apresentarei também as disciplinas que têm afinidades com a Sociologia. Na unidade 2 enfatizarei as primeiras formas de pensamento social, como também os procedimentos teórico-metodológicos dos pensadores clássicos, como o francês Émile Durkheim, com o método positivista-funcionalista; o alemão Karl Marx, com o seu método histórico e dialético; e o também alemão Max Weber, com o método compreensivista. Na unidade 3 apresento a análise da educação na perspectiva marxista, durkheimiana e weberiana. Na unidade 4 contextualizarei a Sociologia da Educação propriamente dita, abordando a sua importância; analisando a função da escola na sociedade capitalista; a sua trajetória desde o funcionalismo até o pós-modernismo; o seu papel no processo socializador; e as explicações sociológicas para o contexto brasileiro com reflexos na educação. Além do mais, ela será compreendida como Espaço Sócio-Cultural na versão de Juarez Dayrel .
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1 A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA
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1.1 O Contexto Histórico do Surgimento da Sociologia
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1.2 Disciplinas que têm Afinidades com a Sociologia
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1.3 Para Saber Mais
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Atividade 1
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1.4 Sugestão de Filme
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2 AS FORMAS DE PENSAMENTO SOCIAL
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2.1 O Positivismo como Primeira Forma de Compreensão 23 da Vida Social. 2.2 As Correntes Sociológicas
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2.2.1 Durkheim e o Positivismo-funcionalismo
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2.2.2 Marx e o Materialismo Histórico e Dialético
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2.2.3 Weber e o Compreensivismo
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Atividade 2
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2.3 Sugestão de Filme
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3 A EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DURKHEIMIANA E WEBERIANA
MARXISTA,
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3.1 Educação em Marx
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3.2 Educação em Durkheim
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3.3 Educação em Weber
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Atividade 3
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4 A COMPREENSÃO DA EDUCAÇÃO NUMA PERSPECTIVA 50 SOCIOLÓGICA 4.1 Para que Estudar Sociologia da Educação
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4.2 A Sociologia da Educação: Entre o Funcionalismo e o 55 Pós-modernismo 4.3 A Função da Escola na Sociedade Capitalista
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4.4 Educação como Processo Socializador: Função 67 4
Diferenciadora e Função Homogeneizadora 4.5 Explicações Sociológicas para o Contexto Brasileiro e 72 seus Reflexos na Educação Atividade 4
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4.6 A Escola como Espaço Sócio-Cultural
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4.7 Referência Bibliográfica
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1 A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA
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1.1 O Contexto Histórico do Surgimento da Sociologia
08
1.2 Disciplinas que têm Afinidades com a Sociologia
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1.3 Para Saber Mais
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Atividade 1
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1.4 Sugestão de Filme
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1 CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA
1.1 Contexto Histórico do Surgimento da Sociologia Sociologia: A palavra Sociologia é um vocábulo composto da palavra latina societas (sociedade, socius = companheiro) e da palavra grega logos (estudo, ciência). A Sociologia é, então, a ciência da sociedade, da associação ou do companheirismo. Assim, a Sociologia é o estudo científico das formas fundamentais da convivência humana.
Revolução Francesa é o nome dado ao conjunto de acontecimentos que, entre 5 de Maio de 1789 e 9 de Novembro de 1799, alteraram o quadro político e social da França. Em causa estavam o Antigo Regime (Ancien Régime ) e a autoridade do clero e da nobreza. Foi influenciada pelos ideais do Iluminismo e da Independência Americana (1776). Está entre as maiores revoluções da história da humanidade.
A Sociologia é uma ciência que estuda o comportamento humano, os meios de comunicação em função do meio e os processos que interligam o indivíduo em associações, grupos e instituições. Ela estuda os fenômenos que ocorrem quando vários indivíduos se encontram em grupos de tamanhos diversos, e interagem no seu interior. A Sociologia como ciência surgiu como um conjunto de idéias a respeito do processo de constituição, consolidação e desenvolvimento da sociedade moderna. Ela é fruto da revolução industrial e é denominada de “ciência da crise” porque procurou dar resposta às questões sociais impostas por essa revolução que, num primeiro momento, alterou a sociedade européia e, depois, o mundo todo. A Sociologia como “ciência da sociedade” não surgiu de repente ou da reflexão de algum autor iluminado. Ela representa o resultado da elaboração de um conjunto de pensadores que se empenharam em compreender as novas transformações que estavam em curso. Ela é fruto de todo o conhecimento sobre a natureza e a sociedade, que se desenvolveu a partir do século XV. Mas a sua formação constitui um acontecimento complexo para o qual concorrerá uma constelação de circunstâncias históricas e intelectuais, e determinadas intenções práticas que se iniciam com a desagregação da sociedade feudal e a consolidação da civilização capitalista. O século XVIII foi um século de profundas transformações políticas e econômicas na sociedade européia que posteriormente se expandiram para o resto do mundo. As transformações políticas em decorrência da Revolução Francesa, de 1789, levaram a uma transformação no modelo político e administrativo das nações européias. O fim da monarquia absolutista fez surgir outras formas 8
de organização política coniventes com as transformações econômicas causadas pela Revolução Industrial da segunda metade do século XVIII. Surge aí o Estado burguês. Os pensadores iluministas eram os ideólogos da burguesia que atacavam os fundamentos da sociedade feudal e os privilégios de sua classe dominante (nobreza, clero), que restringia os interesses econômicos e políticos da burguesia nascente. Foi este contexto que antecedeu a Revolução Francesa. A Revolução Industrial representa o triunfo da sociedade capitalista, onde os empresários passaram a controlar os meios de produção e, por outro lado, as grandes massas das classes trabalhadoras desprovidas dos meios de produção , detentores apenas de força de trabalho, que passaram a ser submetidos ao dono do capital. A nova forma de produção da vida material, a partir de então, faz surgir uma nova forma organização da vida social. A utilização da máquina na Revolução Industrial, além de destruir o artesanato, submete o trabalhador a uma nova disciplina onde, a partir daquele momento, toda a produção dá-se numa linha de trabalho produtivo. E na linha do trabalho produtivo o trabalhador não se reconhece como produtor de bens de consumo. A partir daquele momento, ele passa a trabalhar como um robô, ou seja, no trabalho automatizado e repetitivo, onde ele não participa de todas as etapas da produção e como consequência ele perde a capacidade do saber produtivo que a partir de agora é apropriado pelo capitalista. O novo modo produção interferiu também na forma de organização familiar, desmantelou a família patriarcal, passando, a partir daquele momento, a predominar a família nuclear. Com os cercamentos dos campos para a criação de ovelhas para abastecer a indústria têxtil e com o desenvolvimento da Revolução Industrial, ocorre uma grande migração do campo para a cidade à procura de trabalho, tendo como consequência um excedente de mão-de-obra. Isso faz com que o capitalista passe a explorar o trabalho de crianças e mulheres, com jornadas de 12 a 14 horas diárias de trabalho, salários de subsistência, cidades sem as
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Revolução Industrial consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com profundo impacto no processo produtivo em nível econômico e social. Iniciada na Inglaterra, em meados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir do século XIX.
Podemos definir meios de produção ou também modos de produção, como o conjunto formado pelos "meios de trabalho" e pelos "objetos de trabalho", além da maneira como a sociedade se organiza economicamente. Os meios de trabalho incluem os "instrumentos de produção" (máquinas, ferramentas), as instalações (edifícios, armazéns, silos etc.), as fontes de energia utilizadas na produção (elétrica, hidráulica, nuclear, eólica etc.) e os meios de transporte.
Sindicalismo é o movimento social de associação de trabalhadores assalariados para a proteção dos seus interesses. Ao mesmo tempo, é também uma doutrina política segundo a qual os trabalhadores agrupados em sindicatos devem ter um papel ativo na condução da sociedade.
O Socialismo é um sistema sócio-político caracterizado pela apropriação dos meios de produção pela coletividade. Abolida a sua propriedade privada destes meios, todos se tornariam trabalhadores, tomando parte na produção, e as desigualdades sociais tenderiam a ser drasticamente reduzidas uma vez que a produção, sendo social, poderia ser equitativamente distribuída.
menores condições de saneamento devido à rápida urbanização como consequência da industrialização, e como resultado, a prostituição, o suicídio, o alcoolismo, infanticídio, a criminalidade, a violência, as epidemias etc. Em decorrência da Revolução Industrial e da situação de exploração em que passa a viver a classe proletária, esta inicia o seu papel histórico como classe revolucionária na sociedade capitalista. As manifestações que se sucederam como forma de negar suas condições de vida se materializaram em destruir máquinas, praticar sabotagem, roubos, crimes, criação de associações, formação de sindicatos etc. Passaram a produzir jornais criticando o modelo capitalista e inclinando-se para a nova forma de organização social, onde desapareceriam as classes sociais. Diante de todos esses acontecimentos que tornam visíveis as dinâmicas da vida social, a sociedade coloca-se em um plano de análise, em objeto que deveria ser investigado de forma científica, fugindo das explicações metafísicas ou espirituais. Uma coisa havia em comum entre os pensadores que testemunhavam as transformações da época: apesar de pertencerem a correntes de pensamentos diferenciados, como liberais, conservadores, socialistas etc., eles compartilhavam do mesmo pensamento – de que a sociedade capitalista era passível de ser analisada cientificamente. A partir daquele momento, o pensamento vai renunciando a visão sobrenatural de explicar os fatos e passa a buscar explicações racionais para as modificações que ocorriam na sociedade daquela época. O que até então era fenômeno passou a ser explicado pelo método científico com a aplicação da observação e da experiência, ou seja, aquilo que tinha uma autoridade teológica deveria ceder lugar a uma dúvida metódica para que a objetividade dos fatos passasse a ser conhecida. Em suma, o surgimento da Sociologia prende-se, em parte, aos desenvolvimentos oriundos da Revolução Industrial, pelas novas condições de existência por ela criada. Mas uma outra circunstância
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concorreria também para a sua formação. Trata-se das modificações que vinham ocorrendo nas formas de pensamento, originadas pelo Iluminismo. As transformações econômicas que se achavam em curso no ocidente europeu desde o século XVI não poderiam deixar de provocar modificações na forma de conhecer a natureza e a cultura.
Saiba mais: Veja mais sobre o surgimento da Sociologia www.alunosonline.com.br/sociologia www.brasilescola.com/sociologia
1.2 Disciplinas que têm Afinidades com a Sociologia
Iluminismo é
um conceito que sintetiza diversas tradições filosóficas, correntes intelectuais e atitudes religiosas. Ainda que importantes autores contemporâneos venham ressaltando as origens do Ilumunismo no século XVII tardio, não há consenso abrangente quanto à datação do início da era do Iluminismo. Boa parte dos acadêmicos simplesmente utilizam o início do século XVIII como marco de referência, aproveitando a já consolidada denominação Século das Luzes . O término do período é, por sua vez, habitualmente assinalado em coincidência com o início das Guerras Napoleônicas (1804-15).
A falta de entrosamento entre as disciplinas tem sido um equívoco grave cometido pelas escolas no Brasil e, por isso, hoje, os professores estão sofrendo as consequências da ausência dessa interdisciplinaridade em sua formação.
Isso ocorria porque cada professor preparava o seu programa sem conhecer o dos companheiros. E os motivos que levavam à falta de entrosamento entre os professores eram: a falta de tradição de trabalho em equipe; a vaidade de muitas pessoas, que não querem precisar da contribuição dos outros; o excesso de encargos dos professores – muitos deles iam à escola somente para dar aula; a falta de embasamento filosófico. Isso dificultava uma visão integrada do processo educativo.
Hoje os Programas Curriculares Nacionais (PCN’s) propõem uma visão interdisciplinar, multidisciplinar, transdisciplinar, no sentido de fundir os conteúdos curriculares.
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Os Parâmetros Curriculares Nacionais são diretrizes elaboradas pelo Governo Federal que orientam a educação no Brasil e são separados por disciplina.
Sociologia e Filosofia da Educação
Nas escolas que trabalham com educação é importante o entrosamento da Sociologia com a Filosofia da Educação, que as duas disciplinas caminhem juntas na produção de saberes. Os fatos têm de ser estudados junto com os valores, embora a Sociologia busque a objetividade dos fatos.
Os sociólogos modernos têm de saber distinguir em que medida seus juízos de valor afetam a atitude científica. Eles têm de ser imparciais; não podem tomar posição, mas seus valores estão imbuídos na investigação dos fatos.
A Filosofia deve estabelecer os fins a que se propõe a educação e os valores desta, ou seja, a educação não é simplesmente o repasse de informações, é também a formação humanística do homem, por isso, ela tem valores. E deve também distinguir quais são os valores permanentes e quais são os determinados por momentos históricos. Como por exemplo: os valores de manutenção da vida são permanentes; valores de uma sociedade de consumo são históricos, são modernos; valores que se dão à educação sistematizada são modernos e históricos.
A Sociologia da Educação busca na Filosofia os valores a partir dos quais se elabora a teoria da educação, e volta à Sociologia para ver como a educação interage na sociedade.
Ela oferece o ponto de partida e de chegada para todo o conhecimento humano, uma vez que a mesma elabora as perguntas que angustiam o homem, como também se encarrega de dar as respostas.
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Sociologia e Psicologia
Na Psicologia, a falta de conhecimento sociológico pode levar a uma visão deformada dos problemas psíquicos. Tendemos a ver os problemas como reflexos de uma situação isolada e individual.
Para entendermos a sociedade, temos de entender a psique humana. O homem é individual e interage com os outros, formando o social.
À Sociologia cabe integrar um caso isolado do contexto global em que estão inseridos o indivíduo e sua família, mostrando os condicionamentos sociais e culturais que explicam a maior parte das afecções psíquicas do homem.
Sociologia e Ciência Sociais
A Sociologia ocupa-se dos aspectos da vida do homem e seu relacionamento com os outros homens. O que a distingue das outras ciências sociais, já que estas também se ocupam do homem sob o aspecto das relações sociais?
Para começar, toda ciência tem sua particularidade, e a Sociologia é a única ciência social que se ocupa das relações entre os homens em seu aspecto mais geral, procurando analisar o comportamento humano naquilo em que tal comportamento é afetado pela vida em sociedade, estudando, ao mesmo tempo, o produto destas inter-relações, que são as instituições sociais.
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A Psicologia (do grego Ψυχολογία, transl. psykhologuía , termo derivado das palavras ψυχή, psykhé , "alma", e λόγος, lógos , "palavra", "razão" ou "estudo") é a ciência que estuda os processos mentais (sentimentos, pensamentos, razão) e o comportamento humano e animal (para fins de pesquisa e correlação, na área da Psicologia comparada).
As ciências sociais são um ramo do conhecimento científico que estuda os aspectos sociais do mundo humano. Diferenciam-se das artes e das humanidades pela preocupação metodológica. Os métodos das ciências sociais, como a observação participante e o survey , podem ser utilizados nas mais diversas áreas do conhecimento, não apenas na grande área das humanidades e artes, mas também nas ciências sociais aplicadas, nas ciências da terra, nas ciências agrárias, nas ciências biomédicas etc. Embora polêmica, é comum a distinção entre qualitativos e quantitativos.
Economia Política
Economia é a ciência social que estuda a produção, distribuição, e consumo de bens e serviços. O termo economia vem do grego para oikos (casa) e nomos (costume ou lei), daí "regras da casa (lar).”
Ela é uma ciência social porque estuda o homem e suas relações sociais, mas tem sua particularidade. Ela estuda as relações que homens estabelecem entre si por imposição de suas necessidades materiais ligadas à subsistência, como alimentação, moradia, vestuário etc.
O conceito de Economia Política, segundo o estudioso Charles Gide, “é o estudo daquelas relações do homem em sociedade que conduzem à satisfação de suas necessidades, ao seu bem-estar e que dependem da posse dos objetos materiais”.
A busca da satisfação das necessidades materiais do homem afeta a ordenação da superestrutura da sociedade. Marx analisou que para compreender a sociedade, é necessário entender as relações de produção, baseadas nas forças produtivas existentes nos modos produção que se organizam em torno das forças produtivas.
Ciência Política
A Ciência Política estuda, como as outras ciências, a relação entre os homens, sob o ângulo da organização e da destruição do poder – o poder dos homens sobre outros homens, que se dissimula através do Estado. Esse fato impõe-se aos grupos que adquiriram um mínimo de complexidade em suas relações.
No campo da educação, o conhecimento das Ciências Políticas nos ajuda a compreender o contexto social dentro do qual se inserem as instituições educacionais; ajuda-nos a entender de quem o Estado está a serviço.
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Em todo o grupo, a educação tem uma política que precisa ser entendida para que se possam tomar decisões ligadas à educação.
Antropologia
Antropologia, apesar de ser também uma ciência social, tem vínculos com a Biologia e com a Arqueologia: a Biologia estuda a vida; a Arqueologia, os fósseis. A Antropologia estuda o desenvolvimento do corpo humano e o desenvolvimento cultural através de tempo. Ela procura explicar como as alterações no mundo físico influenciam como sócios.
Tanto a Etnografia (estudo do corpo humano descrevendo raça, religião, língua, costumes etc.) como a Etnologia (estuda a cultura dos povos naturais) têm contribuído para com a Teoria da Educação. Como? Estudando as culturas particulares.
Esses estudos derrubam o mito de uma natureza humana que impediu durante muito tempo o avanço das teorias e dos métodos educacionais.
Antropologia e a Etnologia têm contribuído para desvendar os papéis sociais do homem e da mulher: As comparações entre diferentes comunidades nos mostram que os papéis masculinos e femininos são socialmente construídos; não são imutáveis; não são de uma natureza humana. Levantamentos da Etnografia têm nos mostrado que os papéis tidos por nós como tipicamente masculinos são desempenhados por mulheres, e vice-versa.
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Ciência Política é o estudo da política — dos sistemas políticos, das organizações políticas e dos processos políticos. Envolve o estudo da estrutura (e das mudanças de estrutura) e dos processos de governo — ou qualquer sistema equivalente de organização humana que tente assegurar segurança, justiça e direitos civis. Os cientistas políticos podem estudar instituições, como corporações (ou empresas, no Brasil), uniões (ou sindicatos, no Brasil), igrejas ou outras organizações cujas estruturas e processos de ação se aproximem Antropologia (cuja origem etimológica deriva do grego άνθρωπος anthropos, (homem / pessoa) e λόγος (logos razão / pensamento ). É a ciência preocupada com o fator humano e suas relações.
História
História é o estudo do homem no tempo, concomitante à análise de processos e eventos ocorridos no passado. Por metonímia, o conjunto destes processos e eventos. A palavra história tem sua origem nas «investigações» de Heródoto, cujo termo em grego antigo é Ἱστορίαι (História ). Todavia, será Tucídides o primeiro a aplicar métodos críticos, como o cruzamento de dados e fontes diferentes.
A História mantém estreita relação com a Sociologia. Nós vimos que para entender os aspectos em que surgiu a Sociologia tivemos de fazer um resgate histórico, embora seus objetos de estudo sejam distintos.
A História ocupa-se do fato histórico e a Sociologia ocupa-se dar inter-relação dos indivíduos, que é constante.
A História ajuda a Sociologia da Educação no sentido de distinguir entre o que precisa ser preservado e o que é inútil. A grande lição que a história pode nos dar consiste em impedir que se cometam, de novo, os erros do passado.
Psicologia Social
A Psicologia Social estuda a interação recíproca entre pessoas e os efeitos que essa interação exerce sobre os pensamentos, sentimentos, emoções e hábitos dos indivíduos.
Para a Sociologia Educacional, a Psicologia Social contribui no sentido de permitir entender que os indivíduos que interagem no processo educativo são seres sociais e, ao mesmo tempo, pessoas, na sua individualidade. A função da Psicologia Social é neutralizar os equívocos ditos somente sociológicos ou psicológicos.
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Conclusões
O objetivo deste texto é mostrar o objeto de estudo de alguns ramos do conhecimento que dizem respeito aos homo sócios, e que as divisões destas áreas são divisões arbitrárias com fins metodológicos.
Não existe, no homem e nem na sociedade, atuação compartimentada ou isolada. O comportamento humano é uma totalidade permanente.
1.3 Para Saber Mais Leia o livro Introdução ao Pensamento Sociológico, de Ana Maria de Castro e Edmundo Fernandes Dias (orgs.) Eldorado. Esse é um livro muito interessante, pois os osrganizadores procuram, por meio de textos de autores clássicos (Èmile Durkheim, Max Weber, Karl Marx, Talcott Parsons) e de alguns de seus comentadores, dar uma visão panorâmica das principais questões do conhecimento sociológico. •
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O que é Sociologia, de Carlos B. Martins, Brasiliense.
ATIVIDADE 1 Pesquise sobre o Iluminismo e produza um pequeno texto sintetizando as idéias e os principais representantes desse movimento, e compartilhe com seus colegas.
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1.4 Sugestão de Filme FILME: Germinal Trabalhadores Despertos
O dicionário será uma ferramenta de trabalho importante para você durante o curso. Por isso, se você ainda não começou a utilizá-lo, comece a fazê-lo, pesquisando o significado dos termos “igualitarismo”, “racionalismo”, “individualismo” e “secularização”. Utilizem, em suas pesquisas, dicionários da língua portuguesa e de áreas como Filosofia, Pedagogia, Sociologia e História.
O título do livro e do filme nos confunde um pouco e, se não estivermos a par da temática da obra de Émile Zola, que deu origem ao filme de Claude Berri, podemos passar por esse filme na locadora sem percebê-lo e sem dar a ele o devido valor. Não nos enganemos: essa produção do cinema francês merece ser vista e apreciada tanto pelos amantes da sétima arte, quanto pelos estudiosos da Literatura, da História, das relações humanas e dos movimentos de trabalhadores.
"Germinal" refere-se ao processo de gestação e maturação de movimentos grevistas e de uma atitude mais ofensiva por parte dos trabalhadores das minas de carvão do século XIX, na França, em relação à exploração de seus patrões. Nesse período alguns países passaram a integrar o seleto conjunto de nações industrializadas ao lado da pioneira Inglaterra, entre os quais, a França, palco das ações descritas no romance e representadas no filme.
A forma contundente como as ações ocorrem no filme tornam a crueza dos acontecimentos extremamente chocante para os espectadores. No entanto, esse discurso um tanto quanto agressivo por parte do diretor Berri tem o firme propósito de conclamar os espíritos da audiência e chamar a atenção para as dificuldades e a rudeza do mundo operário do século XIX.
Vilipendiado, roubado, esgotado, trabalhando em condições totalmente impróprias, inseguro, sujeito a acidentes que
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podem ceifar-lhe a vida ou decepar-lhe um braço ou uma perna, assim nos é mostrado o proletariado francês nas telas. Inserido na escuridão das minas de carvão, sujo, cumprindo jornadas de 14, 15 ou 16 horas, recebendo salários baixíssimos e tendo de ver sua família toda encaminhar-se para o mesmo tipo de trabalho e péssimas condições, pouco resta aos trabalhadores, senão a luta contra aqueles que os oprimem.
A obra literária é do período que marca o surgimento da Internacional Comunista. Por isso, há menções a Marx e Engels, e também ao anarquismo (uma das personagens centrais da trama assume o discurso dos pensadores que propuseram o anarquismo até as últimas consequências, mesmo tendo em vista as desgraças que isso poderia causar naquele contexto específico).
Um trabalho paralelo envolvendo a leitura de trechos selecionados do livro, sendo monitorado pelos professores da área de Literatura, acompanhado por uma passagem em Filosofia, pelas obras dos intelectuais que abordaram os temas das lutas de classes, e uma elucidativa aula sobre as condições em que se desenvolveu o movimento trabalhista ao longo do século XIX, na Europa, por parte do professor de História, fariam com que a compreensão do filme e, consequentemente, do fenômeno da confrontação entre patrões e empregados, fosse mais bem assimilada pelos estudantes.
A história do filme gira em torno de uma família que se encontra nas mencionadas condições de miséria e penúria listadas nos parágrafos anteriores. O chefe dessa família, vivido pelo grandalhão Gerárd Depárdieu (considerado um dos melhores atores franceses de todos os tempos, que também trabalhou em outros importantes filmes com temática histórica, como "Danton - O Processo da Revolução", e "1492 - A Conquista do Paraíso"), vê-se, então, obrigado a tomar providências, e para isso é estimulado pela chegada de um novo operário, que já possui vivência em termos de 19
criação e fomentação de movimentos reivindicatórios. O primeiro passo dessa dupla passa a ser, então, criar condições de sobrevivência para os trabalhadores, tendo-se em vista que uma greve poderia se prolongar por um longo período de tempo. Por isso, criam uma caixa de resistência com a qual todos os operários deveriam contribuir. A diminuição dos salários e o pouco caso dos patrões em relação à segurança e à saúde dos trabalhadores aumenta ainda mais as tensões.
Paralelamente à história dos trabalhadores, podemos acompanhar a burguesia e seu cotidiano de brioches, grandes refeições, luxuosas residências e total descaso em relação ao mundo que existe além dos seus portões.
O contraste também é proposital. Tem por objetivo acirrar os ânimos de quem assiste e fazer com que as pessoas tomem partido (obviamente dos trabalhadores). Por isso, deve-se destacar, quando se trabalhar esse filme, a questão ideológica. Como obra que procurou ser fiel aos acontecimentos do período em que foi escrita, a perspectiva para os operários não é das melhores.
Uma boa reprodução de época, acompanhada por atuações convincentes, a escolha acertada das locações onde o filme foi produzido e a excelente trama que se desenvolve paralelamente às disputas entre burgueses e trabalhadores tornam o filme uma ótima pedida para facilitar o estudo dessa difícil e complicada questão. Assistam!
Ficha Técnica: País/Ano de produção: França, 1993 Duração/Gênero: 158 min, drama Disponível em vídeo
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2 AS FORMAS DE PENSAMENTO SOCIAL
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2.1 O Positivismo como Primeira Forma de Compreensão 23 da Vida Social. 2.2 As Correntes Sociológicas
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2.2.1 Durkheim e o Positivismo-funcionalismo
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2.2.2 Marx e o Materialismo Histórico e Dialético
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2.2.3 Weber e o Compreensivismo
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Atividade 2
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2.3 Sugestão de Filme
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2 AS FORMAS DE PENSAMENTO SOCIAL
Auguste Comte (1798-1857) Nasceu em Montpellier, França, de uma família católica e monarquista. Viveu a infância na França napoleônica. Estudou no colégio de sua cidade e depois em Paris, na Escola Politécnica. Tornou-se discípulo de Saint-Simon, de quem sofreu enorme influência. Devotou seus estudos à Filosofia Positivista, considerada por ele como uma religião, da qual era o pregador. Segundo sua Filosofia Política, existiam, na história, três Estados: um teológico, outro metafísico e, finalmente, o positivo. Este último representava o coroamento do progresso da humanidade. Sobre as ciências, distinguia as abstratas das concretas, sendo que a ciência mais complexa e profunda seria a Sociologia, ciência que batizou na sua obra Curso de Filosofia Positiva , em seis volumes, publicada entre 1830 e 1842. Além desta, publicou Discurso sobre o Espírito Positivo , Discurso sobre o Conjunto do Positivismo , Sistema de Política Positiva , Catecismo Positivista e a Síntese Subjeíiva . Morreu em Paris.
2.1 O Positivismo como Primeira Forma de Compreender a Vida Social A primeira corrente do pensamento sociológico foi desenvolvida por Augusto Comte e foi denominado de Positivismo, que veio para substituir as explicações teológicas pela crença na razão.
Na visão de Comte, a sociedade era concebida como um organismo constituído de partes integradas e coesas. Por isso ele foi chamado de para-organicismo. A visão positivista de sociedade dá-se com o avanço do imperialismo europeu do século XIX. Nesse período, os europeus deparam-se com uma civilização de características rudimentares, onde predominava a poligamia, a economia agrária, o artesanato, e a produção doméstica. Para os europeus esse novo mundo teria de ser transformado para receber o produto industrializado e a mão-de-obra assalariada. Então, a Europa vê-se na obrigação de civilizar os incivilizados e, para isso, utilizaram-se da Teoria Evolucionista, de Charles Darwin, e criaram o darwinismo social, argumentando que as 23
Positivismo é uma corrente sociológica cujo precursor foi o francês Auguste Comte (17981857). Surgiu com o desenvolvimento sociológico do Iluminismo e das crises social e moral do fim da Idade Média, e do nascimento da sociedade industrial. Propõe à existência humana valores completamente humanos, afastando radicalmente a Teologia ou Metafísica. Assim, o Positivismo - na versão contemporânea, pelo menos - associa uma interpretação das ciências e uma classificação do conhecimento a uma ética humana, desenvolvida na segunda fase da carreira de Comte.
sociedades saem de um estágio primitivo para estágios avançados, que é o capitalismo. Os cientistas sociais positivistas entendiam que as sociedades atrasadas eram verdadeiros “fósseis vivos primitivos” em plena era capitalista. Apesar do otimismo positivista, o desenvolvimento industrial fazia surgir a todo o momento novos conflitos sociais e, consequentemente, a classe trabalhadora passava a manifestar-se, exigindo mudanças políticas e econômicas nas novas relações sociais. Para evitar conflito, os filósofos positivistas da época, desenvolveram as idéias de “ordem e progresso”. O progresso, no sentido de transformar a sociedade das mais simples para as mais complexas; e a ordem ajustaria os indivíduos para melhor funcionamento da sociedade. O Positivismo buscava justificar, através de um método científico adequado, os padrões burgueses e industriais da organização social. Procurava resolver os conflitos por meio da exaltação à coesão. As formulações positivistas, apesar de serem organicistas, mas não terem aspirações divinas, já são o suficiente para perceber que a sociedade é passível de ser analisada e explicada de outra forma que não a religiosa.
2.2 As Correntes Sociológicas
A Sociologia não é uma ciência de apenas uma orientação teórico-metodológica dominante. Ela tem diferentes formas de analisar a sociedade. As principais, fundadas pelos seus autores clássicos, as quais podemos citar, não necessariamente em ordem de importância, são: a Positivista-Funcionalista, tendo como fundador Auguste Comte e principal expoente clássico em Émile Durkheim – de fundamentação analítica; a Sociologia Compreensiva, iniciada por 24
Max Weber – de matriz teórico-metodológica-hermenêuticocompreensiva; e a linha de explicação Sociológica Dialética, iniciada por Karl Marx, que mesmo não sendo um sociólogo e sequer se pretendendo a tal, deu início a uma linha árdua de explicação sociológica. Estas três formas de análise da sociedade, originadas pelos seus três principais autores clássicos, influenciaram quase todos os posteriores desenvolvimentos da Sociologia, levando à sua consolidação como disciplina acadêmica já no início do século XX, quando Èmile Durkheim sistematizou seus conteúdos e a implantou nas Universidades da França.
2.2.1 Durkheim e o Positivismo-funcionalismo Èmile Durkheim (1858-1917) foi fortemente influenciado pelo pensamento científico do século XIX. Sua preocupação era delimitar o objeto e o método da Sociologia. Para ele, somente o sociólogo seria capaz de perceber a constituição da vida social através de uma aventura intelectual. Durkheim achava que as leis que regulam os fenômenos da natureza seriam iguais às leis que regulam a dinâmica da vida social. Sendo assim, cabe à Sociologia descobrir as leis da vida coletiva. Éinile Durkheim (1858-1917) Nasceu em Epinal, na Al-sácia. Descendente de uma família de rabinos, iniciou seus estudos filosóficos na Escola Normal Superior de Paris, indo depois para a Alemanha. Lecionou Sociologia em Bordéus, primeira cátedra dessa ciência criada na França. Transferiu-se em 1902 para a Sorbonne, para onde levou inúmeros cientistas, entre eles, seu sobrinho Mareei Mauss, reunindo-os num grupo que ficou conhecido como “Escola Sociológica Francesa”. Suas principais obras foram: Da Divisão do Trabalho Social; As Regras do Método Sociológico; O Suicídio; Formas Elementares da Vida Religiosa; Educação e Sociologia; Sociologia e Filosofia; e Lições de Sociologia (obra póstuma). Morreu em Paris.
A Sociologia, na visão de Durkheim, é o estudo dos fatos sociais que podem ser entendidos como os modos de agir que exercem sobre o individuo uma coerção exterior e apresentam uma existência própria, independente das manifestações individuais que 25
possam ter. Durkheim afirmava que os fatos sociais devem ser considerados como coisas. Ele as chama de coisas pelo fato de termos uma visão vaga e confusa, além da ilusão de conhecê-los. Portanto, para livrar-se das pré-noções e dos preconceitos nãocientíficos, devemos tratar os fatos sociais como coisas. Coisa para ele é todo objeto de conhecimento que a inteligência humana não penetra de modo imediato, necessita do auxílio da ciência. Essa atitude é tida somente na mente do intelectual. Os fatos sociais exercem uma força sobre o comportamento dos indivíduos. É o caso da moda, do casamento, das correntes de opinião. São situações que exercem uma coerção, uma espécie de obrigatoriedade sobre o indivíduo. Fato social é qualquer forma de coerção sobre os indivíduos, que é tida como uma coisa exterior a eles, tendo uma existência independente e estabelecida em toda a sociedade, que é considerada, então, como caracterizada pelo conjunto de fatos sociais estabelecidos.
Os fatos sociais são exteriores à consciência individual e são coercitivos. Na exterioridade, os próprios homens elaboram as “maneiras de fazer”, que também são ligadas pelas gerações anteriores (já encontramos prontas). Fazemos em conjunto com uma multidão de pessoas que sequer conhecemos, e o resultado final escapa ao nosso controle. Para que exista um fato social, é preciso que vários indivíduos tenham misturado suas ações e saia um resultado novo. Já o caráter coercitivo dos fatos sociais dá-se pelo fato de existirem fora de nós, e termos de nos conformar com a sua existência. Ele age como uma força exterior que atua sobre nós, nos moldando e nos regulando. Causa-nos uma espécie de sanção, que pode ser legal ou espontânea. As legais são as sanções prescritas pela sociedade, e as espontâneas seriam as que afloriam em decorrência de uma conduta não adaptada à estrutura do grupo ou da sociedade ao qual o indivíduo pertence. Ao estudar os fatos sociais o investigador deve ser neutro, pois eles devem ser estudados como se estivessem fora da consciência do investigador, para não haver parcialidade entre sujeito e objeto.
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Durkheim faz a distinção entre consciência individual (psique, jeito de pensar, agir, entender a vida, a alma do indivíduo) e consciência coletiva (conjunto de crenças e sentimentos comuns aos membros de determinada sociedade, que é independente dos indivíduos – embora só se realize através deste). As duas convivem juntas em cada indivíduo. Só separamos as duas consciências para fins de pesquisa científica, tratando os fatos sociais como coisas exteriores ao indivíduo.
Formas de Solidariedade Durkheim acreditava que as “espécies” sociais tinham as mesmas semelhanças das “espécies” vivas, e que poderiam ser classificadas numa escala evolutiva das mais simples para as mais complexas. Ele caracteriza dois tipos extremos de sociedade, que correspondiam ao nível inferior e ao nível superior da escala evolutiva. Nelas e estariam a solidariedade mecânica e a solidariedade orgânica.
Solidariedade Mecânica: O Princípio das Semelhanças
Nas sociedades arcaicas – primitiva e feudal – a consciência coletiva exercia um papel preponderante para a integração social. Nelas, as pessoas uniam-se a partir de semelhanças na religião, na tradição, nos sentimentos, nas crenças. Todos exercem aproximadamente as mesmas atividades, observam os mesmos costumes, cultuam os mesmos deuses. Os seja, o que unia as pessoas não era a dependência uns dos outros, mas o fato de terem sentimentos comuns. Este tipo de solidariedade tende a declinar nas sociedades modernas.
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Solidariedade Mecânica, para Durkheim, era aquela que predominava nas sociedades précapitalistas, onde os indivíduos se identificavam através da família, da religião, da tradição e dos costumes, permanecendo, em geral, independentes e autônomos em relação à divisão do trabalho social. A consciência coletiva aqui exerce todo seu poder de coerção sobre os indivíduos.
Solidariedade Orgânica: Princípio da Diferenciação
Solidariedade Orgânica é aquela típica das sociedades capitalistas, onde, através da acelerada divisão do trabalho social, os indivíduos tornavam-se interdependentes. Essa interdependência garante a união social, em lugar dos costumes, das tradições ou das relações sociais estreitas. Nas sociedades capitalistas, a consciência coletiva afrouxa-se. Assim, ao mesmo tempo que os indivíduos são mutuamente dependentes, cada qual se especializa numa atividade e tende a desenvolver maior autonomia pessoal.
Neste tipo de solidariedade a integração é realizada a partir da diferenciação entre os indivíduos e os grupos no interior da sociedade. As pessoas se unem a partir da dependência que umas têm das outras para realizar determinada atividade social. Todos têm sua individualidade e cada uma age de acordo com sua vontade. A divergência não põe em risco o grupo. Então, por que as sociedades passaram de um modelo de solidariedade que predominava a integração para um modelo de sociedade que tem como princípio a diferença? Qual a causa da solidariedade orgânica? A resposta está na divisão social do trabalho. Mas o que levou à divisão social do trabalho? A busca da felicidade, não foi. Porque não há provas de que nas sociedades modernas os homens sejam mais felizes do que nas sociedades arcaicas. Para Durkheim a divisão é um fenômeno social decorrente de uma combinação do volume, densidade material e moral da sociedade. Volume é o número de indivíduos. Mas só volume não explica a diferenciação social; é preciso acrescentar a densidade material e moral. Densidade do material é o número de indivíduos em determinado território; densidade moral é a intensidade das comunicações e trocas entre esses indivíduos. A diferenciação social resulta da combinação dos fenômenos do volume e das densidades material e moral.
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Para explicar esse mecanismo, Durkheim invoca o conceito de “luta pela vida” (quanto mais numerosos somos, mais intensa é a luta pela vida). Então, a diferenciação social é a solução pacífica da luta pela vida. Ao invés de alguns serem eliminados para que outros sobrevivam (como fazem os animais), a diferenciação social faz com que um número maior de indivíduos sobreviva, diferenciando-se. Como somos diferentes, cada um contribui com seu papel para a vida de todos.
A Sociologia Diante do Caso Patológico e da Anomia Durkheim admitia que o capitalismo é bom, e a sociedade é perfeita. Contrapondo-se ao pensamento socialista, dizia ele, basta apenas conhecer os seus problemas e buscar uma solução científica para eles. Porque os problemas sociais entre empresários e trabalhadores não se resolveria dentro de uma luta política e sim, através da ciência, ou melhor, da Sociologia. Seria tarefa do sociólogo compreender o funcionamento da sociedade de modo objetivo, por observar, compreender e classificar as leis sociais, descobrir as falhas e corrigi-las por outras mais eficientes. O autor acreditava que os problemas sociais tivessem suas origens na crise moral, isto é, no estado social em que várias regras de conduta não estão funcionando. A esse estado de crise social Durkheim denomina de caso patológico . Por outro lado, os problemas sociais podem ter sua origem também na ausência ou insuficiência de normatização das relações sociais, e que, por sua vez, caracteriza-se como anomia. Frente ao caso patológico (regras sociais falhas), cabe à Sociologia captar suas causas, procurando evitar a anomia (crise total), através da criação de uma nova moral social que supere a velha moral e seja eficiente.
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Sabendo que a sociedade capitalista está cheia de problemas, Durkheim admitia que o Estado fosse uma instituição que teria o poder de elaborar leis que corrigissem os casos patológicos da sociedade.
Karl Marx(1818-1883)
Nasceu na cidade de Tre-ves, na Alemanha. Em 1836, matriculouse na Universidade de Berlim, doutorando-se em Filosofia, em lena. Foi redator de uma gazeta liberal em Colónia. Mudou-se em 1842 para Paris, onde conheceu Friedrich Engels, seu companheiro de ideias e publicações por toda a vida. Expulso da França em 1845, foi para Bruxelas participar da recém-fundada Liga dos Comunistas. Em 1848, escreveu com Engels o Manifesto do Partido Comunista, obra fundadora do "marxismo", enquanto movimento político e social a favor do proletariado. Com o malogro das revoluções sociais de 1848, Marx mudou-se para Londres, onde se dedicou a um grandioso estudo crítico da economia política. Marx foi um dos fundadores da Associação Internacional dos Operários ou Primeira Internacional. Morreu em 1883, após intensa vida política e intelectual. Suas principais obras foram: A Ideologia Alemã; Miséria da Filosofia; Para a Crítica da Economia Política; A Luta de Classes em França; O capital.
2.2.2 Marx e o Materialismo Histórico e Dialético
Marx observava as transformações que ocorriam na sociedade de sua época. Transformações essas que causaram miséria e sofrimento na classe trabalhadora, enquanto que a burguesia se elevava à condição de classe dominante.
Para entender essas transformações que ocorreram na sociedade capitalista, Marx julgou necessário entender como a história humana funciona, desde os primórdios da civilização. Para ele, a história da humanidade é a história da luta de classes. A luta de classe é o motor da história.
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Max e seu companheiro Engels escreveram que a história humana é a história da relação dos homens com a natureza e dos homens entre si.
A primeira condição para o homem viver é ter de comer; e para ter de comer, tem de trabalhar; e ao trabalhar, ele relaciona-se com a natureza e com os outros membros da sociedade. No processo de produção da vida material, o homem desenvolveu formas de relacionar-se com a natureza que se intensificaram ao longo da história. A essa forma Marx chamou de Forças Produtivas – São as forças de que se forças produtivas .
vale a sociedade sobre a natureza para produzir sua existência.
As forças produtivas foram desenvolvendo-se à medida que o homem passou a organizar a produção junto a seus semelhantes, distribuindo tarefas, benefício entre os membros da sociedade. Foi este o ponto de partida do processo de divisão do trabalho, sendo primeiro a divisão social do trabalho, depois a agricultura e a domesticação de animais, campo, a cidade, a indústria e o comércio.
Durante o processo produtivo o homem nunca está sozinho; ele relaciona-se com seus pares, pois a intervenção do homem na produção não é isolada, antes, reveste-se de um caráter social. A esse conjunto de relações Marx denominou de relação de produção .
As relações de produção transformam-se com a alteração e o desenvolvimento das forças produtivas a que estão organicamente ligadas e, por sua vez, agem sobre o desenvolvimento dessas mesmas forças. Ao produzirem bens necessários à vida, os homens criam determinadas relações espontâneas, independentes de sua vontade e consciência, que correspondem às etapas de desenvolvimento das forças produtivas.
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Modo de produção, em economia marxista, é a forma de organização sócioeconômica associada a uma determinada etapa de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção. Existem 7 modos de produção: Primitivo, Asiático, Escravista, Feudal, Capitalista, Comunista e socialista.
As relações de propriedade são, portanto, a base das desigualdades sociais, na medida em que a divisão do trabalho possibilita a existência de homens que trabalham para os outros, por que o fazem com os meios dos outros; e de homens que não trabalham porque têm meios e podem fazer com que os outros trabalhem para si.
Cada época histórica possui um conjunto de forças produtivas desenvolvidas e, ao mesmo tempo, um conjunto de relações sociais e produção, que são o modo pelo qual os homens assumem o controle sobre as forças produtivas.
As grandes transformações pelas quais passou a história da humanidade foram as transformações de um modo produção para outro. São eles: o modo de produção escravista, o feudal e o capitalista, com suas diferentes formas de organização da propriedade como a de escravidão, de servidão e de assalariamento. Dessas diferentes relações de propriedade surgem as classes sociais, e as transformações dão-se por causa da luta de classes em cada época.
As relações sociais de produção funcionam como forma de desenvolvimento das forças produtivas, mas chega um momento em que as forças não mais conseguem se desenvolver; abre-se aí um período de convulsão social, onde as relações vigentes são contestadas, ocasionando a revolução que leva à passagem de um modo de produção a outro
Dialética
Engels afirmava que a Dialética considera as coisas e os conceitos no seu encadeamento: suas relações mútuas, sua ação
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recíproca e as decorrentes modificações mútuas, seu nascimento, o desenvolvimento, sua decadência.
A Dialética tem três características:
A primeira é que tudo se relaciona – lei da ação recíproca: a natureza é um todo unido, coeso, em que os objetos e os fenômenos estão intimamente ligados entre si, dependentes uns dos outros, e condicionando-se reciprocamente. A segunda característica é que tudo se transforma desenvolvimento incessante: nem a natureza, nem a sociedade estão em repouso; elas estão sempre em mudanças, e sempre em relação. Realidade e natureza é processo, é movimento.
E por fim, a terceira característica é a luta dos contrários – contradição: tudo tem um lado positivo e um negativo; um passado e um futuro; o que aparece e desaparece; existe o velho e o novo; o que morre e o que nasce; o que parece o que evolui. Um exemplo típico é que com o estudante de Sociologia há uma luta entre a sua falta de conhecimento sociológico e a vontade de saber.
Essa teoria é para mostrar que a sociedade humana é produto de uma luta entre nossos ancestrais e a natureza cujo conteúdo dessa luta foi e continua sendo o trabalho.
As Formas de Consciências
Marx se propõe explicar que a consciência está ligada às condições materiais da vida, ou seja, ao intercâmbio econômico entre os homens. Mas a consciência que os homens têm dessa relação é falsa. As idéias, as concepções sobre como funciona o mundo são representações que os homens fazem a respeito de suas vidas, são 33
A palavra alienação tem várias definições: cessão de bens; transferência de domínio de algo; perturbação mental, na qual se registra uma anulação da personalidade individual; arrombamento de espírito; loucura. A partir desses significados, traçam-se algumas diretrizes para melhor analisar o que é a alienação, e assim, buscar alguns motivos pelos quais as pessoas se alienam. Ainda assim, os processos alienantes da vida humana foram tratados de maneira atemporal, defraudada, abstraídas de processos sócio-econômicos concretos. A alienação trata-se do mistério de ser ou não ser, pois uma pessoa alienada carece de si mesmo, tornando-se sua própria negação.
apenas aparências. Essas representações implicam, num primeiro momento, em uma falsa consciência, uma consciência invertida.
Ideologia é um termo usado no senso comum contendo o sentido de "conjunto de idéias, pensamentos, doutrinas e visões de mundo de um indivíduo ou de um grupo, orientado para suas ações sociais e, principalmente, políticas". A ideologia, segundo Karl Marx, pode ser considerada um instrumento de dominação que age através do convencimento (e não da força), de forma prescritiva, alienando a consciência humana e mascarando a realidade.
Mais-valia é o nome dado por Karl Marx à diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador, que seria a base da exploração no sistema capitalista.
A percepção da aparência e o entendimento de suas conseqüências para cada um ficam bloqueados pelo modo como os indivíduos adquirem consciência do mundo social em que nasce, cresce e morre.
A realidade cotidiana só lhe ensinou que tem de trabalhar e receber seu salário para viver. Se o trabalho sempre foi o meio através do qual o homem se relacionou com a natureza para retirar o seu sustento, no sistema capitalista, ele é compreendido como algo que não pertence a este ser humano, e aí o indivíduo torna-se alienado, adquirindo uma falsa consciência do mundo em que vive. Como consequência, o trabalho alienado e a dominação de uma classe sobre outra é visto como algo natural, porque o processo histórico real é ocultado pela ideologia, ou seja, por um sistema ordenado de idéias e concepções, de normas e de regras que obrigam os homens a comportarem-se segundo a vontade do sistema, como se estivessem se comportando segunda a sua própria vontade.
Se a exploração econômica e a opressão política do homem pelo homem sempre houve em todas as sociedades, no capitalismo essa opressão dá-se de forma dissimulada, a ponto tal que a classe trabalhadora pensa com a cabeça da classe dominante, ou seja, as idéias dominantes são as idéias da classe dominante.
No modo de produção capitalista, o proprietário dos meios de produção compra força de trabalho da classe trabalhadora, e nessa relação ocorre a mais-valia, ou seja, o patrão não remunera todo o trabalho realizado pelo operário, mas apenas parte dele; a outra parte é apropriada pelo capitalista.
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Marx e Engels achavam que chegaria o momento em que as forças produtivas entrariam em contradição, e aí se abre uma época de revolução social e política, fazendo com que surgisse outro tipo de sociedade, sem exploradores e inexplorados, sem a alienação, sem ideologia, sem classes sociais, e sem Estado. Seria o comunismo.
Max Weber (1964 – 1920)
Foi na cidade de Erfurt que nasceu Max Weber, numa família de burgueses liberais. Desenvolveu estudos de Direito, Filosofia, História e Sociologia, constantemente interrompidos por uma doença que o acompanhou por toda a vida. Iniciou a carreira de professor em Berlim e, em 1895, foi catedrático em Heidelberg. Manteve contato permanente com intelectuais de sua época, como Simmel, Sombart, Tõnnies e Georg Lukács. Na política, defendeu ardorosamente seus pontos de vista liberais e parlamentaristas, e participou da comissão redatora da Constituição da República de Weimar. Sua maior influência nos ramos especializados da Sociologia foi no estudo das religiões, estabelecendo relações entre formações políticas e crenças religiosas. Suas principais obras foram: Artigos Reunidos de Sociologia da Religião; Artigos Reunidos de Teoria da Ciência; Economia e Sociedade (obra póstuma); e A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Morreu em Munique
2.2.3 Weber e o Compreensivismo
Weber teve uma contribuição importantíssima para o desenvolvimento da Sociologia. Herdeiro de uma tradição filosófica diferente e vivendo os problemas da Alemanha, diversos dos da França e Inglaterra na mesma época, pôde trazer uma nova visão que não descendia nem de ideais políticos, nem de racionalismo positivista de origem anglo-francesa.
Diferentemente de Durkheim, Weber tem como preocupação central compreender o indivíduo e suas ações. Segundo ele, a
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O Comunismo é uma ideologia e um sistema econômico que tem por objetivo a criação de uma sociedade sem classes, baseada na propriedade comum dos meios de produção, com a consequente abolição da propriedade privada, sob tal sistema, o Estado não teria necessidade de existir e seria extinto.
sociedade existe concretamente, não é algo externo acima das pessoas, é sim, o conjunto das ações individuais, relacionando-se reciprocamente. Durkheim afirmava que o indivíduo é produto da sociedade. Quando nós nascemos, a sociedade já existe e vai nos moldar através de um processo educacional chamado de socialização . Já Weber diz que a sociedade é formada por indivíduos, que na sua individualidade se relacionam com seus pares, formando a sociedade.
As representações (Estado, a igreja, a família) são o desenvolvimento e entrelaçamento de ações específicas de pessoas individuais, e para se compreender como se encadeia esse entrelaçamento de ações, Weber desenvolveu o conceito de ação social para estruturar a Sociologia como uma ciência compreensiva.
AÇ O SOCIAL – È toda ação que o indivíduo desenvolve quando leva em consideração os outros indivíduos.
O objeto das Ciências Sociais é decifrar o sentido da ação social, ou seja, as ações humanas, e a única maneira de estudar esse objeto é tendo a compreensão de como se desenvolvem essas ações.
O ponto de partida é a ação social. Weber, ao analisar o modo como os indivíduos agem e, levando em conta a maneira como eles orientam suas ações, agrupou as ações individuais em quatro grandes tipos, a saber:
- Ação social racional com relação a fins: nesse tipo de ação, o indivíduo pensa antes de agir em uma situação dada; ele calcula os custos e benefícios que terá realizando ou não a ação.
- Ação social racional com relação a valores: fundamenta-se em convicções, tais como o dever, a dignidade, a beleza, a sabedoria, a piedade ou a transcendência de uma causa. São os valores que estão impregnados na sociedade. 36
- Ação social afetiva: esta ação tem por fundamento os sentimentos de qualquer ordem. O que importa nesta ação é dar vazão às paixões momentâneas.
- Ação tradicional: tem por base os costumes arraigados, a tradição familiar ou um hábito. É um tipo de ação que se adota quase automaticamente, reagindo a estímulos habituais. Reparem que no dia a dia, esses tipos de ações sociais não aparecem separadamente. As razões se misturam. Mas o método de Weber consiste em isolar esses tipos “puros” de comportamentos, que não existem, servem apenas como referência pelos sociólogos para analisar a realidade social.
Vamos compreender como funciona a metodologia de W eber, através da metodologia compreensivista. Para isso, temos de seguir alguns passos.
O primeiro passo é construir um tipo ideal “puro” (o tipo é uma construção mental, feita na cabeça de investigadora, a partir de vários exemplos históricos. Ele é um exagero de perfeição que jamais será encontrado na vida prática).
No segundo passo, selecione o aspecto a ser investigado no mundo social que o cerca.
No terceiro passo, compare o mundo social empírico com o tipo ideal que você construiu na sua mente.
No quarto passo, à medida que você compara, a realidade apresenta-se para você, aproximando-se ou distanciando-se do tipo puro que você imaginou, ou seja, revelando-se em seu caráter mais complexo.
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Na F, Empirismo é um movimento que acredita nas experiências como únicas (ou principais) formadoras das idéias, discordando, portanto, da noção de idéias inatas. Na ciência, o empirismo é normalmente utilizado quando falamos no método científico tradicional (que é originário do empirismo filosófico), o qual defende que as teorias científicas devem ser baseadas na observação do mundo, em vez da intuição ou fé.
É assim que a ação social com relação a fins serve – para que se possa avaliar o alcance daquilo que é irracional. Então, chegamos a um entendimento melhor do que seja a Sociologia chamada de Compreensiva, que é aquela que se refere à análise de comportamentos movidos pela racionalidade dos sujeitos com relação aos outros.
ATIVIDADE 2 Neste capítulo, examinamos conceitos utilizados por diferentes autores na análise da relação dos indivíduos na sociedade: classe social (Marx), consciência coletiva e anomia (Durkheim), ação social (Weber). Qual desses conceitos poderia nos ajudar na interpretação do comportamento de nossa sociedade? Produza um texto e compartilhe com seus colegas .
2.3 Sugestão de Filme
Este filme é indicado para a compreensão sobre socialização na discussão apresentada por Durkheim
Kaspar Hauser (provável 30 de Abril de 1812 – 17 de dezembro de 1833, em Ansbach, Mittelfranken) foi uma criança abandonada, envolta em mistério, encontrada na praça Unschlittplatz , em Nuremberg, Alemanha do século XIX, com alegadas ligações com a família real de Baden. VIDA Hauser passou os primeiros anos de sua vida aprisionado numa cela, não tendo contato verbal com nenhuma outra pessoa, fato esse que o impediu de adquirir uma língua. Porém, logo lhe foram ensinadas as primeiras palavras, e com o seu posterior contato 38
com a sociedade, ele pôde, paulatinamente, aprender a falar, da mesma maneira que uma criança o faz. Afinal, ele havia sido destituído somente de uma língua, que é um produto social da faculdade de linguagem, não da própria faculdade em si. A exclusão social de que foi vítima não o privou apenas da fala, mas de uma série de conceitos e raciocínios, o que fazia, por exemplo, com que Hauser não conseguisse diferenciar sonhos de realidade durante o período em que passou aprisionado. Hauser, supostamente com quinze anos de idade, foi deixado em uma praça pública de Nuremberg, em 26 de maio de 1828, com apenas uma carta endereçada a um capitão da cidade explicando parte de sua história, um pequeno livro de orações, entre outros itens que indicavam que ele provavelmente pertencia a uma família da nobreza. Entre as idiossincracias originadas pelos seus anos de solidão, Hauser odiava comer carne e beber álcool, já que aparentemente havia sido alimentado basicamente por pão e água. Aprendeu a falar, a ler e a comportar-se, e a sua fama correu a Europa, tendo ficado conhecido à época como o "filho da Europa". Obteve um desenvolvimento do lado direito do cérebro notadamente maior que o do esquerdo, o que teoricamente lhe proporcionou avanços consideráveis no campo da música. Hauser foi assassinado com uma facada no peito, em dezembro de 1833, nos jardins do palácio de Ansbach. As circunstâncias e motivações, ou autoria do crime jamais foram esclarecidas, apesar da recompensa de 10.000 Gulden (c. 180.000,00 Euros), oferecida pelo rei Luís I, da Baviera. A sua história foi representada no filme de Werner Herzog, "Jeder für sich und Gott gegen alle " (em língua portuguesa, "Cada um por si e Deus contra todos"), de 1974, lançado no Brasil com o título "O Enigma de Kaspar Hauser".
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3 A EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DURKHEIMIANA E WEBERIANA
MARXISTA,
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3.1 Educação em Marx
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3.2 Educação em Durkheim
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3.3 Educação em Weber
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Atividade 3
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3 A EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DURKHEIMIANA E WEBERIANA
MARXISTA,
3.1 A educação em Marx
O tema da educação não ocupou o lugar central na obra de Marx. Ele não formulou explicitamente uma teoria da educação, muito menos princípios metodológicos e diretrizes para o processo ensino-aprendizagem. Observamos que sua principal preocupação fora o estudo das relações sócio-econômicas e políticas e o seu desenvolvimento no processo histórico. Entretanto, a questão educacional encontra-se inevitavelmente enredada em sua obra. Existem alguns textos que Max, juntamente com Engels, redigiu sobre a formação e o ensino em que a concepção de educação está articulada com o horizonte das relações sócio-econômicas daquela época. É por isso que, antes de fazer algumas considerações sobre educação, foi necessário passar pelo seu modo de compreender a sociedade.
A educação, na sociedade capitalista é, segundo Marx e Engels, um elemento de manutenção da hierarquia social. A igualdade política é algo meramente formal e não passa de uma ilusão, visto que a desigualdade social é concreta e inequívoca.
No entanto, uma das possibilidades de viabilizar a superação das dicotomias existentes e da emancipação do ser humano reside na integração entre ensino e trabalho. A esta integração eles designam ensino politécnico ou formação ominilateral . Por meio dessa educação omnilateral o ser humano desenvolver-se-á numa perspectiva abrangente, isto é, em todos os sentidos. A integração entre ensino e trabalho constitui-se na maneira de sair da alienação crescente, reunificando o homem com a sociedade. Essa unidade, segundo Marx, deve dar-se desde a infância. O tripé básico da educação para todos é o ensino intelectual (cultura geral), 42
desenvolvimento físico (ginástica e esportes) e aprendizado profissional polivalente (técnico e científico).
Marx e Engels não só indicaram frequentemente que o trabalho físico sem elementos espirituais destrói a natureza humana como, também, que a atividade intelectual à margem do trabalho físico conduz facilmente aos erros de um idealismo artificial e de uma abstração falsa. Logo, a união entre os dois dá um caráter integral à educação e tomará o lugar da formação unilateral, especializada e alienada.
Assim, o ensino aparece como instrumento para o conhecimento e também para a transformação da sociedade e do mundo. Este é o potencial e o caráter revolucionário da educação. O proletariado, por si só, não conquista sua consciência de classe, sua consciência política, justamente pelo fato de ter sido privado desde o início dos meios que lhe permitem consegui-lo. Por isso, há a necessidade de um processo educativo pautado em um projeto político e pedagógico definido e voltado aos interesses da grande maioria excluída. Aí é que surge o papel estratégico da escola, dos educadores e intelectuais, os quais, em nosso entender, são decisivos para construção da consciência de classe do trabalhador.
Acreditamos que é extremamente pertinente a concepção educativa de Marx e Engels, visto que a sua proposta recupera o sentido do trabalho enquanto atividade vital em que o homem humaniza-se sempre mais, ao invés de alienar-se, e a educação é concebida não como instrumento de dominação e manutenção do status quo , mas como processo de transformação dessa situação.
A obra desses autores constitui uma crítica fundamental à concepção da burguesia sobre o ser humano e a educação. Às concepções metafísicas e idealistas, que são fundamentalmente conservadoras, estes pensadores opõem a concepção materialista, 43
“O novo homem comunista deveria ser educado de tal modo que ele pudesse de fato superar a divisão do trabalho que o dominara sob o capitalismo. Não seria suficiente a revolução política e o controle do poder do Estado pelos operários para socializar os meios de produção. Seria necessário que, ao socializar os meios de produção, a nova forma de organização industrial encontrasse homens preparados para desempenhar um trabalho que não fosse alienado, parcial, restrito de suas potencialidades.”
histórica e dialética, isto é, no interesse pelo ser humano real em carne e osso, por seus problemas enquanto vivem em sociedade, visando a uma transformação positiva e o humanizante. Esta concepção dialético-histórica do ser humano toma como premissa fundamental o fato de ele não ser um dado, mas é essencialmente um “construir-se”. Deste modo, a educação deve vir para corroborar essa construção que não é meramente teórica ou abstrata, mas real, prática.
Na sociedade capitalista contemporânea, a educação reproduz o sistema dominante tanto ideologicamente quanto nos níveis técnico e produtivo. Na concepção socialista, a educação assume um caráter dinâmico, transformador, tendo sempre o ser humano e sua dignidade como ponto de referência. Uma educação omnilateral é o que continua fazendo falta à nossa sociedade. O atual sistema educativo, sobretudo no Brasil, vem confirmando o que se diz sobre reprodução, exclusão e dominação. Para Durkheim, a “educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não são encontradas ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, relacionados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio moral a que a criança, particularmente, se destine”. destine”.
3.2 Educação em Durkheim
Para Durkheim, a educação é essencialmente um processo pelo qual aprendemos a ser membros da sociedade. Educação e socialização.
“É uma ilusão acreditar que podemos educar nossos filhos como queremos”, sentencia Durkheim, no seu livro Educação e Sociologia . Existem certos costumes, certas regras, que devem ser obrigatoriamente transmitidas no processo educacional, gostemos deles ou não. Se não fizermos isso, a sociedade vingar-se-á de nossos filhos, pois não estarão em condição de viver em meio aos outros, quando adultos. A cada momento histórico, acredita Durkheim, existe um tipo adequado de educação a ser transmitida. Idéias educacionais muito ultrapassadas ou muito à frente das do tempo, diz nosso sociólogo, não são boas porque não permitem que 44
o indivíduo educado tenha uma vida normal, harmônica com seus contemporâneos.
Mas se, como dissemos antes, as sociedades modernas são muito diferenciadas, devido à divisão do trabalho social, como seria possível um único tipo adequado de educação para todos? Ora, não seria possível. Para Durkheim, a educação adequada é educação própria ao meio moral que cada um compartilha. Nas sociedades complexas existem muitos meios morais, conforme a divisão em classes, em castas, em grupos, em profissões etc. Assim, não existe uma educação única para que todos aprendam a ser membros da sociedade. Você aprende a ser um membro da sua classe, no seu grupo, de sua casta, de sua profissão, enfim, no seu meio moral. Este é o modo específico, particular, pelo qual você se torna membro da sociedade. Isto não é algo que esteja disponível em sua abrangência total para todas as pessoas. Socializar-se é aprender a ser membro da sociedade, e aprender a ser membro da sociedade é aprender seu devido lugar nela. Só assim é possível preservar a sociedade. Preservá-la inclusive de sua própria diferenciação.
É isso que nos permite viver em sociedade; é isso que permite que a sociedade viva em nós; e é isso que permite à sociedade continuar viva: sermos iguais e diferentes ao mesmo tempo. Só a educação pela qual passamos é capaz de fazer assim. E é por isso que educação é um processo social.
3.3 A Educação em Weber
Segundo Weber, a história humana é um processo crescente de racionalização da vida, ou seja, é o abandono de concepções mágicas e tradicionais que justificavam o comportamento dos homens.
45
Enquanto que Marx via na educação a possibilidade de romper com a escravidão do ser humano, Weber vê na educação a possibilidade de desenvolver o talento do ser humano, em nome da preparação para obtenção de poder e dinheiro. dinheiro.
Para ele, o que constitui a sociedade é a ação e a interação dos indivíduos. Quanto mais complexas forem as sociedades, mais conflitivas tendem a ser as interações entre indivíduos e grupos, uma vez que maiores serão as constelações de interesses. Então, o Estado veio para regular o conflito através da dominação de uns sobre os outros.
O exercício da autoridade do Estado depende de um quadro administrativo, hierarquizado e profissional que se caracteriza pela existência de uma burocracia. Nesse sentido é que a educação é o modo pelo qual determinados tipos de homens são preparados para exercer as funções de racionalização r acionalização..
Segundo Weber, a educação sistemática passou a ser um pacote de conteúdos e de disposições voltados para o treinamento de indivíduos que tivesse de fato condições de operar essas novas funções, de “pilotar” o Estado, as empresas e a própria política, de um modo racional.
A racionalização e a burocratização alteraram radicalmente o modo de educar. Então, a burocracia estatal e a empresa capitalista precisam de profissionais para isto.
A educação, para Weber, não é mais, então, a preparação para que o membro do todo orgânico aprenda a sua parte do comportamento harmônico do organismo social, como propôs do Durkheim. Nem é, tampouco, vista com possibilidades de emancipação com base na ruptura com a alienação, como propôs Marx. Ela passa a ser, na medida em que a sociedade se racionaliza historicamente, o fator de estratificação social, um meio de distinção, de obtenção de honras, de prebendas, de poder e de dinheiro. Weber vê a educação dirigida três tipos de finalidades: a de despertar o carisma, preparar uma conduta de vida e transmitir conhecimentos especializados. As duas primeiras fogem à nossa 46
racionalização; portanto, a terceira, por ser a racional, torna-se a pedagogia do treinamento.
Com a racionalização da vida social e a crescente burocratização do aparato público de dominação política e das grandes corporações capitalistas privada, a educação passa a ter a finalidade de um preparo especial com o objetivo de tornar o indivíduo um perito.
ATIVIDADE 3
Com base na visão dos autores sobre o papel da educação, comente no fórum a sua visão de educação, destacando a sua preferência em uma das análises anteriores.
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48
4 A COMPREENSÃO DA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA
EDUCAÇÃO
NUMA
4.1 Para que Estudar Sociologia da Educação
50 50
4.2 A Sociologia da Educação: Entre o Funcionalismo e 55 o Pós-modernismo 4.3 A Função da Escola na Sociedade Capitalista
63
4.4 Educação como Processo Socializador: Função 67 Diferenciadora e Função Homogeneizadora 4.5 Explicações Sociológicas para Brasileiro e seus Reflexos na Educação
o
Contexto
72
Atividade 4
87
4.6 A Escola como Espaço Sócio-Cultural
94
4.7 Referência Bibliográfica
128
49
4 A COMPREENSÃO DA EDUCAÇÃO NUMA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA 4.1 Para que Estudar Sociologia da Educação?
O laicismo é uma doutrina filosófica que defende e promove a separação do Estado das igrejas e comunidades religiosas, assim como a neutralidade do Estado em matéria religiosa. Não deve ser confundida com o ateísmo de Estado.
No artigo “Sociologia da Educação: para quê ?” O autor Cristian Baudelot faz um questionamento: é útil ou inútil ensinar Sociologia da Educação aos futuros professores? O sociólogo francês Èmille Durkheim foi o primeiro a formular este questionamento há mais de um século. E a essa pergunta ele deu respostas teóricas e práticas.
Durkheim era um erudito e militante da educação. Ele tinha um interesse enorme pela educação por dois motivos: como intelectual que era, ele via na educação o principal mecanismo de socialização dos jovens; ele também tinha interesse em desenvolver uma moral laica, isso porque a moral existente na época era impregnada de dogmas religiosos, e esses dogmas não mostravam a realidade de forma objetiva e racional, como preconizava Durkheim, ao entender a sociedade cientificamente.
Durkheim via na disciplina Sociologia da Educação a ciência destinada aos futuros professores, uma forma de proceder a uma análise objetiva do sistema de ensino, sua história, suas funções, seus conteúdos, seus ideais. Isso para se obter dois resultados: primeiro, manter a educação moral na educação primária. E uma moral laica, racionalista e sociológica, embasando os professores de conhecimentos sobre os sistemas de ensino para que eles mesmos possam transformá-los, sabendo o que estão fazendo.
A partir dessa nova visão da realidade social, a sociedade passaria a ter uma nova fé, a fé na racionalidade, na objetividade dos fatos, desarmados de dogmas religiosos, para que se tenha uma nova opinião que não seja uma inculcada de cima para baixo, sem questionamentos. Mas Durkheim sabia que isso não seria tarefa fácil 50
para a Sociologia da Educação, porque ele conhecia a resistência que oferecia a realidade social. Afinal de contas, quando as pessoas nascem, a realidade já existe; e essa realidade vai atuar sobre o individuo. E fazer o inverso não seria tarefa fácil.
A Sociologia da Educação seria a disciplina que deveria introduzir no desenvolvimento da sociedade uma alta consciência de si através da educação. Então, professores bem preparados teriam esse papel de conscientização. Daí a utilidade do ensino da Sociologia da Educação aos futuros professores.
Mas segundo Cristian Baudelot, a Sociologia da Educação adormeceu um bom período, votando a renascer nos anos 60, com a pesquisa de alguns sociólogos na área da educação.
A Sociologia moderna, diferente da Sociologia durkheimiana, vê os estudantes como o centro das análises: suas origens de classes, os diferentes resultados escolares, as diferenças sociais. Essa nova Sociologia analisa o público escolar que vem de origens diferentes e que ocuparão postos diferentes na divisão social do trabalho. Estes alunos que ocuparão postos diferenciados serão justificados por alguns autores como consequência da natureza humana como dom e o mérito; outros acham que é normal essa desigualdade social, devido à lei da reprodução da sociedade. Mas todos percebem a diferenciação sócio-profissional.
Legitimidade de um Balanço
Diante dessa realidade, faz necessário levantar o seguinte questionamento: os conhecimentos sociológicos da educação levaram a alguma transformação no funcionamento escolar? Todos esses conhecimentos sociológicos dos últimos anos mudaram algo
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na escola, uma vez que a ética de todo sociólogo, que estuda cientificamente a sociedade é combater as desigualdades sociais?
Então o autor argumenta que é em função desse balanço que saberemos se é o útil ou não ensinar Sociologia da Educação aos futuros professores. Para isso, ele nos convida a fazer uma abordagem, fazendo referência às diferenças de classes.
A abordagem remete à percepção de que a escolarização obrigatória ampliou-se: há mais pessoas com diplomas certificados de estudo em todos os níveis.
Mas isso não é a democratização do acesso ao ensino. Porque esse acesso é aos diferentes diplomas para crianças de diferentes classes sociais: filhos de operários e camponeses têm acesso a certificados primários e de habilidades profissionais; e aos filhos da classe média e alta, o acesso dado é ao ensino superior. Os diplomas são compatíveis com os empregos: ensino curto – operário ensino superior – funções de melhor status . A mudança quanto aos professores foi a feminização: de 1950 a 1975, de cada dez professores, oito eram mulheres, e apenas 18% eram filhas de operárias, o restante eram filhas de classe média e alta; em 1979-80, um filho de operário tinha 10 vezes mais possibilidades de repetir seu primeiro ano primário do que um filho ou filha de um médio. Então, a generalização da escolarização e a tendência de elevar o número de diplomas não significam democratização do ensino, nem aceso de ensino de qualidade para todos.
Então, a difusão de uma Sociologia da Educação de esquerda contra a perpetuação das desigualdades sociais pela escola não modificou o sistema educacional. A Sociologia da Educação não serve para nada, pois não conseguiu vencer as desigualdades sociais que combate? Seria melhor substituí-la por outras disciplinas. Afinal de contas, as informações mostradas anteriormente mostram
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que quem tem poder econômico tem acesso às melhores escolas, e quem têm acesso às grandes escolas, terá melhor poder econômico.
Esse balanço negativo não deve nos levar ao desanimo, porque só em reconhecer esse fracasso já é uma lição de Sociologia para a ação. Pois a realidade escolar não se muda pela boa vontade dos professores, nem por decretos de governos. A realidade é mais complexa, e temos de perceber como se encadeia essa complexidade.
Dentro da sociedade capitalista, o problema são as funções sociais do sistema escolar da sociedade burguesa. E quem é capaz de contribuir para elucidar essas funções sociais é a Sociologia da Educação.
A escola capitalista divide as crianças porque a divisão capitalista do trabalho exige que trabalhadores intelectuais sejam separados dos trabalhadores manuais.
Temos uma realidade na sociedade capitalista: 20% dos trabalhadores são trabalhadores intelectuais, e a grande maioria, 80%, são de indivíduos pouco qualificados.
A divisão capitalista do trabalho, a exploração dos trabalhadores, a extorsão da mais-valia, a desqualificação do trabalho, o temor do desemprego, o exército industrial de reserva, a separação crescente do trabalho intelectual e trabalho manual, eis aqui as verdadeiras causas que permitem explicar a estrutura e o funcionamento da escola capitalista.
É a organização capitalista que separa as crianças em duas vias de escolarização: uma destinada aos filhos membros da classe
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trabalhadora, e a outra destinada aos filhos membros da classe dominante.
O professor deveria ser o elucidador dessa trama social que é costurada, no sentido de reproduzir uma sociedade de classes. Mas ele também é vítima, porque também concorre dentro do sistema de produção capitalista.
Esta é, entretanto, a realidade, e tem de ser encarada. A função real da escola não tem, em absoluto, como fim, desenvolver harmoniosamente o indivíduo ou desenvolver suas qualidades pessoais; isto é um sonho abstrato de psicólogo. Consiste, pelo contrário, em produzir para o mercado de trabalho séries de mão-deobra mais ou menos qualificada. É a estrutura do mercado de trabalho o que pesa sobre a escola, com todo seu peso, até o ponto de imprimir-lhe sua forma. INSEE (Francês: I nstitut
N ational de la S tatistique et des É tudes É conomiques ) é o Instituto
Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos. Ele coleta e publica informações da economia e sociedade francesas, realizando periodicamente o censo da nação, sendo semelhante ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (do Brasil) e ao Instituto Nacional de Estatística (de Portugal). Está localizado em Paris.
Os números de uma pesquisa do INSEE mostram que dos jovens que entram no mercado de trabalho, 3/4 são empregados ditos das classes subalternas, o restante são empregos e quadro. Temos uma polarização das qualificações: por um lado, postos que não exigem qualificação; por outro, postos destinados a indivíduos que receberam uma longa formação escolar.
Temos aí duas vias de escolarização: a primeira é a via secundário-superior, que formará 20% dos quadros; e a segunda via é a primário-profissional; que absorverá os 80% restantes. E contra essa divisão o professor não pode fazer nada. É melhor reconhecer essa divisão do que negá-la. Ela só desaparecerá com a destruição das relações capitalistas de produção. Somente a Sociologia da Educação permite aos professores distinguir entre o que depende deles e o que não depende.
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A educação popular de massa propaga o discurso de que somos todos iguais e que a educação tem de ser igual para todos. Mas, à medida que é pregada a igualdade, a sociedade reproduz a desigualdade. Não há necessidade ou vontade, por parte do sistema, da construção de uma educação popular de massa, pois só assim a desigualdade é reproduzida.
A melhor forma de melhorar a formação dos mais abandonados seria a democratização do ensino. Democratizar ensino é pôr a escola à serviço do povo, com todo produto que é reservado também aos intelectuais. Todos têm de ter a mesma educação na via primário-profissional.
O sociólogo da educação é quem tem essa visão ampla da realidade social e escolar. E para ter essa sensibilidade intelectual com relação à escola e seu papel na sociedade capitalista, os professores de Sociologia da Educação têm de estar preparados em suas áreas, pois é comum encontrar professores de Sociologia da Educação sem a preparação adequada para tal fim. O autor afirma que em um colégio da França, no curso Educação Física, o professor de Sociologia do Esporte é um esportista. E na nossa realidade muitos dos professores de Sociologia são pedagogos, teólogos, filósofos, historiadores etc., ou seja, são profissionais que não têm o embasamento teórico necessário para ministrar tal disciplina.
Então, é importante ensinar aos futuros a serem, eles próprios, Sociólogos da Educação.
4.2 A Sociologia da Educação: entre Funcionalismo e o Pósmodernismo
O campo da Sociologia é bastante fluido, daí a dificuldade de se fazer Sociologia. No campo das ciências naturais, os objetos de estudo são objetivos; já na Sociologia, a objetividade ganha ares de 55
subjetividade. E em se tratando de educação, não podemos dizer que existe somente uma Sociologia ou se existem várias Sociologias.
A Sociologia da Educação de hoje é tão crítica, principalmente no Brasil, que é difícil pensar que nem sempre foi assim. Mesmo assim, ainda hoje, convive, lado a lado, uma Sociologia da Educação extremamente crítica com relação à ordem existente, baseada em alguns modelos marxistas e uma outra inspirada no modelo funcionalista de pesquisas empíricas.
Quando se fala de Sociologia da Educação, pensa-se imediatamente nos estudos das grandes relações entre processos sociais amplos e resultados amplos dos processos educacionais. Um exemplo disso é a produção da desigualdade via escolarização. Mas existem setores no campo da Sociologia da Educação mais preocupados com processos sociais produzidos em nível das pequenas unidades. É o caso do estudo da sala de aula.
Isso mostra como é difícil falar de uma Sociologia da Educação. A diferença entre os temas, as referências teóricas, as orientações políticas são tão grandes que é mais correto falarmos de Sociologias da Educação.
Vamos falar da Sociologia da Educação que se tornou dominante, ou seja, a mais discutida pelos autores desta disciplina, que é a perspectiva crítica.
Movendo-se no Campo: As Referências Principais.
O grande tema da Sociologia da Educação é o dos mecanismos pelos quais a escola contribuiu para a produção e a reprodução de uma sociedade de classes. Temos como autores
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Althusser, Bowles e Gintis, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Stabelet, Michel Young.
O que esses autores têm em comum é que em seus estudos percebemos a contribuição da educação para a produção e reprodução das classes. E o que os diferencia são os ensaios como os de Althusser, Bowles e Gintis, Baudelot e Estabelt, para os quais a divisão social decisiva é aquela entre as classes econômicas e para os quais o dever da escola é preparar as pessoas para os diferentes papéis do trabalho. Já para Boudieu e Passeron, a divisão social é medida por um processo de reprodução cultural.
Vamos tentar, a partir de agora, descrever os argumentos centrais de cada um desses estudos para mapear os principais temas da Sociologia da Educação.
A Divisão Capitalista do Trabalho: O Ponto de Partida e o Ponto de Chegada.
Nos estudos de inspiração marxista (Althusser, Bowles e Gintis, Baudelot e Estabelt), o problema a ser explicado é a divisão da sociedade entre proprietários e não-proprietários, em conjunção com a divisão entre trabalho intelectual e manual, e sua reprodução, com ênfase para o papel da escola nesse processo.
Nessa forma de análise, o papel da escola é preparar tecnicamente e subjetivamente as diferentes classes sociais para ocuparem os seus devidos lugares.
Althusser teoriza a respeito do papel do Estado na reprodução das classes sociais através dos aparelhos ideológicos do Estado. E aí entra a escola, encarregada de fornecer as condições ideológicas ideais para o processo de acumulação capitalista. 57
Para Baudelot e Estabelt, o sistema escolar é dividido em canais separados e incomunicáveis, que agem através dos currículos diferenciados, reproduzindo as classes sociais.
Para Bowles e Gintis, é a vivência de um contexto escolar que se constitui na imagem do contexto do local de trabalho; e que dada vivência produz o tipo de personalidade adequada às divisões existentes.
Bourdieu e Passerom atribuem ao capital cultural, transmitido aos filhos por parte das famílias das classes média e alta, o sucesso escolar e profissional.
Tomás Tadeu da Silva, autor do ensaio “O que Produz e o que Reproduz em Educação”, relata que os estudos desses autores têm deficiência, porque eles partem da visão de que o sistema tem necessidade de produzir mão-de-obra com características técnicas, e de uma população dócil. Daí a necessidade da escola para produzir esses resultados. Então, a escola só funciona assim porque o sistema assim o exige.
Bourdieu e Passeron: Os Processos Culturais em Evidência.
Para Bourdieu e Passeron, a escola não inculca valores e modos de pensamentos dominantes. Ela limita-se a usar o código de transmissão cultural de que apenas as crianças e jovens da classe dominante já foram iniciados no ambiente da família. A escola permite a continuação no jogo da cultura e confirma a exclusão dos filhos dos pais das classes subordinadas. A ênfase é ao de transmissão do capital cultural.
58
A Problematização do Conhecimento Escolar.
A Nova Sociologia da Educação, organizada por Michel Young, em 1971, na Inglaterra, depois se estendeu aos EUA e França, tendo pouca repercussão no Brasil.
Ela coloca no centro das análises sociológicas da educação a problemática dos currículos escolares. Ela põe em questão o processo pelo qual um determinado tipo de conhecimento veio a ser considerado como digno de ser transmitido via escola.
Como é que o conhecimento foi estratificado? Qual a hierarquia entre as diferentes disciplinas? Como essa hierarquia veio a ser estabelecida? Através de qual luta e negociação?
A nova Sociologia da Educação não tem como tema central a estratificação social, mas sim, a estratificação do conhecimento escolar.
Ironicamente, uma das promessas da nova Sociologia da Educação, a da análise pela qual as disciplinas escolares vieram a se constituir objeto de análises sociológicas, não chegou a ser cumprida. Uma importante tarefa parece ser realizada por uma história das disciplinas.
O Legado dos Fundadores e os Temas Centrais Hoje
Apesar do desenvolvimento da Sociologia da Educação nesses 20 anos, a problemática central continua a mesma e os temas preferidos são os mesmos. O tema central gira em torno do papel da educação na produção e reprodução de uma sociedade de classes. 59
Esse grande tema se desdobra: •
Nos temas do papel da ideologia nesse processo;
Na natureza do Estado capitalista e de sua participação na estrutura central, na institucionalização e continuação de um sistema educacional que mantém uma relação estreita com as exigências da produção capitalista; •
Na contribuição decisiva da organização da distribuição do conhecimento escolar no processo de construção das desigualdades educacionais; •
Na estreita relação entre os processos de reprodução cultural e de reprodução social; •
Na contribuição da escola para a reprodução da divisão social do trabalho. •
Muitas das temáticas introduzidas pelos permanecem pouco desenvolvidas. Por exemplo:
fundadores
•
A da relação entre uma teoria do Estado e a educação;
•
A da conexão entre os níveis micro e macro sociológico;
•
A das complexas relações entre ideologias e cultura;
•
A das relações entre a divisão social do trabalho e a educação;
•
A da questão das relações de gênero e raça.
Com relação ao primeiro tema, Bowles, Gintis e Altusser fizeram um esboço da Teoria do Estado, onde levaram em conta a educação como sendo aparelho do Estado.
No que diz respeito ao segundo tema, durante muito tempo foi negligenciado um estudo minucioso do cotidiano das escolas e das salas de aulas. 60
Hoje, muitos sociólogos da educação vêm tentando selecionar certos eventos de uma sala de aula e tentar fazer uma ligação com processos, como o da permanência da estratificação social.
Uma dessas temáticas foi realizada: é a de Willian (1991). Ele tentou fazer uma conexão entre o micro e o macro, procurando mostrar como involuntariamente, mas de forma decisiva, um grupo de adolescentes masculinos, originários da classe operária e concluindo um ciclo de educação secundário, determinava, através da rejeição dos valores escolares e do trabalho mental, seu próprio encaminhamento para o trabalho manual. O resultado final é a reprodução da classe operária como classe operária e como consequência, das relações sociais existentes.
A crítica a William reside no erro em tentar reduzir um processo amplo e complexo aos detalhes isolados de um evento qualquer da vida cotidiana.
Sobre ideologia e cultura, tem-se observado nestes últimos anos uma tentativa de encontrar ideologia em tudo dentro da educação: a ideologia do livro didático; a ideologia das políticas educacionais; a ideologia nos currículos escolares; a ideologia nas mensagens e nos atos dos professores etc. O que se tem discutido é que a ideologia é da classe dominante, e nas classes populares, é cultura.
Nas Ciências Sociais, a conexão entre ideologia e cultura tem sido aproveitada, mas muito pouco no campo da educação.
Outra temática discutida foi a da relação entre educação e trabalho. A educação aparece como local apropriado para a preparação técnica da força de trabalho para a produção capitalista.
61
A natureza precisa de conexão entre a divisão social do trabalho para que haja uma “quase” perfeita organização da produção da vida material. E nesse processo de conexão da divisão social do trabalho, a organização da educação tem sido deixada de lado. Isso porque não querem se centrar na natureza do trabalho capitalista.
Outro tema central da Sociologia da Educação são as relações de raça e gênero. No Brasil, esse tema tem tido pouca importância. Um dado evidente é que a educação no Brasil é feita, na sua maioria, por mulheres.
O Fim da História, o Pós-modernismo e a Sociologia da Educação.
Com a derrocada dos regimes do leste europeu, triunfou o capitalismo. E no Brasil, predomina uma nova direita (neoliberal).
Anuncia-se o fim da modernidade e agora tem-se a pósmodernidade. Há uma crise nas Ciências Sociais e nos métodos de análise tradicionais; e a Sociologia da Educação não poderia ter ficado fora desta suposta crise.
O modelo crítico da Sociologia da Educação sobre os aspectos da educação capitalista e a perversa organização da economia capitalista foram errados, porque agora não há nada perverso no capitalismo.
No Pós-modernismo o eixo da dinâmica social está em toda parte, e em parte alguma.
62
O Neoliberalismo Triunfante
Como fica a Sociologia da Educação nessa encruzilhada? É talvez a hora de reafirmar-se a sua vocação crítica. É hora de desamarrar os nós mistificadores da onda neoliberal e da onda pósmodernista. É hora da Sociologia da Educação reafirmar sua vocação crítica, denunciando a mistificação representada pela voga liberal.
Esse novo véu ideológico apenas demonstra que a tarefa da Sociologia da Educação está longe de ser esgotada; ela está apenas começando.
4.3 A Função da Escola na Sociedade Capitalista
Nas teorias estudadas até agora pela Sociologia da Educação, a escola tem aparecido como a instituição mais eficiente quando se trata de segregar as pessoas. Ela aparece como instituição única, que trata todos os alunos da mesma forma e onde se elaboram o conhecimento e os valores.
Dois pesquisadores franceses – Establet & Baudelot chegaram à conclusão de que existem duas redes de escolarização na França: uma destinada aos filhos dos membros da classe empresarial e outra destinada aos filhos dos membros da classe trabalhadora.
Os filhos da classe empresarial têm acesso às melhores escolas; mais tempo e recurso para estudarem frequentam outras atividades que complementam a formação e educação escolar; participam de cursos de língua estrangeiras, jogos; vão ao teatro, música, dança. Conseguem terminar o curso secundário e ingressar 63
em boas faculdades e cursam os melhores cursos, que trazem retorno financeiro que lhes mantém na condição de classe dominante.
Já os filhos da classe trabalhadora, sem recursos, têm uma longa jornada de trabalho; são obrigados a contentar-se com as piores escolas; não atingem as notas necessárias para entrar nas melhores faculdades e cursar os cursos que melhor trazem recursos financeiros. Ela vê-se, no muito, a frequentar cursos noturnos, sem nenhum curso de complementação ou aperfeiçoamento. São alunos que mal conseguem terminar o primário e lutam para conseguir alguma vaga em um curso profissionalizante. São excluídos dos cursos superiores.
Essa diferença na escolarização das duas classes sociais não aparece de forma clara. Elas coexistem de forma dissimulada, apresentando-se como sendo única, universal, oferecendo oportunidades a todos – e essa aparência ganha sustentação na ideologia.
Em resumo, o processo de escolarização é diferenciado para cada uma das classes sociais, embora a ideologia tente mostrar que é o mesmo: a classe empresarial recebe uma escolarização que lhe permite obter conhecimentos necessários para o exercício de classe dirigente; a classe trabalhadora passa por uma rede de escolarização que lhe possibilita apenas exercer um trabalho disciplinado dentro de sua condição de classe dirigida.
Nesse processo, a instituição linguagem aparece como principal fator de segregação social, pois ela não é única, pode darse de vários modos na escola, como por exemplo, no discurso do professor ou nos seus gestos, nos conteúdos dos livros adotados, nos programas de ensino, nas regras de convivência ou em normas disciplinares. Dentro da escola, a linguagem é, na visão dos pesquisadores, muito semelhante da que aparece na vida da classe 64
empresarial. Aquilo que o professor diz ou faz, aquilo que aparece nos livros e as regras da escola são, na maioria dos casos, semelhantes ao que um pai de família de classe dominante fala ao filho, semelhante aos livros encontrados em sua casa e até mesmo às regras de convivência nesta família. Neste sentido, para a burguesia, a escola é prolongamento da vida cotidiana, pois a linguagem que a classe empresarial encontra na sala de aula é a mesma utilizada em família.
Já com os filhos membros da classe trabalhadora ocorre o inverso. Ao ingressar na escola, a criança encontra uma linguagem da burguesia, que não é sua. A criança pobre encontra-se diante de uma maneira de falar ou agir do professor, diante de livros e conteúdos que não correspondem à sua vida cotidiana de trabalho, de pobreza e sofrimento. Para a criança da classe trabalhadora a escola não é o prolongamento da sua vida; é rompimento, é outra realidade, outro mundo difícil de ser interpretado. Muitas vezes a criança da classe trabalhadora não assimila os conhecimentos que a escola lhe transmite porque não entende a linguagem com que os conhecimentos lhes são transmitidos: a linguagem não tem ligação com o seu dia a dia.
Em resumo, por tratar com a mesma linguagem crianças de classes sociais diferentes, a escola reproduz a desigualdade. Enquanto a criança da classe burguesa conhece essa linguagem, pois a vive no cotidiano, a criança pobre encontra-se diante de uma linguagem nova que terá de dominar com muito esforço e sacrifício. Esse fato reflete-se no aprendizado dessas crianças, pois enquanto a primeira aprende com facilidade, a segunda terá muita dificuldade.
Isso explica por que tantas crianças abandonam a escola depois de repetir a mesma série por mais de três anos consecutivos. Sendo assim, fica desmistificada a idéia, muito comum atualmente, que atribui à própria criança e à sua família as causas do fracasso escolar. Afirma-se constantemente que a criança pobre, mal 65
alimentada, não é inteligente; que a família desintegrada leva a criança a se desinteressar pela escola. A criança pobre não se esforça e não gosta do ensino e, por isso, através de suas próprias deficiências, não será capaz de vencer na vida. Com isso, inocentase a escola e culpa-se o próprio aluno ou a sua família pelo fracasso escolar.
Mas é a escola que, sutilmente, através de sua linguagem, marginaliza a criança pobre, uma vez que na sociedade capitalista ela está a serviço da classe dominante, reproduzindo a sociedade de classes.
Dentro dessa concepção, o professor apresenta-se também como elemento de reprodução das desigualdades sociais. Na sala de aula a educação formal concretiza-se e nela o professor tem papel importante. Em outras palavras, se a educação formal apresenta-se na sala de aula e se a instituição está a serviço da classe dominante, pode-se concluir que o professor estará objetivamente a serviço dos detentores dos meios de produção.
Isso se manifesta no fato de os professores aparecerem como os primeiros a aceitarem as normas escolares e as imporem aos alunos. Em segundo lugar, os professores disciplinam os seus alunos para que produzam na escola como se produzissem numa fábrica, em função da recompensa-punição.
Geralmente o modelo de bom aluno que o professor tem em mente corresponde à criança que nunca pergunta; não reclama; sempre aceita o que o professor diz; não conversa; não fica em pé na sala de aula; numa palavra: o aluno autômato, submisso.
Enfim, a escola, na sociedade capitalista, tem a função de reprodução da sociedade. Ela é conservadora na medida que o seu 66
papel é manter a sociedade como está. E da forma como está apenas uma pequena parcela da população vive em condições dignas de cidadão.
4.4 A Educação como Processo Socializador: Diferenciadora e Função Homogeneizadora
Função
Análise de Algumas Funções de Educação
Segundo Durkheim, a educação tem sido empregada como “um conjunto de influências que, sobre a nossa inteligência ou sobre a nossa vontade, exercem os outros homens” (FORACCHI, 1985). Stuart Mill defende educação como “tudo aquilo que fazemos para nós mesmos, e tudo aquilo que os outros planejam fazer com o fim de nos aproximar da perfeição de nossa natureza. Em sua mais larga acepção, compreende os mesmos efeitos indiretos produzidos sobre o caráter e sobre as faculdades do homem, por coisas e instituições cujo fim próprio é inteiramente outro: pelas leis, formas de governo, pelas artes industriais ou, ainda, por fatos físicos independentes da vontade do homem, tais como o clima, o solo, a posição geográfica”. (FORACCHI, 1985). Segundo Kant, “o fim da educação é desenvolver em cada indivíduo toda a perfeição de que ele seria capaz” (FORACCHI, 1985). Mas o que é perfeição? Perfeição é atingir o ideal supremo. Isso é possível? Não! Porque os homens têm ações diferenciadas, ou seja, uns existem para refletir e outros para a ação. Se fosse dessa forma, na nossa sociedade, somente uns atingiriam essa perfeição pelo fato de uma grande maioria não estar incluída entre os pensadores.
Segundo James Mill, a função da educação é “fazer do indivíduo um instrumento de felicidades para si e para seus semelhantes” (FORACCHI, 1985). Essa resposta também é vaga, porque a felicidade é uma coisa subjetiva; cada um tem sua forma de felicidade.
67
O ponto fraco dessas definições é que elas partem do postulado de que há uma educação ideal, perfeita, apropriada a todos os homens.
Porém, se antes de tentar definir essa educação, eles considerassem a história, suas hipóteses, teriam, talvez, sustentação. Porque na visão de Durkheim, a educação varia com o tempo e com o meio. Por exemplo: na cidade grega a educação era para subordinar o indivíduo à coletividade; hoje, a educação esforçase em fazer do indivíduo uma personalidade autônoma; em Atenas a educação era para formar espíritos delicados, prudentes, sutis; em Roma, era para formar homens de ação, apaixonados pela glória militar; na Idade Média, era uma educação cristã; na Renascença a educação tinham um caráter mais leigo, mais literário; hoje a educação é para a ciência.
Cada sociedade, em um determinado momento, possui um sistema de educação que se impõe ao indivíduo de modo irresistível, e dele não podemos fugir. E esse sistema de educação nos obriga a educar nossos filhos de acordo com os padrões culturais préestabelecidos. É uma ilusão acreditar que podemos educar nossos filhos como queremos. Se desrespeitarmos esses costumes, eles vingar-se-ão em nossos filhos, fazendo com que eles não vivam em harmonia com seus pares devido à diferenciação no processo de socialização.
Para entendermos os costumes, temos de remontar ao passado e observá-lo para formular um conceito, pois não fomos nós que o criamos; quando chegamos, já o encontramos pronto.
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Elementos que Durkheim Considera para Definir Educação
Para definir educação temos de comparar os sistemas educativos que existem, ou que tenham existido, e apreender deles os caracteres comuns. Esses caracteres constituíram a definição de educação.
É importante salientar que para que haja educação é necessário que haja uma geração de adultos e uma geração de nãoadultos, ou seja, jovens, crianças e adolescentes. E que uma ação seja exercida pelos adultos sobre os não-adultos.
A natureza dessa influência é que a educação apresenta duplo aspecto: de ser o uno e múltiplo.
O aspecto múltiplo da educação dá-se pelo fato de haver diversas espécies de educação em determinada sociedade. Por exemplo: na sociedade de castas, a educação varia de uma casta para outra, ou seja, a educação dos patrícios era diferente da dos plebeus; a dos brâmanes não era a dos sudras. Na Idade Média, a educação do pajem era diferente da do vilão; hoje, a educação varia com as classes sociais, como também regionais.
A educação homogênea e igualitária só existiu nas sociedades pré-históricas.
O aspecto uno caracteriza-se pelo fato de ela ter uma base comum que é essa ação exercida pelos adultos sobre os imaturos, tendo como efeito a reprodução da sociedade.
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Partindo desses pressupostos, Durkheim define educação como “ação exercida pelas gerações de adultos sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto, e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine”. (FORACCHI, 1985)
Em cada um de nós existem dois seres: o ser social que é constituído de todos os estados mentais; e o ser social que é constituído por crenças, práticas, tradições, e as opiniões coletivas. Então, a educação, conforme a definição precedente, tem por fim constituir o ser social em cada um de nós, ou seja, nos socializar.
O ser social não nasce com o homem, nem o homem se submete espontaneamente. Quem queria ser submetido espontaneamente à autoridade política, às adversidades da sociedade? Não há em nossa natureza congênita uma predisposição a tornarmo-nos, necessariamente, servidores de divindades ou de emblemas simbólicos da sociedade, que nos leve a render-lhes culto, a nos privarmos em seu proveito ou em sua honra. Foi a própria sociedade, na medida de sua formação e consolidação, que tirou de seu próprio seio essas grandes forças morais diante das quais o homem sente a sua fraqueza e a sua inferioridade.
A educação agrega ao ser a-social que acaba de nascer uma natureza de vida moral e social. As múltiplas aptidões que a vida social supõe não podem organizar-se em nosso tecido, então, elas são transmitidas pela educação; não são hereditárias.
Mas há outras qualidades que o homem procura possuir espontaneamente, como: adquirir inteligência, qualidades físicas e tudo o que contribua para a saúde e o vigor do organismo.
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A inteligência tão cultivada hoje nem sempre foi concebida por todos os povos. Antes era tida como perigosa. Basta lembrar-se do ditado: “bem aventurados os pobres de espírito”. Rousseau já dizia: “para satisfazer à necessidade da vida, a sensação, a experiência e o instinto podem bastar. Nada de inteligência”.
A sede de saber deu-se quando a vida social se tornou complexa.
E com relação às qualidades físicas, se o meio social for inclinado para a perfeição espiritual, pela meditação, a educação física será relegada ao segundo plano. Era assim na Idade Média; é assim com os monges.
Tal seja a corrente de opinião, a educação física será de uma ou de outra espécie. Em Esparta, a educação física era usada para enrijecer os músculos, para resistir à fadiga; em Atenas, para ter os corpos belos; nos tempos da cavalaria, para produzir guerreiros ágeis e flexíveis; nos tempos de hoje, pela questão higiênica.
A educação fez com que, através das ações sociais, os homens aperfeiçoassem-se cada vez mais, tornando-se mais humano. O homem é humano porque coopera com seus semelhantes, e esse saber apreendido é repassado às outras gerações pela linguagem, seja ela oral, livros, figuras, instrumentos. É através da linguagem que aprendemos todos os sistemas de idéias organizados e classificados de todos os trabalhos ao longo dos séculos.
Os frutos da experiência humana são quase que integralmente conservados, graças à linguagem que se transmite de geração.
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As gerações vêm e vão, mas o conhecimento não desaparece; pelo contrário, vai acumulando-se e revisando dia a dia, e é essa acumulação indefinida que eleva o homem acima do animal e de si mesmo. E para que isso aconteça é preciso que haja a sociedade.
4.5 Explicações Sociólogas para o Contexto Capitalista Brasileiro e seus Reflexos na Educação
Pretendemos nesta análise do contexto capitalista brasileiro entender as causas da evasão e da reprovação escolar. E para analisar a evasão e repetência devemos ter um conhecimento da realidade econômica, social e política vivida pela escola.
Para isso, pretendemos compreender o capitalismo e o liberalismo, situar o nascimento da Sociologia Moderna no interior do estabelecimento do capitalismo; perceber o papel das instituições sociais através das teorias de Marx e Durkheim.
Brasil, país capitalista
O Brasil é um país de contrastes. Coexistem de maneira bastante evidente duas classes sociais bem distintas e antagônicas: de um lado temos uma classe social que vive muito bem – bem até demais; e de outro, uma classe que vive abaixo da linha da pobreza. Isso é próprio do capitalismo. Os ricos vivem graças à miséria dos trabalhadores.
Da mesma maneira que diferem as condições de vida das duas classes, variam também os anos de estudos. A classe de maior renda, que é uma minoria, dispõe de maior escolaridade, de maior
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acesso aos bens culturais. A classe de menor renda, que é a maioria, dispõe de um pouco ou nenhum acesso a tais bens culturais.
GRÁFICO DAS PIRÂMIDES INVERTIDAS Distribuição da população por faixa de renda:
Distribuição da escolaridade e do acesso aos bens culturais:
Renda alta
Grande número de anos de estudo e de bens culturais
Renda media Renda baixa
Pouco ou nenhum ano de estudo e de acesso aos bens culturais
O conhecimento perpetua a dupla relação: poder e saber e saber e poder.
Isso se mantém igualmente na relação entre países. Os países que têm poder econômico o ampliam através de pesquisas, e os países pobres importam por um preço alto.
Para Locke, a origem do governo estava em um acordo realizado entre os homens, para garantir a cada um os direitos naturais.
O Liberalismo e a Escola
O sistema capitalista apóia-se em um conjunto de idéias, de formas de agir e pensar que servem para justificar esse sistema. Esse conjunto de idéias forma uma doutrina econômica, o liberalismo , que se sustenta nos seguintes princípios:
O individualismo – para o individualismo, todos têm direitos
naturais, independente da sociedade. Todos têm atributos diferentes, cabendo ao governo garantir a cada um o desenvolvimento de seus talentos. 73
Para o liberalismo, o privilégio decorrente do nascimento (nascer em família rica) deve ser negado. Em contrapartida, o trabalho e o talento são os meios corretos para se enriquecer. Portanto, afirma que qualquer indivíduo pobre, trabalhador e com qualidades, pode enriquecer e adquirir propriedades.
Segundo o individualismo, a pobreza ou a riqueza dependem da vontade e da capacidade cada um.
A liberdade – para o liberalismo, quanto maior for o poder do
Estado, maior será a liberdade do indivíduo.
A propriedade – o direito de cada um tem e que o Estado
deve proteger. E só se consegue a propriedade através do trabalho.
Essas idéias liberais ganharam sua força máxima durante a Revolução Francesa, em 1889, cujo lema era: LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE.
A igualdade – a igualdade perante a lei. Não a igualdade
social. Para os liberais, a existência de ricos e pobres é natural, uma vez que homens não são igualmente esforçados ou talentosos.
A democracia – direito de todos participarem do governo
através de representante de sua própria escolha.
No Brasil, essas idéias liberais trazidas na época de Tiradentes sempre foram contraditórias com a realidade da nossa sociedade. Na realidade, o que nós sempre tivemos, e ainda temos, é uma grande massa de fracassados e miseráveis. E as razões do fracasso são colocadas como razões individuais.
A Sociologia não se resume a um bloco único de explicação da realidade. Dependendo da posição que assumem na análise da O modelo liberal, hoje chamado de neoliberal, serve aos sociedade, os pensadores da conservadores que pretendem a permanência da sociedade como Sociologia diferem quanto ao papel que está. atribuem à educação, à cultura e à própria sociedade, possibilitando análises A escola tem grande peso na aceitação conservadora das distintas da escola.
idéias federais. Ela sustenta-se com princípios individualizantes, pela classificação de avaliação, deixando de ver o aluno como ser social e histórico.
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A escola trata desiguais social e economicamente como iguais, reproduzindo a desigualdade. E as famílias acabam por responder pelo fracasso de seus filhos. Elas não vêem que é a escola a instituição mais eficiente no processo de segregação social.
Compreendendo a Realidade com Auxílio da Sociologia
Marx e Durkheim analisaram e explicaram a sociedade capitalista a partir de pontos de vistas antagônicos.
A harmonia proposta por Durkheim na análise da divisão do trabalho contrasta com o caráter de oposição, de luta de classes, destacado por Marx na mesma divisão do trabalho.
As idéias de Durkheim são liberais, pois defendem a manutenção da ordem social tal como é posta pelo capitalismo. Já Marx considera que a realidade é histórica – são análises críticas da sociedade capitalista.
Durkheim considera que as instituições sociais, entre elas, a educação, servem para conservar a sociedade. Para Marx, essas mesmas instituições são montadas de forma a ocultar as relações antagônicas entre capitalistas e proletariado, mantendo o domínio capitalista.
Durkheim e a Educação
Durkheim faz uma análise funcionalista da sociedade. Para ele, a sociedade assemelha-se a um organismo vivo, então, há um determinismo social sobre os indivíduos.
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Ele considera a divisão do trabalho como um processo natural: “nem todos fomos feito para refletir; é preciso que haja homens de sensibilidade e homens de ação” (KRUPPA, p. 55). Esse pensamento é conservador e o pensamento liberal conservador justifica a desigualdade como fenômeno natural. A desigualdade é tomada com o fenômeno individual e não social.
A estratificação acena com a possibilidade de ascensão social. Depende somente do esforço pessoal. E uma das vias de ascensão social proposta é a educação. Nessa visão, a educação e o sucesso escolar dependem apenas do esforço e da capacidade pessoal de cada um.
As Idéias de Marx
Marx desvendou o sistema capitalista analisando seus aspectos políticos, sociais e econômicos, com a utilização do método dialético.
Ele analisava aspectos e elementos contraditórios da realidade até chegar à sua unidade.
Marx observou que o homem, para sobreviver, trabalha. E ao trabalhar, ela mantém relações com a natureza e relações sociais.
Para Marx, na sociedade capitalista existem os donos dos meios de produção e os desprovidos de qualquer bem produtivo. Esses são apenas donos de força de trabalho, e para sobreviver vendem sua força de trabalho ao capitalista. E nessa relação de compra e venda de força de trabalho, o trabalhador é explorado através de um processo que Marx chama de mais-valia , que são as horas trabalhadas não-remuneradas pelo empregador.
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Na sociedade capitalista, durante a produção, o trabalhador separa-se de seu produto, ou seja, ele não se reconhece como produtor de bens de consumo. É como uma espécie de esquizofrenia mental que Marx chamou de alienação .
No capitalismo o homem deixa de ser homem pelo trabalho. Ele será livre quando desempenhar suas funções animais, como comer, beber, procriar etc.
A verdadeira natureza do trabalho alienado: “o trabalhador se sente contrafeito, na medida em que o trabalho não é voluntário, mas é imposto, é trabalho forçado; o trabalho não é uma satisfação de uma necessidade, mas apenas um meio para satisfazer outras necessidades; o trabalho não se pertence, mas sim a outra pessoa. Para Marx, a alienação do objeto do trabalho simplesmente resume a alienação da própria atividade do trabalho” (1994, p. 60).
A Escola no Brasil
Feitas essa considerações sobre a realidade brasileira e as explicações sociológicas dessa realidade social, vamos analisar a realidade da educação escolar brasileira. Realidade essa que se constitui na falta de vagas, evasão, repetência, analfabetismo, excesso de turnos etc.
Os problemas da educação são de ordem externa e interna. Os de ordem externa são os econômicos e sociais que têm contribuído para que a escola falhe no processo de transmissão de conhecimento e informações à população. Os mecanismos internos que reforçam essa situação se constituem na qualidade do ensino, gestão do sistema educacional, planejamento educacional, currículo, avaliação, códigos disciplinares, jornada e nível salarial dos educadores e funcionários, espaço físico, material pedagógico etc. 77
Partindo desses mais variados problemas, a educação será analisada aqui sob duplo aspecto: como direto da população e como dever do Estado. Primeiro vamos ver os resultados escolares de uma forma global; depois vamos ver à padronização e ao funcionamento da escola.
A escola no Contexto Capitalista Brasileiro
Escola e Renda
A população brasileira ainda acredita que a escola é um meio de ascensão social. Basta ver as lutas pela escola: as filas no início de ano letivo; as organizações de pais e mestres; as lutas dos movimentos sociais etc.
A escola tem respondido a essa luta? Os dados estatísticos nos dão respostas desanimadoras. No Brasil, apenas uma minoria conclui a trajetória escolar. A maioria, de baixa renda, não consegue terminá-la. Ela – a escola – está funcionando como confirmadora da distribuição de renda e de classe social: aos de maior renda, maior número de anos de estudos e de cursos concluídos; aos de baixa renda, a evasão e a repetência somam-se ao trabalho precoce, delineando um quadro já antigo: uns para pensar, outros para trabalhar.
Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 1985 e de 1989, e os dados de 1981, nos mostram que os problemas educacionais são de ordem estrutural. Em 1989, tendo por base os anos de estudos, cada 100 brasileiros, de mais de 10 anos, que tivessem algum trabalho, estavam distribuídos da seguinte forma:
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Tabela 1 Pessoas de 10 anos ou mais, ocupadas, segundo anos de estudo – Brasil – 1989.
Anos de estudos
Pessoas de 10 anos ou mais
%
% Acumulada
Sem instrução e até 1 10.126.372 ano 22.384.977 De 1 a 4 anos 14.081.700 De 5 a 8 anos 8.959.854 De 9 a 11 anos 5.002.475 12 anos ou mais
17 37 23 15 8
17 54 77 92 100
TOTAL
100
100
60.621.934
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil. IBGE, 1991.
Esses mesmos 100 brasileiros que tinham algum trabalho em 1989, tendo por base sua renda, estavam distribuídos da seguinte forma:
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Tabela 2 Pessoas de 10 anos ou mais, ocupadas, com indicação de anos de estudo e classe de rendimento mensal do trabalho (todos os trabalhos) -1989.
Anos de estudos
Ao contrário da aspiração da população, a escola não tem servido como meio de ascensão social, ou seja, a escola apenas tem confirmado a distribuição de renda.
Pessoas de 10 anos ou mais, ocupadas. Classe de rendimento mensal do trabalho De 3 a 10 S. M.
Mais de 10S.M.
Sem instrução e até 4 anos
27.108.584 64%
4.673.842 36%
795.479 16%
De 5 a 8 anos
10.027.298 23%
3.304.723 25%
749.679 15%
9 anos ou mais
5.375.916 13%
5.140.969 39%
3.445.444 69%
TOTAL
42.511.798 100% 70%
13.119.534 4.990.602 100% 100% 22% 8%
60.621.934 O que se tem nos grandes centros urbanos é uma deficiência significativa de vagas frente ao número de alunos que seria necessário atender, situação agravada quando se pretende um ensino de qualidade, com menos turnos por escola e menor número de alunos por sala de aula.
Sem rendimento
Fonte: Anuário Estatístico do Brasil ,IBGE, 1991.
Os números mostram que aos de baixa renda, pouco ou nenhum estudo; aos de maior renda, anos de estudos e cursos concluídos.
Então, a população expressa essa avaliação de forma conformista, carregada de culpa individual: “o menino é fraco de cabeça, não dá para o estudo”.
Vamos entender a escola: inúmeras turmas de primeiras séries contrastam com o reduzido número de oitava séries. As séries vão se afunilando devido às desistências que acontecem durante o 80
processo educacional. Isso se deve ao alto índice de repetência, ao retorno à escola daqueles que foram expulsos do sistema, portanto, às distorções série/idade.
Além do mais, existem as diferenças regionais, e nelas existe a pobreza. No sudeste o índice evasão e repetência é bem menor do que no nordeste; existem disparidades entre zona urbana e zona rural.
A repetência dá-se principalmente nas primeiras e nas quintas séries. Esses são pontos críticos de estrangulamentos, pois é o momento em que o aluno entra em contato com o novo. E esse novo para o aluno filho membro da classe trabalhadora está bem distante de sua vida cotidiana. Já para o filho membro da classe burguesa a escola não é nenhuma novidade, é praticamente uma extensão de sua casa.
Outro problema da educação é quanto à construção e as localizações dos prédios escolares, que muitas vezes são para atender critérios puramente eleitoreiros; muitos prédios são construídos onde não há demanda. Assim, nos grandes centros urbanos, há prédios ociosos, enquanto outros funcionam em quatro turnos ininterruptos. Escolas são feitas de forma desordenada: escola com quatro turnos ou mais; salas superlotadas; salas com um professor para varias séries diferenciadas etc.
Escola e Trabalho
As crianças filhos da classe trabalhadora começam a trabalhar muito cedo para ajudar no orçamento doméstico. No campo, o trabalho das crianças acontece com mais intensidade devido à migração dos adultos para os centros urbanos em busca de empregos.
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No início de cada ano letivo os governos estaduais e municipais fazem chamadas através dos meios de comunicação, incentivando os pais a matricularem seus filhos, mas o que se vê são filas quilométricas nas portas dos colégios.
Isso ocorre devido à concentração de renda. Além do mais, muitos mecanismos sociais atuam para que isso aconteça, e dentre eles, está a travessia na escola. Os dados mostram que não há vagas disponíveis para todos, mas os meios de comunicação divulgam o tempo todo a existência de escola para todos.
Se a análise parar na afirmação da escola para todos, estaremos o tempo todo reiterando a verdade sempre afirmada de que a escola está aí, só não estuda quem não quer. E isso é uma mentira. No Brasil, estudar é para quem pode; quem tem poder econômico; apenas uma minoria conclui os cursos escolares.
A Escola não é uma só
Não existe escola, existem escolas. Mesmo a escola pública localizada no centro da zona urbana é, em geral, melhor do que a da periferia. Também a escola particular, que é mantida através das mensalidades, varia de uma para outra. As escolas privadas de ensino supletivo e de nível superior oferecem condições deficientes de trabalho: classes superlotadas, um ensino que se resume à lousa e um professor, contratado por hora/aula, sem a menor condição de atendimento individual ao aluno, fora do tempo e do espaço da sala de aula.
No ensino privado podemos distinguir quatro grandes redes: as escolinhas, que embora sejam um dever do Estado, estão longe ser realidade; a de primeiro e segundo graus, para atender os filhos da classe média e alta; a formada pela rede de curso pré-vestibular e supletivo, com variação de qualidade de ensino e custos. O supletivo é uma continuidade do ensino fora do compasso. E está destinado àqueles que foram excluídos do ensino; e a rede formada pelas escolas superiores, que são responsáveis por cursos de engenharia, medicina, direito, administração, economia, jornalismo, licenciatura etc.
Geralmente essas faculdades funcionam à noite, porque durante o dia a sua clientela trabalha. Elas atendem pessoas oriundas do segundo grau público regular ou supletivo. Esses alunos 82
das faculdades particulares depois de formados são discriminados. Os formados nas universidades públicas ficam com os melhores cargos.
O mercado de trabalho para docentes oriundos das faculdades particulares vão para a rede pública como professores temporários, lecionando em precárias condições de jornada e remuneração, e ensinam para as classes de menor renda. Já os formados em universidades públicas serão professores efetivos concursados ou trabalharão nas escolas particulares da elite.
Assim, fecha-se o círculo: aos melhores alunos, os melhores professores e, posteriormente, os melhores empregos; aos alunos de menor renda, os professores com formação de menor qualidade e com a exaustiva jornada de trabalho.
A Organização da Escola
Eis alguns mecanismos que nos fornecem elementos para entendermos a evasão e a repetência escolar: A escola é uma instituição social que transforma a suas ações repetidas em regras; •
•
O currículo é formulado de maneira distante da realidade do
aluno;
Os elementos que estruturam a vida cotidiana como fé, probabilidade, economicismo, pragmatismo, são cristalizados, aí a escola se apresenta como instituição imutável; •
A escola acompanhou o desenvolvimento do capitalismo, então ela é marcada por fatores que constituem o sistema. •
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O termo burocracia tem sido utilizado em vários sentidos. Tem sido usado para designar o seu contrário, para designar o governo de altos funcionários, para designar organização. Na realidade, burocracia é tudo isso, na medida em que burocracia é poder, controle e alienação.
O objetivo aqui é mostrar que as regras de funcionamento da escola muitas vezes se distanciam do seu objetivo, que é formar sujeitos críticos, portadores de conhecimentos. Elas passam a exercer apenas o papel disciplinador. E esse poder disciplinador dá-se em decorrência da burocracia implantada pelo Estado dentro da escola.
No Interior da Escola a Burocracia Conta com um Poderoso Aliado: O Poder Disciplinador
O aluno não tem controle sobre o que ele faz ou sobre o que é feito com o produto do seu trabalho. O caderno do aluno funciona como registro e permite a inspeção e o controle da conformidade às ordens da instituição .
A organização burocrática se sustenta com o poder e o saber que são produzidos pelas normas burocráticas. E a escola é quem prepara o indivíduo, através do exercício disciplinador, para uma submissão útil ao sistema institucional burocratizado.
Segundo o sociólogo Maurício Tratenberg, a escola é local de vigilância: a escola lhe controla com o diário; ela tem seu histórico; cria disciplinas para entender e controlar a consciência e a alma do aluno, como a psicologia da educação, a psicopedagogia.
Os Procedimentos Burocratizantes da escola são:
A) O administrativo tem procedência sobre pedagógico . A escola para viver financeiramente precisa de demonstração de competência. Aí os números falam mais alto que o pedagógico.
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B) A submissão. Nesse compromisso com os números valorizase a submissão, que é a do diretor a seus superiores, do professor ao diretor, dos alunos ao professor. No emprego público, a segurança do emprego leva à acomodação e à submissão.
Na relação professor/aluno, existe todo um conjunto simbólico de representações que reproduz a relação de poder. A própria posição das carteiras enfileiradas; o professor na parte mais alta da sala vendo os alunos de cima para baixo; a caderneta como instrumento controlador; o sistema de avaliação, que na realidade é uma seleção, pois avaliar pressupõe tempo.
C) A situação de medo. O medo de perder a vaga; medo de ser reprovado; o medo de perder o emprego; o medo de perder sua autoridade; nos grandes centros a escola tem medo da comunidade, por isso, constroem muros altos, portões trancados, a polícia vigilante etc.
D) A burla . Professores burlam o sistema alegando achatamento salarial; professores faltam, tiram licença, vão para cargos comissionados; muitos professores vão para projetos de melhoria de ensino e não retornam mais – o que deveria ser um meio se torna um fim; existe o desperdício de tempo na demora de entrada na sala de aula, na distribuição da merenda, na busca de carteiras; existe burla na redução da jornada curricular para atender os quatro turnos; na repetência de exercícios etc.
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E) As situações de preconceitos . Os preconceitos que circulam na escola, nas falas, tanto dos professores como dos alunos: contra o favelado, o pobre, o negro. São tidos como sexualmente promíscuos, vadios, burros, marginais etc.
Os professores têm essas atitudes por que:
São alienados porque o trabalho os alienou. “Segundo Patto, a professora cumpre com sua obrigação realizando diariamente um ritual, sempre o mesmo, destituído de vida e de significado que a mortifica: obediente mas descrente, coloca sílabas na lousa, passa mecanicamente pelas carteira, constata sempre os mesmos erros que aponta com maior ou menor irritação, para começar tudo de novo no dia seguinte, no mês seguinte, no semestre seguinte. Os dias são todos iguais...” (1994, p. 108). •
Reproduzem o discurso da carência cultural e alimentar: “A criança não aprende porque não se alimenta. Porque é pobre”. •
A escola às vezes diz que o problema da criança é médico: “Tem que fazer tratamento. Tá cheio de verme”. •
Que a escola é o caminho para o sucesso e só não chega lá quem não quer. •
Falta uma discussão por parte da escola no sentido de mostrar o verdadeiro papel da educação na sociedade burguesa.
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ATIVIDADE 4 Produza um ensaio sobre o papel da educação na sociedade capitalista e coloque na base de dados.
Filme: Ao mestre, com carinho
Um jovem professor enfrenta alunos indisciplinados e desordeiros neste filme clássico que refletiu alguns dos problemas e medos dos adolescentes do anos 60. Sidney Poitier tem uma de suas melhores atuações como Mark Thackeray, um engenheiro desempregado que resolve dar aulas em Londres, no bairro operário de East End. A classe, liderada por Denham (Christian Roberts), Pamela (Judy Geeson) e Barbara (Lulu, que também canta a canção-título), estão determinados a destruir Thackeray como fizeram com seu predecessor, ao quebrar-lhe o espírito. Mas Thackeray, acostumado a hostilidades, enfrenta o desafio, tratando os alunos como jovens adultos que em breve estarão se sustentando por conta própria. Quando recebe um convite para voltar a engenharia, Thackeray deve decidir se pretende continuar.
O Clube do Imperador em busca da Formação Plena
Não há entre os autênticos educadores um único que não tenha o interesse genuíno de fazer com que sua aula extrapole os limites dos conteúdos que 87
estão sendo trabalhados e permita a seus estudantes uma formação plena, integral. E quando falamos nisso, destacamos que essa idéia envolve a busca não apenas do conhecimento, do ponto de vista acadêmico, mas também ético e filosófico.
Queremos transformar nossas crianças e jovens em pessoas que saibam o quanto é importante valorizar a vida, estimular o progresso, perceber o mundo em que vivem, amar o conhecimento, gostar de conviver com outras pessoas (e com as diferenças), enfim, crescer em busca da harmonia, do amor e da paz.
Há, sem dúvida, como nos diz o mestre Rubem Alves, aqueles que entram em aula apenas para “dar aulas”. São competentes (ou não tão competentes) “dadores” de aulas de história, matemática, ciências ou português, entretanto, não conseguem perceber que o papel dos educadores extrapola conceitos e teorias, regras gramaticais e descrições de paisagens, fatos históricos ou fórmulas matemáticas.
A educação carrega em si, de forma implícita, a realização da plenitude de nossos alunos através de seu contato conosco, os professores. Isso não significa que somos exemplares e virtuosos. Somos sujeitos a falhas e imperfeições como todas as outras pessoas. O que se espera é que consigamos, através de nossa prática pedagógica, de nossa proximidade com os estudantes, de nossa capacidade de dialogar e tantas outras habilidades e competências que devemos ter, que sejamos capazes de falar ao coração, atingir a alma, perpetuando palavras, pensamentos e ações que estão além de meros conteúdos.
Muitos educadores sabem disso. São eles que estão sempre se dispondo a escutar seus alunos tanto em aula e em relação aos tópicos e temas trabalhados em suas disciplinas, quanto fora de aula, 88
para ajudar a dissipar as dúvidas que surgem na estrada da vida; são esses professores que estudam sempre e constantemente buscam novas fórmulas e metodologias que tornem suas aulas ainda mais motivadoras; são esses profissionais que nunca parecem satisfeitos e que, às vezes, são chamados de inconformados por sua atitude de perene procura de respostas aos problemas do cotidiano da escola.
Se você está se percebendo nessas linhas e notando que suas atitudes são condizentes com aquilo que está escrito, parabéns! Você deveria receber prêmios (o maior de todos é o carinho e a consideração de nossos alunos) e reconhecimento por sua postura e conduta profissional. Sei que não é isso que você está querendo através de suas realizações, afinal de contas o nosso espírito de educadores não é tão afeito aos holofotes, à fama e à celebridade, o que realmente vale é saber que passamos a fazer parte da história de vida de nossos estudantes e que os auxiliamos a obter sucesso e alcançar a felicidade profissional e pessoal.
O filme “O Clube do Imperador” nos coloca diante de um professor que persegue esse nosso sonho de forma abnegada. Tenho certeza de que só isso já é suficiente para que você se interesse em saber mais e assista ao filme... Boa diversão!
O Filme
William Hundert (Kevin Kline) é um conceituado professor de história da Antiguidade Clássica (Grécia e Roma), verdadeiramente apaixonado por seu trabalho. Além disso, Hundert é um dos baluartes da tradicional escola onde dá suas aulas. Respeitado pelo 89
diretor e pelos alunos, todos os anos esse professor organiza uma competição cultural que se tornou clássica no colégio, o “O Clube do Imperador”.
Em sua nova turma de estudantes o professor Hundert começa desde o princípio a estimular o gosto pelo estudo dos grandes acontecimentos relacionados aos generais e imperadores romanos, e aos filósofos e artistas gregos. É capaz de gastar uma aula inteira se dedicando a explicitar pensamentos e campanhas militares para os jovens estudantes.
Seus novos estudantes são muito promissores, o que o anima ainda mais a realizar um trabalho de qualidade. Entre eles há, inclusive, o filho de um dos vencedores de uma das edições passadas do “O Clube do Imperador”. Depois de alguns dias de aula transcorridos, sua aula é interrompida para a chegada de um novo estudante, Sedgewick Bell (Emile Hirsch), arrogante e prepotente filho de um senador.
Confrontado algumas vezes pelo garoto, Hundert resolve contar com o apoio do pai do garoto para conseguir fazer com que ele se aplique mais aos estudos e valorize a educação a que está tendo acesso. De seu empenho surge a primeira grande oportunidade de valorizar Sedgewick e dar-lhe o necessário estímulo para um maior interesse na escola, ao ter em suas mãos a chance de classificá-lo para as finais do “O Clube do Imperador”.
Será possível aos professores, através de suas atitudes, modificar o futuro de seus alunos? Até que ponto o convívio diário com os professores pode influenciar o caráter e as atitudes dos estudantes? O individualismo e a busca da vitória a qualquer preço são ensinamentos que devem continuar fazendo parte das lições trabalhadas na escola? Até que ponto os professores devem 90
continuar acreditando e investindo na recuperação de seus alunos (seja na formação ética ou na acadêmica)? Será que o idealismo muitas vezes não chega a cegar os professores em seus julgamentos e procedimentos em relação a seus estudantes?
Todas essas questões estão de certa forma, presentes no filme “O Clube do Imperador”, isso já o qualifica a ser visto por educadores e seus pupilos, pelos pais e por todas as pessoas interessadas em melhorar a educação. Assistam!
Aos Professores
1- Jamais deixem de sonhar! Mais do que isso, invistam em seus sonhos, façam com que eles se tornem realidade. Apliquem seu tempo, utilizem seus conhecimentos, pesquisem quando necessário e permitam que todo o seu esforço e experiência se transformem em projetos que revertam em favor da educação, da escola onde trabalham, da comunidade à qual servem e, principalmente, de seus alunos.
2- Tendo como exemplo o filme “O Clube do Imperador”, por que não realizar concursos culturais em sua escola? Podem ser criadas competições em qualquer disciplina ou mesmo em todas, por séries ou níveis de dificuldade, agregando notas ao desempenho dos alunos em cada disciplina ou para premiar com medalhas e troféus os vencedores. O mais importante é fazer com que os alunos se interessem e queiram cada vez mais estudar.
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3- Muitos professores me questionam nas palestras e workshops que realizo a respeito da formação mais ampla e integral do aluno. Costumo lhes dizer que os alunos se pautam muito em nossas atitudes e postura diante do mundo. Uma das observações mais constantes de nossos estudantes em relação a seus professores relaciona-se à coerência entre discurso e prática. Não adianta, por exemplo, o professor defender de forma veemente a democracia se suas atitudes são de intolerância e incompreensão.
4- As escolas deveriam preocupar-se em documentar a passagem de seus estudantes pela escola através de fotografias, como ocorre regularmente nos Estados Unidos, com os Yearbooks (livros do ano). Além disso, seria muito interessante se a cada 5 ou 10 anos as escolas conseguissem reunir os alunos que se formaram e seus professores para reuniões e confraternizações em que se falasse sobre o que aconteceu com cada um depois do término de seus compromissos escolares. Seria estimulante para professores e alunos saber que seu convívio foi fundamental para o futuro de ambos.
Ficha Técnica O Clube do Imperador (The Emperor’s Club) País/Ano de produção: EUA, 2002 Duração/Gênero: 109 min., Drama Direção de Michael Hoffman Roteiro de Ethan Canin e Neil Tolkin Elenco: Kevin Kline, Emily Hirsch, Embeth Davidtz, Rob Morrow, Edward Herrmann, Harris Yulin, Paul Dano, Rishi Mehta, Jesse Eisenberg, Gabriel Millman.
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FILME: Nenhum a Menos
Vencedor do festival de Veneza de 99, Nenhum a Menos , de Zhang Yimou, é um retrato quase documental da atual situação da classe de estudantes rurais na China. Com uma câmera discreta, e muitas vezes escondida, Yimou registrou o ensino em uma escola rural no interior do país.
Com atores amadores, e grande parte deles ainda crianças, o que se vê é uma verdadeira aula de direção ao retratar a evasão escolar justificada pela pobreza. Tudo começa quando o professor da escola tira uma licença para cuidar de sua mãe. Em seu lugar, a prefeitura coloca uma garota de apenas 13 anos, Wei (Wei Minzhi). Ela terá de morar na própria escola durante um mês, junto com alguns dos 28 alunos, até que o mestre retorne. Sua missão é A iniciante Wei Minzhi é garantir que nenhum deles abandone uma professora de a escola. apenas 13 anos
Wei faz a chamada religiosamente a cada novo dia e depois passa para os alunos os deveres de cópias das lições escritas no quadro negro. Sem se preocupar muito se eles realmente estão aprendendo, ela só quer que eles não abandonem o curso e saiam da escola. Tamanha é a pobreza do local que a garota só dispõe de um giz para cada dia de aula, ninguém possui livros, e as camas dos alunos são improvisadas com as carteiras da classe.
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A garota professora e seus alunos, fixados no meio de um vilarejo, formam uma espécie de espelho-miniatura da comunidade chinesa com seus problemas atuais, principalmente quando se refere à camada rural da população.
A determinação de Wei em manter os alunos na escola é tanta que as situações passam a ser cada vez mais absurdas, chegando ao ponto da garota partir para uma grande e próspera metrópole, em busca de um dos alunos, Zhang Huike (Zhang Huike) que fugiu com a família em busca de trabalho.
O diretor diz ter usado atores amadores para enfatizar o realismo. Sem deixar que as crianças lessem o roteiro, a maioria das atuações partiram como improvisações das personagens que interpretavam, grande parte das vezes, suas próprias vidas. Boaventura de Sousa Santos (Coimbra, 15 de Novembro de 1940) é Doutor em Sociologia do Direito, pela Universidade de Yale e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. É diretor dos Centro de Estudos Sociais e do Centro de Documentação 25 de Abril [1] dessa mesma Universidade. É atualmente, um dos principais intelectuais da área de Ciências Sociais, com mérito internacionalmente reconhecido, tendo ganho especial popularidade no Brasil, principalmente, depois de ter participado nas três edições do Fórum Social Mundial em Porto Alegre.
NENHUM A MENOS Título Original: Yige dou buneng shao País de Origem: China Ano: 1998 Duração: 106min Diretor: Zhang Yimou Elenco: Wei Minzhi, Zhang Huike, Tian Zhenda, Gao Enman, Sun Zhimei
4.6 A Escola como Espaço Sócio- cultural Juarez Dayrell
PRIMEIROS OLHARES SOBRE A ESCOLA
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JUAREZ DAYRELL Possui Graduação em Ciências Sociais, pela Universidade Federal de Minas Gerais (1983); Mestrado em Educação, pela Universidade Federal de Minas Gerais (1989), e Doutorado em Educação, pela Universidade de São Paulo (2001). Em 2006 realizou o Pósdoutorado no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal de Minas Gerais e Coordenador do Observatório da Juventude da UFMG (www.fae.ufmg.br/objuventude). Está integrado à Pós Graduação da Faculdade de Educação na linha de pesquisa: Movimentos Sociais, educação e cultura, desenvolvendo pesquisas em torno da temática Juventude, Educa ão e Cultura.
Analisar a escola como espaço sócio-cultural significa compreendêla na ótica da cultura, sob um olhar mais denso, que leva em conta a dimensão do dinamismo, do fazer-se cotidiano, levado a efeito por homens e mulheres, trabalhadores e trabalhadoras, negros e brancos, adultos e adolescentes, enfim, alunos e professores, seres humanos concretos, sujeitos sociais e históricos, presentes na história, atores na história. Falar da escola como espaço sócio-cultural implica, assim, resgatar o papel dos sujeitos na trama social que a constitui, enquanto instituição.
Este ponto de vista expressa um eixo de análise que surge na década de 80. Até então, a instituição escolar era pensada nos marcos das análises macro-estruturais, englobadas, de um lado, nas "teorias funcionalistas" (Durkheim, Talcott Parsons, Robert Dreehen, entre outros) e, de outro, nas "teorias da reprodução" (Bourdieu e Passeron; Baudelot e Establet; Bowles Gintis; entre outros). Essas abordagens, umas mais deterministas, outras evidenciando as necessárias mediações, expõem a força das macro-estruturas na determinação da instituição escolar. Em outras palavras, analisam os efeitos produzidos na escola pelas principais estruturas de relações sociais que caracterizam a
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sociedade capitalista, definindo a estrutura escolar e exercendo influencias sobre o comportamento dos sujeitos sociais que ali atuam. Nessa perspectiva, EZPELETA & ROCKWELL (1986, p. 58) desenvolvem uma análise em que privilegiam a ação dos sujeitos na relação com as estruturas sociais. Assim, a instituição escolar seria resultado de um confronto de interesses: de um lado, uma organização oficial do sistema escolar, que "define conteúdos da tarefa central, atribui funções, organiza, separa e hierarquiza o espaço, a fim de diferenciar trabalhos, definindo idealmente, assim, as relações sociais"; de outro, os sujeitos-alunos, professores, funcionários, que criam uma trama própria de inter-relações, fazendo da escola um processo permanente de construção social. Para as autoras, em "cada escola interagem diversos processos sociais: a reprodução das relações sociais, a criação e a transformação de conhecimentos, a conservação ou destruição da memória coletiva, o controle e a apropriação da instituição, a resistência e a luta contra o poder estabelecido", (idem). Apreender a escola como construção social implica, assim, compreendê-la no seu fazer cotidiano, onde os sujeitos não são apenas agentes passivos diante da estrutura. Ao contrário, trata-se de uma relação em contínua construção, de conluios e negociações em função de circunstâncias determinadas.
A escola, como espaço sócio-cultural, é entendida, portanto, como um espaço social próprio, ordenado em dupla dimensão: institucionalmente, por um conjunto de normas e regras, que buscam unificar e delimitar a ação dos seus sujeitos; cotidianamente, por uma complexa trama de relações sociais entre os sujeitos envolvidos, que incluem alianças e conflitos, imposição de normas e estratégias individuais ou coletivas de transgressão e de acordos. Um processo de apropriação constante dos espaços, das normas, das práticas e dos saberes que dão forma à vida escolar. Fruto da ação recíproca entre o sujeito e a instituição, esse processo, como tal, é heterogêneo. Nessa perspectiva, a realidade escolar aparece mediada, no cotidiano, pela apropriação, elaboração, reelaboração ou repulsa expressas pelos sujeitos sociais (EZPELETA & ROCKWELL, 1986).
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Desta forma, o processo educativo escolar recoloca a cada instante a reprodução do velho e a possibilidade da construção do novo, e nenhum dos lados pode antecipar uma vitória completa e definitiva. Esta abordagem permite ampliar a análise educacional, na medida em que busca apreender os processos reais, cotidianos, que ocorrem no interior da escola, ao mesmo tempo que resgata o papel ativo dos sujeitos, na vida social e escolar.
O texto que se segue expressa esse olhar e reflete questões e angústias de professores de escolas noturnas da rede pública de ensino, com os quais venho trabalhando e aprendendo através de assessorias e cursos de aperfeiçoamento, nos últimos quatro anos. É fruto também de uma pesquisa exploratória, realizada em 1994, em duas escolas públicas noturnas, situadas na periferia da região metropolitana de Belo Horizonte. Esta é a fonte dos exemplos, das cenas e das situações reais aqui apresentadas. Aos alunos, professores e direção destas escolas deixo os meus agradecimentos.
OS ALUNOS CHEGAM À ESCOLA
Um som estridente de campainha corta o ar, juntando-se ao burburinho de vozes, carros, ônibus. São I8h 30min e a escola dá o seu primeiro sinal. Nota-se uma pequena agitação. Os alunos que chegaram, até esse momento, encontram-se em grupos, espalhados pelo largo formado pela confluência de três ruas. É um pequeno centro comercial de um bairro de periferia, na região metropolitana de Belo Horizonte: lojas, açougue, padaria, locadora do video, bares etc. Alguns rapazes chegam à porta das lojas, esperando pelo movimento. A entrada dos alunos na escola parece ser um ritual cotidiano, repetindo-se todos os dias os gestos, falas, sentimentos, em momentos de encontro, paquera, ou simplesmente, de um passatempo.
Rapazes e moças continuam chegando aos poucos, alguns em grupos, outros sozinhos. Cumprimentos, risos, conversas ao pé de 97
ouvido. Grupo de rapazes, grupo de moças, grupos misturados. Olhares sugestivos acompanhados de comentários e risos, um rapaz sai do seu grupo e vai até as moças e diz algo que provoca sorrisos. Existe um clima de desejo no ar. Um casal de namorados beija-se, encostado no muro sob uma árvore indiferente ao burburinho.
Edward Palmer Thompson (3 de fevereiro de 1924, Oxford - 28 de agosto de 1993, Worcester) foi um historiador britânico da concepção teórica marxista e é considerado por muitos como o melhor historiador inglês do século XX. Durante a Segunda Guerra Mundial luta na Itália contra o governo fascista liderado por Benito Mussolini. Estuda no colégio Corpus Christi (Cambridge), onde adere ao Partido Comunista Britânico. Em 1946 formou um grupo de estudos históricos marxistas junto com Christopher Hill, Eric Hobsbawm, Rodney Hilton, Dona Torr, dentre outros. Lecionou na Universidade de Leeds em cursos não acadêmicos dirigidos aos trabalhadores. Foi professor da Universidade de Warwich de 1965 a 1971. Nos anos 1970 lecionou esporadicamente em universidades estadunidenses, como a de Pittsburg, Rutgers, Brown, Dartmoth College.
Mas é no momento do sinal que aumenta o volume de pessoas chegando. Brancos, negros, mulatos, na sua maioria jovens, aparentando idades que variam de 15 a 20 anos, alguns poucos mais velhos, principalmente mulheres. Vestem-se das formas mais variadas, predominando jeans e tênis. Começam a entrar por um portão de ferro inteiriço.
A escola ocupa todo um quarteirão, cercada por muros altos, pintados de azul, o que lhe dá uma aparência pesada. Além do portão, existe uma outra entrada, através de uma garagem por onde passam os professores. Após o portão, os alunos descem por uma rampa ao lado de um pequeno anfiteatro e entram por um outro portão, onde deixam a caderneta com uma servente, entrando em seguida no pátio coberto da escola.
O espaço é claramente delimitado, como que a evidenciar a passagem para um novo cenário, onde vão desenpenhar papéis específicos, próprios do "mundo da escola", bem diferentes daqueles que desempenham no cotidiano do "mundo da rua".
A DIVERSIDADE CULTURAL
Quem são estes jovens? O que vão buscar na escola? O que significa para eles a instituição escolar? Qual o significado das experiências vivenciadas neste espaço?
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Para grande parte dos professores, perguntas como estas não fazem muito sentido, pois a resposta é óbvia: são alunos. E é essa categoria que vai informar seu olhar e as relações que mantém com os jovens, a compreensão das suas atitudes e expectativas. Assim, independente do sexo, da idade, da origem social, das experiências vivenciadas, todos são considerados igualmente alunos, procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades. Para esses professores, a instituição escolar deveria buscar atender a todos da mesma forma, com a mesma organização do trabalho escolar, mesma grade e currículo. A homogeneização dos sujeitos como alunos corresponde à homogeneização da instit inst itui uiçã çãoo escolar, escolar, compreendid compreendidaa como universa universal.l.
A escola é vista como uma instituição única, com os mesmos sentidos e objetivos, tendo como função garantir a todos o acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente acumulados pela sociedade. Tais conhecimentos, porém, são reduzidos a produtos, resultados, conclusões, sem levar em conta o valor determinante dos processos. Materializado nos programas e livros didáticos, o conhecimento escolar torna-se "objeto", "coisa" a ser transmitida. Ensinar torna-se transmitir esse conhecimento acumulado; e aprender torna-se assimilá-lo. Como a ênfase é centrada nos resultados da aprendizagem, o que é valorizado são as provas, as notas e a finalidade da escola se reduz ao "passar de ano". Nessa lógica, não faz sentido estabelcer as relações entre o vivenciado pelos alunos e o conhecimento escolar, entre o escolar e o extra-escolar, justificando-se a desarticulação existente entre o conhecimento escolar e a vida dos alunos.
Dessa forma, o processo de ensino/aprendizagem ocorre numa homogeneidade de ritmos, estratégias e propostas educativas para todos, independente da origem social, da idade, das experiências vivenciadas. É comum e aparentemente óbvio os professores ministrarem uma aula com os mesmos conteúdos, mesmos recursos e ritmos para turmas de quinta série, por exemplo, de uma escola particular do centro, de uma escola pública diurna, na periferia, ou de uma escola noturna. A diversidade real dos alunos é reduzida a diferenças apreendidas na ótica da cognição (bom ou mau aluno, esforçado ou preguiçoso etc.) ou na do comportamento (bom ou mau aluno, obediente ou rebelde, disciplinado 99
A discussão a respeito do concito de cultura no campo da Antropologia não é consensual, havendo mias de 300 conceitos cunhados, não cabendo aprofundar a questão, no âmbito deste trabalho. Para um maior aprofundamento, buscar entre outros DURHAM (1984), GEERTZ (1978), VELHO (1978) LARAIA (1986).
ou indisciplinado etc.). A prática escolar, nessa lógica, desconsidera a totalidade das dimensões humanas dos sujeitos — alunos, professores e funcionários — que dela participam.
GILBERTO VELHO é professor titular e decano do Departamento de Antropologia do Museu Nacional da UFRJ. Dirige a Coleção Antropologia Social desta editora, onde tem publicados os seguintes livros: A utopia urbana (1973); Desvio e divergência (1974);Individualismo e cultura (1981); Subjetividade e sociedade (1986); Projeto e metamorfose (1994); e Antropologia urbana (2002). É autor ainda de Nobres & anjos (1998), entre outras obras.
Sob o discurso da democratização da escola, ou mesmo da escola única, essa perspectiva homogeneizante expressa uma determinada forma de conceber a educação, o ser humano e seus processos formativos, ou seja, traduz um projeto político-pedagógico que vai informar o conjunto das ações educativas que ocorrem no interior da escola. Expressa uma lógica instaimental, que reduz a compreensão da educação e de seus processos a uma forma de instrução centrada na transmissão de informações. Reduz os sujeitos a alunos, apreendidos, sobretudo, pela dimensão cognitiva. O conhecimento é visto como produto, sendo enfatizados os resultados da aprendizagem e não o processo. Essa perspectiva implementa a homogeneidade de conteúdos, rítmos e estratégias, e não a diversidade. Explica-se, assim, a forma como a escola organiza seus tempos, espaços e ritmos, bem como o seu fracasso. Afinal de contas, não podemos esquecer — o que essa lógica esquece — de que os alunos chegam à escola marcados pela diversidade, reflexo dos desenvolvimentos cognitivo, afetivo e social, evidentemente desiguais, em virtude da quantidade e qualidade de suas experiências e relações sociais, prévias e paralelas à escola. O tratamento uniforme dado pela escola só vem consagrar a desigualdade e as injustiças das origens sociais dos alunos.
Uma outra forma de compreender esses jovens que chegam à escola é apreendê-los como sujeitos sócio-culturais. Essa outra perspectiva implica em superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de de aluno, dando-lhe um outro significado. Trata-se de compreendêlo na sua diferença, enquanto indivíduo que possui uma historicidade, com visões de mundo, escalas de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios.
O que cada um deles é, ao chegar à escola, é fruto de um conjunto de experiências sociais vivenciaclas nos mais diferentes espaços 100
sociais. Assim, para compreendê-lo, temos de levar em conta a dimensão da “experiência vivida". Como lembra THOMPSON (1984), é a experiência vivida que permite apreender a história como fruto da ação dos sujeitos. Estes experimentam suas situações e relações produtivas como necessidades, interesses e antagonismos e elaboram essa experiência em sua consciência e cultura, agindo conforme a situação determinada. determinada. Assim, o cotidiano torna-se espaço e tempo significativos.
Nesse sentido, a experiência vivida é matéria-prima a partir da qual os jovens articulam sua própria cultura, 1 aqui entendida enquanto conjunto de crenças, valores, valores, visão de mundo, rede de significados signifi cados e expressões simbólicas da inserção dos indivíduos em determado nível da totalidade social, que terminam por definir a própria natureza humana (VELHO, 1994). Em outras palavras, os alunos já chegam à escola com um acúmulo de experiências vivenciadas em múltiplos espaços, através das quais podem elaborar uma cultura própria, um "óculos" pelo qual vêem, sentem e atribuem sentido e significado ao mundo, à realidade onde se inserem. Não há, portanto, um mundo real, uma realidade única, preexistente à atividacie mental humana, humana, como afirma SACRISTÁN SACRISTÁN (1994, p.70) O mundo real não é um contexto fixo, não é só nem principalmente o universo físico. O mundo que rodeia o desenvolvimento do aluno é, hoje, mais que nunca, uma clara construção social onde as pessoas, objetos, espaços e criações culturais, políticas ou sociais adquirem um sentido peculiar, em virtude das coordenadas sociais e historicas que determinam sua configuração. Há múltiplas realidades, como há múltiplas formas de viver e dar sentido à vida (Tradução minha).
Nessa perspectiva, nenhum indivíduo nasce homem, mas constitui-se e se produz como tal, dentro do projeto de humanidade do seu grupo social, num processo contínuo de passagem da natureza para a cultura, ou seja, cada indivíduo, ao nascer, vai sendo construído e vai se construindo enquanto ser humano. Mas como se dá esta produção numa sociedade concreta?
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Quando qualquer um daqueles jovens nasceu, inseriu-se numa sociedade que já tinha uma existência prévia, histórica, cuja estrutura não dependeu desse sujeito, portanto, não foi produzida por ele. São as macroestruturas que vão apontar, a principio, um leque mais ou menos definido de opções em relação a um destino social, seus padrões de comportamento, seu nível de acesso aos bens culturais etc. Vai definir as experiências que cada um dos alunos teve e a que têm acesso. Assim, o gênero, a raça, o fato de serem filhos de trabalhadores desqualificados, grande parte deles com pouca escolaridade, entre outros aspectos, são dimensões que vão interferir na produção de cada um deles como sujeito social, independentemente da ação de cada um.
2. Para uma discussão detalhada sobre este processo de formação, ver o texto “A educação do aluno trabalhador, uma abordagem alternativa”. (DAYRELL, 1992)
Ao mesmo tempo, porém, existe um outro nível, o das interações dos indivíduos na vida social cotidiana, com suas próprias estruturas, com suas características próprias. É o nível do grupo social, onde os indivíduos se identificam pelas formas próprias de vivenciar e interpretar as relações e contradições, entre si e com a sociedade, o que produz uma cultura própria. É onde os jovens percebem as relações em que estão imersos, apropriam-se dos significados que se lhes oferecem e os reelaboram, sob a limitação das condições dadas, formando, assim, sua consciência individual e coletiva (ENGUITA, 1990). Nesse sentido, os alunos vivenciam experiências de novas relações na família, experimentam morar em diferentes bairros, num constante reiniciar as relações com grupos de amigos e formas de lazer. Passam a trabalhar muito cedo em ocupações as mais variadas. Alguns ficam com o salário, outros – a maioria, já o dividem com a família. Aderem a religiões diferentes, pentecostais, católicos, umbandistas etc. O lazer é bem diferenciado, quase sempre restrito, devido à f alta de recursos.
São essas experiências, entre outras, que constituem os alunos como indivíduos concretos, expressões de um gênero, raça, lugar e papéis sociais, de escalas de valores, de padrões de normalidade. É um processo dinâmico, criativo, ininterrupto, em que os indivíduos vão lançando mão de um conjunto de símbolos, reelaborando-os a partir das suas interações e opções cotidianas. Dessa forma, esses jovens que chegam à escola são o resultado de um processo educativo amplo, 102
que ocorre no cotidiano das relações sociais, quando os s ujeitos fazemse uns aos outros, com os elementos culturais a que têm acesso, num diálogo constante com os elementos e com as estruturas sociais onde se inserem e as suas contradições. 2Os alunos podem personificar diferentes grupos sociais, ou seja, pertencem a grupos de indivíduos que compartilham de uma mesma definição de realidade, e interpretam de forma peculiar os diferentes equipamentos simbólicos da sociedade. Assim, apesar da aparência de homogeneidade, expressam a diversidade cultural: uma mesma linguagem pode expressar múltiplas falas.
Nessa medida, a educação e seus processos é compreendida para além dos muros escolares e vai ancorar-se nas relações sociais:
São as relações sociais que verdadeiramente educam, isto é, produzem os indivíduos em suas realidades singulares e mais profundas. Nenhum indivíduo nasce homem. Portanto, a educação tem um sentido mais amplo, é o processo de produção de homens num determinado momento histórico (DAYRELL, 1992, p.2).
A educação, portanto, ocorre nos mais diferentes espaços e situações sociais, num complexo de experiências, relações e aiividades, cujos limites estão lixados pela estrutura material e simbólica da sociedade, em determinado momento histórico. Nesse campo educativo amplo, estão incluídas as instituições (família, escola, igreja etc.), assim como também o cotidiano difuso do trabalho, do bairro, do Iazer etc.
O campo educativo onde os jovens se inserem como habitantes de uma sociedade complexa, urbana e industrial, apresenta uma ampla diversidade de experiências, marcadas pela própria divisão social do trabalho e das riquezas, o que vai delinear as classes sociais. Constitui, a princípio, dois conjuntos culturais básicos, numa relação de oposição
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complementar, e expressam uma das dimensões da heterogeneidade cultural na sociedade moderna: a oposição cultura erudita x cultura popular.
EUNICE RIBEIRO HURHAM Possui Graduação em Ciências Sociais, pela Universidade de São Paulo (1954), Mestrado em Ciência Social (Antropologia Social) pela Universidade de São Paulo (1964) e Doutorado em Ciência Social (Antropologia Social) pela Universidade de São Paulo (1967). Atualmente é professor titular da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Antropologia Urbana, atuando principalmente nos seguintes temas: obra etnográfica, Bronislaw Malinowski.
A diversidade cultural, no entanto, nem sempre pode ser explicada apenas pela dimensão das classes sociais. É preciso levar em conta uma heterogeneidade mais ampla, "fruto da coexistência, harmoniosa ou não, de uma pluralidade de tradições cujas bases podem ser ocupacionais, étnicas, religiosas etc." (VELHO, 1987, p.l6), que faz com que os indivíduos possam articular suas experiências em tradições e valores, construíndo identidades cujas fronteiras simbólicas não são demarcadas apenas pela origem de classe.
Porém, nos adverte Eunice DURHAM (1984): tratar a heterogeneidade cultural no âmbito de uma mesma sociedade é qualitativamente diferente de tratá-la entre diversas sociedades. Em outras palavras, quando procuramos compreender a cultura xavante, por exemplo, estamos lidando com diferenças que expressam manifestações de uma mesma capacidade humana criadora, fruto de um procsso histórico independente. Outra coisa é lidar com alguma expressão da cultura popular, a linguagem, por exemplo, em que a diversidade não é apenas a expressão de particularidades do modo de vida, mas aparece como "manifestações de oposições ou aceitações que implicam num constante reposicionamento dos grupos sociais na dinâmica das relações de classe" (Idem, p.35). A diversidade cultural na sociedade brasileira tembém é fruto do acesso diferenciado às informações, às instituições que asseguram a distribuição dos recursos materiais, culturais e políticos, o que promove a utilização distinta do universo simbólico, na perspectiva tanto de expressar as especidades das condições de existência, quanto de formular interesses divergentes. Dessa forma, a heterogeneidade cultural também tem uma conotação político-ídeológica.
Essa mesma diversidade está presente na elaboração e na expressão dos projetos individuais dos alunos, onde a escola se inclui. A noção de projeto é entendida como uma construção, fruto de escolhas racionais, conscientes, ancoradas em avaliações e definições de realidade, 104
representando uma orientação, um rumo de vida (VELHO, 1987). Um projeto é elaborado e constando em função do processo educativo, como evidenciamos acima, sempre no contexto do campo educativo ou de um "campo de possibilidades", ou seja, no contexto sócio-histórico-cultural concreto, onde se insere o indivíduo, e que circunscreve suas possibilidades de experiências. Com isso, afirmamos que todos os alunos têm, de uma forma ou de outra, uma razão para estar na escola, e elaboram isto de uma forma mais ampla ou mais restrita, no contexto de um plano de futuro.
Um outro aspecto do projeto é a sua dinamicidade, podendo ser reelaborado a cada momento. Um fator que interfere nesta dinamicidade é a faixa etária e o que ela possibilita enquanto vivência. Essa variável remete ao amadurecimento psicológico, aos papéis socialmente construídos, ao imaginário sobre as fases da vida. Concretamente, as questões e interrogações postas por um adolescente serão muito diferentes das de um jovem de 18 anos e, mais ainda, de um adulto de 30 anos. Um adolescente, por exemplo, está às voltas com sua identidade sexual, com seu papel no grupo: o que é ser homem? O que é ser mulher? Pode estar perplexo diante dos diferentes modelos sociais de homem e mulher que lhe são passados pelos meios de comunicação de massa, pelos colegas no trabalho, pela família. Certamente, seu projeto individual vai espelhar este momento que vive.
Portanto, os alunos que chegam à escola são sujeitos sócioculturais, com um saber, uma cultura, e também com um projeto, mais amplo ou mais restrito, mais ou menos consciente, mas sempre existente, fruto das experiências vivenciadas dentro do campo de possibilidades de cada um. A escola é parte do projeto dos alunos.
O que implicam estas considerações a respeito da diversidade cultural dos alunos?
Um primeiro aspecto a constatar é que a escola é polissêmica, ou seja, tem uma multiplicidade de sentidos. Sendo assim, não podemos considerá-la como um dado universal, com um sentido único, principalmente quando este é definido previamente pelo sistema ou 105
pelos prolessores. Dizer que a escola é polissêmica implica levar em conta que seu espaço, seus tempos, suas relações podem estar sendo significadas de forma diferenciada, tanto pelos alunos, quanto pelos professores, dependendo da cultura e projeto dos diversos grupos sociais nela existentes.
Sobre o significado da escola, as respostas são variadas: o lugar de encontrar e conviver com os amigos; o lugar onde se aprende a ser "educado"; o lugar onde se aumentam os conhecimentos; o lugar onde se tira diploma e que possibilita passar em concursos. Diferentes significados para um mesmo território certamente irão influir no comportamento dos alunos, no cotidiano escolar, bem como nas relações que vão privilegiar.
Um segundo aspecto é a articulação entre a experiência que a escola oferece, na forma como estrutura o seu projeto políticopedagógico, e os projetos dos alunos. Se partíssemos da ideia de que a experiência escolar é um espaço de formação humana ampla, e não apenas transmissão de conteúdos, não teríamos de fazer da escola um lugar de reflexão (refletir, ou seja, voltar sobre si mesmo, sobre sua própria experiência) e ampliação dos projetos dos alunos?
Essa questão torna-se mais presente quando levamos em conta as observações de Gilberto Velho:
[...] Quanto mais exposto estiver o ator a experiências diversificadas, quanto mais tiver de dar conta de ethos e visões de mundo contrastantes, quanto menos fechada for sua rede de relações ao nível do seu cotidiano, mais marcada será a sua autopercepção de individualidade singular. Por sua vez, a essa consciência da individualidade, fabricada dentro de uma experiência cultural específica, corresponderá uma maior elaboração de um projeto (VELHO, 1987, p. 32).
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A escola não poderia ser um espaço de ampliação de experiências? Considerando-se principalmente a realidade dos alunos dos cursos noturnos, a escola não poderia estar ampliando o acesso, que lhes é negado, a experiências culturais significativas ?
Pensando no exemplo do adolescente em crise, referido anteriormente, podemos nos perguntar também sobre quais lugares ele possui para refletir sobre .suas questões e angústias pessoais. Quais espaços e momentos podem contribuir para que ele se situe em relação ao mundo em que vive? A família, nestes tempos pós-modernos, tem dado conta de responder a demandas desse nível? São questões que remetem a uma reflexão sobre a função social da escola e seu papel no processo de formação de cidadãos. Essa discussão torna-se cada vez mais urgente, urgente, principalmente principalmente se levarmos em conta, como Vicente BARRETO BARRETO (1992), que o domínio moral situa-se na ordem da razão, da qual a educação é o instrumento, na sociedade democrática. Quando essa ordem de valores éticos é rompida ou não é transmitida às novas gerações, instala-se a violência, tornando inviável a vida social, política e cultural.
Tais implicações desafiam os educadores a desenvolverem posturas e instrumentos metodológicos que possibilitem o aprimoramento do seu olhar sobre o aluno, como "outro", de tal forma que, conhecendo as dimensões culturais em que ele é diferente, possam resgatar a diferença como tal, e não como deficiência. Implica buscar uma compreensão totalizadora desse outro, conhecendo "não apenas o mundo cultural do aluno mas a vida do adolescente e do adulto em seu mundo de cultura, examinando as suas experiências cotidianas de participação na vida, na cultura e no trabalho". (BRANDÃO, 1986, p.139).Tal postura nos desafia a deslocar o eixo central da escola para o aluno, como adolescentes e adultos reais. Como nos lembra Malinowski, para compreender o outro, é necessário conhecê-lo.
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AS MÚLTIPLAS DIMENSÕES EDUCATIVAS DO ESPAÇO ESCOLAR
O som estridente da campainha volta a soar, avisando, pela segunda vez, que é hora de iniciar o turno. São 18h 35min e os alunos continuam entrando pelo portão gradeado, deixando as cadernetas com a servente. Entram sozinhos, em grupos, e dirigem-se para um grande pátio coberto em frente à cantina. É grande a algazarra, som de vozes, risos, gritos. Uns param no pátio, conversando em grupos, brincando com outros; alguns seguem direto, pelos corredores, para a sala de aula.
Vista de dentro, a escola ocupa um grande espaço. É formada por dois grandes blocos. Um menor, com salas da administração, de professores, uma biblioteca e uma sala um pouco maior, transformada em auditório. Lá um pequeno pátio descoberto entre os dois blocos: um pouco mais escuro é o lugar preferido dos poucos casais do namorados. Um casal que está se beijando num canto é repreendido pela servente: o namoro é proibido na escola.
O outro bloco tem um grande pátio coberto, que termina na cantina e em dois longos corredores laterais, que dão acesso às salas de aulas. Nesse pátio, existem 4 mesas grandes, baixas, de madeira, para os alunos "tomarem a merenda". Grupos sentam-se sobre as mesas, fazendo delas uma arquibancada. Conversam entre si, mexem com os outros, brincam com as meninas que passam. Umas param e ficam também a conversar. Nesses momentos, mistu ram-se alunos de diferentes turmas. É perceptível um "clima" diferente daquele de quando estão fora da escola.
O corredor do lado direito é limitado pelo muro alto que cerca a escola; já o do lado esquerdo dá para um desnível, com uma quadra de futebol embaixo, nesse momento, vazia. Há um movimento pelos corredores e, na frente das salas, alguns alunos esperam a chegada dos professores. No meio do bloco há um pequeno corredor que liga os dois 108
lados, onde estão os banheiros. Parece ser um lugar próprio para qualquer transgressão, matar aula, por exemplo, pois, além de mais escondido, pemite uma boa visão de quem se aproxima.
No seu conjunto, o espaço físico é rígido, retangular, frio, pouco estimulante. As paredes são lisas, sem nenhum apelo. Apenas há, perto da cantina, cartazes anunciando festas e alguns avisos da escola. Logo os professores começam a passar pelo pátio e alguns alunos vão procurar um ou outro professor. Com o sinal efelivo do começo das aulas, os alunos encaminham-se para as salas e o pátio fica vazio.
A ARQUITETURA DA ESCOLA
A arquitetura e a ocupação do espaço físico não são neutras. Desde a forma da construção até a localização dos espaços, tudo é delimitado formalmente, segundo princípios racionais que expressam uma expectativa de comportamento dos seus usuários. Nesse sentido, a arquitetura escolar interfere na forma da circulação das pessoas, na definição das funções para cada local. Salas, corredores, cantina, pátio, sala dos professores, cada um destes locais têm uma função definida a priori . O espaço arquitetônico da escola expressa uma determinada concepção educativa.
Um primeiro aspecto que chama atenção é o seu isolamento do exterior. Os muros demarcam claramente a passagem entre duas realidades: o mundo da rua e o mundo da escola, como que a tentar separar algo que insiste em se aproximar. A escola tenta fechar-se em seu próprio mundo, com suas regras, ritmos e tempos. t empos.
O território é construído de forma a levar as pessoas a um destino, através dos corredores. Chega-se às salas de aula, o locus central do educativo. Assim, boa parte da escola é pensada para uma locomoção rápida, contribuindo para a disciplinação. A 109
biblioteca fica num canto do prédio, espremida num espaço reduzido. Nenhum local, além da sala de aula, é pensado para atividades pedagógicas. Da mesma forma, a pobreza estética, a falta de cor, de vida, de estímulos visuais, deixam entrever a concepção educativa estreita, confinada à sala de aula e à instrução, tal como afirmamos anteriormente.
Os alunos, porém, apropriam-se dos espaços, que a rigor, não lhes pertencem, recriando neles novos sentidos e suas próprias formas de sociabilidade. Assim, as mesas do pátio tornam-se arquibancadas, pontos privilegiados de observação do movimento. O pátio torna-se lugar de encontro, de relacionamentos. O corredor, pensado para locomoção, é também utilizado para encontros, onde muitas vezes os alunos colocam cadeiras em torno da porta. O corredor do fundo torna-se o local da transgressão, onde ficam escondidos aqueles que "matam" aulas. O pátio do meio é resignificado como local do namoro. É a própria força transformadora do uso efetivo sobre a imposição restritiva dos regulamentos. Fica evidente que essa re-significação do espaço, levada a efeito pelos alunos, expressa sua compreensão da escola e das relações, com ênfase na valorização da dimensão do encontro.
Dessa forma, para os alunos, a geografia escolar e, com isso, a própria escola, tem um sentido próprio, que pode não coincidir com o dos professores e mesmo com os objetivos expressos pela instituição. Mas não só os alunos re-significam o espaço; também os professores o fazem. Uma das professoras dessa escola descrita, ocasionalmente, em dias de muito calor, leva seus alunos para as mesas do pátio, fazendo dali uma sala de aula, para o prazer de todos.
Essa questão, no entanto, é pouco discutida entre os educadores. Não se leva em conta que a arquitetura é o cenário onde se desenvolve o conjunto das relações pedagógicas, ampliando ou limitando suas possibilidades. Mesmo que os alunos, e também professores, o re110
signifiquem, existe um limite que muitas vezes restringe a dimensão educativa da escola. É muito comum, por exemplo, professores desenvolverem pouco trabalho de grupo com seus alunos, em nome de dificuldades, tais como: tamanho da sala, carteiras pesadas etc. Uma discussão sobre a dimensão arquitetônica é importante em um projeto de escola que se proponha a levar em conta as dimensões sócio-cullurais do processo educativo. Ao mesmo tempo, é preciso estarmos atentos à forma como os alunos ocupam o espaço da escola e fazermos desta observação motivo de discussões entre professores e alunos. Atividades, como essas, poderiam contribuir, e muito, para desvelar e aprofundar a polissemia da escola.
A DIMENSÃO DO ENCONTRO
As cenas descritas evidenciam que a escola é essencialmente um espaço coletivo de relações grupais. O pátio, os corredores, a sala de aula, materializam a convivência rotineira de pessoas. No momento em que os jovens cruzam o portão gradeado, ocorre um "rito de passagem", pois passam a assumir um papel específico, diferente daquele desempenhado em casa, tanto quanto no trabalho, ou mesmo no bairro, entre amigos. Neste sentido, os comportamentos dos sujeitos, no cotidiano escolar, são informados por concepções geradas pelo diálogo entre suas experiências, sua cultura, as demandas individuais e as expectativas com a tradição ou a cultura da escola. 3
A forma das relações entre os sujeitos vai variar também, dependendo do momento em que ocorrem, seja fora ou dentro da escola, fora ou dentro da sala, numa clara relação entre tempo e espaço. O recreio é o momento de encontro por excelência, além de ser o da alimentação. Os alunos de diferentes turmas misturam-se, formando grupos de interesse. Enquanto uns merendam, outros, quase sempre rapazes, sentam-se sobre as mesas no pátio. Alguns grupos de moças ficam andando por ali, num footing pelo pátio; outros ficam em sala ou pelos corredores, em pequenos grupos. É também comum haver grupos 111
3. Para FORQUIN (1993), a cultura da escola são suas características de vida própria, seus ritmos e ritos, suas linguagens, seu imaginário, seu regime peculiar de produção e gestão de símbolos. Como expressão da cultura, também é dinâmica, se efetivado de fato quando os sujeitos se apropriam desse imaginário e o reelaboram no seu cotidiano. É isso que faz de cada escola, e nesta, de cada turno, uma experiência peculiar.
menores nas salas jogando truco. É o momento da fruição da afetividade, quando os alunos ficam mais soltos, conversam, discutem, paqueram.
Há um clima diferente entre o encontro no início das aulas, e o da hora da saída, quando as relações tornam-se mais fugazes, com mais avisos, recados, combinações. Em cada um destes momentos, predomina um tipo de relação, com comportamentos e atitudes próprios, regras e sanções. 4
4. Refletindo sobre as diferentes formas de interação entre os alunos destes com o ambiente no cotidiano escolar, MACLAREN (1991, P.131) classifica como “estados de interação” os diferentes estilos de relação. Identifica quatro estilos básicos de “esquina de rua”, “estudante”, “santidade” e” de casa”. Em cada um deles identifica conjuntos, organizados de comportamentos, dos quais os emerge um sistema de práticas vividas.
Em qualquer um dos lugares mencionados, o tempo é sempre curto para um fluir das relações. Na medida em que a escola não incentiva o encontro ou, ao contrário, dificulta a sua concretização, ele dáse sempre nos curtos espaços de tempo permitidos ou em situações de transgressão. Assim, as relações tendem a ser superficiais, com as conversas girando em torno de temas como paqueras, comentários sobre alguma moça ou rapaz, programas de televisão. Durante a observação, nunca tive oportunidade de presenciar alguma conversa que aprofundasse mais algum tema.
A sala de aula também é um espaço de encontro, mas com características próprias. É a convivência rotineira de pessoas com trajetórias, culturas, interesses diferentes, que passam a dividir um mesmo território, pelo menos por um ano. Sendo assim, formam-se sub-grupos, por afinidades, interesses comuns etc. É a formação de "panelinhas", quase sempre identificadas por algum dos estereótipos correntes: a turma da bagunça, os C.D.F, os mauricinhos. A ocupação dos territórios, muitas vezes, coincide com os comportamentos dos grupos: a turma da bagunça tradicionalmente ocupa o fundo da sala, tornando-se a "turma de trás"; os CDF ocupam as cadeiras da frente, é a "turma do gargarejo". Com as conversas e brincadeiras ocorrendo preferencialmente no interior de cada um deles, cada grupo tem regras e valores próprios. Ao mesmo tempo, há vários alunos "soltos", que parecem não se ligar a nenhum dos grupos, ou porque não se identificam, ou porque, de alguma forma, são excluídos. Interfere aqui a mobilidade dos alunos entre escolas. Na sala de aula observada, de 26 alunos, 10 haviam chegado nesse último ano. 112
Outro fator que interfere nos agrupamentos são os critérios de enturmacão, levados a efeito pela escola. A tendência é separar as turmas anualmente, desfazendo as "panelinhas", separando os "bagunceiros", numa lógica que privilegia o bom comportamento em detrimento da possibilidade de um aprofundamento dos contatos. Se em cada ano as turmas são misturadas, há um reiniciar constante das relações, dificultando o seu desenvolvimento. Mais uma vez a escola expressa a lógica instrumental.
De qualquer forma, o cotidiano na sala de aula reflete uma experiência de convivência com a diferença. Independente dos conteúdos ministrados, da postura metodológica dos professores, é um espaço potencial de debate de idéias, confronto de valores e visões de mundo que interferem no processo de formação e educação dos alunos. Ao mesmo tempo, é (mas poderia ser muito mais) um momento de aprendizagem de convivência grupal, onde as pessoas estão lidando constantemente com as normas, os limites e a transgressão. Como lembra BRANDÃO (1986, p.121), a sala de aula
[...] funciona não como o corpo simples de alunos e professores regidos por princípios igualmente simples que regram a chatice necessária das atividades pedagógicas. A sala de aula organiza sua vida a partir de uma complexa trama de relações de aliança o conluios, de imposição de normas e estratégias individual ou coletivas de transgressão, de acordos. A própria atividade escolar, como o dar aula, fazer prova, era apenas um breve corte, no entanto, poderoso e impositivo, que interagia, determinava relações e era determinado por relações sociais, ao mesmo tempo internas e externas aos limites da norma pedagógica.
Em cada um desses espaços e momentos, a vivência do tempo é específica. Assim, o tempo do recreio é sempre curto, passa rápido, com vários eventos ocorrendo ao mesmo tempo e os alunos podendo envolver-se com todos eles. Já o tempo na sala de aula tende a ser longo, ligado ao lazer, um contínuo "transformar a impaciência em hábito", num claro processo de disciplinação. 113
Podemos dizer que a escola se constitui de um conjunto de tempos e espaços ritualizados. Em cada situação, há uma dimensão simbólica, que se expressa nos gestos e posturas acompanhados de sentimentos. Cada um dos seus rituais possui uma dimensão pedagógica, na maioria das vezes, implícita, independente da intencionalidade ou dos objetivos explícitos da escola. É o que muitos autores entendem como "currículo oculto" ( SILVA, 1994). Os diferentes comportamentos dos alunos, a relação com os professores, a semana de provas são exemplos desses rituais escolares.
Tomaz Tadeu da Silva Tomaz Tadeu da Silva é P.h.d. pela Stanford University (1984). Atualmente é professor colaborador do Programa em PósGraduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Seu último (2007) trabalho publicado é a tradução da Ética, de Spinoza (Autêntica). Publicou mais de 30 artigos em periódicos especializados, 30 capítulos de livros e 25 livros. Atua na área de educação, com ênfase em Teoria do Currículo. Em seu Currículo Lattes, os termos mais frequentes na contextualização da produção científica são: currículo, diferença, Deleuze, Foucault, neoliberalismo, Estudos Culturais, identidade e pósmodernismo.
Além desses, há um outro tipo de rituais, ligados às datas comemorativas. São momentos mais intensos, que demandam um investimento maior dos professores e um maior envolvimento dos alunos. Alguns servem para fortalecer emocionalmente alunos e/ou professores: é o caso da Semana do Estudante, do Dia dos Professores ou Dia das Mães. Outros funcionam para tentar injetar uma renovação do compromisso com as motivações e valores dominantes: é o caso da Semana da Pátria. E, ainda, outros enfatizam a memória coletiva, ativando lembranças que manifestam a tradição de um grupo: como é o caso das festas juninas. Todos eles são momentos que garantem a reprodução de valores considerados universais na nossa cultura, contribuindo, de alguma forma, na construção dos elementos de uma "identidade nacional".
Vista por esse ângulo, a escola torna-se um espaço de encontro entre iguais, possibilitando a convivência com a diferença, de uma forma qualitativamente distinta da família e, principalmente, do trabalho. Possibilita lidar com a subjetividade, havendo oportunidade para os alunos falarem de si, trocarem idéias, sentimntos. Potencialmente, permite a aprendizagem de viver em grupo, lidar com a diferença, com o confito. De uma forma mais restrita ou mais ampla, permite o acesso aos códigos culturais dominantes, ncessários para se disputar um espaço no mercado de trabalho.
114
Olhar a instituição escolar pelo prisma elo cotidiano permite vislumbrar a dimensão educativa presente no conjunto das relações sociais que ocorrem no seu interior. A questão que se coloca é que esta dimensão ocorre predominantemente pela prática usual dos alunos, à revelia da escola, que não a potencializa. Os tempos que a escola reserva para atividades de socialização são mínimos, quando não reprimidos. Comentando sobre esse aspecto, principalmente na ótica dos alunos BRANDÃO (1986, p.119) afirma: “Aos olhos do observador formal esta face tribal, desbragada e não visivelmente estruturada, ocorre como inexistente, ou são simplesmente profanas e profanadoras o bastante para não serem considerados. No entanto, na dinâmica cotidiana da sala de aula e mesmo da vida da escola, este conjunto absolutamente ordenado, regrado e criativo de práticas escolares, autônoma e transgressivelmente pedagógicas, interagia com as "atividades planejadas". Em boa medida, sempre foi da interaçao justamente entre este lado livre e permissivo da iniciativa discente, e os mecanismos pedagógicos de controle docente, que a própria vida real da escola se cumpria como uma realidade social culturalmente existente, e não apenas pedagógica e formalmente pensada.
A DIMENSÃO DO CONHECIMENTO NA ESCOLA
Às 18h 35min chego à porta da sala. A sala está vazia: dentro, três meninas cochichando num canto, quatro rapazes no fundo discutindo futebol. No dia anterior houve jogo do Atlético. Os quatro restantes estão calados. São onze alunos de uma turma de vinte e seis.
A professora S., de Geografia, chega, cumprimenta os alunos; eles respondem, mas pouca coisa muda, os alunos continuam do mesmo jeito. Ela diz que vai continuar com a matéria, a geografia da América do Norte. Começa a escrever um "resumo" no quadro, a respeito da colonização dos EUA. Num primeiro momento, os alunos movimentam115
se: pegam os cadernos, abrem, e começam a escrever. Mas não demoram cinco minutos começa a desconcentração na sala, gerando uma situação comum a quase todas as aulas: apenas os alunos que estão na primeira fila copiam silenciosos. O restante inicia um movimento de escrever no caderno, por pouco tempo. Param, conversam com os colegas dos lados, voltam a copiar. Um aluno levanta, vai até outra carteira. Outro pede uma caneta emprestada. Ao meu lado, José começa a conversar com Angela, sentada na sua frente, sobre beijos, abraços, numa brincadeira de sedução. Brincadeira, porque há uma regra implícita de não se namorar alguém da própria sala. Do outro lado, Vander liga o wallkman e fica escutando rádio; logo depois empresta um dos fones para Sheila escutar uma música. Às vezes, entabulam alguma discussão, mas sem nenhuma relação com o que se passa na sala.
A cada aluno que vai chegando, até às 18h 50min, altera-se o clima: sempre alguém tem algum comentário, algum recado para aquele que chega. Em quinze minutos chegaram sete alunos, mesmo assim, fica evidente como o primeiro horário é sempre esvaziado.
Maria levanta a voz e "ordena" que todos tragam as cartolinas para a festa do Haloween. Parece ter uma liderança na turma. A professora S. continua escrevendo no quadro, sem alterar-se com o zum zum zum. Para os alunos, a atividade parece ser uma obrigação, que eles cumprem para se verem livres. A maioria expressa um tédio que é compensado pelo clima de "ti ti ti" que eles próprios criam em sala. Tudo é motivo de brincadeira: entra uma abelha na sala e começa uma pequena confusão para tirá-la: "olha a picadura deste bicho, einh!" grita Celso, lá de trás. A "turma de trás", correspondendo às imagens criadas, é sempre mais barulhenta e desafiadora.
Proessora S. acaba de copiar, coloca seu caderno na mesa e começa a andar pela sala. No fundo, pára na carteira de José e pergunta por que ele não está copiando. Ele, sério, diz que está com um problema na mão, devido a um acidente na fábrica e que Maria 116
está copiando para ele. S. aceita a desculpa. Ele me vê observando a conversa e pisca para mim, dando a entender que conseguiu enrolar a professora.
S. começa a explicar a matéria: a explicação baseia-se no resumo que está no quadro. Não desperta a atenção da turma. Todos estão calados, mas poucos prestam atenção no que ela fala: continuam a copiar, desenham, ficam quietos, ouvem música.
S. faz a chamada pelos números da lista. Soa o sinal avisando o fim da aula. S. despede-se, dizendo que continua a explicação na terceira aula daquele mesmo dia. O horário é significativo: 4 aulas de quarenta minutos cada. Nesse dia, os alunos terão Geografia, Educação Artística, Geografia, Matemática. Chamou-me a atenção o fato de S. não tocar no assunto do eclipse, que ocorreria naquela noite.
Essa aula servirá de modelo ao fazermos algumas considerações. Num primeiro momento, observar a sala de aula é constatar o óbvio, a "chatice" de uma rotina asfixiante, onde pouca coisa muda. O que é uma sala de aula? Uma turma de alunos, uns interessados e bem comportados, outros nem um pouco interessados, em constante bagunça. Os professores, uns mais envolvidos que outros, mais criativos ou tediosos. Os processos terminam sendo muito parecidos: ensinar a matéria. Mas se apurarmos o olhar, por trás desta aparente obviedade, existe uma dinâmica e complexa rede de relações entre os alunos e destes com os professores, num processo contínuo de acordos, conflitos, construção de imagens e estereótipos, num conjunto de negociações, onde os próprios atores, alunos e professores, parecem não ter a consciência da sua dimensão. Essa rede aparece como relações naturalizadas, óbvias, de qualquer sala de aula.
Um aspecto que chama a atenção são os papéis de aluno e de professor. Esses papéis não são dados, mas sim construídos, nas relações no interior da escola, onde a sala de aula aparece como o espaço 117
privilegiado. Na construção do papel de aluno, entra em jogo a identidade que cada um veio construindo, até aquele momento, em diálogo com a tradição familiar, em relação com a escola, e com suas experiências pessoais em escolas anteriores. É um diálogo com estereótipos socialmente criados, que terminam por cristalizar modelos de comportamento, com os quais os alunos passam a se identificar, com maior ou menor proximidade: o "bom aluno"; o "mau aluno", o "doidão"; o "bagunceiro"; o "tímido", o "esforçado". Concorre para essa escolha a tradição que a própria escola e seus professores mantêm, relacionada com uma concepção de aluno, naquele espaço. Em cada situação, a turma vai lançando mão desses elementos do imaginário escolar e os reelabora a partir da situação específica de cada um. A construção do papel desses jovens, como alunos, vai dando-se, assim, na concretude das relações vivenciadas, com ênfase na relação com os professores. É esse mesmo entrecruzamento de modelos que constrói os diferentes "tipos" de professores e demais sujeitos da escola.
Na relação entre professor e aluno, existe um discurso e um comportamento de cada professor que termina produzindo normas e escalas de valores, a partir das quais classifica os alunos e a própria turma, comparando, hierarquizando, valorizando, desvalorizando. Dessa forma, a turma, como um todo, e os alunos, em particular, podem ter uma reação própria a cada professor, dialogando, negando ou assu mindo a sua imagem. Nessa construção de imagens e estereótipos, mesmo sendo fruto das relações entre alunos e professores, o discurso e a postura destes têm uma influência muito grande, interferindo diretamente na produção de "tipos" de alunos e da própria turma.
Uma turma pode ser "bagunceira" ou "fraca" para uns professores e
não o ser para outros, mas certamente isto interfere na auto-imagem, e ela pode assumir de fato o "tipo" ou abrir o conflito com o professor. Na escola
observada, por exemplo, os professores comparavam duas turmas de 8 ª série, uma delas considerada pior que a outra. Falavam disso cons tantemente,
quando havia algum problema, quase sempre ligado à dis ciplina. Os alunos, quando se referiam a essa imagem negativa, expressavam um certo
ressentimento, quase a dizer que se sentiam rejeitados. Assim, cada turma 118
pode ter uma especificidade em relação às demais. E mais, com cada
professor pode ter uma reação diferenciada, dependendo da forma como se constroem as relações.
É significativo também que, nesse jogo de papéis, as imagens criadas quase sempre se refiram a um dos aspectos cognitivos (bom e mau
aluno, inteligente e preguiçoso, responsável e irresponsável etc.) e aos comportamentos em sala, expressão da lógica instrumental, que, como
vimos anteriormente, representa o aluno reduzido a sujeito cognoscente, mas de forma mecânica.
Nessa criação de imagens e papéis, onde geralmente se expressam com mais clareza os preconceitos e racismos existentes nas relações, são comuns imagens ligadas à cor ou à raça, e mesmo a questões sexuais, com
ênfase no homossexualismo e na prostituição.
De uma forma ou de outra, a construção dessas auto-imagens interfere, e muito, no desempenho escolar da turma e do aluno, refletindo também no seu desempenho social, em outros espaços além da escola. Existe uma dimensão educativa nas relações sociais vivenciadas no inte rior da
instituição, nesse processo de produção de imagens e estereóti pos, que
interfere na produção da subjelividade de cada um dos alunos, de forma positiva ou negativa. Um jovem, taxado de "mau aluno", assumindo ou não o estereótipo, tende a se ver assim e deixar-se influenciar p or esse rótulo, que se torna um elemento a mais na produção de sua subjetividade. Aliada a outros fatores, como as repetências constantes (numa turma de 26 alunos, 18 já
tinham tomado pelo menos uma bomba), ou a desqualificação no trabalho, contribuem, no seu conjunto, para produzir, no caso desses jovens trabalhadores, uma subjetividade inferiorizada.
Um segundo eixo de questões refere-se ao cotidiano das aulas e à relação com o conhecimento. No dia a dia das relações entre professor e alunos, parecem existir dois mundos distintos: o do professor, com sua matéria, seu discurso, sua imagem; e o dos alunos, com sua dinâmica. Os 119
dois mundos às vezes se tocam, se cruzam mas, na maioria das vezes, permanecem separados.
Para boa parte dos professores, não todos, é verdade, a sala se reduz a uma relação simples e linear entre eles e seus alunos, regida por
princípios igualmente simples. Como descrevemos no início deste trabalho, os alunos são vistos de forma homogênea, com os mesmos interesses e necessidades, quais sejam, o de aprender conteúdos para fazer provas e passar de ano. Cabe, assim, ao professor, ensinar, transmitir esses conteúdos, materializando o seu papel. O professor parece não perceber ou não levar em conta a trama de relações e sentidos existentes na sala de aula. O seu olhar percebe os alunos apenas enquanto seres de cognição e, mesmo assim, de forma equivocada: sua maior ou menor capacidade de aprender conteúdos e comportamentos; sua maior ou menor disciplina.
Imerso nessa visão estreita da educação, dos processos educativos,
do seu papel como educador e, sobretudo do aluno, o professsor não percebe a dimensão do conjunto das relações que se estabelecem ali na sua frente, na sala de aula. Deixa, assim, de potencializar a aprendizagem, já em curso, de uma das dimensões humanas, ou seja, do grupo, das relações sociais e seus conflitos.
Diante da aula, a pergunta imediata poderia ser: quais são os objetivos desta unidade? Qual a relação que existe com a realidade dos alunos? O que e em que este tema acrescenta algo ou é importante para cada um deles? Em
nenhum momento, a professora ou qualquer outra professora explicitou os objetivos específicos da matéria que está ensinando. O professor não diz e
os alunos também não perguntam. Parece que a resposta está implícita: o
conhecimento é aquele consagrado nos programas e materializado nos livros didáticos. O conhecimento escolar reduz-se a um conjunto de informações já construídas, cabendo ao professor transmiti-las e, aos alunos, memorizá-las. São descontex tualizadas, sem uma intencionalidade explícita e, muito menos, uma articulação com a realidade dos alunos. No caso desses conteúdos, por exemplo, os jovens são “bombardeados” 120
constantemente pela indústria cultural, com elementos da cultura
americana: roupas, gírias, atividades de lazer etc. Não seria o caso de estabelecer relações entre as duas realidades? De analisar essas relações, a
partir do que os próprios alunos já sabem sobre aquele país? O que se
questiona não é tanto o conteúdo escolar em si, apesar das muitas aberrações existentes, mas a forma como é entendido e trabalhado pelo professor. Da forma como está posto, o conhecimento escolar deixa de ser um dos meios através dos quais os alunos podem se compreender melhor, compreender o mundo físico e social onde se inserem, contribuindo, assim, na elaboração de seus projetos. Também podemos nos perguntar se a escola, mais do que enfatizar a transmissão de informações, cada vez mais dominadas pelos meios de comunicação de massa, não deveria se orientar para contribuir na organização racional das informações recebidas e na reconstrução das concepções acríticas e modelos sociais recebidos.
Os professores, na sua maioria, presos que estão a esta forma de lidar com os conteúdos, deixam de se colocar como expressão de uma geração adulta, portadora de um mundo de valores, regras, projetos e utopias a ser proposto aos alunos. Deixam de contribuir no processo de formação mais amplo, como interlocutores desses alunos, diante das suas crises, dúvidas, perplexidades geradas pela vida cotidiana.
César Coll Salvador é Diretor do Departamento de Psicologia Evolutiva e professor da Faculdade de Psicologia da Universidade de Barcelona, Espanha. Lá foi o Coordenador da reforma do ensino de1990, a Renovação Pedagógica. O modelo desenvolvido por ele e sua equipe inspirou mudanças na educação de diversos países, inclusive do Brasil. Como consultor do Ministério da Educação (MEC) entre 1995 e 1996, colaborou na elaboração dos nossos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), publicados em 1997.
Cabe perguntar: está havendo, nesse caso, um processo de aprendizagem? Se levarmos em conta a noção de aprendizagem significativa, a resposta é não. Na concepção desenvolvida por SALVADOR (1994), o aluno aprende quando, de alguma forma, o 121
conhecimento se torna significativo para ele, ou seja, quando estabelece relações substantivas e não arbitrárias entre o que se aprende e o que já conhece. É um processo de construção de significados, mediado por sua percepção sobre a escola, o professor e sua atuação, por suas expectativas, pelos conhecimentos prévios que já possui. A aprendizagem implica, assim, estabeIecer um diálogo entre o conhecimento a ser ensinado e a cultura de origem do aluno.
BASIL BERNSTEIN Autor da teoria sobre os impedimentos sociais no aprendizado e sobre o papel que a comunicação linguística desempenha em uma sociedade estruturada em classes, sua obra teve grande influência na reforma educacional de países como Chile e México. Basil Bernstein nasceu em Londres, filho de uma família de imigrantes judeus. Em 1947, foi estudar Ciências Sociais na London School of Economics, curso trocado depois pelo de Sociologia. Sem qualquer ajuda econômica, foi obrigado a trabalhar para continuar os estudos. Em 1960, conseguiu uma bolsa de pesquisa em Fonética no University College de Londres, instituição na qual posteriormente faria seu Doutorado em Lingüística. Dois anos depois, ingressou no Instituto de Educação, assumindo o cargo de professor-adjunto de Sociologia da Educação. Alguns meses mais tarde era promovido a professor, sendo em 1967 nomeado catedrático e diretor do Departamento de Pesquisa Sociológica. Foi nessa época que escreveu duas de suas obras mais importantes: Estudos Teóricos para uma Sociologia da Linguagem (1971) e Estudos Aplicados (1973). Suas pesquisas culminaram com a publicação de A Estrutura do Discurso Pedagógico , em 1997.
E aqui retomamos a discussão sobre a diversidade cultural. Tanto a Antropologia, quanto a Psicologia e a Linguística, entre outras áreas das Ciências Sociais, já constataram a relação íntima existente entre a cultura de origem, os sentimentos e emoções, e as suas expressões ou, em outras palavras, a relação íntima entre a construção de um universo simbólico e a dimensão cognitiva, como evidencia Basil BERNSTEIN (1971, p.28). Este autor mostra também que a cognição se expressa nos diferentes usos da linguagem, relacionandoa às diferenças de classes sociais: "A receptividade de uma forma particular de estrutura da língua determina a maneira como são construídas as relações com os ojbjetos e a orientação para uma manipulação própria das palavras." Quando afirmamos a existência de 122
uma diversidade cultural entre os alunos, implica afirmar que, numa mesma sala, podemos ter uma diversidade de formas de articulação cognitiva. Dessa forma, para a aprendizagem efetivar-se, é necessário levar em conta o aluno em sua totalidade, retomando a questão do aluno como um sujeito sócio-cultural, quando sua cultura, seus sentimentos, seu corpo, são mediadores no processo de ensino e aprendizagem.
Além da postura pedagógica dos professores, cabe também nos perguntarmos pela qualidade dos conhecimentos, dos conteúdos ministrados na escola. O que observamos, em grande parte das aulas assistidas, das mais diferentes matérias, é que o que é oferecido aos alunos é uma versão empobrecida, diluída e degradada do conhecimento. A falta de acesso dos alunos a um corpo de conhecimentos significativos, com coerência interna, que possibilite um diálogo com sua realidade, aliada a uma postura pedagógica estreita, pode ser uma das causas centrais do fracasso da escola, principalmente daquela dirigida às camadas populares.
Vista num outro ângulo, a aula, para os alunos, parece ser uma provação necessária para atingir a meta, que é ter notas para passar de ano. O que dá sentido e motivação são as notas, os possíveis pontos que vão ganhar com cada uma das atividades passadas pelo professor. Nosso período de observação foi o 4° bimestre, e as conversas dominantes entre os alunos eram a respeito dos pontos necessários para passar em cada uma das matérias, aquelas em que precisavam mais ou, menos e – felicidade – aquelas nas quais não precisavam de nenhum ponto. Nesses casos, nem era mais necessário frequentar as aulas. O conteúdo é encarado como um meio para o verdadeiro fim: passar de ano. E a escola também tende a se tornar um meio para outro fim: o diploma e, com ele, a esperança de um emprego melhor, ou uma certa estabilidade ocupacïonal.
Se os alunos têm essa percepção das aulas e dos conteúdos é porque ela, assim, veio sendo construída nas experiências escolares. 123
Mais do que "alienação" dos alunos, como muitos professores gostam de afirmar, é fruto da própria cultura escolar. Mas no cotidiano da sala de aula, mesmo tendo estes objetivos, as alunos vão produzindo estratégias próprias, para suportar a "chatice necessária" das aulas. O que parece mesmo ajudar a passar o tempo são as conversas e brincadeiras, o ritmo alternado de concentração e desconcenlração. A intensidade e o grau de envolvimento nas aulas vão depender do papel que se assume como aluno. Na sala, tem desde aqueles que não dão uma palavra, ficando quietos praticamente todo o período, até os que não param ou que ficam escutando rádio pelo walkman.
Os estudantes tendem a criar um mundo próprio, mais ou menos permeável, dependendo de cada professor e da relação que ele cria com a turma. Poucos conseguem tocar efetivamente a turma. Nesse sentido, ficam reduzidas as passibilidades educativas. O cotidiano evidencia a pouca ênfase na criação de hábitos necessários ao trabalho intelectual. Os professores não conseguem (e muitas vezes não pretendem) disciplinar minimamente os alunos, por exemplo, na atenção, na concentração. Nas aulas, não estimulam o exercício das capacidades de abstração, de questionamento, de articulação entre fatos etc. Em suma, não há uma intencionalidade naquilo que seria uma das funções centrais da escola, que são as habilidades básicas necessárias ao processo de construção de conhecimentos. Parece que o que é aprendido, neste nível, o é individualmente, sem uma intencionalidade, por parte dos professores ou da escola.
Junto a esta dimensão do conhecimento, um outro elemento fundamental na escola são as alividades extra-classe. O próprio nome já indica que são atividades realizadas fora dos marcos do que são considerados efetivamente pedagógicos. Talvez por isso mesmo, nelas, o prazer e o lúdico são permitidos. Nessas atividades, nem todos os alunos, e muito menos o conjunto dos professores, participam. São momentos quando fica mais explícita a noção de uns e outros a respeito da escola, sua função, suas dimensões educativas. Para muitos alunos, e também professores, as atividades extra-classe são perda de tempo, "penduricalhos" pedagógicos, que pouco acrescentam à dimensão 124
educativa central, que é a transmissão de conteúdos, o "ensino forte", no dizer de muitos alunos.
Presenciamos um destes eventos, a festa do Halloween, coordenada pelas professoras de Inglês, Português e Educação Física. Cada turma teve de preparar alguma alividade para apresentar, à noite, além de contribuir na confecção da ornamentação: vampiros, aranhas e morcegos de cartolina. A preparação deu-se em uma semana, mudando o clima da escola, de um cotidiano monótono, para uma excitação significativa. Durante a semana, o recreio era o momento em que cada turma ensaiava sua apresentação e, nas aulas, os alunos organizam-se. No dia, a comunidade lotou o anfiteatro, evidenciando uma predisposição a participar de atividades culturais. As apresentações, na sua maioria, foram coreografias coletivas de dança. Era visível o envolvimento e interesse de boa parte dos alunos. O fato de uma turma produzir uma coreografia, ensaiar, dividir responsabilidades, brigar com aqueles que não queriam se envolver, produzir as fantasias, ficar tensa na véspera da apresentação, apresentar e ser aplaudida, é uma experiência educativa intensa. Não deixa de significar um resgate da capacidade de criar, expressar, de potencializar as capacidades que quase nunca são estimuladas no cotidiano destes jovens.
Ao mesmo tempo, chama a atenção o fato da escola não aproveitar esses momentos e situações para ampliar seu trabalho educativo, relacionando tais ações ao cotidiano da sala de aula, aos conteúdos, ampliando o acesso dos alunos aos bens e expressões culturais. O que foi apresentado foi criação apenas dos alunos, sem nenhuma orientação ou acréscimo por parte dos professores. Apesar daqueles professores que promoveram a festa trabalharem de alguma forma com o tema em suas aulas, havia uma desconexão entre o conteúdo da sala e o extra-classe. Mas, mesmo com esses limites, uma atividade como esta aponta para a riqueza pedagógica dessas situações, contribuindo, através do prazer, para o reforço da autoestima, do sentimento de ser criativo, para o fortalecimento do sentimento de grupo entre os alunos e os professores. Aponta também
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para o potencial da escola como um espaço de cultura e lazer para o próprio bairro.
Um último aspecto a ser analisado diz respeito à estrutura da escola. A forma como a escola se organiza, como divide os tempos e espaços, pouco leva em conta a realidade e os anseios dos alunos. Há aí um deslocamento: a escola parece organizar-se para si mesma, como se a instituição em si tivesse algum sentido. Exemplo claro deste deslocamento é o horário de início das aulas. Se grande parte dos alunos dessa escola são trabalhadores, iniciar as aulas às 18h 30min irá resultar em não menos de 50% do infrequência diária no primeiro horário. Isso evidencia a falta de sensibilidade de colocar a organização da escola em função daqueles que são sua razão do existir, ou seja, os alunos.
Finalizando, vimos construindo, ao longo deste texto, um determinado olhar sobre a instituição escolar, apreendida enquanto espaço sóciocultural. Neste sentido, buscamos apreender alunos e professores como sujeitos sócio-culturais, ou seja, sujeitos de experiências sociais que são feitas reproduzindo e elaborando uma cultura própria. Na escola, desempenham um papel ativo no cotidiano, definindo de fato o que a escola é, enquanto limite e possibilidade, num diálogo ou conflito constante com a sua organização. Portanto, vimos definindo a escola como uma instituição dinâmica, polissêmica, fruto de um processo de construção social
Nesta ótica, ressaltamos aspectos e dimensões presentes no cotidiano escolar, que muitas vezes nos passam despercebidos, aparecem como "naturalizados" ou óbvios, que nada acrescentam aos "objetivos educacionais". Buscamos desvelar como os atores lidam na escola com o espaço, o tempo e seus rituais cotidianos. Concluímos que os atores vivenciam o espaço escolar como uma unidade sóciocultural complexa, cuja dimensão educativa encontra-se também nas experiências humanas e sociais ali existentes. Os alunos parecem vivenciar e valorizar uma dimensão educativa inportante em espaços o tempos que geralmente a Pedagogia desconsidera: os momentos do 126
encontro, da afelividade, do diálogo. Independente dos objetivos explícitos da escola, vem ocorrendo no seu interior uma multiplicidade de situações e conteúdos educativos, que podem e devem ser potencializados. É fundamental que os profissionais da escola reflitam mais detidamente a respeito dos conteúdos e significados da forma como a escola se organiza e funciona no cotidiano.
Acreditamos que a escola pode e deve ser um espaço de formação ampla do aluno, que aprofunde o seu processo de humanização, aprimorando as dimensões e habilidades que fazem de cada um de nós seres humanos. O acesso ao conhecimento, às relações sociais, às experiências culturais diversas, podem contribuir, assim, como suporte no desenvolvimento singular do aluno como sujeito sócio-cultural, e no aprimoramento de sua vida social.
Tornam-se necessários a ampliação e o aprofundamento das análises que, como essa, buscam apreender a escola na sua dimensão cotidiana, apurando o nosso olhar sobre a instituição, seu fazer e seus sujeitos, contribuindo, assim, para a problematização da sua função social.
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Ferdinan Francisco do Nascimento
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